Wolf Creek
Original:Wolf Creek
Ano:2016•País:Austrália Direção:Tony Tilse, Greg McLean Roteiro:Greg McLean, Peter Gawler, Felicity Packard Produção:Elisa Argenzio, Peter Gawler Elenco:John Jarratt, Lucy Fry, Dustin Clare, Andy McPhee, Damian de Montemas, Jessica Tovey, Eddie Baroo, Matt Levett |
Dentre os assassinos contemporâneos do Cinema de Horror, o violento Mick Taylor encontrou seu espaço em um pequeno filme lançado em 2005, na febre dos torture porn. Greg Mclean se inspirou nas ações do terrível Ivan Milat, que aterrorizou os mochileiros na Austrália, entre as décadas de 80 e 90, para criar um personagem que mesclava carisma e frieza, no pesadelo vivido pelos jovens Liz (Cassandra Magrath), Kristy (Kestie Morassi) e Ben (Nathan Phillips). A belíssima fotografia dos desertos australianos iluminados em cores alegres numa contraposição ao sangue em profusão em cada corte de seu imenso facão afiado, além das cenas violentas e da boa direção, fez com que o público perguntasse durante anos sobre uma continuação. McLean partiu para as emoções de um lendário crocodilo gigante antes de retornar às dunas, nas imediações do ponto turístico conhecido como Wolf Creek. O segundo filme, embora sem o ineditismo e as surpresas, também foi eficiente no inferno experimentado pelo surfista inglês Paul Hammersmith (Ryan Corr), participando de um jogo mortal com o caipira interpretado por John Jarratt.
Antes que um terceiro longa fosse lançado, na expectativa dos fãs de rever as crueldades do psicopata, Wolf Creek ganhou uma série de TV em seis episódios, com produção de Greg McLean, que ainda dirigiu o último capítulo, e direção de Tony Tilse, a partir de um roteiro desenvolvido por Peter Gawler e Felicity Packard. Será que existe conteúdo para manter o público preso ao deserto, enquanto acompanha a matança de Mick Taylor a cada caronista que cruza o seu caminho? O que a versão para a TV poderia trazer de diferente que pudesse ampliar a mitologia já apresentada e, ao mesmo tempo, estabelecer uma conexão com os dois filmes lançados?
No episódio piloto, conhecemos uma família americana em viagem pela Austrália buscando reabilitar a filha de dezenove anos Eve Thorogood (a limitada Lucy Fry, de 11.22.63, 2016), viciada em remédios. Com o trailer encostado na mata para passar a noite, o casal Roland (Robert Taylor) e Ingrid (Maya Stange) não percebe a tempo que o pequeno Ross (Cameron Caulfield) está prestes a ser devorado por um crocodilo às margens de um rio. Ele é salvo por Mick Taylor, que aceita algumas bebidas e uma conversa à volta de uma fogueira, enquanto a irritada Eve opta por ficar no veículo ouvindo música.
Não demora muito para o assassino mostrar a que veio. Ele esfaqueia a perna do pai e logo depois rasga sua garganta com um facão; partindo então para a mulher e a criança, com seu rifle. Assim que ele invade o trailer para finalizar a obra, Eve encontra um meio de fugir pelo rio até ser baleada nas costas por Mick. Sem vestígios de seu corpo, ele acredita que a jovem tenha servido de refeição para algum réptil e limpa o rastro de sangue e violência, queimando o trailer e desaparecendo com os corpos. A garota é salva por pescadores e levada a um hospital da região, onde se recupera de maneira impressionante, recebendo alta mais rápido do que se tivesse tirado um dente.
Sem pistas da presença do louco anunciado por Eve, embora ele costume agir no país há décadas, Eve é até acusada pelo crime, na investigação precoce de Sullivan Hill (Dustin Clare), que passa por um momento difícil no casamento. Percebendo que não poderá contar com o apoio da polícia, Eve decide caçar Mick Taylor através dos desertos, atravessando regiões para perguntar sobre a caminhonete azul e a alguma identificação do vilão. Nessa jornada, ela terá uma passagem pela cadeia, numa cela com janela (!!!), incomodará uma gangue de motoqueiros, se envolverá com um criminoso e encontrará personagens esquisitos como a atendente do bar Madonna e um pai psicótico que se esconde no subterrâneo, desde o sumiço da filha.
É claro que uma produção se manter interessante durante seis horas seria necessário mesmo a inclusão de subplots e personagens que irão interagir com a protagonista. Mas, é aí que os furos se evidenciam: ao mesmo tempo em que muitos deles afirmam que o país é imenso e existem inúmeras caminhonetes do mesmo estilo, e Eve atravesse cidades, as personagens se cruzam a todo momento em locais diversos como se estivessem numa cidade pequena. O bandido que ela conheceu na cadeia a encontra várias vezes, assim como o próprio policial, fascinado pela história da garota. Ainda que ele esteja caçando-a pela Austrália, sempre que questiona sobre seu sumiço dificilmente consegue uma resposta que facilite sua busca, mas é só estacionar a frente de um restaurante para vê-la perambulando por lá.
E para lembrar o público de que se trata de uma produção ao estilo slasher, o sádico Mick Taylor se transforma num assassino banal, que mata rapidamente qualquer pessoa que encontra pelo caminho, contradizendo seu modo de ação nos dois filmes. John Jarratt já não tem o mesmo carisma de outrora, deixando de lado a simpatia – seu ponto forte nos filmes – para expressar um mau humor constante e uma falta de paciência para lidar com os turistas. Se o enredo descaracteriza o vilão, por outro lado mantém uma conexão interessante com os filmes anteriores, principalmente com o primeiro e o personagem Ben (desta vez interpretado por Fletcher Humphrys), o único sobrevivente, perturbado com a tortura sofrida e o descrédito das autoridades na época. Mas, é bom também ressaltar a desnecessária explicação sobre a origem da maldade do psicopata, justificando seu lado doentio desde a infância, repetindo a besteira cometida por Rob Zombie e seu Halloween.
Tony Tilse (de Ash Vs Evil Dead e Pânico na Ilha do Rock, 2011) começa um pouco irregular, prejudicando, por exemplo, o ataque de Mick ao trailer, com suas aproximações exageradas de câmera. A partir do segundo, passa a valorizar a paisagem australiana, beneficiado pelos núcleos do enredo. Greg McLean, na direção do último, Wolf Creek, mantém o seu ritmo certeiro, explorando corretamente a ambientação do assassino. Aliás, parece que a casa de Mick é um pouco diferente da mostrada no primeiro filme, assim como é possível sentir falta dos carros abandonados em Wolf Creek.
Muito pouco para a trajetória do assassino mais tenebroso do novo século. Um que poderia fazê-lo pensar duas vezes antes de atravessar o deserto australiano com o risco de cruzar com um caipira aparentemente simpático, mas com intenções cruéis. Um corte profundo no vale sombrio de Wolf Creek que talvez só possa ser cicatrizado com um terceiro filme, sem Tilse ou qualquer outro nome que não seja o de Greg McLean.