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Alucarda (1977)

Alucarda
Original:Alucarda, la hija de las tinieblas
Ano:1977•País:México
Direção:Juan López Moctezuma
Roteiro:Sheridan Le Fanu, Alexis Arroyo, Tita Arroyo, Juan López Moctezuma, Yolanda López Moctezuma
Produção:Max Guefen, Juan López Moctezuma, Eduardo Moreno
Elenco:Claudio Brook, David Silva, Tina Romero, Susana Kamini, Lili Garza, Tina French, Birgitta Segerskog, Martin LaSalle

O cinema de horror produzido na América Latina ainda não obteve o merecido reconhecimento das novas gerações de críticos e cinéfilos. Existem obras muito interessantes vindas da Argentina, do Chile e principalmente do México. Não é por acaso que um dos principais autores do moderno cinema fantástico – Guillermo Del Toro – seja mexicano. O país tem uma cultura muito rica e toda uma tradição de culto aos mortos, muitas cores, uma mistura das antigas civilizações com a cultura imposta pelos espanhóis, entre diversos elementos que fizeram do México uma fonte de grandes escritores, pintores, diretores e fotógrafos. Um dos mais importantes autores, ligado diretamente ao cinema fantástico produzido no México, é Juan Lopez Moctezuma, criador de um emblemático filme de horror de imagens perturbadoras: Alucarda.

Moctezuma foi amigo e colaborador de dois grandes nomes da vanguarda do séc XX: o dramaturgo e diretor Fernando Arrabal e o cineasta Alejandro Jodorovski. Com os dois amigos, Moctezuma fundou o Teatro Le Panique, um movimento estético e inovador de encenação onde o transe, a força e a histeria dos atores eram privilegiados. Com Arrabal e Jodorovski, Moctezuma colaborou com o polêmico filme Fando e Lis, que causou a expulsão de Jodorovski de um festival de cinema no México. Somente com Jodorovski, ele colaborou com o primeiro cult movie da história do cinema: El Topo. Após esses primeiros experimentos com os dois famosos amigos, Moctezuma resolveu dirigir seu primeiro projeto: The Mansion of Madness, livremente inspirado na obra de Edgar Allan Poe. Logo em seguida ele lança seu filme mais popular: Alucarda – La Hija de las Tinieblas, 1972.

Alucarda (1977) (1)

Alucarda é mais uma adaptação livre da história sobre a vampira Carmilla, que teve muitas adaptações famosas, principalmente as da produtora inglesa Hammer. A leitura de Moctezuma reúne uma série de subgêneros do horror cinematográfico. Em cena vemos, já na abertura, a vinda ao mundo de uma criança amaldiçoada, uma filha das trevas, numa referência ao sub-título em espanhol do filme. A atriz que faz o papel da mãe é Tina Moreno, a mesma que irá interpretar a sombria protagonista do filme: Alucarda, uma jovem interna de uma escola religiosa mantida por freiras que parecem saídas de um quadro de Brughel, com seus corpos cobertos, tendo apenas o rosto de fora, quase como múmias. O ator David Silva interpreta o Padre Lázaro, o inquisidor chefe espiritual do convento que enxerga a presença do demônio em todos os lugares. Nesse clima medieval, em pleno séc XIX, surge em cena Justine, a jovem inocente que ao chegar no convento descobre que será colega de quarto de Alucarda. A aparição inicial de Alucarda em cena é muito impactante: ela surge como que saída das trevas do quarto, num artesanal, porém, eficiente truque de iluminação do diretor de fotografia Xavier Cruz.

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Alucarda e Justine ficam amigas na hora e em um passeio no campo conhecem um cigano corcunda que as introduz no mundo sobrenatural de maneira definitiva. Moctezuma constrói, a partir do encontro das duas jovens com o cigano corcunda, uma série de sequências oníricas com fortes doses de erotismo e violência. Vemos as duas jovens nuas em um ritual de vampirismo lésbico, guiadas pelo cigano corcunda onde Justine experimenta o sangue de Alucarda. Os cenários simplórios ganham dimensões dramáticas fortes com o uso criativo da iluminação. Em determinado momento vemos a recriação com atores de uma famosa tela de Goya: “O Sabbath das Feiticeiras”, onde uma figura que remete ao demônio é rodeado de mulheres, conduzindo tudo ao transe e a orgia.

Alucarda (1977) (2)

Após o encontro homoerótico de Alucarda e Justine, somos conduzidos ao mundo dos inquisidores quando o Padre Lázaro relata fatos macabros de possessões coletivas em mosteiros e conventos na Europa da Idade Média. Ao acusar as duas jovens de satanismo, inicia uma tortura violenta contra Justine, em uma angustiante sequência onde ela é perfurada por um enorme alfinete. Surge então o Dr Oszek, interpretado por Cláudio Brook, que também interpreta o cigano corcunda. Ele surge como a “voz da razão”, da Ciência, em contraponto com a figura autoritária do inquisidor Padre Lázaro. Esse confronto ganha contornos sobrenaturais quando ambos presenciam uma freira morta, após ser mutilada, voltando à vida. Temos em cena além de elementos de satanismo, vampirismo lésbico, torturas inquisitórias, o elemento dos zumbis, nesse filme que mescla muitos subgêneros, sem contar o nunexploitation na figura das freiras do convento e seu transe coletivo histérico.

