O Chamado 2 (2005)

3.7
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O Chamado 2 (2005)
Samara está de volta… mas agora transformada em mais uma vilã banal!
O Chamado 2
Original:The Ring Two
Ano:2005•País:EUA
Direção:Hideo Nakata
Roteiro:Ehren Kruger, Kôji Suzuki
Produção:Laurie MacDonald, Walter F. Parkes
Elenco:Naomi Watts, David Dorfman, Sissy Spacek, Simon Baker, Elizabeth Perkins, Gary Cole, Ryan Merriman, Emily VanCamp, Kelly Overton, James Lesure, Kelly Stables

Há um certo tempo, quando eu escrevi uma análise confessando gostar do filme Ringu 2, sequência de um grande sucesso do cinema de horror japonês (ambos os filmes dirigidos por Hideo Nakata), abri o texto citando as diferenças entre Ocidente e Oriente. Dentro desta minha comparação, eu exemplifiquei dizendo que uma sequência de filme de sucesso feita no Japão tentava expandir a mitologia do primeiro, e não apenas copiar os elementos que fizeram sucesso anteriormente – como normalmente acontece no cinema ocidental. Apostava eu, também, que O Chamado 2, sequência do remake americano do primeiro Ringu, seria praticamente uma cópia do original, aproveitando as ideias que deram certo e sem mexer em uma linha do roteiro.

Pois é… O mundo dá voltas, os dias passam, os meses também, e aqui estou eu voltando ao tema, desta vez escrevendo sobre aquele mesmo O Chamado 2 que era apenas um projeto em desenvolvimento enquanto eu analisava Ringu 2 para o Boca do Inferno. Algumas coisas me pegaram de surpresa nestes meses que separam os dois textos, como o fato de os produtores americanos terem “importado” o diretor japonês Hideo Nakata para comandar a sequência nos Estados Unidos, porém com a condição de que o filme tivesse um roteiro original, sem nada a ver com o Ringu 2 – que é considerado pavoroso por aquelas pessoas que gostam de assistir filmes sem a necessidade de ter que pensar e raciocinar sobre o que vêem.

O envolvimento de Nakata no projeto me deu pelo menos uma garantia: mesmo que o filme ficasse longe das doideiras da série japonesa, mesmo assim teria um diferencial, que seria o toque oriental e um sujeito de visão que, afinal, trabalhou nos filmes originais! E além do mais, Nakata não é um diretor de videoclipe, como esses para quem os produtores dos EUA gostam de entregar projetos de filmes de horror. Vale lembrar que o primeiro escalado para comandar O Chamado 2 era o diretor de comerciais de TV (!!!) Noam Murro. Por outro lado, eu continuei com aquela ideia fixa de que o filme não seria nada mais do que uma cópia de tudo o que deu certo em O Chamado, com pouca ousadia – o extremo oposto do que foi a sequência japonesa, que teve cara e coragem para mudar completamente a trama do original, para o bem ou para o mal!

E ver O Chamado 2 no cinema me deu a comprovação de que eu estava certo em algumas coisas e errado em outras. Certo sobre a cópia, e errado sobre Nakata. Não é que o japa acabou influenciado pelos produtores americanos? Pelo menos é o que parece: este é o filme mais impessoal do cineasta japonês. Tudo bem que ele não se entrega aos devaneios e pirotecnias típicas dos diretores americanos do gênero, preferindo compor um clima mais contido, sem abusar dos efeitos especiais. Por outro lado, não hesita em avacalhar a obra assustadora que ele próprio ajudou a criar, “americanizando” em demasia certos detalhes, enchendo de sustos desnecessários e forçando heroísmos e soluções absurdas. Talvez o maior culpado de tudo seja o roteiro péssimo de Ehren Kruger, que nem tenta criar uma história minimamente aceitável, caindo no lugar comum. Por outro lado, a direção de Hideo Nakata também não ajuda muito, e o diretor acaba fazendo uma montanha-russa de cinema-pipoca tipicamente americana, ou seja, uma colcha de retalhos formada de sustos, sem um pingo de originalidade e ousadia.

