Fenda no Tempo (1995)

4.8
(18)

Fenda no Tempo
Original:The Langoliers
Ano:1995•País:EUA
Direção:Tom Holland
Roteiro:Tom Holland, Stephen King
Produção:David R. Kappes
Elenco:Patricia Wettig, Dean Stockwell, David Morse, Mark Lindsay Chapman, Frankie Faison, Baxter Harris, Christopher Collet, Kimber Riddle, Kate Maberly, Bronson Pinchot, Tom Holland, Julie Arnold Lisnet, David Forrester, Chris Hendrie, Jennifer Nichole Porter, Stephen King

A máquina de produção literária assustadora de Stephen King estava a todo vapor quando lançou em 1990 a antologia “Depois da Meia-Noite” (Four Past Midnight), uma compilação de quatro publicações, escritas entre 1988 e 1989. Vencedora do prêmio Bram Stoker, a obra traz histórias de horror sobrenatural, explorando medo, loucura e sensação de insegurança. Além da conhecida “Janela Secreta, Jardim Secreto“, que inspirou o longa Janela Secreta, há também “Os Langoliers“, que foi adaptado na minissérie Fenda no Tempo, e “O Policial da Biblioteca” e “O Cão da Polaroid“. Com King já estabelecido como influência escrita e um nome a ser acompanhado em qualquer adaptação e continuações, os sucessos de Jovem Outra Vez (1991) e A Dança da Morte (1994) serviram de motivação para mais uma longa produção para a TV.

Fenda no Tempo foi filmado no verão americano de 1994, com um orçamento estimado entre U$3 e U$5 milhões, e locações no Aeroporto Internacional de Bangor, Maine. Utilizaram para as cenas do avião a aeronave japonesa aposentada Lockheed L-1011, aberta nos sets, uma ideia que se mostrou favorável à transmissão de realidade. Apesar das evidentes falhas técnicas, erros de continuidade e efeitos especiais horrorosos, a exibição da minissérie nos dias 14 a 15 de maio de 1995 na rede ABC foi bem aceita, com as críticas apontando uma qualidade mediana e adequada para a proposta. No Brasil, o filme chegou ao mercado pela América Vídeo em VHS duplo, trazendo spoilers no título nacional e também na tagline: “O grande mestre do horror e do suspense transporta você a outra dimensão.

São spoilers porque a boa surpresa seja descobrir com os personagens o que realmente está acontecendo. Começa como um episódio de Além da Imaginação, apresentando a primeira das dez pessoas que se envolverão em uma situação fantástica: o piloto Brian Engle (David Morse, de À Espera de um Milagre, 1999) acaba de descobrir que sua ex-mulher faleceu em um acidente em Boston, precisando viajar para lá. Ouve a comissária falar algo sobre um fenômeno incomum sobre o Deserto de Mojave parecido com uma Aurora Boreal e adormece. É acordado pelos gritos da garota cega Dinah Bellman (Kate Maberly, de O Pesadelo 3, 2008), que percebe o desaparecimento de sua tia e de vários outros passageiros, deixando para trás brincos, relógios, outros itens pessoais incluindo uma peruca.

A garota é acalmada pela professora Laurel Stevenson (Patricia Wettig, da série Prison Break, 2005-2007), que pretendia ir a Boston em um encontro romântico. Acordam também o diplomata inglês Nick Hopewell (Mark Lindsay Chapman, de Titanic, 1997), que esconde um mistério sobre a razão de sua viagem; o escritor de mistério e suspense, alterego de King, Bob Jenkins (Dean Stockwell, de Hospedeiros – A Ameaça Interior, 2000), o violinista Albert Kaussner (Christopher Collet, de Acampamento Sinistro, 1983); a viciada Bethany Simms (Kimber Riddle), o empresário dorminhoco Rudy Warwick (Baxter Harris), o mecânico Don Gaffney (Frankie Faison, de Velozes e Mortais, 2004) e o irritante gerente de banco Craig Toomy (Bronson Pinchot, da série Primo Cruzado, 1986-1993).

No primeiro momento, além do estranhamento e da apresentação para os demais, Brian tenta contato com as torres de controle, mas sem sucesso. Também nota uma escuridão abaixo do avião, como se não houvesse mais terra onde pousar. Enquanto Craig já evidencia seu lado insuportável ao dizer que precisa participar de uma reunião em Boston, Bob aposta em ideias super outra dimensão e realidades paralelas, a partir de sua experiência literária. O estranhamento aumenta quando pousam no Aeroporto Internacional de Bangor e não encontram qualquer vestígio de vida no local, nem mesmo sons de pássaros ou qualquer cheiro, além dos alimentos estarem sem sabor. Como quase toda criança das obras de Stephen King, Dinah também demonstra capacidade telepática para “enxergar” como Craig vê o restante do grupo e escutar um som ao longe, parecendo que algo se aproxima.

