A linda e misteriosa Transilvânia

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Quem me conhece sabe que o cinema de terror é parte importante da minha vida. Sou um apaixonado pelo gênero e isso me levou inclusive a fazer meu mestrado e meu doutorado em cinema de terror. E sempre que tenho a oportunidade de viajar eu procuro por alguma “atração” de terror. Assim quando estive em NY fui logo para a frente do edifício Dakota, onde O Bebê de Rosemary foi filmado. Em Los Angeles fui procurar a casa de A Hora do Pesadelo. E como esquecer quando conheci Elvira, a rainha das trevas na mesma viagem? Na Inglaterra peguei um trem e fui em busca do castelo onde Rocky Horror Picture Show foi gravado e passei um dia por lá.

Tanto amor pelo gênero me fez pensar em um dia conhecer a Transilvânia. Apesar de não ser um grande fã de filmes com vampiros, apesar de existirem alguns excelentes, o nome Transilvânia sempre foi para mim sinônimo de filmes de terror. No entanto, não estamos falando de um destino fácil de chegar, mas depois de algumas tentativas, finalmente comprei as passagens. Apenas para contextualizar, localizada na Romênia, a Transilvânia não é uma cidade, mas uma região que fica situada no centro-oeste do país. É limitada a leste e a sul pelas montanhas dos Cárpatos.

A primeira dificuldade da viagem foi literalmente como chegar lá. Precisei pegar quatro aviões para a Romênia. Meu primeiro voo foi para Lisboa, depois segui para Roma, mais um terceiro para Sófia, capital da Bulgária, e finalmente um quarto avião para Bucareste, capital da Romênia. Ou seja, reserve pelo menos dois dias apenas para chegar à Romênia.

Apesar da expectativa, começar a viagem em Bucareste é no mínimo frustrante. Além de não fazer parte da Transilvânia, a cidade não é feia, mas está longe de ser bonita. Em comparação com outras capitais europeias, Bucareste não tem absolutamente nada demais. Mas eu havia sido alertado deste fato e passei apenas um dia por lá. No dia seguinte peguei um trem para finalmente chegar à Transilvânia. Foi neste momento que minha viagem realmente começou a valer cada centavo.

No filme Drácula de Bram Stoker, o personagem Jonathan Harker explica que chegar à Transilvânia é como estar entrando em uma das regiões mais desconhecidas e selvagens da Europa. E em uma carta escrita pelo próprio Drácula, o vampiro saúda Harker ao seu lindo país. É impossível não lembrar destes dois momentos do filme enquanto o trem segue. A cordilheira dos Cárpatos é sem dúvida um dos pontos de destaque da viagem. Algumas montanhas são tão altas que são cobertas pelas nuvens. E em alguns trechos o trem passa entre áreas muito fechadas de florestas. A minha primeira parada foi na cidade de Brasov.

Com cerca de 200 mil habitantes, Brasov é um charme de cidade. Cercada pelos Cárpatos, o fã de filmes de terror vai se sentir em casa. Não apenas pelo visual, mas porquê em diversos lugares existem placas informando que você está na Transilvânia. Aliás, o principal banco da Romênia se chama… Banco Transilvânia. Isto sem contar bares, restaurantes e lojas. No entanto, não notei nada vampiresco em Brasov. Na verdade parece existir quase que uma negação deste tema.

Outro fato curioso é que meu primeiro dia em Brasov foi de sol. Viajei no verão e cheguei em um dia com o sol brilhando, o céu super azul, um calor terrível e crianças correndo e brincando nos parques. Confesso que fiquei um pouco desapontado. Mas no dia seguinte surgiu uma super nuvem que encobriu todo o sol e deixou o dia cinzento e um pouco frio. A partir daquele momento eu estava me sentindo mais na Transilvânia.

O povo romeno é super simpático e, mesmo quase ninguém falando em inglês, é possível se comunicar. Aliás, a língua romena é de origem latina e parece uma mistura de italiano, espanhol, francês e inglês. Apesar do sotaque ser bastante difícil para nós, a leitura do romeno é de certa forma fácil. Isto ajuda muito na hora de escolher o que comer em restaurantes.

De Brasov seguimos para Sighișoara. Quanto mais entrávamos na Transilvânia mais a viagem se tornava melhor. A Romênia é um país encantador e o seu interior é de deixar qualquer turista de boca aberta. Em um desses trens eu esqueci a minha carteira com todo o meu dinheiro. Imagine o filme de terror que seria perder a certeira no interior da Romênia… Mas ao perceber que estava sem a carteira, voltei para o trem que ainda estava na estação e vi um homem procurando o dono da carteira encontrada por ele. Ou seja, o romeno é honesto.

