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Vejamos e convenhamos: os norte-americanos podem ser tudo de ruim, mas se tem uma coisa em que devemos lhes tirar o chapéu é para seu cinema B sci-fi dos anos 50. Como são divertidas aquelas tralhas todas, com seus títulos absurdos, seus argumentos risíveis, sua precariedade de produção! E se isso é pouco, há ainda filmes inteiramente dedicados a apresentar a mulher como a grande vilã da história, onde chafurdam personagens masculinos fracos e sem personalidade, no mínimo idealizados por escribas pseudomasoquistas com sua própria visão sexual de dominação feminina, em argumentos que beiram o sexploitation (gênero de filmes sobre exploração sexual que surgiria definitivamente nos anos 60). Só que tudo, obviamente, ainda muito light, como nos quatro cults que analisaremos rapidamente neste artigo.

Tomemos um dos clássicos dessa vertente maravilhosa: Cat-Women of the Moon, pérola impagável rodada em 1953 por Arthur Hilton – e também conhecida como Rocket to the Moon – lançada em 3D. Nas entrelinhas, descobrimos que durante milhares de anos a civilização subterrânea lunar teve um império poderoso e secreto no lado escuro do satélite, até o momento em que sua reserva de oxigênio começou a minguar irremediavelmente, o que obrigou os selenitas a participar de um enorme suicídio em massa. Somente sete mulheres permaneceram vivas para desfrutar das últimas reservas de ar, que agora, desafortunadamente, também já se encontravam escassas. Telepatas, essas sete mulheres conseguiram perceber que uma expedição da Terra à Lua (incrível!) estava sendo organizada justo nesse momento crítico, e conseguiram, ainda através da telepatia, fazer com que uma mulher fosse inclusa na missão, para, através dela, dominar as mentes dos demais tripulantes e, futuramente, conquistar a própria Terra. Assim, cinco astronautas (quatro homens e uma mulher) partem numa viagem rumo à Lua e lá encontram essa estranha raça de mulheres vivendo no subsolo, as tais “mulheres-gato da Lua“, até ambas as partes perceberem que nem tudo são flores na descoberta e exploração de novos mundos.

Fotografado em preto e branco, sob uma película de quinta categoria que deve ter sido resgatada do lixo de alguma outra pequena produtora, os defeitos especiais são os mais toscos possíveis, com uma edição de imagens incrivelmente mal realizada, repleta de cortes de continuidade nem um pouco discretos, num amadorismo nato. Destaque para a sequência em que a heroína da história é atacada por duas enormes aranhas de pano e papelão, nas cavernas da Lua. Mas interessantes mesmo são essas tais mulheres-gato, beldades dos anos 50 enfiadas num sexy conjunto preto todo colado ao corpo e um penteado pretensamente futurista que lembra vagamente atrizes de filmes sadomasoquistas dos anos 80 (para ficar completo, só faltaria o chicote, mas aí também seria pedir muito). O elenco traz Sonny Tufts, Marie Windsor, Victor Jory, Susan Morrow, Douglas Fowley, além de um grupo de garotas denominado “Hollywood Cover Girls” interpretando as selenitas selvagens que, nos diz o cartaz, são além de tudo “ardentes, destemidas, ferozes!“. Pena que seja só ficção…

Avançamos um ano e encontramos Devil Girls from Mars (a Garota Demônio de Marte, naturalmente), de David McDonald, outra patacoada fantástica envolvendo uma vilã sexy do espaço sideral. Dessa vez, porém, ela veio até nós. E que garota-demônio: é uma tal de Nyah (interpretada pela belíssima Patrícia Laffan), versão masculina e cruel de Klaatu (de O Dia em que a Terra Parou, de 1951), que chega a um vilarejinho da Escócia junto com seu robô lata de sardinha para conquistar a Terra e raptar homens viris para levar embora consigo (!). Obviamente que ela não revela sua intenção logo de cara, se infiltrando como quem não quer nada numa hospedaria local e ali obtendo informações vitais de seu interesse. Mas, depois de alguns homens pentelhos cruzarem seu caminho e serem desintegrados pelo ridículo robô guarda-costas da marciana, os demais terrestres não demoram a descobrir suas malévolas intenções e armam uma resistência (!!), conseguindo expulsa-la de volta ao espaço, onde sua nave espacial luminária acaba por explodir em pedacinhos.

Só em filmes mesmo para existir homens tão burros quanto esses: além da ideia de sujeição masculina (agradabilíssima, por sinal, em sua conotação erótica), há também a exótica indumentária de couro negro da diabólica marciana, sugerindo coisas no mínimo inspiradoras que se poderia praticar nos confins insólitos do espaço sideral. É pena que ela tenha pousado no país errado. O grande barato da história, no entanto, são os efeitos: o enorme disco voador da devil girl, mais parecendo uma calota de carro adornada com uma auréola de sucatas surrealistas (ou uma luminária, como já foi sugerido por outros críticos atentos); e o robô? Tão tosco quanto primitivo, e ainda por cima com o nome feminino de “Shani” (ou seu equivalente fonético), ele é responsável por algumas boas gargalhadas, ainda mais quando libera seus raios desintegradores estilo “Gort” – ridículo até não querer mais, coitado. Produção inglesa descaradamente imitando o padrão norte-americano, não restam dúvidas de que esse filme, maravilhosamente fotografado em preto e branco, é um dos grandes clássicos B dos anos 50, trash de amar. Mas eu continuo me perguntando: por que esse tipo de evento não ocorre de verdade?

