Preacher é um quadrinho recheado de violência, humor negro, diálogos ágeis e afiados no melhor estilo Quentin Tarantino, referências à cultura popular americana e questionamentos. Escrita por Garth Ennis (Justiceiro), ilustrada por Steve Dillon (Hellblazer) e com capas de Glenn Fabry (Neverwhere), a série foi idealizada tendo 66 edições mais 6 especiais, formando o número 666 e foi um dos títulos mais bem-sucedidos da Vertigo, linha adulta da DC Comics, ajudando a sedimentar o selo nos anos noventa após o cancelamento das séries que deram origem à Vertigo, Sandman e Monstro do Pântano.
O jovem pastor Jesse Custer, desiludido e perdendo sua fé, é possuído por uma entidade meio anjo meio demônio e adquire o poder de fazer com que qualquer pessoa obedeça aos seus comandos. Junto com sua ex-namorada, e primeiro amor, Tulipa e o vampiro irlandês beberrão, Cassidy, Jesse empreende uma jornada pelo coração dos EUA na busca por Deus para exigir do próprio Senhor explicações sobre por que o Todo-Poderoso deixou seu posto.
Preacher causou polêmica por sua abordagem nada ortodoxa sobre religião, principalmente do catolicismo, mas os detratores das aventuras de Jesse Custer não enxergaram além da superfície. Preacher questiona os valores da sociedade americana e ainda toca em temas delicados e não muito comuns aos quadrinhos mainstream como feminismo, racismo, a ganância de grandes corporações, honra e até sobre a influência negativa de ídolos irresponsáveis – talvez uma crítica a outro tipo de religião – ao apresentar o “Cara-de-cu” um garoto que após saber da notícia do suicídio de Kurt Cobain, tenta se matar, mas acaba sobrevivendo desfigurado. Este mesmo personagem acaba tendo uma carreira meteórica como ídolo do rock em uma das melhores seqüências da série.
Garth Ennis escreve uma espécie de “grande romance americano” sobre a busca de um homem por sua fé, tratando com uma delicada macheza temas como romance, amizade, traumas de infância e cicatrizes de guerra. Tudo isso misturado com assassinos seriais, misticismo, vampiros, messias retardados, orgias sexuais bizarras, Klu Klux Kan e muitas referências aos antigos westerns – como a importantíssima participação de John Wayne. Impossível não se emocionar e se envolver com a amizade e cumplicidade de Jesse e Cassidy e o amor entre nosso querido pastor e sua namorada Tulipa.
Companheiro de Ennis nessa viagem, Steve Dillon, possui um traço simples e competentíssimo, retratando de maneira sucinta e direta cenas de ação e violência. Sem falar nas expressões faciais em que é um mestre. Glenn Fabry fecha a equipe criando verdadeiras obras-de-arte para ilustrar as capas de cada edição. Seu trabalho é tão competente que foi editado em um livro contendo todas as suas capas para a série (Preacher: Dead or Alive).
Adaptação para as telas
Durante muitos anos se falou da adaptação de Preacher para as telas. A princípio os comentários falavam sobre uma série de TV para a HBO, inclusive com um famoso teste de maquiagem do Cara-de-Cu tendo vazado na internet. Após algum tempo o projeto foi abandonado, pois a série foi considerada muito “violenta e explícita”. O eterno Ciclope da franquia original dos X-Men no cinema, James Marsden chegou a ser contratado para o papel de Jesse Custer nesta possível versão da HBO.
Depois disso, em 2008, após os direitos para a série ter passado de mão em mão, Preacher chegou até Sam Mendes, que já dirigiu Estrada Para A Perdição, outra adaptação dos quadrinhos para o cinema e do roteirista de vários filmes dirigidos por Tim Burton, John August, que chegou a escrever novas histórias para a série em conjunto com Garth Ennis.
Em 2013, a AMC anunciou que iria produzir um piloto de Preacher e que Seth Rogern e Evan Goldberg estariam trabalhando junto com Sam Caitlin no projeto. Garh Ennis e Steve Dillon estavam envolvidos no projeto como produtores executivos e Domic Cooper foi contratado para viver Jesse Custer nesta versão do seriado. Enquanto alguns fãs mais radicais questionavam algumas contratações para o elenco e a adição de personagens inexistentes nos quadrinhos originais para a série de TV, o projeto foi avançando aos poucos até se tornar realidade.
Preacher estreia pela AMC, mesma emissora responsável por Breaking Bad e The Walking Dead, no próximo dia 22 de maio, e ainda não tem previsão de estreia no Brasil.
Preacher no Brasil
Apesar de todas as qualidades da série e seus fãs, Preacher não teve um histórico de publicação no Brasil bastante confuso e cheio de percalços. A série começou a ser editada no Brasil em 1997 pela Metal Pesado que publicou suas treze primeiras histórias – seguindo a numeração original americana – antes de mudar para a Tudo em Quadrinhos em 1999. A TEQ/Fractal lançou por aqui mais sete edições e depois Preacher passou para as mãos da Atittude Publicações que lançou apenas uma edição.
Em maio de 2000 Preacher começou a ser publicado pela Brainstore que foi uma das editoras que mais longe conseguiu chegar com a série no Brasil, lançando 34 edições e atingindo o último arco, que permaneceu em aberto durante alguns anos.
A editora Devir lançou por aqui os três primeiros encadernados da série que compreendem as edições 1 a 26 (Vol.1: A Caminho do Texas, Vol.2: Até o Fim do Mundo e Vol.3: Orgulho Americano). Posteriormente a Pixel Media lançou os dois arcos seguintes, que vão da edição 27 à 40 (Rumo ao Sul e Guerra ao Sol), até que a editora Panini adquiriu os direitos sobre o material da Vertigo
A Panini tomou a acertada decisão de começar de onde as editoras anteriores haviam parado começou com o encadernado que englobava as edições 41 a 50 (Vol.7: Salvação) e, finalmente, concluiu a série no Brasil. Logo em seguida, a Panini anunciou que relançaria todos os encadernados, desde o início, fechando uma coleção completa com os inéditos Vol.4: Histórias Antigas, Vol.8: Às Portas do Inferno e Vol.9: Álamo. A coleção completa vem sendo relançada de tempos em tempos pela Panini, de olho no sucesso que a série faz entre os fãs de quadrinhos.
Até o fim do mundo
Mais do que uma série de horror e humor-negro, Preacher é uma história sobre amor e amizade que, por mais que não seja uma história para todos os gostos devido à imensa quantidade de palavrões, blasfêmias e sexo das mais variadas formas possíveis, toca em temas tão universais que torna quase impossível não se relacionar com os personagens. Não é à toa que seus rostos soem tão familiares mesmo em meio a tantas situações absurdas.
Preacher é sem sombra de dúvidas a obra-prima de Garth Ennis e, assim como o Monstro do Pântano de Alan Moore, o Sandman de Neil Gaiman e o Constantine de Jamie Delano, é uma das bases do selo Vertigo.
Um quadrinho pra se ler e reler, até o fim do mundo.