A Maldição de Ju-On – Parte 2

5
(2)

Parte 3 – O Começo do Fim

A trajetória de Ju-on até aqui é, sem dúvidas, bem interessante e diferente de outras franquias. O gradual crescimento da popularidade fez com que os curtas de Takashi Shimizu se tornassem uma série com valor estimado na casa dos milhões de dólares. Um projeto que era inicialmente muito atrelado a cultura e ao momento em que o Japão vivia se tornou global. Mas como todo império tem seu fim e toda franquia quando esticada demais acaba se perdendo, Ju-on também entrou em queda após o segundo filme americano. Se no Japão, a popularidade do J-horror já havia se exaurido há algum tempo, o mesmo não tardou a acontecer nos Estados Unidos.

Ao longo da primeira parte deste artigo, ressaltei como os filmes da série foram lançados em pares, em todas as suas versões. Como toda regra tem sua exceção, não podia ser diferente com Ju-on. Três anos após o lançamento da parte 2, os americanos optaram por uma nova sequência para O Grito, mas por que então considerar este filme como isolado e não parte de uma trilogia?

O Grito 2 (2006)
O Grito 2 (2006)

Como também mencionado anteriormente, O Grito 2 foi o último filme da série, em ambos os países, a contar com a direção do criador Takashi Shimizu e seus fantasmas prediletos interpretados por Takako Fuji e Yuya Ozeki. Além de seguir em frente sem o seu núcleo original, o filme foi totalmente transportado para os Estados Unidos, abdicando por completo da trama japonesa. É exatamente por conta desse rompimento que a existência de O Grito 3 é como a de um filho bastardo. A direção ficou por conta de Toby Wilkins, que havia sido responsável pelos curtas Tales From the Grudge, lançados em paralelo com O Grito 2. O roteiro foi escrito pelo pouco experiente Brad Keene, que não voltou a escrever mais nada após este filme.

Com a maldição agora totalmente transportada para os Estados Unidos, a terceira parte se passa quase que inteiramente dentro do prédio residencial introduzido no filme anterior.

Curiosamente, o filme guarda mais semelhanças com a franquia Horror em Amityville do que com a franquia Ju-on e o motivo é bem simples: sem o núcleo japonês e incapazes de transpor todo aquele contexto histórico e cultural por trás da assombração, o filme segue o caminho sobrenatural comum ao cinema de horror americano. Algumas sequências e a própria linearidade do enredo parecem diretamente influenciadas pelo remake de Horror em Amityville (2005), e não pelos filmes anteriores da franquia. Kayako e Toshio foram representados por Aiko Horiuchi e Shimba Tsuchiya, respectivamente, apesar de que, em momentos de flashback, são utilizadas cenas com os atores originais. Existe uma discrepância grande entre as imagens, principalmente entre as versões de Toshio, que neste terceiro filme está notavelmente mais alto. O Grito 3 foi lançado diretamente em vídeo e foi o primeiro filme da série a receber censura R-Rated, algo próximo à censura 18 anos, em decorrência das cenas de morte mais violentas.

O Grito 3 (2009)
O Grito 3 (2009)

Apesar das vendas boas em vídeo, o filme não obteve o sucesso de seus predecessores e, como resultado, colocou um ponto final no universo Ju-on fora do Japão. Ao contrário de O Chamado que está em vias de ressuscitar nos Estados Unidos agora em 2016, a maldição de O Grito continua descansando em paz – ou será que não? Ao passo em que O Chamado 3 já é uma realidade, boatos percorrem a internet já há dois anos, dizendo que Sam Raimi iria produzir OUTRO reboot da franquia nos Estados Unidos. Aparentemente, o roteiro de tal reboot já está sendo finalizado por Jeff Buhler, mas não há qualquer informação mais concreta a respeito, e já não se ouve falar do filme desde meados de 2015. Não obstante, a história já é BEM diferente no Japão.