Por que não desce um alienígena do espaço e transforme uma mulher belíssima como a Allison Hayes numa estonteante escultura móvel de quinze metros de altura, exibindo detalhes de seu magnífico corpo mesmo à grande distância, como ocorre no filme Attack of the Fifty Foot Woman, rodado em 1958 por Nathan Hertz? Neste clássico a dominação e o sadismo femininos atingem as raias do colossal, o sonho secreto de muitos, muitos homens (inclusive, eu creio, dos produtores do filme). Eis outro cult histórico do período, dirigido por um especialista em orçamentos micrométricos, Nathan Hertz (que de vez em quando assinava Nathan Juran), apresentando um argumento absurdo e com efeitos especiais de um primarismo assustador, mesmo para a época. Por isso mesmo, um símbolo da era Drive’in. Uma nave-esfera de outro mundo pousa em algum lugar do deserto californiano e seu único ocupante, um alienígena humanoide gigantesco, realiza rápidas experiências em Nancy Archer (Hayes), que passava de carro no local, alterando-lhe o metabolismo e fazendo-a crescer até a altura de 50 pés (“fifty foot“), ou, simplificando, 15 metros. Não bastasse o fato de a mulher já ser meio desequilibrada emocionalmente, graças a seu marido mulherengo e mau caráter (William Hudson), o pequeno vilarejo do deserto terá de enfrentar a fúria colossal da agora ainda mais furiosa e vingativa mulher-monstro, até conseguirem eletrocuta-la numa torre de alta tensão. Há uma gigantesca mão de borracha, toda flácida, e um boneco de pano descaradamente fuleiro sugerindo o marido desafortunado, que paga caro sua traição à pobre moçoila, além dos efeitos de retroprojeção para a mulherona e o alienígena da nave-esfera, tão mal feitos que garantem bons momentos de diversão gargalhante.

Ícone sexual a partir desse filme, Allison Hayes foi uma das mais famosas “scream-queens” do cinema trash, aparecendo também em pérolas como O Extraordinário (1957), The Hipnotic Eye (1960) e The Crawling Hand (1963), entre vários outros. O elenco ainda traz outra “sci-fi girl” famosa do período, como coadjuvante: a belíssima Yvette Vickers (da pérola Attack of the Giant Leeches, de 1959). Diversão mais que garantida, pode apostar vida nisso.

Assim como a baba Queen of Outer Space (1958), de Edward Brands. Quatro astronautas terrestres partem numa missão ao espaço e, depois de serem atingidos por raios misteriosos, vão parar num planeta Vênus todo florido e dominado por uma raça de mulheres supergostosas. A rainha dessas mulheres (interpretada pela atriz Laurie Mitchell), que tem o rosto todo deformado e por isso está sempre escondida atrás de uma máscara brilhante, passa a ter ódio dos homens (que não a desejam, oh coitada!) e por isso pretende destruir toda a Terra, com sua supermáquina de raios calcinantes. Algumas das outras amazonas venusianas a apoiam, enquanto outras não – para a sorte dos quatro terrestres abobalhados, que se apaixonam e tudo o mais e querem que se dane o resto (não são tão abobalhados assim…). E não é pra menos, nesse filme que é um tesão, repleto de beldades com as pernas de fora em seus vestidinhos coloridos e ultracurtos e seus olhares maliciosos, inspirando pensamentos extraplanetários bastante diferenciados, no mínimo. Cult maravilhoso, dos filmes escolhidos para essa seleção esse é o único produzido a cores, além de ser o único, também, bancado por um estúdio mais ou menos respeitável na época (a Allied Artists), o que não o torna, todavia, superior aos demais em termos de caracterização e efeitos. O começo já é picaretagem, pois utiliza cenas reais de lançamentos de foguetes no Cabo Canaveral, assim como quase todos os outros filmes B de ficção científica desse período; também não vê outra alternativa senão utilizar desenhos animados para simular os raios misteriosos que atacam nossos intrépidos astronautas no espaço. Tudo o mais é filmado dentro de estúdios, com um visual brega e kitsch digno dos filmes setentistas, simulando o curioso habitat das deliciosas e carentes beldades do planeta Vênus, com direito a um aranhão de pelúcia que ataca um dos astronautas numa obscura caverna de papel machê – e, durante as sequências, uma das atrizes não consegue esconder o meio-sorriso! (Uma pausa: por que sempre aranhas? Por que não mosquitos, ou formigas, ou baratas? Por que sempre aranhas peludas e ameaçadoras? Haveria um outro sub-tom erótico na forma desse inseto simbolicamente feminino, ou seria apenas uma coincidência daquelas bem adequadas à proposta geral desse tipo de enredo?). O importante é que tudo é muito divertido, nessa aventura supercolorida estrelada pela belíssima Zsa Zsa Gabor (famosa pop star da época, ganhadora do premio Golden Globe para atriz mais glamourosa de 1957), em meio a um elenco canastrão formado por Eric Fleming, Patrick Waltz, Paul Birch, Lisa Daves, Dave Willock, entre muitos outros.

E se o que você procura é diversão, enredos descontraídos repletos de roupagem e picaretagem trash, com mulheres sexys desfilando em roupas sensuais em meio a monstros e criaturas privilegiadas, um conselho: assista aos sci-fi-horror dos anos 50\60, não importando se esteja em sua versão original, sem legendas ou dublagem em português (pois esses filmes não foram lançados no Brasil e dificilmente o serão). E, quando voltar a realidade contemporânea, procure não se desesperar: é improvável, mas talvez o cinema recupere um pouco de sua antiga forma.

N.E. Texto anteriormente publicado no fanzine Juvenatrix e posteriormente publicado em outra versão do Boca do Inferno

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2 Comentários

  1. Parei de ler em “os norte-americanos podem ser tudo de ruins (sic)”.

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