4.9
(9)

O Corvo
Original:The Crow
Ano:1994•País:EUA
Direção:Alex Proyas
Roteiro:James O'Barr, David J. Schow, John Shirley
Produção:Jeff Most, Edward R. Pressman
Elenco:Brandon Lee, Michael Wincott, Rochelle Davis, Ernie Hudson, Bai Ling, Sofia Shinas, Anna Thomson, David Patrick Kelly, Angel David, Laurence Mason, Michael Massee, Tony Todd, Jon Polito, Bill Raymond

“As pessoas acreditavam que, quando alguém morre, um corvo carrega sua alma para a terra dos mortos. Mas, às vezes, algo tão ruim acontece que uma tristeza terrível é levada consigo, e a alma não consegue descansar. Então, às vezes, apenas às vezes, o corvo pode trazer essa alma de volta para consertar as coisas erradas.”

A trágica morte de Brandon Lee durante as filmagens de O Corvo (The Crow, 1994) estabeleceu paralelos com a dor do artista, James O’Barr, que perdeu a namorada em um acidente de trânsito na década de 70. Ele concebeu sua obra-prima em 1989, com publicação pela Caliber Comics, imaginando uma entidade vingativa, uma alma atormentada pela saudades e pelo desejo de se vingar, e alcançou sucesso absoluto, ampliado pelos direitos adquiridos para uma adaptação cinematográfica. Só não imaginava que iria reviver a dor, com mais uma tragédia – uma maldição que faria O’Barr até se arrepender de ter desenvolvido a graphic novel.

Nos primeiros contatos com o artista, o estúdio sugeriu um musical estrelado por Michael Jackson. O’Barr imaginava algo sombrio e poético como o produto original e precisou supervisionar três roteiros e ainda alterar alguns tratamentos antes de dar a luz verde. Também quis opinar sobre a escolha do protagonista, indo contra os desejos por Brandon Lee, já associado a filmes de artes marciais. O ator conseguiu não apenas convencê-lo como também fez os produtores desistirem de contratar Christian Slater e River Phoenix. Perdendo 20 quilos para o papel, Lee queria que Eric Draven mostrasse seu talento interpretativo para não viver às sombras de seu pai, Bruce Lee. Conseguiu ir além, dando a face mais associada ao personagem, como Boris Karloff o fizera com a Criatura de Frankenstein.

Um erro fatal no manuseio de uma arma cenográfica fez o ator Michael Massee, através de seu vilão Funboy, disparar um cartucho no abdômen de Brandon Lee, quando mais de 80% de suas cenas haviam sido concluídas. Com a morte de Lee, em 31 de março de 1993, a Paramount Pictures desistiu de apostar no lançamento do filme, mas a Miramax viu potencial para os cinemas. Injetou mais US$8 milhões de dólares no orçamento na confecção das cenas que faltavam, com o uso de dublês e CGI, e os 23 do orçamento final se pagaram pela boa bilheteria, conquistando nos cinemas mundiais mais de US$50 milhões de dólares.

Além de atrair curiosos ao cinema para ver a última atuação de Brandon Lee, o longa também se mostrou eficiente em seus aspectos técnicos, conquistando boas críticas. A fotografia, a linguagem narrativa, o visual e as atuações mostravam que O Corvo era mais do que uma produção amaldiçoada. Havia um enredo fantástico, consistente e, como O’Barr queria, amplamente poético. Eric Draven agora tinha um rosto, e a morte do ator ironicamente dialogava com a proposta.

Ambientado em um Detroit fictícia, tomada pela violência com criminosos incendiários, o músico Eric Draven (Lee) e sua noiva Shelly Webster (Sofia Shinas) são atacados por uma gangue: ele é baleado e defenestrado, enquanto Shelly é violentada e seriamente ferida, morrendo pouco depois no hospital. O sargento Daryl Albrecht (Ernie Hudson, de Os Caça-Fantasmas e A Mão que Balança o Berço) nada pode fazer para evitar a tragédia na famigerada Noite do Diabo. E a pequena Sarah Mohr (Rochelle Davis), que ficava sob os cuidados do casal devido à vida marginal de sua mãe, é a narradora da lenda sobre o corvo, condutor das almas.

