Narrativas do Medo (2017)

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Narrativas do Medo
Original:
Ano:2017•País:Brasil
Autor:Cesar Bravo, Rô Mierling, Alexandre Callari, Marcos DeBrito, Marcus Barcelos, Duda Falcão, Márcio Benjamin, Ademir Pascale, Geraldo de Fraga, Paul Richard Ugo, Alfer Medeiros, Petter Baiestorf, Melvin Menoviks, Daniel Pires, Rodrigo RamosFlávio Karras, Hedjan C.S., Vitor Abdala•Editora: Autografia

por Glau Kemp

É uma das melhores antologias de terror de 2017. Um livro ambicioso que traz os autores de terror mais talentosos da atualidade. Nomes já consagrados e novos talentos estão lado a lado em um livro versátil e surpreendente que não se prende há temas específicos e dá total liberdade para autores.

O organizador desse projeto incrível é o autor e jornalista Vitor Abdala e a publicação foi feita pela editora Autografia, através do selo Neblina Negra. Uma das coisas que mais me chamou a atenção nesse livro é o espírito colaborativo do projeto. São dezoito autores e todos têm seu nome na capa, sem protagonismo para nomes mais conhecidos, e por esse motivo o livro já ganhou minha simpatia logo de início, pois representa exatamente o que uma antologia deve ser.

Narrativas do Medo fortalece o gênero de terror com um trabalho primoroso. São dezenove contos todos de excelente qualidade sem exceção, mas para não me entender muito irei comentar os seis que mais me surpreenderam.

Malditos Palhaços – Alexandre Callari

Steve kino é um escritor consagrado por um calhamaço de mais de 800 páginas. O livro intitulado de Medo traz uma criatura capaz de se manifestar na forma do maior medo de uma pessoa, e na maior parte do livro essa criatura é um palhaço.

Cheio de referências bastante atuais o conto coloca Steve diante de uma onda de imitadores que adotam o personagem que ele criou para fazer brincadeiras que saem do controle. O conto tem um time ótimo e eu encarei como homenagem muito oportuna a Stephen King.

“Seu instinto, temperado por centenas de horas de filmes de terror, milhares de páginas de leituras macabras e incontáveis horas vislumbrando cenas inquietantes nos labirintos da própria mente, recusou-se a crer que ele estivesse seguro, e o fez apanhar uma faca”…

Pesadelos em Sachsenhausen – Paul Richard Ugo

Esse conto prendeu atenção pela riqueza de detalhes. O protagonista é Leonard Abramoff,  um brasileiro de origem judaica que cresceu ouvindo as terríveis histórias da família que fugiu da Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial, mas infelizmente nem todos conseguiram escapar e alguns foram capturados pelo regime nazista.

Durante uma viagem turística Leonardo decide refazer os mesmos passos de seus antepassados, chegando até se hospedar em um local de grande significado para sua família.  A história é muito bem detalhada e com pouco espaço o autor conseguiu construir um excelente protagonista e um grande vilão.

“Um oficial da Gestapo entrou na casa e ordenou que abrissem seu ventre com um punhal diante dos olhos do meu bisavô. De lá tiraram os diamantes que jaziam em um pequeno saquinho de linho.”

Necrochorume – Duda Falcão

Um pai e um filho, na tentativa de uma reaproximação, vão acampar em uma pequena cidade. O menino percebe que há algo estranho no lugar e com as pessoas que vivem nele, mas o pai deseja relembrar a própria infância e o prazer de estar em meio à natureza e pescar. O homem contorna os contratempos com empolgação e ignora os sinais de alerta.

A história é bastante sombria e tem um desfecho muito intrigante e eu realmente queria que o conto fosse um pouco maior. Foi surpreendida em uma cena muito boa no maior estilo Lovecraft e esse se tornou um dos meus contos preferidos no livro.

“O menino sentiu um calafrio que arrepiou toda a sua espinha. Tentou se afastar, sem sucesso. Era como se estivesse preso a ela.”

