Ring 2 – O Chamado (1999)

2.5
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Ringu 2 (1999)

Ring 2 - O Chamado
Original:Ringu 2
Ano:1999•País:Japão
Direção:Hideo Nakata
Roteiro:Hiroshi Takahashi, Kôji Suzuki
Produção:Takashige Ichise, Makoto Ishihara
Elenco:Miki Nakatani, Hitomi Satô, Kyôko Fukada, Fumiyo Kohinata, Kenjirô Ishimaru, Yûrei Yanagi, Rikiya Ôtaka, Yôichi Numata, Masako

As diferenças entre Ocidente e Oriente são muitas e também passam pela questão cultural. A sequência do fenômeno Ringu, dirigido por Hideo Nakata em 1998, assinala bem estas diferenças. Diferente do Japão, se a continuação fosse feita nos EUA, provavelmente a ideia seria: “O primeiro fez sucesso? Então vamos COPIAR a ideia original“.

Basicamente, foi isso que aconteceu. O primeiro Ringu foi um sucesso estrondoso e gerou uma continuação natural, Ringu 2, de 1999, que não apenas utiliza as melhores ideias do filme original como expande surpreendentemente o universo da história, maravilhando (e por outro lado chocando) quem gostou da primeira parte.

Ao mesmo tempo, Ringu foi refilmado em 2002 como O Chamado nos Estados Unidos, e já se falava em uma continuação. Entretanto, as ideias são diferentes, e os produtores da sequência americana divulgaram aos quatro ventos que não iriam levar em consideração nem uma linha do roteiro de Ringu 2 na hora de fazer a “sua” continuação.

Na verdade, a história nos bastidores da produção japonesa é complicada: logo após o sucesso de Ringu no Japão, a produtora Asmik Ace decidiu filmar uma continuação baseada no segundo livro de Kôji Suzuki (o autor dos livros sobre o universo de Ringu), com outro diretor, Jôji Iida. A sequência bastarda foi feita no mesmo ano do original, 1998, rapidamente e utilizando parte do elenco do primeiro filme, especialmente Miko Nakatami (Mai Takano) e Hiroyuki Sanada (Ryuji Takayama).

O resultado foi Rasen, um filme fiel ao livro, mas que acabou se transformando em um fracasso de bilheteria – em parte por ter uma história muito técnica, com explicações científicas e médicas em demasia e pouco horror. Preocupados com o fracasso da sequência, os produtores resolveram simplesmente desaparecer com Rasen e chamar de volta Hideo Nakata (o diretor de Ringu) para fazer uma continuação oficial. Para não confundir os espectadores, ao invés de Rasen foi usado o simples título de Ringu 2.

O roteiro da “nova” continuação deixa de lado o livro de Suzuki e prefere contar uma história original inspirada no primeiro filme e não no universo literário do autor. Como roteiristas assinaram o próprio diretor Nakata mais Hiroshi Takahashi. O resultado surpreende, embora para alguns vá parecer que a ideia do primeiro filme foi mudada e transformada demais.

É claro que é impossível comparar Ringu 2 com o original de Hideo Nakata. O primeiro filme desde já se inscreve como um dos clássicos modernos do cinema de horror e dificilmente seria possível fazer outro filme semelhante, copiando as mesmas ideias – afinal, como alguém conseguiria repetir o impacto do assustador final de Ringu, que me fez tremer no sofá enquanto assistia?

Como continuação, Ringu 2 tem o mérito de ter ideias novas, mantendo a atenção do espectador com um ritmo lento, de muitas explicações e clima de mistério, com menos ação e agonia que o Ringu original – onde a heroína tinha o tempo de vida limitado em sete dias, o que provocava uma sensação de pânico no espectador à medida que o prazo ia se encerrando.

"Este garoto que você abraça não é Yoichi. Não é mais".
“Este garoto que você abraça não é Yoichi. Não é mais”.

Hideo Nakata também sabia que o espectador já conhecia muito sobre o universo de Ringu, ao contrário dos personagens desta continuação. Todos nós já vimos as cenas da fita amaldiçoada, sabemos como as vítimas morrem após sete dias e sabemos tudo sobre Sadako e seu triste destino. Por isso, seria perda de tempo contar uma história onde novamente algum personagem desafortunado assistisse à fita e tivesse sete dias para descobrir como vencer a maldição e escapar da morte.