Ju-On (2009)

Takashi Shimizu abandonou a cadeira de diretor por trás de Ju-on, mas não se afastou completamente de sua estimada criação. Celebrando o eventual aniversário de dez anos da franquia, Takashi retornou ao Japão para o filme duplo Ju-on White/Black Ghost – ou, Fantasma Branco/Preto. Cada filme teve duração média de uma hora e foram lançados separadamente, porém simultaneamente em cinemas de todo o Japão em 2009, um mês após o lançamento americano de O Grito 3. Ambos contavam histórias semelhantes à tragédia de Kayako e Toshio, mas sem conexão alguma com os fantasmas vingativos originais – Toshio fez pequenas cameos em ambos. Ju-on Fantasma Branco foi escrito e dirigido por Ryûta Miyake, e trouxe a história de um fantasma de uma idosa. Ju-on Fantasma Preto, por sua vez, foi comandado por Mari Asato. No centro da história, o fantasma em questão é uma garota coberta de tinta preta dos pés à cabeça. Fantasma Preto é o filme que mais tomou liberdades na hora de recontar a tradicional história de vingança, acrescentando novos elementos e um final ainda mais pessimista que todos os outros da série. Os méritos vão todos para Mari Asato, um dos nomes mais promissores do cenário de horror japonês atual, que tem levado adiante o legado do J-horror em grande estilo. Além de Ju-on: Fantasma Preto, Asato está por trás do interessantíssimo Bilocation (2013) e da estonteante adaptação cinematográfica do vídeo game Fatal Frame (2014). Definitivamente um nome a ser acompanhado!

Ju-On (2014) 11

Após os três lançamentos em 2009, a série ficou jogada para baixo do tapete por alguns anos, até finalmente retornar em 2014, com o novo reboot Ju-on: O Começo do Fim – escolha curiosa de nome, por sinal. Takashi Shimizu, que havia marcado presença como produtor nos dois filmes anteriores, abre mão de vez de qualquer relação com este novo filme, literalmente entregando os pontos para se dedicar a outros projetos. Pouco antes, Shimizu voltou aos Estados Unidos para dirigir o conturbado Voo 7500, filme que quase não viu a luz do dia.

O único nome conhecido que retornou para Ju-on: O Começo do Fim foi o produtor Taka Ichise, talvez a figura mais importante do cenário de J-Horror. Infelizmente, no papel de roteirista, Ichise não conseguiu deixar uma impressão tão boa. Considerando as versões japonesas e americanas, está foi a quarta vez que a história de Kayako e Toshio foi recontada. No melhor estilo Hollywood, há uma tentativa de torcer a franquia ao máximo, para extrair até a última gota de dinheiro possível. É estranho pensar que ao retornar ao seu país de origem, o novo longa continuou mais próximo da americanização do que de suas raízes. O Começo do Fim é um filme que falha em transmitir os temas esclarecidos na primeira parte deste artigo; o elemento cultural japonês é diluído em meio à um enredo esgotado, as novas representações não têm o mesmo impacto e o filme não apresenta qualquer qualidade técnica de destaque. O começo do fim de Ju-on se deu com a saída definitiva de Takashi Shimizu, assim como aconteceu nos Estados Unidos.

Ju-On (2014) 12

Lembram-se daquela máxima estabelecida ao longo desta análise, de que os filmes da franquia sempre vêm em pares? Pois bem, em 2015, O Começo do Fim teve uma sequência, com o subtítulo O Final, nome este que sugeria um fim definitivo para a série que até então já havia rendido dez outros filmes, em sua grande maioria, canibalizando uns aos outros. O Final busca inspiração em O Grito 2, o filme americano, e o resultado é fraquíssimo, assim como o de seu predecessor. Mais uma vez ao invés de focar em suas próprias raízes históricas e culturais, entrega-se a conteúdos repetidos e que já não funcionavam mais há muitos anos.