Esse algo é o que a mente perturbada de Craig, atormentado por um passado de agressão e repressão do pai, chama de Langoliers, criaturas esféricas, ágeis e com dentes, que costumam se alimentar de garotos desobedientes. Aqui cabe uma interpretação do espectador sobre esses monstrinhos serem uma projeção de Craig a partir de seus medos, representando uma limpeza da realidade anterior, como se o passado precisasse ser constantemente apagado. É claro que Craig vai além de apenas ser chato e ter uma mente insana, trazendo uma verdadeira ameaça ao grupo, esfaqueando e até matando quem ele considera incômodo. Mas ele não pode ser morto, pois Dinah sabe que o rapaz terá uma grande importância futuramente com a chegada dos Langoliers.

Se o simples voo do avião já deixa evidências de um efeito de computador artificial, pior acontece quando os monstrinhos realmente dão as caras. Uma espécie de pac-man com dentes – mas sem os cabelos da descrição de Craig -, os bichinhos são vergonhosos. Teria sido muito melhor se ficassem apenas na sugestão, enquanto eram ouvidos ao longe, derrubando torres e árvores, sem a necessidade da aparição no ato final, o que destrói toda a sensação incômoda da aproximação de algo assustador. O enredo, que vinha bem como um conto alongado de mistério sobrenatural, propondo teorias sobre viagens no tempo e dimensões paralelas, não precisava dessa exposição ridícula.

Ainda que os efeitos tenham sido vexatórios – e tornam-se ainda mais se vistos hoje em dia -, Fenda no Tempo continua um bom passatempo. Não precisaria de três horas para explorar todos os detalhes da versão literária, tendo momentos arrastados e personagens inúteis, mas entende-se pela necessidade televisiva em duas partes. Curiosamente, o texto original é bem parecido com a série, em um daqueles casos raros em que a adaptação seguiu à risca o material original. A direção de Tom Holland, mais conhecido pelo filme Brinquedo Assassino (1988), é adequada à proposta, sem grandes virtudes, porém fazendo um trabalho bom de elenco e organização de set.

Efeitos especiais de 16 bits!

Disponível na plataforma Paramount, com qualidade ruim de reprodução, Fenda no Tempo vale como produção de acesso ao mundo de fantasia de Stephen King. É mais um exemplar das virtudes do escritor em contar histórias intrigantes, daquelas que o prenderão na poltrona e não permitirão qualquer bocejo. Se tentar dormir, já sabe: pode ser que acorde em uma dimensão alternativa, com a ameaça de criaturas digitais vorazes.

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Marcelo Milici

Professor e crítico de cinema há vinte anos, fundou o site Boca do Inferno, uma das principais referências do gênero fantástico no Brasil. Foi colunista do site Omelete, articulista da revista Amazing e jurado dos festivais Cinefantasy, Espantomania, SP Terror e do sarau da Casa das Rosas. Possui publicações em diversas antologias como “Terra Morta”, Arquivos do Mal”, “Galáxias Ocultas”, “A Hora Morta” e “Insanidade”, além de composições poéticas no livro “A Sociedade dos Poetas Vivos”. É um dos autores da enciclopédia “Medo de Palhaço”, lançado pela editora Évora.

3 thoughts on “Fenda no Tempo (1995)

  • 11/05/2024 em 20:28
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    Lembro de ver esse filme no cinema em casa quando tinha uns 8 anos (mas sem certeza sobre o ano exato), ele realmente era assustador para mim, inclusive lembro dos monstros terem pelo espetado, tipo uma versão selvagem do sonic, mas pode ser meu cérebro misturando com Critters. Acho uma pena ele não estar facilmente disponível hoje.

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    • 19/05/2024 em 11:32
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      Já eu lembrava das esferas prateadas. Clara confusão com Fantasma ..rs

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  • 11/05/2024 em 17:35
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    Eu gostei do filme. Mesmo com fracos efeitos especiais (que quando assisti, era jovem e apaixonado por tudo que Stephen King escrevia e fã de qualquer filme, série ou minissérie baseados em SUAS VERDADEIRAS OBRAS), para mim eram o máximo! Stephen King + Ficção Científica + Terror eram TAMBÉM (claro que em escala bem menor) Obras Primas! SOU APAIXONADO POR TUDO QUE STEPHEN KING ESCREVE e é Publicado no Brasil! E TENHO TODOS OS SEUS LIVROS PUBLICADOS AQUI, EM PORTUGUÊS. Evidentemente, tenho o Livro “Depois da Meia Noite” com 4 novelas,TODAS EXCELENTES! Comprei num Sebo, e se tiver um Relançamento dele TEREI DOIS! O FILME É MUITO BOM! CLARO QUE O LIVRO É MELHOR (dificilmente um filme qualquer baseado num livro pode superá-lo, isso é raríssimo!). Eu Gostei! Pena que não assino a Paramount (já assino 4 streaming + 1 que minha irmã assina), mas TENHO O DVD! Vejo de vez em quando.

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