4.5
(4)

Lobisomens sobre Rodas
Original:Werewolves on Wheels
Ano:1971•País:EUA
Direção:Michel Levesque
Roteiro:Michel Levesque, David M. Kaufman
Produção:Stuart Fleming, Paul Lewis, Joe Solomon
Elenco:Steve Oliver, Donna Anderson, Gene Shane, Billy Gray Johnson, Barry McGuire, Owen Orr, Anna Lynn Brown, Leonard Rogel, Severn Darden

Existe uma diferença sutil entre clássico e ícone. Aplicando alguns conceitos literários ao cinema, enquanto o clássico é atemporal e inesgotável, o ícone está mais associado à sua representatividade, ou seja, é uma obra que simboliza uma época ou determinado grupo, por exemplo.

Lançado em 1971, o longa-metragem Lobisomens Sobre Rodas não é nem de longe um clássico ou um ícone, embora seja uma produção totalmente conduzida pelo espírito de seu tempo. Fortemente influenciado por Sem Destino (Easy Rider, 1969, este sim um ícone, e talvez também um clássico), o filme dirigido pelo cineasta americano Michel Levesque (de Sweety Sugar, 1972) é um road movie que se alimenta dos principais signos do movimento contra-cultural que contestava os valores e costumes americanos da época. Além do sexo, drogas e rock and roll, a mistura proposta pela trama (escrita por Levesque e David M. Kaufman) insere motocicletas, satanismo e lobisomens em um cenário estéril que reverbera todo o niilismo e o consequente vazio de uma geração desiludida que tentava a todo custo romper com o status quo. Ainda que o resultado não seja um filme com significativa qualidade técnica ou artística, é uma obra interessante vista como uma representante de seu período histórico e cultural.

No roteiro “rabiscado” por David M. Kaufman e Levesque, uma gangue de motociclistas autodenominada The Devil’s Advocates viaja a esmo pelo interior do estado da Califórnia, espalhando violência pelas estradas sujas e empoeiradas por onde passam. Impulsionados pela falta de propósito e por uma visão pessimista de mundo, os homens liderados pelo descrente Adam (Stephen Oliver, do também obscuro Savage Abduction, 1973) não se preocupam com qualquer valor moral ou princípio ético, logo a delinquência e a depravação fazem parte de uma rotina brutal onde o grupo e todos ao redor estão em risco permanente.

Após espancarem alguns moradores locais e saquearem um posto de gasolina, o grupo continua a rodar até encontrar uma nova parada, uma misteriosa igreja escondida em meio a uma mata. Cordialmente, alguns monges oferecem alimento e vinho aos motociclistas. Eles aceitam sem questionar, mas após comerem, beberem e festejarem, todos adormecem profundamente. Os monges, que então se revelam parte de um culto satânico, sequestram Helen (a namorada de Adam, interpretada por Donna Anderson, de O Vento Será Tua Herança, 1960) e a utilizam em um ritual macabro no qual ela é supostamente amaldiçoada com a marca de Satanás. Os motociclistas acordam, resgatam Helen e fogem para a estrada novamente. Porém, o destino dos infames “Advogados do Diabo” está traçado, pois a maldição faz com que a garota se transforme em uma criatura selvagem e incontrolável a cada anoitecer.

O roteiro, irregular em seu ritmo, parte de um plot inicial criativo (um road movie sobrenatural com lobisomens), mas falha em sua execução pouco profissional e no próprio desenvolvimento da trama e dos personagens, propositalmente desprezíveis, mas sem nenhum carisma. Durante seus 80 minutos de duração, apenas um único diálogo, que acontece antes do encontro da igreja, faz algum sentido e sugere um conflito interessante, que depois é vagamente explorado. A conversa entre o líder do grupo e um dos membros, chamado Tarot, mostra uma divergência grande: enquanto Adam é um cético absoluto, Tarot é supersticioso e acredita que outras forças não-naturais poderiam intervir na vida de um homem comum. Então, ao ler as cartas de um baralho de tarô ele identifica que um grande mal estaria à espreita de Helen.

Rodado em poucas semanas no interior da Califórnia, Lobisomens Sobre Rodas é uma produção cujas limitações de orçamento são observadas em diferentes momentos, seja no desempenho caricato e exagerado do elenco – aqui vale pontuar que parte deste elenco era formado por motociclistas da vida real e não por atores –, na repetição desnecessária de algumas cenas na estrada e principalmente pelas criaturas, que pouco aparecem, e quando se apresentam, já próximo ao desfecho, a iluminação é tão inadequada que fica difícil identificar se os efeitos de maquiagem são bons ou não.

Para os curiosos, o longa foi exibido no Brasil pelo SBT pela última vez nos anos 90 e hoje pode ser encontrado extraoficialmente no Youtube ou com melhor qualidade em DVD no box Lobisomens no Cinema Volume 3, lançado pela Versátil Home Vídeo; aliás, esta caixa traz ainda outras raridades licantrópicas, como O Jovem Lobisomem (Full Moon High, 1981), A Face do Monstro (Lycanthropus, 1961), O Lobisomem e a Espada Mágica (La Bestia y La Espada Mágica, 1983) e A Verdadeira História do Lobisomem (El Retorno de Walpurgis, 1973), estes dois últimos com a presença do lendário Paul Naschy.

Com muito esforço podemos listar pelo menos um ponto positivo: a trilha sonora. Composta por Don Gere, a trilha intercala de maneira caótica canções de folk rock e blues, intensificando o efeito de estranhamento provocado por toda bizarrice nonsense mostrada na tela.

Já uma cena que deve chamar atenção dos fãs de horror é a do ritual envolvendo a personagem Helen, quando em transe (e topless), ela performa uma extensa e sensual dança manuseando uma cobra – impossível não lembrar de Salma Hayek, no futuro Um Drink no Inferno (1996).

Em resumo, Lobisomens Sobre Rodas não é um bom filme, contudo é inventivo, emblemático e desprendido de regras (propositalmente, ou não); além de apresentar um dos títulos mais legais do gênero. Se vale uma conferida? Sim, atenuando todas as expectativas, possivelmente vale.

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