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O Dia em que a Terra Parou
Original:The Day the Earth Stood Still
Ano:2008•País:EUA, Canadá
Direção:Scott Derrickson
Roteiro:David Scarpa, Edmund H. North
Produção:Paul Harris Boardman, Gregory Goodman, Erwin Stoff
Elenco:Keanu Reeves, Jennifer Connelly, Kathy Bates, Jaden Smith, John Cleese, Jon Hamm, Kyle Chandler, Robert Knepper, James Hong, John Rothman, Sunita Prasad

Meus primeiros pensamentos quando ocorreu o anúncio do remake de O Dia em que a Terra Parou, de 1951 foram: como melhorar o que já é perfeito? De que maneira pode se repetir uma história que deu origem a era de ouro da ficção científica com o mesmo impacto? Como atualizar um filme que rompeu qualquer barreira temporal? Alguns de vocês vão reclamar: “lá vem o mala do Gabriel defendendo seus filmes velhos e falando mal dos remakes…”. Se você está pensando isso neste momento, sinto dizer, ou você nunca assistiu a The Day The Earth Stood Still ou não captou a importância política e histórica que a película teve para a indústria cinematográfica como o principal e um dos mais sérios filmes da chamada “paranoia atômica” na ficção científica dos anos 50.

Até porque minha visão atual sobre os remakes de maneira geral já não é mais azul ou vermelha – parafraseando uma figura do cenário político nacional, se não tem remédio, o negócio é “relaxar e gozar” na cadeira do cinema e esperar alguma coisa boa daí.

Todavia quando estamos falando desta produção especifica, realizar uma refilmagem se torna um terreno perigoso – talvez comparável com a magnitude que teve o remake de Psicose – por ser extremamente significativa e cultuada por amantes de todos os gêneros. Como disseram os críticos estadunidenses na ocasião do lançamento, uma refilmagem que fizesse justiça ao original deveria ser, no mínimo, um sério candidato ao Oscar de melhor filme e fim de papo.

O diretor Scott Derrickson (O Exorcismo de Emily Rose e Hellraiser: Inferno) e o roteirista David Scarpa (A Última Fortaleza) tinham, portanto, uma batata quentíssima nas mãos, uma missão que poderia colocá-los no panteão dos filmes de ficção científica ou colocar uma lápide em suas carreiras.

Derrickson sempre se declarou admirador ferrenho do filme original de Robert Wise e quis refilmá-lo desde 1993. Mas foi apenas dezoito anos depois que conseguiu da Fox o orçamento de 80 milhões de dólares para realizar a produção. Sendo lançado no dia 12 de dezembro de 2008 nos Estados Unidos (aqui no Brasil o filme ganhou os cinemas em 09 de janeiro de 2009).

O filme não empolgou muito apesar da instigante campanha de marketing, rendeu pouco mais de 30 milhões no fim de semana de estreia e nem chegou a se pagar em sua terra de origem (fechou a conta em 79,3 milhões, mas foi mais bem sucedido no resto do mundo arrecadando no total US$ 230,8 milhões). A crítica foi quase unânime ao avaliar o resultado tímido: se a película não conseguiu enterrar a carreira dos dois, foi por muito pouco, pois você sabe que alguma coisa está absolutamente errada quando um filme que se chama O Dia em que a Terra Parou é lançado e a Terra não para…

Na historia, Helen Benson (Jennifer Connelly, Água Negra) é uma cientista inteligentíssima e muito respeitada no ramo da astrobiologia que dá aulas em uma faculdade. Numa noite qualquer, os federais cercam a sua casa, como se fosse uma foragida. Ela e seu “filho-puxadoJacob (Jaden Smith, de Karate Kid e filho de Will Smith) estão se preparando para jantar quando levam aquele susto, sem saber o que está acontecendo, Helen deixa o filho com a vizinha é levada para uma base secreta do governo, onde descobre que vários outros cientistas também estão sendo “abduzidos” para o mesmo local.