O diretor também faz o pior que poderia fazer: ele se repete. Ou melhor: se auto-plagia. A impressão que tive é que Nakata perdeu o roteiro de O Chamado 2 e resolveu refilmar outro de seus filmes, Dark Water, talvez sem saber que nosso amigo Walter Salles já estava trabalhando nisso. Do começo ao fim, O Chamado 2 é praticamente um xerox de Dark Water, inclusive na nova motivação que o roteirista encontrou para a vilã-mirim Samara, aquela que vive no poço e que mata em sete dias. O quê? Você pensou que ela só queria ser “ouvida“? Hahaha. Engano seu, meu amigo. Samara tem outros planos, na linha Dark Water, e é inevitável uma sensação de decepção com esta mudança na personalidade da “vilã“.

Já explico, em partes, porque é tão fácil se decepcionar com O Chamado 2:

1-) Ringu, o original japonês de 1998 – e, vá lá, suas continuações também – praticamente revolucionou o cinema de horror moderno. Dá até para dizer que não existe uma outra série cinematográfica no gênero tão referencial quanto Ringu feita nos últimos anos – é só lembrar que os filmes geraram mangás, séries de TV e remakes diversos, não só nos EUA, mas também na Coreia. Também influenciaram várias imitações, como o péssimo Medo.Ponto.Com.

2-) The Ring, ou O Chamado, o remake americano de 2002, com direção segura de Gore Verbinski, é uma das raras boas refilmagens americanas, embora eu não concorde com muitas das mudanças relacionadas ao original japonês. E também foi um sucesso de bilheteria, que praticamente PRECISAVA ser transformado em série para os produtores poderem lucrar mais.

3-) O envolvimento de Hideo Nakata, diretor de Ringu e Ringu 2, era uma garantia de que a sequência americana pelo menos teria fidelidade às suas raízes, e que o filme não cairia no lugar-comum das produções feitas nos Estados Unidos. Mas, na prática, não foi o que aconteceu.

4-) Ainda que o filme fosse fraco, se mantivesse um mínimo da “essência” da trama original (Samara, a maldição, o prazo de sete dias para morrer, a investigação do mistério…), os fãs aprovariam de qualquer forma. Também não foi o que aconteceu.

O Chamado 2 (2005) (5)

5-) A dupla de atores principais do remake, Naomi Watts e David Dorfman, estavam de volta, o que garantia que o roteiro da sequência realmente daria continuidade à trama, ao invés de partir para uma história independente.

Todas as peças estavam no lugar, mas algo deu errado.

O Chamado 2 começa com uma introdução que é praticamente um repeteco da abertura de Ringu e O Chamado. Um rapaz e uma garota estão em casa, sozinhos. O garoto, Jake (Ryan Merriman, do péssimo Halloween Resurrection), pede se a namoradinha gostaria de ver “a coisa mais assustadora do mundo“. E mostra uma fita sem identificação, pedindo que ela veja e se apavore. Percebe-se que o rapaz está nitidamente apavorado e olhando para o relógio. Acontece que Jake já sabe tudo sobre Samara e a maldição, viu a fita e seu prazo de sete dias está se encerrando. É preciso mostrar a cópia feita da fita amaldiçoada para uma nova vítima, e propagar a maldição, caso contrário todos nós sabemos o destino do pobre coitado… E o inevitável acontece: a garota não assiste a fita e Jake tem que pagar o preço. E Samara sai da TV para agarrá-lo e mostrar que a maldição, como vista no primeiro O Chamado, continua.

