3.5
(13)

Vagina Dentada
Original:Teeth
Ano:2007•País:EUA
Direção:Mitchell Lichtenstein
Roteiro:Mitchell Lichtenstein
Produção:Joyce Pierpoline, Mitchell Lichtenstein, Richard Lormand
Elenco:Jess Weixler, John Hensley, Josh Pais, Hale Appleman, Lenny Von Dohlen, Vivienne Benesch, Ashley Springer, Nicole Swahn, Laila Liliana Garro, Adam Wagner

Dawn (Jess Weixler) é uma jovem inocente, pura e religiosa que ministra palestras para outros jovens sobre a importância de “se guardar” para o casamento.  Mas uma descoberta sobre si e sobre partes do seu próprio corpo coloca em questionamento tudo em que ela acredita. Teeth (Vagina Dentada) foi lançado em 2007, gerando grande polêmica e discussão sobre sua abordagem de temas que até então apareciam apenas em subtexto nos filmes classificados como terrir (terror + comédia).

Após se apaixonar por Tobey (Hale Appleman), o casal em segredo (pois ele também é do grupo de jovens que decidiram esperar) vive um momento digno de filmes de romance… que acaba em tragédia. Ele tenta forçar uma relação sexual com Dawn e acaba sem o pênis. Em meio a muito sangue e a primeira mutilação do longa, a protagonista entra em desespero e parte em busca de ajuda.

Com o passar das cenas, o roteiro aprofunda-se no desenvolvimento da personagem. Também entendemos uma parte importante do seu passado: seu histórico de abuso e violências. A fonte começa em casa. Seus pais são extremamente negligentes, e o primeiro homem a tentar abusá-la na infância foi seu irmão (John Hensley), que, após perder o dedo nessa tentativa, acabou se tornando obcecado por Dawn.

Continuamente os homens passam a violentá-la em outros contextos: como seu próprio ginecologista, outro colega de sala com quem passa a se conectar etc. E Dawn aprende uma lição valiosa: ela pode confiar no seu próprio corpo quando o entende. Qualquer um que desrespeitar seu não, ou tentar algo que ela não queira, pagará as contas. E assim ela entende o que significa consentimento. E é com o consentimento que ela descobre que é capaz de sentir prazer.

Isso é apenas uma das coisas que faz Teeth diferente de tantos outros filmes que abordam a adolescência. O tropo do “coming of age”, puberdade e sexualidade aqui são focados nos genitais. Um grande tabu para o cinema em geral, e é usando da “trasheira” que essa abordagem se torna possível e certeira.

A própria lenda urbana da vagina dentada foi adotada pelo cristianismo centenas de anos atrás. Por ser um “lugar” extremamente perigoso, poucos homens poderiam se aventurar, e apenas os escolhidos sairiam vivos. O controle sobre o corpo da mulher infelizmente ainda é pauta histórico-social, e no filme temos essa subversão. A maldição de ter uma vagina dentada passa a ser uma benção na vida da protagonista.

A atuação de Weixler navega bem entre as nuances da personagem, como uma garota inocente, amedrontada e então empoderada. John Hensley também está ótimo como seu irmão perturbado. Uma pena que ambos tiveram pouquíssimo destaque em suas carreiras após Teeth.

O toque da comédia pode parecer exagerado em alguns momentos, mas ao se tratar de um assunto sério, pende ao absurdismo para escancarar ao público sobre o que realmente está sendo falado aqui. Pode não acertar sempre, mas é uma ferramenta valiosa aliada ao horror que permite a licença poética do desequilíbrio do tom narrativo. Talvez se lançado em décadas passadas (como nos anos 70-80) poderia ter se tornado um clássico dos filmes B/exploitation como outros do gênero. Mas em seu lançamento com pouco orçamento e divulgação, acabou gerando polêmica sobre sua classificação e qualidade, sendo negligenciado e passando fora do radar dos filmes de terror dos anos 2000.

Vagina Dentada é inclusive o filme de estreia na direção e roteiro de Mitchell Lichtenstein. Apesar de ser uma história sobre abusos sofridos por mulheres escrita por um homem gay, Mitchell consegue abordar o tema até de maneira respeitosa sem escrachar na violência desnecessária do malegaze. Chega a ter certo cuidado e carinho com detalhes em cena, como na construção dos cenários, a maneira de mostrar os corpos sem a objetificação escancarada a que estamos acostumados. Por esse primeiro passo em sua carreira cinematográfica, Mitchell merece reconhecimento e todas as indicações a prêmios que Teeth conseguiu na época.

O próprio diretor em entrevistas diz que o filme tem uma mensagem moral muito clara. Usando de sátira, critica a hipocrisia cristã, o comportamento machista/violento/abusivo dos homens e a castração social de uma cultura em que uma mulher nunca vence: nem quando é pura demais e nem quando abraça completamente sua libido e sexualidade.

Dawn, ao entender-se melhor, toma as rédeas de sua vida, se empoderando diante de sua condição. Ela não usa disso para uma vingança desenfreada de todos os homens que passam pela sua vida, mas sim como uma maneira de se proteger das ameaças que estão sempre à espreita.

Apesar de uma quantidade considerável de pênis protéticos aparecendo em tela, o filme não só é realista demais em seus cenários como também nos temas que aborda. Mesmo com  piadas visuais e risos de nervoso, a história de Dawn é triste e facilmente identificável por muitas mulheres. Infelizmente no mundo real com pouco empoderamento e finais muito mais trágicos.

Teeth pode não agradar a todos os públicos pela sua abordagem, decepamentos ou piadas, mas merece reconhecimento por conseguir ser subversivo num gênero que o permite tanto. Mitchell já brincou com a possibilidade de uma continuação que nunca saiu da especulação, o que é ótimo, pois o longa é um clássico por si sem a necessidade de maiores explorações.

O filme merece sim uma chance de ser assistido. Seja em grupo com seus amigos para dar boas risadas, ou mostrar aos homens ao seu redor para colocarem a mão na consciência. Vagina Dentada é melhor do que se imagina dentro do que consegue entregar. Falha tentando acertar em momentos pontuais, mas definitivamente não deveria ter caído no esquecimento tão cedo.

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Média da classificação 3.5 / 5. Número de votos: 13

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1 comentário

  1. Sério que esse filme ganhou 4 caveiras? A premissa é até original, mas que direçãozinha ruim

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