O motivo da pressa: um objeto gigantesco está em rota de colisão com o nosso planeta, mais especificamente em Manhattan em Nova York, e faltam apenas 78 minutos para pensar no que fazer antes do impacto. Apesar do desespero sem chegarem a alguma conclusão – acentuado com a falha no lançamento dos mísseis que poderiam explodir o objeto – os cientistas logo percebem que conforme o corpo celeste adentra a atmosfera da Terra ele reduz a velocidade, dando a impressão que está pousando.

Logo em seguida, a imensa esfera esverdeada de luz e gás pousa no Central Park, a equipe de cientistas chega no local e junto deles a polícia, a SWAT e o exército em prontidão. Em meio a poeira levantada no pouso, uma figura sai da esfera e tenta um contato com Helen, que está a frente. Porém o ser é alvejado com um tiro e cai, em seguida um outro ser maior – o modelo 2008 de GORT – sai da névoa e realiza um ataque sonoro que desarma todos os humanos, a única coisa que o faz parar é a frase celebre proferida pelo alien ferido, “Klaatu barada nikto”, com isto GORT permanece imóvel em frente à esfera.

Levado com urgência para um hospital improvisado, a bala é removida do alien e a “pele” cinzenta – feita de um material similar a placenta – dá lugar a uma forma humana, como se estivesse nascendo. Recuperando-se aos poucos, o governo estadunidense – representado pela secretária de defesa Regina Jackson (Katy Bates, Louca Obsessão) – quer saber qual o seu objetivo no planeta.

O extraterrestre revela que se chama Klaatu (Keanu Reeves, que não fazia um sci-fi desde a trilogia Matrix) e que só falará na presença dos líderes de todo o mundo. A secretária apresenta uma postura hostil e contrariando os cientistas, ordena que Klaatu seja sedado e levado para um lugar mais seguro.

Helen simpatiza com o estranho e injeta água ao invés de sedativo, logo em seguida Klaatu foge e não muito mais tarde Helen e o filho se juntam a ele. O objetivo então é revelado, a missão do alienígena é salvar o planeta Terra antes que seja tarde demais, para isso vai exterminar todos os humanos.

Perseguidos pelas autoridades, a cientista vai tentar de todas as formas convencer Klaatu de que os humanos podem mudar e o leva para uma conversa com o professor Barnhardt (John Cleese), ganhador do prêmio Nobel e uma das mentes mais brilhantes do mundo, isso antes que seja tarde demais e nosso destino esteja selado.

A versão século XXI de O Dia em que a Terra Parou é eficiente no quesito modernidade: GORT passou de um mirradinho robô de papelão pra um troglodita de muitos metros; a nave não tem mais todo aquele mistério de 1951 e virou uma esfera de luz que parece saída do seriado The 4400, também temos muitas exibições de armamentos de última geração, tecnologia e efeitos especiais dignas de Transformers que deixam o ritmo acelerado… Só que nisso existem problemas, aliás, problemões…

Keanu Reeves como Klaatu atua tão rígido e sem emoção que parece mais o GORT e menos um alienígena – se bem que dizer que Reeves é inexpressivo chega a ser um pleonasmo. Jaden Smith é um bom ator, porém padece com seu personagem de pirralho chatinho reclamando em 9 de cada 10 linhas de diálogo, Jennifer Connelly é a pior de todo o elenco, altamente deslocada, ela faz apenas duas expressões: a de “piedade” ou a de “cientista trabalhando” e, não me levem a mau agora, eu adoro Kathy Bates, contudo ela não me convenceu como secretária de defesa dos Estados Unidos.

A única surpresa positiva é o ex-Monty Python John Cleese como o professor Barnhardt, com seu trabalho sério contrastando com seu lado cientista meio maluco faz lembrar um pouquinho o Dr. Walter Bishop do seriado Fringe. mas como tudo o que é bom dura pouco, o roteiro chuta Barnhardt pra escanteio e o personagem não tem uma fagulha da importância que sua contraparte de 1951 tinha. Excelentes atores do calibre de John Rothman (Copycat – A Vida Imita a Morte), Hiro Nakagawa (Elektra) e o veteraníssimo James Hong (Aventureiros do Bairro Proibido) participam da produção, contudo são desperdiçados com pouco tempo em cena.

