![]() A Boneca Vampira
Original:Yûrei yashiki no kyôfu: Chi wo sû ningyô
Ano:1970•País:Japão Direção:Michio Yamamoto Roteiro:Hiroshi Nagano, Ei Ogawa Produção:Fumio Tanaka, Tomoyuki Tanaka Elenco:Kayo Matsuo, Akira Nakao, Yukiko Kobayashi, Yôko Minakaze, Atsuo Nakamura, Kaku Takashina, Jun Hamamura, Ginzô Sekiguchi, Sachio Sakai, Tadao Futami, Jun Usami, Shigeo Katô |
Depois de vários meses na América, Kazuhiko Sagawa retorna ao Japão guiado por um único desejo: rever a sua noiva, Yuko, que vive com a mãe em um antigo casarão isolado no campo. A viagem até a casa é arriscada, pois uma forte tempestade castiga a região, transformando a estrada em um caminho traiçoeiro. Ao alcançar o destino, Kazuhiko é confrontado com uma triste notícia: sua futura esposa faleceu em um acidente automobilístico envolvendo um deslizamento de terra. Passada uma semana, sem receber notícias do irmão, Keiko Sagawa (irmã de Kazuhiko) resolve procurá-lo. Com a ajuda do amigo Hiroshi, ela viaja até a residência de Yuko, mas não encontra Kazuhiko, que já teria partido. Movidos pela suspeita de que algo terrível possa ter acontecido, eles iniciam uma investigação que vai revelar uma terrível tragédia familiar há muito enterrada e colocar em risco a vida de ambos.
A Boneca Vampira (The Vampire Doll ou Yûrei yashiki no kyôfu: Chi wo sû ningyô), conhecido internacionalmente como Legacy of Dracula ou Bloodsucking Doll (em uma tradução livre: Legado de Drácula ou Boneca Sugadora de Sangue), é um longa-metragem japonês de terror lançado em 1970. O filme é o primeiro de uma trilogia conhecida como Bloodthirsty Trilogy (Trilogia Sanguinária), que inclui também Lago do Drácula (1971) e A Maldição de Drácula (1974).
O longa foi produzido pelos lendários Estúdios Toho (os responsáveis pela criação do maior ícone do cinema kaiju, Godzilla) e dirigido pelo cineasta Michio Yamamoto (do drama Trono Manchado de Sangue, 1957 e dos outros dois episódios da trilogia Bloodthirsty); já o roteiro foi escrito pela dupla Hiroshi Nagano (de Um Animal Chamado Homem, 1970) e Ei Ogawa (de Entretanto, Eu Te Matarei, 1960). O elenco principal é centrado em duas atrizes, Kayo Matsuo (Lobo Solitário – O Andarilho do Rio Sanzu, 1972), interpretando a jovem obcecada pela busca do irmão desaparecido e Yukiko Kobayashi (de O Despertar dos Monstros, 1968), vivendo a vampira Yûko Nonomura. Suportando as atrizes, estão Atsuo Nakamura e Akira Nakao, como o irmão da protagonista e o amigo, respectivamente.
Impossível não notar a evidente influência (quase inevitável, na opinião deste que vos escreve, considerando o contexto cinematográfico da época) dos estúdios Hammer (em tempos, para os desavisados: Hammer foi uma produtora britânica que popularizou o horror gótico a partir dos anos 60, revisitando os monstros clássicos do cinema ocidental, especialmente o vampiro Drácula, criado por Bram Stoker. Com um custo de produção relativamente baixo, atraía grandes públicos aos cinemas da Europa e dos Estados Unidos).
Os Estúdios Toho exploraram a temática vampírica (incluindo seus elementos mais básicos, como os arquétipos da vampira sedutora e o ajudante vilão com alguma limitação física) e as mesmas técnicas visuais da Hammer, como o cenário e ambientação góticos (o casarão isolado com arquitetura ocidental e decadente) e a atmosfera resultante de uma fotografia carregada de filtros azuis (a chamada Day-for-night, técnica que simula uma cena noturna gravando-a durante o dia). De alguma maneira, propositalmente ou não, A Boneca Vampira acabou se estabelecendo como uma espécie de contrapartida japonesa ao modelo estético da Hammer.
Curiosamente, o filme ganha força ao subverter a sua própria premissa, transformando a expectativa inicial em uma reviravolta inesperada. A trama, que a princípio encoraja o espectador a esperar uma história clássica de vampiros, se revela um intrigante thriller sobrenatural envolvendo bizarrices como hipnose e pacto com o diabo.
Este pequeno plot twist (o vampiro que aparentemente não é um vampiro como nós conhecemos) talvez mereça alguma crítica pelo ritmo um pouco acelerado em que ele é apresentado, mas também é merecedor de elogios por direcionar o enredo para as temáticas mais tradicionais do Japão, como o Onryō, a clássica história japonesa de fantasmas, com suas maldições e vinganças. Esta revelação também acrescenta uma conexão com um fato histórico importantíssimo para os japoneses: a participação do país na Segunda Guerra Mundial.
Mesmo com esta fusão entre o J-Horror e o estilo Hammer funcionando (sim, A Boneca Vampira é muito eficiente em seus pouco mais de 71 minutos), os outros dois filmes da trilogia deixam de lado a ambiguidade em relação ao vampirismo e os componentes mais característicos do cinema de horror japonês, abraçando por completo as regras da mitologia clássica dos vampiros. Importante comentar que apesar dos longas-metragens que compõem a trilogia Bloodthirsty serem conceitualmente semelhantes, eles não são narrativamente conectados.
Ainda referente ao roteiro, ele é organizado de maneira que a mudança do foco narrativo lembra outra produção ocidental muito famosa: Psicose (1960), de Alfred Hitchcock. Além disso, o enredo também compartilha um plot inicial semelhante (a procura por um irmão desaparecido).
Já uma pergunta que pode passar pela cabeça do infernauta é: onde está a famigerada boneca do título? Para sermos justos, existem pelo menos duas bonecas no filme, porém nenhuma delas é vampira ou protagonista; provavelmente a escolha da palavra foi apenas um artifício para deixar o título mais atraente para os fãs do gênero.
A Boneca Vampira estreou nos cinemas japoneses em 4 de julho de 1970 e um ano depois em poucas salas americanas, como Legacy of Dracula. No Brasil, até o momento em que este texto é escrito, a produção continua inédita. Caso o leitor tenha interesse, nos Estados Unidos foi lançado, pela Arrow Video, um Blu-ray contendo todos os filmes da trilogia.
Enfim, embora não seja nem de longe um clássico do cinema japonês, A Boneca Vampira é uma produção que se mostra competente ao fundir conceitos ocidentais e orientais do horror e deve agradar aos admiradores do gênero, seja pela atmosfera melancólica e ambientação gótica ou pela história, simples, mas bem contada.