Neste ponto, Nakata tem o mérito de surpreender seu espectador. Não tanto quanto fez no primeiro Ringu, mas o diretor surpreende, sim, por não buscar o susto fácil ou as saídas fáceis, complicando ainda mais a história e acrescentando outros elementos para manter a atenção do espectador até o final.

É óbvio que os espectadores (fãs do primeiro filme, principalmente) não podem esperar um filme superior a Ringu, mas eu diria que Ringu 2 não faz feio, mantendo a essência, ampliando a mitologia e acrescentando algumas boas novas ideias, apesar de confundir um pouco a cabeça. Mesmo assim, o cinema de horror atual é tão carente de boas histórias que um filme que faça o espectador pensar já deve ser considerado.

Pelo menos não é aquele feijão-com-arroz de assassinos mascarados, onde a única coisa que vale são as muitas mortes absurdamente violentas por minuto. Ringu 2 é um filme que exige do espectador muito mais neurônios do que estômago! Talvez peque um pouco por ser excessivamente técnico e buscar explicações científicas no que simplesmente não deveria ser explicado, mas alguns vão gostar mais justamente por este detalhe.

Mas esperem um pouco!!! E o que aconteceu com Rasen, a sequência bastarda de Ringu???

Bem, acabou virando um daqueles objetos de culto entre adoradores do horror justamente por ser obscuro! O filme só foi lançado oficialmente nos Estados Unidos em 2005, graças à tentativa da produtora Asmik Ace de acabar com qualquer traço da fracassada produção. Por sinal, também foi feita no Japão uma minissérie utilizando o livro Rasen como base.

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Se a série Ringu demorou cinco anos para chegar ao Brasil, imaginem quanto tempo demorará até que alguma distribuidora nacional sequer cogite lançar Rasen por aqui! Triste esta vida de povo de terceiro mundo…

Ringu 2: O Verdadeiro Horror Urbano

Se em Ringu boa parte da história passava-se em locais comuns dos filmes de horror (cabanas em meio à floresta, ilhas isoladas e com poucos habitantes…), na continuação a maior parte da trama se desenrola na cidade grande mesmo. Ou seja, é um verdadeiro filme de horror urbano, e talvez por isso mesmo ele pareça tão assustador em alguns momentos – pois fica a impressão de que fenômenos sobrenaturais não estão limitados às tradicionais casas mal-assombradas ou às cidadezinhas pequenas onde normalmente acontecem os filmes de horror.

Um dos grandes méritos do roteiro de Ringu 2 é transformar os personagens secundários do primeiro filme em personagens centrais e vice-versa. Assim, Reiko Asakawa, a jornalista e heroína do primeiro filme, aqui aparece menos de 15 minutos. A verdadeira personagem principal é a estudante Mai Takano, aluna e namorada do professor universitário e ex-marido de Reiko, Ryuji Takayama, morto no final de Ringu.

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Outro detalhe interessante é que praticamente TODOS os personagens do primeiro filme estão de volta, o que é raríssimo em continuações, ainda mais nos Estados Unidos (mesmo o colega de Reiko na TV, Okazaki, que aparece meros segundos em Ringu, aqui foi alçado a papel de destaque).
Quando esta continuação começa, todos nós (bem, pelo menos os que viram o primeiro filme) já sabem o básico da história: existe uma fita amaldiçoada que mata as pessoas que a assistem, exatamente sete dias depois. Existe uma menina chamada Sadako, que foi presa em um poço na infância e manifesta seus poderes paranormais por meio da tal fita, que é seu instrumento de vingança.

NÓS SABEMOS! Mas o restante dos personagens, tirando Reiko e seu filho Yoichi, NÃO SABEM DE NADA! Este é outro mérito do roteiro de Ringu 2: os principais personagens estão totalmente perdidos, como todos nós estávamos durante o primeiro Ringu. Entretanto, a estas alturas já estamos suficientemente bem informados, de forma que não iríamos engolir uma nova investigação sobre o mistério da fita, como no filme original. Aí entra a criatividade dos roteiristas Hideo Nakata (o próprio diretor do primeiro e também deste segundo filme) e Hiroshi Takahashi: a trama da fita fica em segundo plano e o roteiro examina a influência maligna de Sadako nos personagens do primeiro filme, uma influência tão poderosa (e perigosa) quanto a própria maldição da fita!