Sighișoara é uma pequena cidade medieval com pouco mais de 20 mil habitantes. E se Brasov não tem nenhuma ligação com vampirismo, Sighișoara é o oposto. Lá foi a cidade na qual Vlad, o empalador, que teria inspirado Bram Stoker a criar o vampiro Drácula, teria nascido. A utilização do verbo no futuro do pretérito acontece pelo simples fato de que muitas informações sobre Vlad não são exatas. De uma forma ou de outra, lá é possível encontrar desde estátua dele em praça pública até a casa na qual ele teria nascido.

No entanto, algumas “atrações” são de um mal gosto tremendo. Na tal casa na qual Vlad teria nascido, existe um “passeio” para você conhecer o “quarto” onde ele nasceu… Com uma decoração sofrível que mais parece a “noite de terror” de algum parque de diversões, entramos no tal quarto para vermos um “ator” deitado em um caixão. É constrangedor de ruim… E claro que, após acordar, o “vampiro” pede dinheiro.

Independente de Vlad, o empalador, Sighișoara é um lugar encantador. Cercada também pelos Cárpatos, a cidade faz você se sentir dentro de um cenário medieval de filme. E durante a noite surge uma neblina que deixa todo o visual ainda mais encantador ou assustador dependendo de que tipo de experiência você está buscando. Pelo seu aspecto medieval, é impossível não sair de lá com muitas fotos. Uma observação interessante é que o péssimo filme A Freira foi filmado em duas cidades romenas sendo uma dessas Sighișoara. Eu não queria ir embora, mas precisei sair e desta vez foi de ônibus.

Eu estava na não tão bonita estação de ônibus de Sighișoara quando um senhor romeno puxou conversa. Com inglês meio confuso começou a me falar para ter cuidado viajando pelo interior do país, pois coisas estranhas acontecem na região e as pessoas depois nunca mais são vistas. Ou seja, encontrei um Crazy Ralph na Transilvânia. Perguntei para ele se vampiros existem. Ele riu e respondeu que se existem, moram provavelmente nas montanhas dos Cárpatos. Ele começou a fazer algumas perguntas muito suspeitas como se estava viajando sozinho, para onde eu estava indo, onde ficaria… Fingi que meu telefone estava chamando e pedi licença. Velho esquisito na Transilvânia fazendo perguntas estranhas… Era o enredo óbvio de um filme de terror.

Entrei no ônibus e segui para Bran, que com seus cinco mil habitantes, é conhecida por seu castelo no qual Vlad teria vivido alguns anos. Mais uma vez as informações não são exatas, mas o castelo, também em estilo medieval, é lindo. Lá existem algumas salas dedicadas não apenas a Vlad, mas aos vampiros desde lendas e mitos até os cinematográficos com destaque para Drácula. A cidade, um lugarejo na verdade, também é muito charmosa.

Depois de quase uma semana nestas três cidades, infelizmente voltei para Bucareste para de lá seguir para a Ucrânia. De lá aproveitei para mais um destino típico de filme de terror: conhecer Chernobil. De volta ao Brasil, já estou morrendo de saudades da Transilvânia. Apesar da dificuldade de chegar lá e do investimento, a viagem foi incrível. A Transilvânia é linda e quero não apenas voltar, mas quero voltar no outono ou no inverno. Em se tratando de Transilvânia, quero que a próxima viagem seja ainda mais soturna.

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Filipe Falcão

Jornalista formado e Doutor em Comunicação. Fã de filmes de terror, pesquisa academicamente o gênero desde 2006. Autor dos livros Fronteiras do Medo e A Aceleração do Medo e co-autor do livro Medo de Palhaço.

One thought on “A linda e misteriosa Transilvânia

  • 14/10/2018 em 21:09
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    Á Romênia é um país muito mistico e cheios de mistérios ,principalmente essa parte do país ao qual você (Felipe) visitou, até eu tinha vontade de conhecer esse fascinante país do Leste Europeu … esse fosse no Brasil em que você tive-se perdido esse dinheiro no trem e voltaria para busca-lo, esquece pois nunca mais você acharia á sua carteira com dinheiro ou documentos ou alguém mesmo para entrega-los em mãos o nosso país esta anos -luz em matéria de educação em relação ou outros.

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