Natal Diabólico
Original:Christmas Evil / You Better Watch Out
Ano:1980•País:EUA Direção:Lewis Jackson Roteiro:Lewis Jackson Produção:Pete Kameron, Burt Kleiner Elenco:Brandon Maggart, Jeffrey DeMunn, Dianne Hull, Andy Fenwick, Brian Neville, Joe Jamrog, Wally Moran, Gus Salud |
Descobrir que o Papai Noel não existe nunca foi tão danoso à saúde mental. No longa-metragem You Better Watch Out, de 1980, ou Natal Diabólico, essa revelação rendeu um trauma sem precedentes na vida de Harry Stadling, interpretado por Brandon Maggart. Em uma despretensiosa noite de Natal, ele flagrou seu pai, caracterizado de bom velhinho, e sua mãe em um momento íntimo. Esse momento o acompanhou durante toda a fase adulta, quando ele passa a ser ridicularizado pelos colegas de trabalho, diminuído pelo irmão e começa a nutrir uma fixação pelo mito do Santa Claus, vigiando as crianças da vizinhança e mantendo uma lista de garotos e garotas que não se comportaram bem durante o ano. Em um determinado final de ano, após um colapso nervoso, Harry chega ao seu limite e, fantasiado de Papai Noel, parte em uma jornada de matança e “justiça” pelas crianças boazinhas.
Dirigido e roteirizado por Lewis Jackson, o filme trabalha muito bem a ideia de que a nossa criança interior nos acompanha a vida toda – e como nossos traumas e desejos antigos podem ser subvertidos na fase adulta. Nesse sentido, um ponto muito positivo do longa-metragem é a série de elementos que cercam o personagem principal que sempre remetem ao Natal e fazem parte da sua fantasia – ele trabalha em uma fábrica de brinquedos, a decoração da casa dele remete ao Natal, além dele se enxergar como o próprio Papai Noel – seu pai.
Referenciando o complexo de édipo, o longa é uma narrativa excelente de desvirtualização da mágica do Natal e funciona bem tanto como um slasher, mas também causa bastante tensão em cenas que trabalham um horror mais psicológico. Além disso, a interpretação de Brandon como o perturbado Harry é muito boa – o ator transmite bastante a confusão mental dele e a sua degradação psíquica – e o elenco infantil é competente. Simbolicamente, as crianças representam essa fantasia que não morreu, o que fica nítido na cena em que a menina entrega o canivete para o Harry. No entanto, nem todos os personagens possuem suas funções narrativas tão bem aproveitadas, como é possível observar no pouco desenvolvimento da relação do personagem principal com o seu irmão, onde claramente há um conflito não resolvido entre os personagens.
Já em relação à sua duração, o filme tem o tempo que precisa ter para focar na narrativa – do primeiro até o segundo ato – e nas coisas horríveis que vão acontecendo ao personagem principal que, mais tarde, contribuem para a sua loucura. O ritmo é mais lento durante essas duas primeiras partes, o que é necessário para que o terceiro ato seja um pouco mais brutal, tanto psicologicamente quanto fisicamente.
Os efeitos práticos visuais são decentes, principalmente se considerarmos as possibilidades de uso desses recursos nos anos 80. As mortes dos personagens são criativas e os ataques de fúria do personagem principal são muito bem dirigidos, havendo apenas alguns pequenos erros de continuidade que prejudicam um pouco o andamento do filme, como é o caso do momento da fuga do personagem neve afora, onde ele cai e a peruca do Papai Noel também cai, mas no instante seguinte, ele reaparece com a caracterização arrumada novamente.
Dito isso, Natal Diabólico é estranho, divertido e creep no sentido mais literal da expressão – uma excelente opção para assistir em meio às festividades do final do ano. Com um final, para dizer no mínimo, “viajado”, assim como pede o filme, o espectador certamente tira suas próprias conclusões sobre o destino de Harry, mas elas não importam: o diretor usa a figura do Papai Noel apenas como metáfora para brincar com os traumas e com a fantasia do personagem principal do início ao fim, o que faz com que nós tenhamos uma certa empatia com ele e com sua dor.