O filme então corta para nossos velhos conhecidos, a jornalista Rachel Keller (Naomi) e seu filho Aidan (David), que continua tão esquisito quanto no original. Depois do pesadelo vivido no primeiro filme, da ameaça de morrerem vítimas da maldição e da morte de Noah, ex-marido de Rachel e pai de Aidan, a dupla decidiu se mudar para uma cidade do interior do Estados Unidos, chamada Astoria, onde podem recomeçar suas vidas longe da ameaça da maldição de Samara. Aliás, é bom lembrar que nunca fica claro para quem, afinal, Rachel mostrou a cópia da fita que fizeram no final de O Chamado, o que foi decisivo para salvar a vida de Aidan.

E já que toquei neste assunto, um rápido aparte: vamos considerar que, entre O Chamado e O Chamado 2, a maldição de Samara já se espalhou de forma irremediável pelo mundo. Pense que se a cópia feita por Rachel no final do primeiro filme teve que ser passada para alguém e este alguém, já sabendo o que precisava fazer para não morrer em sete dias, também fez sua cópia, já deveriam existir centenas de fitas circulando por todos os Estados Unidos, talvez por todo o mundo. As pessoas até saberiam como escapar da maldição (Jake, o rapaz do início do filme, por exemplo, já sabia), mas ainda assim teriam que fazer novas cópias e espalhar pelo mundo, mostrando a outras pessoas. Só que o roteiro fraquinho de Kruger simplesmente esquece deste detalhe, que poderia dar uma interessante magnitude à história.

Na verdade, isso não importa dentro do contexto da sequência, já que toda a trama da fita maldita é rapidamente abandonada, isso ainda nos primeiros 20 minutos de duração. Acontece que Rachel, atualmente trabalhando no pequeno jornal de Astoria, fica sabendo que um jovem (Jake, lembra dele ainda?) foi encontrado morto em circunstâncias misteriosas. A jornalista vai até lá, meio com a pulga atrás da orelha, e acaba invadindo a ambulância para dar uma olhada no cadáver e ter certeza se é obra de Samara ou não. Ao ver o rosto terrivelmente deformado do rapaz (um elemento que foi introduzindo no remake americano, pois nos filmes japoneses as pessoas apenas morriam com uma expressão natural de horror em seus rostos), Rachel tem a certeza de que não pode fugir da maldição. Pior: num susto completamente gratuito, mas eficaz (pelo menos todo o cinema pulou da poltrona na sessão em que eu estava), o fantasma de Samara sai de dentro do cadáver do garoto, agarra Rachel pelo braço e diz, com sua voz cavernosa: “Eu te encontrei!!!“, antes de desaparecer. Uma rápida visita do fantasminha ou alucinação da cabeça da traumatizada jornalista?

Tempo! Tempo! Eu até gostaria de pensar que era uma alucinação, mas é óbvio que o roteiro quer que acreditemos que Samara realmente apareceu naquele momento para deixar bem claro a Rachel que estava de volta. E que a havia encontrado. A pergunta: por quê? Se Rachel havia feito exatamente o que Samara queria (espalhou a maldição, gravando uma cópia da fita e mostrando a outra pessoa), que motivo Samara teria para querer vingança contra Rachel? Ora, ela fez exatamente o que outras pessoas com certeza também fizeram para fugir da maldição. E, supostamente, este era o objetivo da garota: ser ouvida, espalhar suas fitas para que todos soubessem o que aconteceu com ela…

Mas voltemos ao filme: Rachel acaba recuperando a fita de vídeo na casa onde o rapaz foi morto e, rapidamente, dá um fim nela, incinerando-a. Neste momento, parece que o pesadelo acabou (apesar de, volto a salientar, certamente existirem dezenas, talvez centenas de outras cópias da fita se espalhando por todos os Estados Unidos naquele exato momento). A jornalista volta para casa e é como se Samara nunca mais fosse incomodar. Mas este é um filme de horror, certo? E logo Samara parte para o plano B: se a fita mixou, então vamos buscar outra forma de atazanar os pobres Rachel e Aidan, que, sabe-se lá por quê, se transformaram em alvos prioritários da menina-fantasma.