Ringu 2 começa já com um choque no espectador: uma semana depois dos acontecimentos do filme original, em um necrotério, Takashi Yamamura, o primo de Shizuko Yamamura (vidente e mãe de Sadako), é chamado para reconhecer os restos da menina, retirados do fundo do poço onde foram encontrados por Reiko e Ryuji no primeiro filme. Não há grandes explicações ou resumo do capítulo anterior, de forma que quem não viu o original não pode nem pensar em querer entender esta sequência. Após um rápido susto em Takashi e no espectador, quando os cabelos de Sadako começam a sair debaixo do lençol que cobre o cadáver, vem a revelação surpreendente: Sadako não viveu apenas 7 dias no fundo do poço, mas sim 30 anos!

Entram os créditos iniciais e o filme se desenvolve baseado na personagem de Mai Takano, que procura a emissora de TV onde Reiko Asakawa trabalhava para saber o paradeiro da mulher – em busca de informações sobre a misteriosa morte de seu namorado Ryuji, no final do filme original.

Ali Mai encontra Okazaki, um colega de trabalho de Reiko, que está preocupado com o desaparecimento da repórter e resolve ajudá-lo na sua investigação. A primeira parada é a casa onde ela vivia com o filho Yoichi. Lá, a dupla descobre evidências macabras do que aconteceu em Ringu: a tela da TV foi destruída, Okazaki encontra as fotografias com rostos distorcidos de Tomoko (sobrinha de Reiko, morta no primeiro filme) e seus amigos, além de restos carbonizados de fitas de vídeo, que estavam na banheira.

Okazaki percebe que há algo estranho por trás de tudo e resolve rever as fitas gravadas por Reiko na semana anterior ao seu desaparecimento. É quando descobre a lenda urbana a respeito da fita amaldiçoada – assistindo as entrevistas com jovens feitas por Reiko no primeiro filme.
Paralelamente, a polícia investiga a morte de Koichi, o pai de Reiko, falecido misteriosamente com uma horripilante expressão de medo no rosto. O velho morreu para salvar o neto Yoichi.

Lembrem-se: para escapar da maldição, é preciso copiar a fita e mostrá-la para outra pessoa, e foi o que Reiko fez no final do primeiro filme. Mas só nós sabemos disso tudo: a polícia e os personagens principais estão boiando como nós estávamos na primeira parte!!!

Um dia, no ônibus, Mai passa pelo parque onde o falecido Ryuji costumava corrigir provas e trabalhos escolares. Um rápido flashback mostrando um encontro singelo entre Mai e Ryuji e então a garota volta a si, bem a tempo de ver o vulto de uma mulher com uma criança pequena andando no mesmo parque. Reiko e Yoichi???

O filme dá uma reviravolta quando Mai e Okazaki vão até o hospital psiquiátrico onde está internada Masami, amiga de Tomoko, que ficou louca após a morte da jovem no primeiro Ringu. Ela na verdade viu Sadako matar a amiga, e por isso ficou amaldiçoada: além de não falar mais, ela começou a desenvolver poderes mentais, com o de projetar mentalmente as imagens da fita amaldiçoada (e isso que ela nem viu a fita!) sempre que passa por um aparelho de TV.

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O dr. Kawajiri, que era amigo de Ryuji (eles estudaram Medicina juntos), investiga o fenômeno e tenta fazer uma experiência, gravando em uma fita as imagens que Masami reproduz. Sem saber, eles estão assistindo as amaldiçoadas imagens geradas por Sadako, e agora todos eles – Mai, Okazaki, o dr. Kawajiri e uma enfermeira – precisam encontrar uma forma de acabar com a maldição para salvar suas vidas… ou morrer em sete dias!

Obcecado pela história da maldição, Okazaki continua o trabalho de Reiko e conhece Kanae, uma bela garota que tem muitas informações sobre a lenda da fita amaldiçoada. A bem da verdade, Kanae a assistiu! Okazaki combina para que ela consiga uma cópia em troca de determinada soma em dinheiro. Mas ela confessa que assistiu à fita e tudo que pede é que o repórter também a assista. Entretanto, Okazaki anda assustado com as investigações e, meio cético, meio desconfiado, resolve trancar a fita numa gaveta da sua mesa, sem qualquer intenção de ver o que ela contém.

A partir daqui a história vai se complicando cada vez mais, mas sempre deixando o espectador cada vez mais surpreso: acontece ainda o retorno de Reiko Asakawa e seu filho Yoichi, agora transformado em uma ameaça graças à evolução dos poderes paranormais herdados do pai Ryuji; a reconstrução do rosto de Sadako em laboratório, e também um inevitável retorno à ilha onde Reiko passou alguns dos momentos mais dramáticos da sua vida no primeiro Ringu.