Penitência – Rodrigo Ramos

Traz a história de Bento, um padre atormentado pelos próprios pecados que muda de paróquia com frequência para fugir das consequências de seus atos.  Esse conto tem uma carga emocional grande do personagem que, apesar de sofrer internamente e se punir, parece não compreender a gravidade de suas ações ou realmente se arrepender.

A história é um terror realístico que mergulha na consciência do padre e lá consegue desenvolver cenas com mais elementos fantásticos. Gostei da escrita e principalmente do desfecho da história.

 “A cada novo estralo, uma nova ferida se abria, vertendo sangue quente sobre cicatrizes antigas. Bento perdeu a conta de quantas vezes rezou o pai-nosso até que a dor foi mais forte e o velho padre caiu, tingindo de sangue o chão de mármore da velha igreja”.

Filhos do Escuro- Hedjan C.S

Um médico bem sucedido tem uma noite de horror ao enfrentar seus próprios demônios. Esse conto me conquistou com uma cena bem bizarra. Gostei do modo atípico que a entidade se manifestou e sua motivação também acrescentou mais profundidade ao texto.

“Abriu a porta do quarto com o pé, acendendo a luz com a mão que não segurava a arma. O quarto estava vazio. Mas algo se movia dentro do armário. Pensou ser um rato de bom tamanho. Abriu a porta de supetão, para espantar o bicho, e recuou horrorizado.”

A Lenda do Raimundinho – Daniel Pires 

Esse conto tem uma característica muito bacana, pois parece um relato assombrado. É narrado em primeira pessoa, de uma maneira bem suave que envolve o leitor na história. Me senti ouvindo uma história de terror no roda de conversa.

O conto traz uma lenda urbana da cidade de Avaré no interior de São Paulo, onde o espírito de Raimundinho assombra as pessoas que visitam seu túmulo e não deixam doces como oferenda. O narrador é um amante de histórias de terror e vai até o túmulo e faz um vídeo, mas não deixa a oferenda e a partir daí se sente atormentado por algo ruim.

“– Você não trouxe balas, o Raimundinho vai te cobras pela filmagem – brincou meu irmão.

Tentei me desvencilhar dessa praga:

– Imagina, moleque besta. O Raimundinho Jamais faria isso.”

Narrativas do Medo é um livro que merece figurar entre os trabalhos mais expressivos do terror contemporâneo pela qualidade e a rara oportunidade de reunir, em 200 páginas, estilos tão diferentes. Um exemplo a ser seguido para quem organiza antologias e uma meta para escritores.

Não tenho críticas negativas, mas gostaria de ressaltar que internamente o livro é muito simples em questão de diagramação. Esse livro merece ser lido pelo maior número de leitores possível e sua simplicidade restringe um pouco o público. É uma questão importante principalmente relacionada ao leitor mais jovem que é mais exigente na questão estética do livro. Espero que pensem em fazer um volume dois.

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Autor Convidado

Um infernauta com talentos sobrenaturais convidado a ter seu texto publicado no Boca do Inferno!

6 thoughts on “Narrativas do Medo (2017)

  • 20/01/2021 em 21:09
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    Boa noite. Como consigo este livro? Estou procurando para comprar mas não encontro em lugar nenhum.

    Resposta
  • 29/09/2017 em 17:47
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    Esse livro é incrível. Medo, versatilidade, surpresas sangrentas a cada página vencida. Foi um prazer conhecer (e redescobrir) o trabalho de tanta gente talentosa.

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  • 29/09/2017 em 10:14
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    Muito boa a resenha! Como sempre, Boca do Inferno é pioneiro, ao fazer a primeira resenha do Narrativas do Medo! Obrigado, Glau Kemp!!!

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  • 28/09/2017 em 21:53
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    O texto possui alguns erros de digitação e outros de concordância e grafia. Creio que na resenha do primeiro conto ela quis dizer “timing” e não “time” como está escrito.

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  • 28/09/2017 em 16:41
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    Glau,

    Muito obrigado pelas palavras!

    Fiquei realmente emocionado e determinado a seguir produzindo depois de ter sido tão bem acolhido em minha estreia. Tanto pela equipe de escritores, como pelo público e agora com uma resenha tão calorosa como essa!

    <3

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