O Chamado 2 (2005) (4)

Certa tarde, mãe e filho vão participar de uma feira de antigüidades. Enquanto Rachel fica circulando pelas bancas, e encontra até uma suspeita fita de vídeo sem identificação numa barraquinha (olha ali outra evidência de que a maldição está se espalhando de maneira irremediável!!!), Aidan vai ao banheiro e vê o vulto de Samara no espelho. Sabe-se lá porquê, ele faz várias fotografias da menina, ao invés de sair no pinote dali e correr para debaixo da saia da mãe. E o improvável acontece: Samara possui Aidan. Assim, sem mais nem menos.

A partir de então, e por um bom tempo, pouquíssima coisa acontece. Rachel começa a perceber que há algo de estranho com seu filho (ou mais estranho, considerando que o pirralho já é bem esquisito). A temperatura corporal do garoto passa a abaixar violentamente (como se ele estivesse morto), e Aidan começa a chamá-la de “mamãe“, e não de “Rachel“, como era usual. Aos poucos, a jornalista começa a se conformar com a ideia de que Samara está no corpo do seu filho, e as fotografias tiradas pelo garoto no banheiro – que mostram, lentamente, Samara “entrando” em Aidan (sem malícia, por favor…) – comprovam esta teoria. Para tentar salvar a vida do garoto, que vai parar no hospital, Rachel reinicia sua investigação, voltando para os locais por onde já havia passado no primeiro filme, em busca de novas informações sobre Samara, que possam levar a uma salvação para Aidan.

Lá pelas tantas, Rachel chega a voltar para o Rancho Morgan, aquela fazenda de criação de cavalos onde Samara viveu na infância antes de ser morta, e onde seu pai adotivo, Richard Morgan, se suicidou no filme original. Ali, Rachel descobre evidências que a levam até a verdadeira mãe da garota, Evelyn, que vive num hospício desde que tentou afogar a filha quando esta ainda era um bebê (é mal de família, todo mundo quer matar a Samara!!!). Neste momento, descobrimos porque a menininha é malvada e tem poderes que usa para o mal: a atriz que interpreta Evelyn é ninguém menos que a veterana Sissy Spacek. Ou seja: Samara é filha de Carrie, a Estranha!!! Agora sim tudo se explica… Aliás, os produtores de O Chamado 2 merecem um prêmio pela total falta de imaginação, ao representarem Evelyn como uma “versão envelhecida” de Samara, inclusive com o longo cabelo negro na frente do rosto, no tal esquema “mais óbvio, impossível“.

Como o leitor pode observar, O Chamado 2 não tem lá muita história – e este fiapo de enredo também não é lá tão interessante quanto poderia, e deveria, ser. A própria trama da maldição da fita é sumariamente abandonada já nos primeiros 20 minutos, e então o filme se transforma na enésima versão sobre uma criança possuída por espírito do Mal. Muitos podem argumentar que o filme tentou seguir uma direção diferente, ao invés de simplesmente repetir a história original. E aí eu dou a cacetada: pois Ringu 2, que seguiu numa direção radicalmente oposta ao original, ainda assim manteve alguns elementos primordiais do original, como a maldição da fita (que fica em segundo plano, mas está lá), o prazo de sete dias e uma investigação realmente interessante.

O grande problema, na comparação entre O Chamado 2 e Ringu 2, é que Rachel, por ser a personagem principal também em O Chamado, deveria saber muito mais sobre Samara, porque foi obrigada a aprender sobre sua oponente no primeiro filme. Mas, ao contrário, parece que a “heroína” não aprendeu absolutamente nada. Tanto que ela precisa voltar aos lugares onde já tinha ido no original em busca de mais pistas e informações, e até as encontra facilmente, considerando que o Rancho Morgan, por exemplo, estava desabitado. Além do mais, não existe a limitação de tempo em sete dias, e o espectador não se sente aflito e oprimido com a condição de Rachel. Na verdade, o que parece é que ela tem todo o tempo do mundo para investigar e resolver o mistério sobre o passado de Samara, mesmo que Aidan esteja internado num hospital. Isso tira muito do suspense do filme, ajudando a tirar o interesse do espectador pelo desenvolvimento da história.

