Águas Profundas
Original:Deep Water
Ano:2022•País:EUA, Austrália Direção:Adrian Lyne Roteiro:Zach Helm, Sam Levinson, Patricia Highsmith Produção:Guymon Casady, Benjamin Forkner, Arnon Milchan Elenco:Ben Affleck, Ana de Armas, Tracy Letts, Grace Jenkins, Dash Mihok, Rachel Blanchard, Kristen Connolly, Jacob Elordi |
A escritora Patrícia Highsmith (1921-1995) tem uma série de boas adaptações cinematográficas de seus livros, com destaque para Pacto Sinistro (1951), O Amigo Americano (1977) e O Talentoso Ripley (1999), para ficar nos meus três preferidos. Vários de seus livros contam com o amoral Tom Ripley como protagonista, certamente o personagem mais famoso criado pela escritora, que já foi interpretado por atores celebrados como Alain Delon, Matt Damon e John Malkovich.
Geralmente as tramas de suspense psicológico da escritora vêm associadas com críticas à sociedade, principalmente às contradições do ser humano, à ausência de um propósito e ao apego a frivolidades, sendo essas as principais características também presentes no livro Em Águas Profundas, publicado em 1957.
Aqui não temos Ripley, mas o casal Vic e Melinda, que, apesar de ricos, são infelizes no relacionamento. Somos apresentados ao seu círculo de amigos e aos casos extraconjugais de Melinda, que tem a conivência e/ou indiferença de seu marido. Contudo, uma situação que vinha aparentemente sendo tolerada, chega uma morte para fragilizar essa convivência colocando os personagens em situações limite.
O poder do livro recai não tanto no enredo em si, mas no aprofundamento dos personagens e suas interações. Vic e Melinda são personagens complexos, e o livro consegue retratar com maestria a frieza de um em contraponto ao vulcão de emoções de outro e vice-versa, já que essas condições se alternam entre o casal.
A adaptação desse material demandaria um roteiro e uma direção sutil, provocadora na medida certa e atinada no desenvolvimento dos personagens. Contudo, não é isso que vemos nesse caso. O roteiro do filme, disponibilizado pela Amazon Prime (co-escrito por Sam Levinson, da série Euphoria), tenta colocar TODAS as situações do livro em tela, o que resulta em algo apressado (apesar das quase duas horas de filme) e falha em nos fazer identificar com os protagonistas. A direção do veterano Adrian Lyne, que fez sucesso com Atração Fatal (1987) e Proposta Indecente (1993), é pesada e a trama avança de forma truncada, deixando de aproveitar alguns enredos importantes (a interação de Vic com os amantes de Melinda por exemplo) e por vezes descaracterizando personagens (o mais emblemático é a mudança drástica de Melinda de amante fogosa para esposa apaixonada).
O final do longa, diferente do livro, tenta ser mais esperto e moderno, contudo, é conservador quando enquadra seus personagens no estereótipo social vigente. Além disso, a ridícula cena do carro com o personagem Don (interpretado pelo ótimo ator e dramaturgo Tracy Letts), que não está no livro, demonstra a falta de competência do roteiro e da direção.
Já ia esquecendo: Ben Affleck e Ana de Armas, que realmente tiveram um relacionamento durante as filmagens, estão muito bem como Vic e Melinda, principalmente esta última, que consegue transmitir a sensação de sufocamento ao permanecer encarcerada num relacionamento que, na sua visão de mundo, não faz sentido.
Até agora é o pior filme que assisti em 2022. Pelo envolvimento, na vida real, dos protagonistas do filme, pensei que a “química”, pelo menos isso, fosse funcionar. Nada acontece e as personagens são mal desenvolvidas demais. Algumas ficam pelo caminho sem nenhuma razão.