Um ano depois, enquanto a pequena visitava os túmulos de Shelly e Eric, um corvo pousa sobre a lápide, bicando-a, e traz de volta o rapaz, amargurado pelas lembranças de bons momentos com a amada e também do encontro com os criminosos. Nas suas recordações, os assassinos são apresentados como sendo Tin Tin (Laurence Mason), Funboy (Massee), T-Bird (David Patrick Kelly) e Skank (Angel David), sob o comando do poderoso Top Dollar (Michael Wincott, de Alien: A Ressurreição), que tinha interesses no edifício, sob os protestos do casal assassinado.

Assim que nota sua condição imortal, Eric faz uma pintura em sua face, veste-se com roupas pretas, e sai pela noite, guiado pelo corvo para proceder sua vingança. Ele inicia o banho de sangue contra Tin Tin em um beco, esfaqueando-o até a morte, e depois parte para a loja de penhores, sob os cuidados de Gideon (Jon Polito), para recuperar a aliança de casamento repassada a ele. Explodindo o local, ele deixa o proprietário vivo para que ele possa avisar aos demais sobre seu retorno, e parte para se vingar de Funboy, encontrando-o em um apartamento se drogando com a mãe de Sarah, Darla (Anna Thomson). Como Eric se vinga fazendo uso dos pecados de suas vítimas, ele “limpa” Darla e injeta várias seringas no bandido.

Antes de continuar com sua vingança, Eric tem um encontro com Albrecht, revelando sua natureza sobrenatural. Diferente de outras produções em que a polícia tenta evitar as ações do vigilante, o sargento entende as intenções de Eric e sabe que dificilmente conseguirá fazer qualquer coisa para impedi-lo. O Corvo ainda voará por outros locais para perpetuar sua vingança, culminando em um belíssimo confronto no telhado de uma igreja.

São evidentes as cenas realizadas após a morte de Brandon Lee. Na primeira metade do filme, seu personagem é falante, cita Edgar Allan Poe e relembra Shelly por diversos momentos. As gravações posteriores trazem um Eric mais quieto, distante, obscuro e visto de costas. Felizmente a sequência final foi gravada por Lee, pois seria bastante complicado camuflar seu rosto no duelo com Top Dollar.

Mesmo com a tragédia e as costuradas necessárias para completar o filme, O Corvo continua uma belíssima produção. Há várias diferenças em relação aos quadrinhos originais como a inclusão das personagens Myca (Bai Ling) e do braço direito do vilão, Grange (Tony “Candyman” Todd), e principalmente no assassinato de Eric e Shelley. Nos quadrinhos, a gangue encontra o casal na estrada, com o veículo quebrado, e resolve se aproveitar da situação, deixando o rapaz durante quase dois dias no hospital antes de morrer.

Deve-se enaltecer as atuações de Brandon Lee, Michael Wincott e Ernie Hudson, além da fotografia noturna, de chuva constante, criando cenários que devem ter sido inspirados em Tim Burton, e a trilha sonora, a partir de canções do The Cure, The Jesus and Mary Chain, Rage Against the Machine, Helmet, Nine Inch Nails e Pantera. A boa trilha combina com o fato de Eric ser um músico no filme e não um mecânico como nos quadrinhos, assim como a experiência do diretor, Alex Proyas, no comando de clipes do Cutting Crew e até do Sting. A edição é bem acelerada, com cortes constantes até mesmo nas cenas de ação, porém não chegam a incomodar.

Rever O Corvo, depois de inúmeras exibições na TV aberta durante a minha adolescência, resgata sentimentos de nostalgia e tristeza. Ainda que seja um filme de herói, o desfecho trágico do ator Brandon Lee deixou cicatrizes profundas e um tom melancólico à produção. É um voo do corvo pelo passado, trazendo de volta um personagem que nasceu da dor e da poesia.

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2 Comentários

  1. Simplesmente meu filme favorito. Ambientação, história, trilha sonora, perfeição.

  2. Um dos melhores filmes de “super herói” já feitos, a atmosfera gótica do filme era incrível assim como a atuação de Brandon Lee, lamentável o que ocorreu nas filmagens pois quem sabe Brandon pudesse voltar nas sequências.

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