E o roteiro fraco (ele de novo) torna tudo muito conveniente e facilitado para os personagens, especialmente para Rachel. No início, por exemplo, ela tenta falar com a garota que testemunhou a morte de Jake e um policial a impede, levando a moça embora… apenas para deixá-la sozinha em uma sala momentos depois, bem ao lado de Rachel, que aproveita então para interrogar a menina sem qualquer dificuldade. Rachel também consegue invadir sem qualquer problema tanto o carro funerário onde está o cadáver de Jake quanto a cena do crime, para recuperar a fita. Depois, durante sua investigação, tem toda as pistas entregues de bandeja: primeiro, tem uma “visão” que já lhe mostra todas as informações necessárias; depois, encontra um amigável corretor de imóveis no Rancho Morgan que facilita sua entrada na casa; depois, ainda, consegue acesso sem qualquer dificuldade ao manicômio onde Evelyn, a mãe verdadeira de Samara, está internada, e por aí vai. Só em filme, mesmo.

O roteiro fraco (olha ele mais uma vez!) também deixa pouco espaço para outros personagens, concentrando toda a ação em Rachel, Aidan e Samara, quando a continuação original japonesa era fascinante justamente por resgatar diversos personagens secundários do primeiro filme e lhes dar mais destaque. Em O Chamado 2, os coadjuvantes fazem muito pouco ou nada, e parecem estar ali apenas para morrer. Ou não fazem diferença alguma. Pior: com isso, acaba-se desperdiçando excelentes atores. Sissy Spacek é de longe a mais afetada: sua Evelyn, apesar de ter dado vida à grande vilã do filme, não faz absolutamente nada, quando poderia ser uma importante fonte de conhecimento e esclarecimentos, explicando, por exemplo, a origem de Samara e de seus poderes malignos (o que jamais acontece); Simon Baker (que estará também em Terra dos Mortos, de George A. Romero) interpreta Max Rourke, um jornalista que é colega de trabalho de Rachel em Astoria, e cuja participação no filme é tão inútil que eu acabei nem precisando citá-lo quando narrei a história, nas linhas acima. Embora tenha sido colocado no roteiro como uma espécie de “ajudante” de Rachel, tomando o lugar do falecido Noah do original, Max acaba se transformando apenas em baby-sitter de Aidan, sem participar diretamente da ação e sem ajudar a heroína em sua investigação – sem nem ao menos envolver-se romanticamente com Rachel, como muitos poderiam imaginar. Também sobra pouco para a outrora bela Elizabeth Perkins (de Os Flinstones), irreconhecível como a dra. Emma Temple, que acredita que Rachel está agredindo Aidan ao encontrar o garoto cheio de marcas pelo corpo (provocadas, obviamente, por Samara). Mas o mais desperdiçado do elenco é o excelente Gary Cole (das séries de TV The West Wing e American Gothic), que não tem qualquer função na trama como o corretor de imóveis Martin Savide, que mostra o Rancho Morgan para Rachel quando ela volta àquele amaldiçoado local. E se Naomi Watts faz seu bom trabalho habitual, o garoto David Dorfman continua tão ruim quanto no primeiro filme, se não pior. As caras e bocas que ele faz quando já se encontra possuído por Samara são de se mijar de rir!

