4.8
(8)

Rent-a-Pal
Original:Rent-a-Pal
Ano:2020•País:EUA
Direção:Jon Stevenson
Roteiro:Jon Stevenson
Produção:Annie Baker, Brian Landis Folkins, Brandon Fryman, Robert B. Martin Jr, Jon Stevenson, Jimmy Weber
Elenco:Brian Landis Folkins, Wil Wheaton, Kathleen Brady, Amy Rutledge, Adrian Egolf, Brandon Fryman

Estamos em 2021, a Internet nos dá uma possibilidade que poucas gerações puderam experimentar: a de conversar e interagir com diferentes pessoas a qualquer momento do nosso dia. Podemos criar amizades virtuais com pessoas que nem sequer sabemos como realmente são, e dessa maneira podemos estabelecer diferentes vínculos e construir relações como nenhuma outra geração conseguiu criar. Mas por que mesmo com essas infinitas possibilidades continuamos a nos sentir cada vez mais sozinhos?

O diretor e roteirista Jon Stevenson encontrou um VHS de 1987 chamado “Rent-A-Friend” (Alugue um amigo) que possuía uma premissa bastante simples: você alugaria um amigo? Ao levar a fita para casa você teria uma conversa unilateral já pré-gravada com um personagem na tela da sua televisão – o conceito parece bastante estranho atualmente mas conseguia ser interativo nos anos 80. Foi justamente ao assistir essa fita que Stevenson começou a escrever o roteiro de Rent-A-Pal (2020). Ambientado nos anos 1990 durante a era de ouro do VHS e vídeos locadoras, o filme explora o mesmo conceito da fita achada pelo diretor, mas consegue gerar um debate extremamente interessante sobre a solidão e falta de comunicação em meio a uma era onde as pessoas nunca estiveram tão “conectadas”.

David (Brian Landis Folkins) é um homem de meia idade que vive com sua mãe idosa que sofre de demência. Boa parte do seu tempo é dedicado a desempenhar um papel de cuidador, fazendo comida, dando banho e garantindo que sua mãe tenha uma vida digna. Quando não está cuidando da idosa, David se encontra em seu porão, assistindo fitas que ele comprou de um serviço de namoro em vídeo – um Tinder da era VHS: mulheres deixam mensagens pré-gravadas sobre quem são e o que elas buscam em um homem.

David se dedica o tempo todo a dar um fim em sua solidão, e ele acredita que o meio mais fácil para isso seja encontrar uma companheira. Sem amigos, emprego ou qualquer tipo de relacionamento, David passa seus dias esperando por ligações de alguma dessas mulheres que utilizam o serviço de namoro e também alimenta esperanças de que alguma delas possa interessá-lo. David tenta criar uma relação significativa com as mulheres ao seu redor, e ao receber rejeição podemos ver a já frágil autoestima do personagem ser cada vez mais destruída.

Mas um dia ao entrar na vídeo locadora, David encontra um VHS diferente chamado “Rent-A-Pal”: um vídeo de um homem chamado Andy (Wil Wheaton), que mantém uma conversa com o espectador através da tela, prometendo diversão e amizade para aquele que se propor a assistir. David então leva a fita para casa e começa a interagir com Andy em seu solitário porão. O relacionamento dos dois começa a crescer de maneira bastante estranha e Wil Wheaton entrega uma das performances mais sinistras do ano no papel de Andy. David encontra quase que uma cura para sua solidão em Andy e começa a contar cada vez mais sobre sua vida para o seu mais novo amigo, fazendo com que suas conversas com Andy se tornem o ponto alto do dia de David.

Mas então, algo inesperado acontece com David: ele finalmente obtém uma resposta no serviço de namoro de vídeo. Lisa (Amy Rutledge) é uma cuidadora solitária que entende o drama vivido por David e se interessa por ele. Em uma sequência bastante interessante vemos David sair de seu porão e experimentar vivências reais ao lado de Lisa, sentindo uma felicidade que a muito tempo ele desejava.

O que Andy acha desse relacionamento? É esse questionamento que David não consegue abandonar, pois mesmo sem perceber a conversa com Andy começou a nutrir pensamentos de ódio e frustração em David, um ódio voltado principalmente para as figuras femininas de sua vida. Respaldado por Andy, David começa a querer afastar cada vez mais essas figuras de sua vida, se tornando agressivo com a sua mãe e começando a ignorar telefonemas e tentativas de encontros com Lisa.

Temos então o terceiro ato do filme, que culmina em David completamente perdido e solitário dentro de sua amizade com Andy. Responsabilizando todas as mulheres de sua vida por sua solidão e rejeição, Davi  faz com que elas se tornem vítimas de seu ódio desenfreado. Stevenson aqui trabalhou um conceito que vem se tornando cada vez mais forte dentro de fóruns da Internet, o do Incel (Celibato Involuntário). Trata-se de homens frustrados por não conseguirem ter uma vida sexualmente ativa, e é justamente na Internet que eles encontram pessoas que validam esse sentimento fazendo com que o ódio em relação às figuras femininas presentes nas vidas destes homens se torne cada vez maior.

Mesmo sendo apresentado dentro dos anos 90, Rent-A-Pal é um filme extremamente atual, em meio a solidão da era digital ( e principalmente devido ao isolamento social de 2020). Não é nem um pouco difícil encontrar pessoas que passam pelo mesmo drama de David. E muitas vezes a resposta para essas frustrações é encontrada em personagens como Andy, pessoas que vendem um discurso extremamente amplo que pode ser aplicado basicamente para qualquer um que esteja buscando uma conexão, real ou não.

Ao sentar em seu porão sozinho e contar para Andy sobre sua vida pessoal, seu relacionamento com seus pais e suas frustrações, David não se importa se as respostas de Andy são pré-gravadas ou não; ele as interpreta como deseja, fazendo com que pela primeira vez ele tenha a sensação de estar sendo escutado e compreendido.

Rent-A-Pal é um terror onde o monstro do filme é a solidão e a maneira que lidamos com ela, e ele se torna mais assustador ao se perceber que o drama de David e a solução que ele encontra para seus problemas vem se tornando cada vez mais comuns em nossa realidade.

O longa desperta um debate realmente interessante, que ganha mais força com o ótimo texto de Jon Stevenson, e uma direção bastante condizente com a proposta do filme, ainda podendo agradar bastante aqueles que têm uma nostalgia pela época do VHS e das gloriosas vídeo locadoras.

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1 comentário

  1. Cara, assiste esse filme agora, e foi perturbador. Me identifiquei de varias maneiras pois tb cuido de uma mãe idosa e tb sou sozinho. Confesso que chorei no ato final. Filme pesadissímo…

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