Agora vamos ao principal defeito de O Dia em que a Terra Parou: a falta de foco, e não estou falando do trabalho de câmera. O original tinha uma mensagem fortíssima para a época, que ecoa até hoje – nós, humanos, somos ignorantes selvagens, o que há de mais vil no reino animal. Devolvemos com violência tudo aquilo o que não conhecemos ou não compreendemos e colocamos a política mesquinha em detrimento a razão, colocando em cheque nossa própria existência.

Já o remake tenta dar uma de Greenpeace, todavia não sabe exatamente em qual time joga. Na tentativa de atualizar o recado e ainda assim atrair público jovem descerebrado interessado só na barulheira para o cinema, Derrickson faz uma mescla de ação superlativa e mensagem piegas que dificilmente daria certo. Não se sabe se o diretor tentou fazer um sci-fi clássico com cara de blockbuster ou um blockbuster com elementos clássicos da ficção científica e isso acaba se tornando um tremendo engodo para quem esperava uma abordagem semelhante ao longa de 1951.

Só para ilustrar na forma mais absurda, Derrickson coloca Klaatu ao mesmo tempo como um comedido e superior porta-voz das colônias galácticas a fim de transmitir um recado, porém ele corre contra os helicópteros do governo e ainda dá umas bordoadas no meio do caminho tal qual Jason Bourne. Trocando em miúdos, o diretor promove a “michael bayzação” do filme original.

Não mais afetado pela guerra fria, a história também falha em colocar um contexto político-econômico-ambiental satisfatório para justificar a aparição do alienígena, que parece mais interessado em aprender sobre os humanos do que para executar uma missão importantíssima – o que reforça minha teoria de que Keanu Reeves estava interpretando um robô – [ATENÇÃO, SPOILER NO RESTANTE DO PARÁGRAFO] e por isto, no final – quase tão brochante e meloso quanto o de Guerra dos Mundos e Eu Sou a Lenda – o Klaatu de 2008 virou uma vítima burra de sua própria ignorância: não disse ao que veio, não cumpriu seu objetivo e ainda “morreu”, sem ter certeza de que os humanos mudariam sua conduta. Muito ao contrário do original, que em seu desfecho cíclico e memorável, põe um medo justificável a raça humana através de um ultimato que dificilmente será esquecido.

Falando um pouco mais sobre o roteiro, esta edição tem muitas questões não explicadas – para citar uma – por que cargas d’água o presidente dos Estados Unidos não parece estar nem aí pra crise situada em seu país, mesmo que o planeta todo esteja em risco? – e os diálogos sofrem de um “bairrismo” imenso. Eu não sei se os personagens estadunidenses foram criados arrogantes deste jeito de propósito ou se reflete a arrogância do próprio roteirista. Uma das falas que mais refletem isto é quando os cientistas dizem que a estrutura de DNA de Klaatu é tão complexa que a comunidade mundial ficaria anos para desvendar seus segredos, no que a personagem de Kathy Bates responde que o DNA de Klaatu é “de propriedade do governo dos Estados Unidos”.

Nem tudo é perdido e a produção tem bons momentos, a trilha sonora é excelente, o trabalho da câmera é interessante e muitos takes são inspirados. Entre erros e acertos, a nova versão de O Dia em que a Terra Parou perdeu a relevância de seu antecessor e virou só um bom filme para assistir com a(o) namorada(o) e comer umas pipocas, descartando o filme da memória tudo no dia seguinte. O que é improvável e nem de perto deveria se esperar quando se conhece e admira a obra original. Para estes será um desperdício e uma grande decepção.

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4 Comentários

  1. Tem coisa infinitamente pior que a refilmagem: é o Blu-ray do Clássico Original fora de catálogo já muito tempo.

  2. Eu não conheço o de 1951 e gostei desse, passei para meus alunos que concordaram que a espécie humana destrói as outras. E ficou o recado que devemos mudar o tratamento ao planeta pois somos nocivos a ele.
    Gostaram muito.
    Procuramos o livro e não achamos.?

  3. É a destruição em praça pública de um eterno clássico da Ficção Cientifica!
    Pode puderam fazer isso?!
    E pior, estragaram o Gort, um personagem emblemático, transformando-o em um gigante mole!!!!!!!!
    A única coisa bacana é que Keanu Reeves ficou legal como Klaato.
    Só isso.

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