É uma pena que uma trama tão fascinante quanto a da maldição de Samara (ou Sadako, para aqueles que, como eu, preferem a série original japonesa) tenha sido diluída infantilmente em uma historia de vingança e possessão demoníaca. Em O Chamado 2, some o mistério e o suspense do primeiro filme, aquele tom de tragédia iminente e o desespero da contagem de dias que se encerra. Em seu lugar, entra um óbvio festival de sustos, muitos deles gratuitos. Outro erro do filme é colocar Samara muito tempo em cena, destruindo a aura de mistério que havia em torno da vilã no filme original (até a atriz-mirim mudou, de Daveigh Chase para Kelly Stables, sem grandes resultados práticos). E, infelizmente, esta personagem fascinante acaba perdendo completamente o foco que tinha no original e nos filmes japoneses. Se antigamente podíamos até nos sensibilizar com a situação da menininha (afinal, ela teve um destino tão triste que sua terrível maldição chegava a ser justificada), em O Chamado 2 ela é definitivamente transformada numa vilã sem sentimentos e objetivos, tipo um Pinhead ou Freddy Krueger, que aparece o tempo todo sem a necessidade da pessoa estar amaldiçoada ou ter assistido sua fita, que mata qualquer personagem só por matar, novamente independente da vítima estar amaldiçoada ou não. Enfim, tornou-se uma vilã-fantasma sem graça e sem novidades, como tantas outras. Perdeu a magia, virou clichê.

O Chamado 2 ainda inclui um ataque de veados feitos em computação gráfica, que me deixou rindo sozinho no cinema. Mas todo mundo está elogiando e dizendo que a cena é muito bem-feita, o que me leva a pensar que o errado sou eu – que, só para constar, já coloquei o momento lado a lado com o péssimo ataque de hienas em CGI mostrado em O Exorcista: O Início. E o roteiro (ele de novo), mesmo com fama de original, ainda bebe muito da fonte de Ringu 2, sim. Nakata tem até uma oportunidade para refazer – agora em computação gráfica – a assustadora e tétrica sequência em que Rachel é perseguida por uma super-ágil Samara no interior do poço (em Ringu 2, era Mai Takano que era perseguida por Sadako, que escalava com rapidez as paredes do poço, lembrando uma aranha). Esta talvez seja a melhor cena de O Chamado 2, e nem ao menos é original. O detalhe de colocar Aidan como catalisador do mal de Samara também vem diretamente do roteiro de Ringu 2, onde Sadako se aproveitava dos poderes paranormais de Yoshi, o filho de Reiko Asakawa, para tentar transformá-lo em uma cópia de si própria. Ou seja: os dois filmes têm muito em comum, sim. Embora eu ainda prefira os delírios de Ringu 2.

Mesmo que seja muito fraco em comparação com todos os outros filmes já produzidos sobre o universo Ringu (perde até para o polêmico e não-oficial Rasen e suas paranoias científicas), O Chamado 2 ainda assim é um filme assistível. A produção é boa e alguns sustos realmente pegam o espectador de surpresa, mesmo que sejam gratuitos e enfureçam aqueles que gostavam do filme original justamente por não precisar destes artifícios medíocres para assustar (como o som que sobe, fazendo um TCHAN!!!, por exemplo). Eu mesmo tinha muita expectativa quanto ao filme, principalmente pela participação do diretor Hideo Nakata, e me decepcionei bastante, acreditando que é uma seqüência perfeitamente dispensável, que não acrescenta nada à história e pode ser facilmente esquecida sem qualquer prejuízo. Pelo menos, o roteiro encontra uma forma de finalmente prestar a devida homenagem a Kôji Suzuki, o autor dos livros que deram origem à série Ringu, quando descobrimos que o médico de Aidan se chamava “dr. Kôji“.