Quando ninguém mais podia imaginar algo de interessante saindo desta franquia já tão exaurida e maltratada, eis que os produtores japoneses aparecem com uma ideia completamente surtada! Após uma brincadeira de Primeiro de Abril, alguma alma insana resolveu que seria uma ideia fantástica colocar Kayako, a fantasma vingativa icônica da série Ju-on, em uma batalha contra ninguém menos que Sadako, a garota da fita maldita de Ringu. Segundo boatos, o filme contará a história de uma garota que assiste a fita amaldiçoada de Sadako dentro da casa amaldiçoada de Kayako. A ideia beira à paródia, mas ao mesmo tempo tem um apelo imenso aos fãs, na linha de outros confrontos como Freddy vs. Jason e Alien vs. Predador. O longa ficará por conta de Kôji Shiraishi, diretor responsável por Noroi e Grotesque, filmes bem interessantes e com propostas diversas. Sem dúvidas uma boa escolha. Segundo o IMDB, Takako Fuji poderia retornar pela primeira vez em dez anos ao papel que a imortalizou entre os fãs de horror. Sadako vs. Kayako será lançado oficialmente em 2016, para delírio dos fãs.

Sadako vs Kayako (2016)
Sadako vs Kayako (2016)

Se este artigo me permitiu conhecer um pouco mais sobre Kayako, ouso dizer que é nela que devemos apostar nossas fichas nessa batalha. A maldição desta é deveras mais poderosa e deixou um rastro de morte que cruzou oceanos! Levando em consideração a história de Ju-on e até mesmo uma recente leva de filmes japoneses, é bem provável que Sadako vs Kayako seja um filme em duas partes.                                          

Conclusão

Dezoito anos se passaram desde que Takashi Shimizu concebeu Kayako e Toshio, fantasmas vingativos inspirados na tradição japonesa e que refletiam problemas sociais daquele país. Alcançando um sucesso gradativo e sempre tentando recontar a mesma história, Ju-on conquistou o mundo e foi parte de um dos movimentos cinematográficos mais relevantes e influentes que os filmes de terror já viveram, o J-horror.

Sadako vs. Kayako (2016) D

Vários nomes atravessaram a franquia dos dois lados do mundo, e foi criado um verdadeiro mar de dinheiro que, como era de se esperar, levou Ju-on para um final indigno de sua história. As repetidas vezes em que se auto devorou destituíram a série de qualquer valor, deixando-a no mundo da auto-paródia e do divertimento vazio. Ju-on tornou-se aquilo que os ingleses chamam de “cautionary tale”, neste caso em específico, uma história que nos adverte sobre os males de abandonar raízes em prol de algo comercial. A história de Ju-on é definitivamente única dentro do mundo das franquias cinematográficas, mas com um final tão desanimador quanto a maioria das outras. Apesar disto, os primeiros filmes estão resistindo bravamente ao teste do tempo e se consolidando como as obras fantásticas que são.

Resta agora aos fãs torcer para que os próximos filmes não arrastem o nome Ju-on para um poço ainda mais fundo, perdendo qualquer traço de dignidade, e que o trabalho de Takashi Shimizu seja devidamente valorizado. O J-Horror ainda vive, mas se transforma juntamente com o mundo. Fica então a torcida para que essa transformação seja para melhor.

O que você achou disso?

Clique nas estrelas

Média da classificação 5 / 5. Número de votos: 2

Nenhum voto até agora! Seja o primeiro a avaliar este post.

Avatar photo

Daniel Rodriguez

Belorizontino, professor de inglês, psicólogo de formação e fã do bizarro, do estranho, do surreal, do sanguinário e do monstruoso!

3 thoughts on “A Maldição de Ju-On – Parte 2

  • 09/11/2016 em 01:48
    Permalink

    Assisti ao Sadako vs Kayako. É uma porcaria, mas não consigo achar o filme uma bomba total. Defino-o como “comédia de terror”, misturando elementos absurdos, que lembram O Exorcista, Freddy vs Jason, Dragon Ball Z (?), Naruto (??) e… …Shurato (???).
    Não tem como controlar a risada do início ao fim, é a lei do “quanto pior, melhor”.
    Misture Todo Mundo em Pânico, Jason X e as maluquices que citei acima e você tem Sadako vs Kayako.

    Resposta
  • 18/08/2016 em 09:51
    Permalink

    Espero mesmo que a Takako Fuji retorne pra essa bomba que será Sadako x Kayako, pelo menos ela é assustadora e traz lembranças de quando a franquia não tinha sido totalmente jogada no lixo, vale pelo lado emocional pros fãs… mas o visual da personagem está péssimo, assim como o do Toshio.

    Resposta

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *