
![]() Não Documentado
Original:Undocumented
Ano:2010•País:EUA Direção:Chris Peckover Roteiro:Chris Peckover, Joe Peterson Produção:Keith Calder, Jess Wu Calder, Josh Finn Elenco:Scott Mechlowicz, Alona Tal, Yancey Arias, Kevin Weisman, Greg Serano, Tim Draxl, Noah Segan, Peter Stormare, Jsu Garcia, Adam Kulbersh, Nicholas Tucci, Castulo Guerra, Tom Connolly, Jose Jacinto Marquez |

O horror quando se associa à política, algo praticamente orgânico, traz resultados perigosos. Essa polarização que assombra o mundo, independente da ideologia, pode provocar atitudes extremas, em ações de ódio e intolerância. Exemplos não faltam nas redes sociais e em qualquer ambiente coletivo, não precisando que você vá muito longe na pesquisa, bastando abrir qualquer portal de notícias para encontrar casos de assassinatos e discriminação. Nos EUA, a era Trump mais uma vez tem dificultado a entrada de estrangeiros e tem se empenhado em deportar os chamados “imigrantes ilegais“, numa caça às bruxas que envolveu até mesmo brasileiros que sempre apoiaram o presidente americano. O interessante longa Não Documentado (Undocumented, 2010) estabelece um diálogo entre patriotismo extremo e torture porn, em uma exemplificação bem intensa sobre imigração e violência.
Não se trata de uma ficção absurda: antes mesmo das eleições que colocaram Donald Trump no poder, já existiam milícias armadas, compostas por extremistas, que patrulham as fronteiras com o México, principalmente ao sul, caçando e torturando quem tenta realizar a travessia. Nem todos os casos são denunciados às autoridades, tratando-se de uma diversão sádica, disfarçada de patriotismo. Com o Trump e sua política “Build The Wall“, as ações contra a imigração ilegal se consolidaram por fundamentos oficiais, ainda que não exista prova da continuidade da prática.
Com direção de Chris Peckover (Perigo Próximo, 2017), a partir de um roteiro dele em parceria com Joe Peterson, Não Documentado poderia funcionar como um curioso found footage. Tem algumas cenas filmadas pelos atores, mas a condução principal é a tradicional, sem que isso afete o bom resultado. Os jovens cineastas Travis (Scott Mechlowicz), William (Tim Draxl), Liz (Alona Tal), Davie (Greg Serano) e Jim (Kevin Weisman) estão produzindo um documentário sobre imigrantes mexicanos ilegais, entrevistando membros da família de Davie, incluindo seu primo Alberto (Yancey Arias), a esposa Maria (Carmen Corral) e a filha Selina (Lorél Medina).

O grupo pretende acompanhar a travessia da família desde o primeiro contato com o coiote (Castulo Guerra) até encontrar abrigo nos EUA. Depois de atravessarem um túnel escuro, eles sobem em um caminhão, imaginando terem passado pelos piores momentos da travessia. Mas o veículo é abordado pelos que parecem ser guardas da fronteira, e todos são levados a um galpão, incluindo os cineastas americanos.
Ali começa o pesadelo de todos os detidos: um grupo mascarado, composto por patriotas extremistas, expõe seu ódio contra imigrantes mexicanos, e pede que os americanos, também mantidos em cárcere, filmem tudo, com a promessa que depois serão libertados. Em uma versão mais leve de Os 120 Dias de Sodoma, os mexicanos são presos em ganchos de carne, sem roupas, separado das mulheres. Uma mula de drogas é forçada a se alimentar de um preservativo de cocaína até ser morto espancado; uma mulher, a serviço dos torturadores, é obrigada a se alimentar com fatias de maçã como um animal; Alberto, que mal fala o inglês, participa de um jogo de perguntas e respostas sobre curiosidades americanas, precisando acertar questões de conhecimento de cidadania para não ver sua esposa ser desmembrada.
O líder dos extremistas, conhecido apenas como Z, é interpretado pelo irreconhecível Peter Stormare. Ele conduz as ações violentas e apresenta alguns lugares do galpão, incluindo o falso médico que extrai de mexicanos vivos órgãos para transplante. Travis e Liz tentam organizar uma fuga, porém em uma delas eles descobrem que as crianças que os torturadores permitiram que fossem libertadas morreram no arame farpado. Logo percebem que a intenção dos psicopatas não envolve um período de tortura visando libertá-los.

Ainda que apare os excessos, sem, por exemplo, evidenciar crimes sexuais, Não Documentado é um curioso espelho que reflete a violência não tão distante da realidade. Até mesmo as pessoas que são favoráveis a essa política que não permite a vinda de estrangeiros provavelmente se sentirão incomodadas com a proposta, colocando-se no lugar daqueles que buscam melhores condições de vida. Traz algumas facilidades na narrativa como nos momentos em que os sequestradores resolvem deixar o local e partem de carro sem motivo aparente, quando uma porta é vista aberta ou quando o enredo ignora os arames farpados para permitir uma nova tentativa de fuga. No entanto, a mensagem está ali, ainda que pouco ousada no grafismo e sem excessos que poderiam torná-la mais impactante.





