Quando o espectador acredita que o filme não pode ficar mais estranho e surpreendente, Ringu 2 dá mais uma reviravolta impressionante!

Se o filme perdeu a dramática contagem de dias (no primeiro filme, Reiko tem apenas sete dias de vida e o espectador acompanha desesperado enquanto o tempo se esgota), pelo menos manteve o mesmo clima de horror e ameaça constante do primeiro. Não há grandes efeitos ou cenas sangrentas, na verdade há bem poucos sustos, mas um clima de medo e horror permeia toda a produção.

O único pecado do roteirista foi ter dado muito destaque ao experimento científico do dr. Kawajiri para destruir Sadako, nos 20 minutos finais, em momentos que soam técnicos e inverossímeis demais para a maioria dos espectadores. Mas a cena final é uma das melhores surpresas do cinema de horror dos últimos tempos, uma conclusão ao mesmo tempo misteriosa, assustadora e criativa, de deixar quem assiste arrepiado e emocionado ao mesmo tempo.

O negócio é fazer como eu fiz: Ringu 2 é um filme de terror, caramba! Então esqueça um pouco a lógica e divirta-se com uma história diferente e bem contada, que praticamente em nada lembra o filme original – e se isso é bom ou ruim, cabe a cada um julgar.
Mas eu ainda fico com uma nova história radicalmente diferente da original do que com as “continuações xerox”, como os americanos adoram fazer. E viva Ringu 2!

[PS: A saga continua em uma terceira parte, chamada Ringu Zero, que se passa 30 anos antes de Ringu 1 e 2, conta a história da juventude de Sadako e tem outro diretor. O filme é bem menos assustador, mas responde a muitas perguntas e tem um final surpreendente.]

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Felipe M. Guerra

Jornalista por profissão e Cineasta por paixão. Diretor da saga "Entrei em Pânico...", entre muitos outros. Escreve para o Blog Filmes para Doidos!

7 thoughts on “Ring 2 – O Chamado (1999)

  • 01/03/2022 em 14:33
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    Existe uma definição perfeita pra Ringu 2: sabe quando você vai fazer aquela redação na escola, mas não planeja nada antes, vai escrevendo qualquer merda que sai da sua cabeça, fica uma bagunça sem lógica alguma, e quando vc acha que vai construir algo interessante… o tempo acaba, a professora recolhe a redação e você tira 0. Esse é Ringu 2. Só não é pior do que Rasen, mas ambos chegam a ser cômicos só de lembrar kkkkkkkkkkk O Chamado 2 dá de mil a zero nesse lixo.

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  • 19/02/2019 em 02:08
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    O que acheibestrnho no 1 filme foi aquela coisa de ficção cientifica com sobrenatural dela desenvolver um vírus pra voltar a vida, muito mirabolante… a Sadako ficou bem diferente da 1 versão do filme, ñ entendi por que ñ mantiveram a mesma atriz..

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  • 17/05/2016 em 00:48
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    Prefiro a versão americana, porque é muito mais bem filmada, além do roteiro ser melhor desenvolvido. Porém, se eu fosse escolher entre a vilã da versão original e a versão americana, sem dúvidas eu escolheria a vilã da versão original, pois a considero mais ameaçadora. Esta, ao menos no primeiro filme, não possui efeitos que a deixam mais assustadora.

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      09/01/2014 em 19:50
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      Olá, Augusto! Tudo bem?

      O título do filme lançado no Brasil em DVD é Ring 2 – O Chamado mesmo!

      Abs

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  • 07/01/2014 em 05:14
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    Também gostei muito dessa sequência. Ela estende ainda mais a história e é realmente muito bacana o elenco ter sido mantido praticamente por completo.

    Já o Ring 0 (Zero) eu achei meio chatinho. Aquela história de peça de teatro e tal… Apesar de responder algumas questões em relação ao passado da Sadako, acho que poderia ter sido melhor trabalhado. Talvez se o Nakata tivesse sido o diretor, né…

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    • 06/04/2022 em 21:05
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      Eu gostei do Ringu 0, pois conta melhor a história de Sadako e conta coisas que não foram mostradas no filme original, mas tudo bem, cada um tem suas opiniões

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