Porto Estelar
Original:Starport Ano:2024•País:EUA Páginas:• Autor:George R. R. Martin, Raya Golden•Editora: SumaHQ |
Alguns anos antes do sucesso de As Crônicas de Gelo e Fogo – conhecido popularmente por Game of Thrones, graças a série da HBO -, George R. R. Martin era mais um escritor tentando deslanchar. Em Hollywood, passou a escrever roteiros de séries, também ajudando na produção de algumas. Porém, nem tudo que é escrito de fato é filmado, ou apenas não chega às telas por inúmeros motivos. Em meados dos anos 90 Martin escreveu o roteiro de uma série de sci-fi que nunca viu a luz do dia, e foi apenas em 2019 – após Martin já ser um escritor consolidado de imenso reconhecimento e prestígio há alguns anos graças às Crônicas, entre outras obras – que a produção foi adaptada para os quadrinhos, chamada de Porto Estelar. Anteriormente, uma das versões do script já havia sido publicada na coletânea Quartet: Four Tales from the Crossroads, entretanto, não teve muita procura. Agora, em 2024, a editora Suma, com seu selo SumaHQ, nos traz em toda sua glória Porto Estelar, com arte e adaptação por Raya Golden, assistente de George R. R. Martin e quadrinista, já tendo adaptado outras obras do autor.
Dez anos atrás, três naves alienígenas pousaram na Terra – uma em Singapura, uma na Dinamarca e a última em Chicago, bem no meio de um estádio durante o SuperBowl. A intenção não era invadir nosso planeta, e sim nos convidar a fazer parte da Harmonia dos Mundos, uma unificação de todos os povos conhecidos da galáxia para trazer paz e troca de experiências e tecnologias. Três portos foram construídos para tal propósito e, após alguns percalços e burocracias, o porto de Chicago finalmente ficou pronto. Já nos tempos atuais, vemos que todos vivem em relativa harmonia de fato, com extraterrestres de todos os tipos e cores caminhando livremente pela Terra, fazendo compras e convivendo uns com os outros. Claro que nem tudo é belo e pacífico, tendo muito preconceito dos humanos com os alienígenas, espécies que nos consideram inferiores, costumes diferentes e enfim, algumas confusões são inevitáveis, porém contornáveis. A força policial precisou passar por algumas adaptações para lidar com essa nova Era e, mesmo após dez anos, alguns ainda tem dificuldades ou simplesmente são intolerantes. De qualquer modo, Chicago terá a grande honra de receber um representante comercial da espécie que cedeu uma de suas tecnologias, e precisam garantir que tudo corra perfeitamente bem em nome da paz. É claro que nada vai correr bem. A tenente Bobbi Kelleher, o novato entusiasta de aliens Charlie Baker e o detetive Aaron Stein precisarão lidar com os eventos que podem colocar a Harmonia, especialmente a Terra, em risco.
Nos anos 90 as séries e filmes de ficção científica estavam em alta, por isso não é de se estranhar que Martin tenha sido contratado para escrever um roteiro do gênero. Quem já conhece o estilo do autor, sabe que ele gosta de criar diferentes mundos, povos e costumes, além de um idioma específico. Em Porto Estelar não é diferente. Temos uma imensa variedade de aliens de todos os tipos, sejam baratas gigantes usando smokings elegantes, sejam belos espécimes humanoides com códigos de conduta e honra incorruptíveis (será?), e cada um fala uma língua. É claro que, como tudo se passa na Terra, precisam falar o inglês, mas sempre dando uma amostra de seu idioma materno quando possível.
A riqueza de detalhes de cada espécie, e até mesmo alguns de seus costumes, é impressionante, e Raya Golden consegue passar isso muito bem em sua arte. Os traços são agradáveis e seus personagens, expressivos. Assim como o texto de Martin é todo detalhado, assim são os traços da artista. Cada roupa, naves espaciais e características de cada um que aparece nesse quadrinho – e, acredite, aparecem muitas espécies – são únicos e extremamente minuciosos. As cores vibrantes, que ficam a cargo da colorista Rachel Hilley, também nos remetem a programas de sci-fi antigos, onde as naves espaciais e as roupas eram cheias de roxos e azuis e os fluidos que saíam dos alienígenas, gosmas verdes. Tudo isso está presente aqui, causando até mesmo uma certa nostalgia em quem chegou a assistir grandes séries como Battlestar Gallactica.
A trama não é nada de outro mundo de se entender, mas há muitos trâmites, conspirações e politicagens por trás, coisa que, novamente, faz parte do estilo do autor, já que traições e burocracias são uma grande parte da essência de Game of Thrones. Diferente da maioria das obras de ficção científica, aqui a existência de seres de outro planeta não é tão relevante, eles apenas estão ali, assim como qualquer outra ser. O preconceito de algumas pessoas não é nada diferente do que já vimos e vemos com frequência na sociedade – inclusive, mesmo escrita há mais de 30 anos, a narrativa continua extremamente atual -, apenas é voltada para outras espécies, e são esses dilemas que fazem Porto Estelar brilhar, além de personagens extremamente carismáticos. Até mesmo os coadjuvantes tem seu momento de holofote e são cruciais para a trama, muitas vezes tendo mais destaque do que os protagonistas, ou sendo tão importantes quanto.
A história tem começo, meio e fim, com algumas conveniências de roteiro conforme se aproxima do final, sendo fechadinha e sem pontas soltas, mas uma sequência não pode ser descartada. O quadrinho é baseado apenas no roteiro do episódio piloto que Martin escreveu, portanto, agora que chegou às grandes massas, uma continuação é totalmente plausível.
Porto Estelar é uma HQ de sci-fi divertidíssima cheia de conchavos, ação, gosma alienígena e loucuras extraterrestres.