As sequências mais importantes ficam para a parte final. Em uma delas vemos Moctezuma citando os clássicos da Hammer quando o corpo de Justine é encontrado em uma cripta. Seu corpo está em um caixão repleto de sangue. Nua e ensanguentada ela ataca uma das freiras com uma violenta mordida no pescoço, fazendo o sangue jorrar como nos melhores filmes de zumbis que seriam feitos posteriormente. O delírio de fogo mostra Alucarda em um duelo sobrenatural no convento. A montagem que intercala o olhar de Alucarda com as chamas é sensacional, culminando nas perturbadoras imagens dos crucifixos em chamas. Moctezuma fecha sua obra com grande força cênica em um filme de muitos momentos raros, resumidos nesta análise.

Alucarda (1977) (4)

A melhor edição em DVD de Alucarda saiu pela distribuidora Mondo Macabro, com excelentes extras que incluem além de um documentário, uma entrevista justamente com um dos famosos admiradores desse filme: o já citado Guillermo Del Toro. Alucarda é um filme realmente inesquecível…

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5 Comentários

  1. Um filme interessante que trabalha com duas protagonistas que carregam nos seus nomes referências a personagens bem conhecidas na literatura e cinema: Alucarda lembra Drácula, pois seu nome é “Drácula” ao contrário e Justine refere-se à personagem do Marquês de Sade, que sofre várias humilhações. Ótima resenha, Marcelo Carrard! Parabéns!

  2. Infelizmente alucarda nao aparece entre os top melhores filmes de terror no brasil é impressionante a falta de informações como o povo é tao preguiçoso em pesquisar , o vi esse filme em 2017 me prendeu ate o fim e nem parecia um filme tao antigo pois a narrativa o horror psicologico levado a mil … assim como foi bom dia de sata e bodas de sata alucarda fica no topo desse genero !

  3. Nossa o Primeiro “cult movie”só foi feito em 1970??

    Dificil acreditar que numa invenção que já tinha pouco mais de 80 anos de existência… Um filme dos anos 70 foi o ‘primeiro’ de um genero… Mas afirmações exageradas são sempre uma saída mais usada para uma critica mais exagerada ainda…

  4. Ótimo filme. Eu tenho justamente esse dvd da distribuidora Mondo Macabro. Ótima aquisição.

  5. Sem sombra de dúvidas, ALUCARDA é um dos filmes mais assustadores do cinema mexicano, e um dos mais fascinantes também, ao lado de “Satanico Pandemonium”.
    O filme de Moctezuma é simplesmente clássico em todos os momentos – desde a primeira aparição de Alucarda até o confronto final no convento.
    A fotografia de Xavier Cruz é perfeita, deixando o filme imerso em uma atmosfera gótica e sombria.
    Moctezuma prova que não se precisa de muitos efeitos especiais para criar Terror, já que o filme não tem quase nenhum efeito especial mirabolante – apenas a cena da freira que flutua no ar.
    A sequencia da orgia no jardim é uma das mais emblemáticas e polêmicas de todo o filme – todos os atores estão completamente nus, enquanto Alucarda e Justine estão vestidas, uma em frente à outra, enquanto um homem com uma assustadora máscara de bode as encara e as prepara para o ritual. Aliás, a preparação anteiror das duas meninas para o ritual, sob o comando do cigano corcunda é o momento em que percebemos que o filme trata de satanismo e magia negra e apenas um pouco de vampirismo.
    A unica referência ao vampirismo é a assustadora e impactante cena em que uma das freiras ressuscita Justine, imersa em um caixão repleto de sangue – uma cena em que nossas capacidades de assistir ao filme são testadas.
    A própria protagonista, papel de destaque de Tina Romero, prova que pode mudar de menina doce à vilã da história, num piscar de olhos – pois, após perder Justine, ela se decida a se aproximar a filha cega do médico, uma demonstração do poder de manipulação de Alucarda.
    Entre outras cenas brutais, destaque para o momento em que Alucarda e Justine blasfemam no convento, diante das freiras, em alto e bom som. A sequência seguinte, do exorcismo das meninas é o nosso teste para o resto do filme – é simplesmente chocante, um show de tortura e polêmica, inclusive com as duas meninas crucificadas e Justine sendo despida, sem o menor pudor e depois, morrendo ali mesmo, diante do choro desesperado de Alucarda.
    E o melhor fica para o final, onde a menina joga sua vingança contra todos do convento, transformando o lugar em um inferno – literalmente – com direito a controversos e perturbadores closes do crucifixo e do altar em chamas. Destaque para a morte de Alucarda – ela simplesmente evapora diante do altar e do crucifixo, uma prova que ela é, de fato, uma entidade sobrenatural.
    O melhor é que nunca descobrimos, de fato, o que a mãe de Alucarda fez para a filha possuir essa ligação chocante e perigosa com o sobrenatural.
    Enfim… ALUCARDA é um verdadeiro clássico do cinema mexicano e um dos filmes mais assustadores já feitos – uma prova de que uma boa história não precisa de monstros para ser assustadora – basta ter um toque de Sobrenatural.
    ALUCARDA É UM VERDADEIRO CLÁSSICO!!!!!!!!!
    UMA OBRA-PRIMA!!!!!!!!!!

    10/10

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