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Drácula: A Ordem do Dragão
Original:Dracula: L’ordine Del Drago
Ano:2024•País:Itália
Páginas:128• Autor:Corrado Roi, Marco Cannavò•Editora: Darkside Books

Indiscutivelmente Drácula, de Bram Stoker, é um clássico que virou um marco na história, servindo de inspiração e sendo discutido e adaptado à exaustão até os dias de hoje. Em inúmeras resenhas e artigos aqui do Boca do Inferno já falamos sobre isso, da importância da obra para a literatura e para o mundo do horror. Então vamos falar um pouco sobre fatos históricos. É de conhecimento relativamente geral que o famoso Conde Drácula foi baseado em uma figura histórica também bastante conhecida, chamada de Vlad, O Impalador. Seu pai, o príncipe da Valáquia Vlad II, fazia parte de uma instituição chamada Ordem do Dragão, que tinha como exigências defender a cruz e dizimar os inimigos – na época, húngaros e otomanos. Como é de se esperar, o símbolo da Ordem era um dragão, e Vlad II tinha tanto orgulho de fazer parte disso que incorporou o dragão em seu brasão e foi até um pouco além: adotou também o cognome “Dracul” (o termo tem origens no latim “draco”, ou seja, dragão). Parece familiar?  Vai ficar ainda mais. Seu filho, Vlad III, foi chamado de Draculea, que significa “filho de Dracul”.  Até aqui já podemos ver de onde surgiu a inspiração de Bram Stoker para o nome do vampiro mais comentado do mundo, certo? Mas ainda tem mais.

Dracul não significava apenas dragão, como também diabo, e camponeses amedrontados e inimigos da Ordem se referiam assim à família de Vlad II. Consequentemente, Vlad III era o “filho do diabo”, e isso se adequaria perfeitamente a ele no futuro. Sem entrar nos detalhes de sua história, Vlad III tinha o costume de empalar seus inimigos. Diz a lenda que ele organizou um banquete para nobres do território romeno e, de surpresa, mandou seus soldados empalarem todos lentamente enquanto bebia o sangue dos inimigos, virando uma figura temida, lendária e demoníaca. A lenda diz respeito apenas ao ato de beber o sangue, todas as outras crueldades praticadas por ele são simplesmente fatos. Sendo assim, verdades se juntaram aos mitos e foram espalhadas pelos camponeses locais, que começaram a associar O Impalador com o vampirismo. Séculos depois, tais lendas continuavam vivas e chegaram aos ouvidos de Bram Stoker. O resto da história vocês já sabem.

Feita essa introdução histórica, que não foi apenas para explicar a origem de Drácula, a Darkside Books lançou a graphic novel Drácula: A Ordem do Dragão, com roteiro de Marco Cannavò e arte de Corrado Roi, que aborda um pouco do envolvimento do vampiro na instituição em sua vida anterior e como se tornaram inimigos mortais.

A história começa tal qual a do livro: o advogado Jonathan Harker viaja até a Transilvânia para encontrar Vlad Drácula, um príncipe interessado em adquirir uma propriedade em Londres. Durante uma conversa, Drácula vê uma foto da noiva de Harker e imediatamente se interessa na moça de modo um tanto obsessivo. Pouco após sua chegada, o jovem advogado se vê preso no castelo e logo descobre que o príncipe é um ser demoníaco indo atrás de sua noiva. Agora, Jonathan precisa correr contra o tempo para conseguir salvá-la. Mas será que ela realmente precisa ser salva, ou sua doce e inocente Lucy é muito mais do que aparenta?

Essas são apenas as primeiras páginas dessa HQ, e a partir daqui o roteiro de Cannavò toma rumos bem distintos do original. A começar pelo nome da futura esposa de Jonathan. Quem já leu a obra original, sabe que Mina é sua noiva, e Lucy apenas sua amiga, mas essa é a menor das mudanças. Os quadrinhos seguintes vão mostrar a origem de Drácula, sua associação com a Ordem do Dragão e a sede de sangue de sua esposa, que só vai ser descoberta séculos depois.

Não é a primeira vez que as origens de Drácula são trabalhadas em uma releitura, em específico a origem que remete ao Vlad III já foi abordada em Drácula Untold (2014) – com as devidas liberdades criativas, é claro. No quadrinho de Roi e Cannavò, usaram alguns dos fatos históricos citados no início do texto para dar vida à uma nova narrativa.

O roteiro segue bem até certo ponto, e acrescenta camadas até mesmo a uma das esposas de Drácula, Greta, que se torna uma personagem importante para o desenvolvimento da história. Mistério e tensão pairam no ar, até o momento da revelação de um grande segredo e do passado de Drácula. A partir desse ponto as coisas começam a ficar bem mais sanguinolentas e frenéticas, entretanto, é justamente por isso que começa a se perder e alguns problemas ficam aparentes no roteiro. O autor parece querer mostrar muitas coisas em um curto espaço de tempo, sem desenvolver satisfatoriamente nenhuma delas. A Ordem do Dragão do título aparece apenas em um momento, pontos chave da trama são jogadas rapidamente e muita coisa parece sem explicação.  Fica a impressão de que estamos na mesma corrida contra o tempo de Harker, onde tudo é feito de forma acelerada, às pressas, apenas para chegar ao final. Provavelmente mais páginas resolveriam esse problema, mas no final das contas temos algumas cenas que deveriam ser impactantes, mas não o são devido ao ritmo acelerado.

Além da mudança de nome de Mina para Lucy, as personalidades das personagens também estão bem distintas. Sem entrar em grandes detalhes para evitar spoilers, Lucy é muito mais assertiva e dissimulada aqui, o que acaba se mostrando uma mudança coerente com o roteiro proposto. Van Helsing se assemelha muito mais a um cientista louco sem pudores, e Drácula ganha mais complexidade, mostrando um pouco mais de sua humanidade – e também um pouco mais de bestialidade -, e isso é um grande ponto positivo. Greta, como já citado, é uma grata surpresa, já que raramente vemos algo sobre a personalidade das esposas de Drácula além de sua sede de sangue e sensualidade.

Agora, a verdadeira joia desse quadrinho é a arte de Roi, toda em preto e branco. Seus traços são profundos e sombrios, captando toda a essência de Drácula – belo e terrível, envolvente e assustador. Toda a estética é belíssima e faz valer a edição.

Drácula: A Ordem do Dragão possui um enredo criativo, mas ao tentar inovar além da conta e incluir elementos mirabolantes em demasia, fatalmente acaba se perdendo em dado momento.  Cannavò e Roi utilizaram fatos e mitos para criar uma releitura de Drácula um tanto ousada, que peca um pouco em seu desenvolvimento, mas nos entrega uma arte de arrepiar.

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