Stopmotion
Original:Stopmotion
Ano:2023•País:UK Direção:Robert Morgan Roteiro:Robert Morgan, Robin King Produção:Alain de la Mata, Christopher Granier-Deferre Elenco:Aisling Franciosi, Stella Gonet, Tom York, Therica Wilson-Read, Bridgitta Roy, Caoilinn Springall, Alex Freeborn, James Swanton, James Harris, Jaz Hutchins, Joshua J. Parker, Nicola Alexis |
Descender para a loucura pode ser um caminho lento ou um tropeço para o abismo. O diretor especialista na técnica de stopmotion Robert Morgan decide contar sobre essa linha tênue em seu longa de estreia, Stopmotion (2023), acompanhando uma animadora ao ter que lidar com o adoecimento súbito de sua mãe controladora e perfeccionista.
Ella (Aisling Franciosi) é filha da renomada animadora Suzanne (Stella Gonet). Inicialmente vemos a dinâmica de trabalho das duas, onde sua mãe é uma grande especialista e quase tirana no tratamento de sua filha, que não é nada além de um fantoche, seguindo regras milimetricamente impostas. Percebemos em detalhes sutis o quanto isso afeta Ella, até que sua mãe é internada e ela deve preencher esse espaço de sucessora para finalizar sozinha a obra em que estavam trabalhando. Mas essa é a oportunidade perfeita para Ella finalmente trabalhar em uma criação só sua, livre dos abusos de Suzanne.
Tomar as rédeas da própria vida e mergulhar no processo criativo de sua própria obra pode ser um pouco mais complexo do que parece. A arte fala de nós e ao entrar em contato com suas sombras, coisas estranhas começam a acontecer com Ella.
O filme tem uma mescla de live action com stopmotion, a especialidade de Robert Morgan. O diretor, que sempre trabalha em seus curtas com body horror, gore, sexualidade e criaturas bizarras, não faz diferente aqui em seu primeiro longa. O ritmo se transforma conforme as emoções da protagonista avançam. Quanto mais obscura a relação com sua liberdade se torna, mais aterrorizante ficam a trilha sonora e o visual do filme. Os elementos vão se misturando e a bizarrice aumenta conforme a agonia de Ella diante de sua criação também a perturba.
Com o passar do tempo, presa em seu processo criativo, Ella é perseguida por uma estranha garotinha (Caoilinn Springall), que aparece em momentos inoportunos lhe dando ideias perturbadoras para seu projeto. Assim, realidade e arte começam a se misturar e os pesadelos de seu passado, as ideias da criança, começam a tomar formas que vão nos incomodando como espectadores.
O filme é construído em três partes, dividido por dias, de acordo com o que narra a garotinha sobre uma criatura. No primeiro dia você o vê, no segundo ele se aproxima, e no terceiro… bom chegamos ao clímax do filme. Então sabemos que a desgraceira está logo ali e, quando chega, é dramaticamente maravilhoso para quem está acompanhando.
Stopmotion é uma grande analogia para questões internas, como o sentimento de ser um impostor e nunca bom o suficiente naquilo que se faz – quando somos controlados e nos sentimos presos em nós mesmos, ou por aqueles que são mais próximos. Além de elevar o sentimento sufocante de como nossos traumas e questões são trabalhadas, acabam nos assombrando e atrapalhando nossa vida de maneiras que não conseguimos imaginar. São as metáforas que carregam o roteiro e o visual surrealista do longa.
Apesar de ser muito claro sobre seu plot e para qual caminho tem a intenção de seguir, isso não tira a qualidade de como é executado. Principalmente quando o gore entra em ação. É tão detalhado e faz tanto sentido com o “que” e o “como” são apresentados, que nos enoja e nos atrai para não desviar um olhar por um segundo. Ok, talvez por um segundo, pelo choque visual, mas voltamos nossa atenção logo em seguida.
Aisling Franciosi é uma ótima atriz (que você também pode conferir no longa Nightingale) e consegue expressar com poucas falas toda a carga emocional da personagem. Robert Morgan fez seu nome em Stopmotion e deixa claro que refletimos muito de nós em nossas criações, querendo ou não. Para quem gostou da animação Mad God, com certeza irá aproveitar este.
Aos fãs de gore, técnica de stopmotion e horror metafórico, vale muito a pena assistir esse filme perturbador e excelente. Original visualmente com sua esquisitice, bom roteiro e atmosfera. Ele traduz, às vezes literalmente, que criar algo seu pode ser à base de suor, lágrimas, sangue e às vezes até morte e pedaços de… bom, você terá de assistir pra conferir.