O Chamado 2 (2005) (3)

E uma coisa fica bem clara: Nakata é simplesmente obcecado por água. E, ainda, pensa que água é uma coisa terrivelmente assustadora – o que não é, ainda mais sendo usada de forma tão gratuita quanto em O Chamado 2. O que tem de água em cena não é brincadeira: é água saindo da TV, das paredes, debaixo de portas, voando da banheira, são cenas em banheiras, poços ou mostrando rios e lagos… Enfim, é água que não acaba mais – o que me leva a pensar, mais uma vez, que Nakata se enganou e tentou refilmar Dark Water ao invés de Ringu 2. Outra coisa que fica bem clara é que o diretor japonês rendeu-se definitivamente aos modismos hollywoodianos, principalmente quando ele coloca na boca de Rachel o diálogo mais ridículo do ano, digno de estudos semióticos, quando a “heroína” solta uma “frase heroíca” envolvendo o palavrão fuck, uma sentença que se encaixaria muito bem em um filme de Stallone ou Van Damme, mas nunca em um terror pretensamente “sério” como este, onde acaba completamente deslocada – tanto que fez gargalhar todo o público na sessão onde eu estava.

Mas os adolescentes, aparentemente o público-alvo dos produtores e do roteirista Kruger, adoraram. Pelo menos na sessão de cinema em que eu estava, eles saíram do cinema como uma manada de búfalos, rindo, gritando e falando maravilhas sobre o filme. Inclusive heresias, como “é melhor do que o primeiro“. No fundo, eles esquecerão tudo o que viram em, vamos dizer assim, sete dias. E só queriam, mesmo, era levar uns sustinhos básicos e arrepios por duas horas, enquanto comiam pipoca e paqueravam seus pares. Se este também é o seu objetivo, pode encarar O Chamado 2 sem medo. Agora, se você é um grande fã do primeiro filme, ou mesmo da série japonesa, prepare-se para uma grande desilusão e para um inevitável sentimento de que não existem mais boas idéias em Hollywood, mesmo que eles importem cineastas japoneses para tentar dar um novo fôlego ao seu cada vez mais agonizante cinema de horror.

Quem duvida que logo sai um O Chamado – O Início???

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Felipe M. Guerra

Jornalista por profissão e Cineasta por paixão. Diretor da saga "Entrei em Pânico...", entre muitos outros. Escreve para o Blog Filmes para Doidos!

9 thoughts on “O Chamado 2 (2005)

  • 29/08/2016 em 18:37
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    porque duas caveiras achei injusto eu acho
    que pela historia essa seria a continuaçao mas certa como o segundo filme eu adorei o filme

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  • 10/07/2016 em 23:52
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    eu não curti muito o chamado 2 por não ser a mesma garota samara e tambem por a maquiagem desta nova atriz não ser legal como do primeiro filme, a maquiagem desta atris foi tão mau feita que já da para perceber que é outra atriz. A já iria me esquecendo!, bom a unica coisa que gostei deste filme foi a samara não ter amostrado tanto o seu rosto para ninguém criticar a maquiagem mau feita!

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  • 10/12/2014 em 10:52
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    Um filme não precisa ser uma “cópia” do original para ser bom. Eu gostei dos dois chamados. Não digo qual o melhor porque faz tempo que eu assisti, então não me lembro detalhadamente. Mas sobre a água, pra mim funciona porque dá aquela sensação de sufocamento, especialmente porque eu não sei nadar, haha

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  • 29/10/2014 em 21:52
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    ola eu gosto dos remakes, nunca vi os japoneses,só uma curiosidade, por acaso, O Grito é do msm diretor ou não,pois a tematica parece meio igual,tirando a agua!!!

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      30/10/2014 em 10:28
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      Não é o mesmo diretor, Matthy. Quem dirigiu O Grito foi o Takashi Shimizu, e quem dirigiu O Chamado 2 foi o Hideo Nakata.

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  • 03/04/2014 em 12:56
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    Enquanto eu assistia o filme eu sempre me perguntava….”e se o individuo assistir essa fita em um local sem telefone?????” hehehe tenso.

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    • 10/12/2014 em 10:46
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      Eu tbm me perguntava isso sempre hahahahahahahahaha

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  • 08/01/2014 em 23:30
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    duas caveiras tá bom mesmo,mas esse filme é legalzinho.

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