Desaparecidos (2011)

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Desaparecidos (2011)
Rodrigooooo…..Rodrigooooo
Desaparecidos
Original:Desaparecidos
Ano:2011•País:Brasil
Direção:David Schurmann
Roteiro:Rafael Blecher, David Schurmann
Produção:David Schurmann
Elenco:Charlene Chagas, Natalia Vidal, Pedro Urizzi, André Madrini, Fernanda Peviani, Adriana Veraldi, Francisco Carvalho, Eliot Tosta

Em outubro de 1997, dois cineastas entraram numa floresta perto de Burkittsville, Maryland, enquanto filmavam um documentário. Dois anos depois, usaram uma belíssima estratégia de marketing, envolvendo internet e televisão, e lançaram o filme nos cinemas pelo mundo. Com um orçamento estimado em 60 mil, atingiram facilmente a marca de 140 milhões apenas em sua passagem pelos EUA, e desenvolveram a fórmula do mockumentary associado ao found footage, criada em 1980 com Cannibal Holocaust, de Ruggero Deodato. Apesar da consagração imediata, o longa só seria copiado anos mais tarde, tendo inspirado grandes obras como Rec e Atividade Paranormal, entre muitas outras. Em 2011, chegaria a vez do Brasil…

O famoso documentarista brasileiro David Schurmann, autor de O Mundo em Duas Voltas, que relata a viagem de sua família pelo planeta a bordo de um veleiro, ficou sabendo durante o Festival de Cannes, em 2010, do conceito transmídia e como ele poderia se aplicar no cinema. Quando retornou ao Brasil, na Copa do Mundo, recebeu o contato de amigos estrangeiros querendo saber o significado da expressão Cala a Boca Galvão, que constantemente aparecia no twitter e era falsamente relacionada a um pássaro em extinção. Logo percebeu que as pessoas não costumavam questionar as informações que apareciam na internet; qualquer coisa postada em duas ou três fontes se tornaria real. Com base nessas dados, ele teve a ideia de produzir algo que associasse internet e cinema para um público com idade entre 14 e 25 anos, construído a partir das redes sociais. Provavelmente a distância do mundo social durante seu passeio pelo mundo não tenha permitido ao diretor saber de dois detalhes: 1) as coisas que aparecem na internet se tornam reais quando PARECEM reais; 2) esse conceito inovador já serviu de inspiração para dezenas de filmes, sendo que muitos já lançados no Brasil. Portanto, os brasileiros JÁ conhecem o estilo e estão familiarizados com a fórmula. Aliás, se você fizer uma breve pesquisa no youtube encontrará um curta amador bem interessante chamado Sexta-Feira 13 – Cenas Perdidas, baseado em A Bruxa de Blair e Sexta-Feira 13, realizado por Ricardo Coutinho.

Schurmann montou uma equipe de produção, contratou atores jovens e começou a desenvolver o projeto Desaparecidos, que estreou em alguns cinemas no dia 9 de dezembro de 2011, sem muito alarde. Segundo consta no press-kit e site oficial do filme, a divulgação foi feita através do Facebook, com a criação de perfis falsos para tentar convencer o público que a festa em Ilhabela realmente iria existir. Também foram produzidos vídeos virais, facilitando a aproximação dos curiosos com a tragédia envolvendo os personagens, sem imaginar que se tratava de um simples filme de terror. Infelizmente, a divulgação pincelada não funcionou, tanto que os realizadores do Boca do Inferno – sempre atentos ao que acontece de estranho no mundo – só ficaram sabendo da produção quando foi divulgado material para a imprensa, além do convite para uma cabine única realizada em São Paulo.

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Apesar dos tropeços com o lançamento, era preciso saber se o material produzido valeria todo esse esforço. Aqui cabe outro infelizmente, pois o filme está longe de alcançar os seus objetivos tanto como produção de terror quanto entretenimento, resumindo-se a 73 minutos de histeria e repetição da fórmula que fez sucesso em longas similares. Aliás, é preciso dizer que há momentos aborrecedores e outros que se tornam involuntariamente hilários, bem aquém da proposta inicial de mexer com o público. Não foi desta vez que tivemos o nosso A Bruxa de Blair!

Desaparecidos traz um grupo de jovens que recebe um convite curioso para participar de uma festa em Ilhabela. Além de um flyer de divulgação, cada convidado recebeu uma câmera de vídeo para usá-la no pescoço durante o evento para registrar tudo o que acontece no evento com filmagens aleatórias. Embora o objetivo seja usá-la NA FESTA, os jovens a vestem rapidamente, permitindo que o equipamento registre algumas conversas fiadas em casa e no passeio de carro. Até aí tudo bem! É até inovador o conceito, já que difere das demais produções que insistem em criar pseudo-cineastas que, mesmo em perigo, registram tudo – como o rapaz devorado pela criatura em Cloverfield, por exemplo. Ou até apelam para as câmeras de segurança, equipes de jornalismo (REC), reality shows (O Olho que Tudo Vê) ou pessoas que procuram manifestações sobrenaturais (Atividade Paranormal). O problema está na sofisticação da câmera digital, capaz de gravar áudios com extrema qualidade e ainda possui iluminação para cenas noturnas. Como os personagens não manejam o material, não há zoom, apenas enquadramento fechado e plano americano, o que dificulta para o público ter uma dimensão da situação apresentada.

O jovem Rodrigo (André Madrini) está animado com essa festa VIP. Sofrendo de asma e precisando utilizar constantemente uma bombinha, o rapaz é o fio condutor dos problemas, quando, na festa, resolve sair para ficar com uma garota (Adriana Veraldi) que conheceu no evento. Sua irmã superprotetora Alexa (Charlene Chagas) é quem decide levar os demais amigos para uma busca no matagal das proximidades. Vão com ela Marco (Pedro Urizzi) e a namorada Kamila (Natália Vidall), além da amiga Fábia (Fernanda Peviani). Há também um tal de Fred, responsável pela festa, citado em diversos momentos, mas que não dá o ar da graça.

Depois de uns beijinhos e a aparição de uns belos peitinhos na cachoeira, mesmo com o convite da beldade para algo mais tórrido, Rodrigo resolve investigar um barulho no mato e se perde. Ele provavelmente não deve ter visto filme algum de terror para saber que está infringindo uma das regras de sobrevivência no gênero. Se o filme se chamasse Rodrigo ou aparecesse um contador na tela, você iria se impressionar com a quantidade de vezes que esse nome é dito e gritado na projeção. Até mesmo quando seu corpo aparecesse pendurado numa árvore seu nome continua no ar entre lamentos do ocorrido.

A partir daí o que se segue são cenas de andança pela floresta escura, garotas que se machucam sozinhas e o som de algo que se move com extrema agilidade pela mata e vez ou outra aparece mastigando alguém. Aliás, não dá para saber qual o menu da criatura pois as vítimas que aparecem mais tarde pendurados em árvores não foram devoradas! A princípio imaginei que o grupo estivesse à mercê de um velociraptor, devido aos sons que a coisa produz entre as folhas.

A dúvida sobre o que está espreitando os jovens vai continuar mesmo quando você já estiver devolvendo os restos dos milhos não consumidos durante a sessão na lixeira da saída. Em dois momentos, personagens parecem estar prestes a dizer do que se trata, mas são interferidos pelos cortes das câmeras. Num deles, durante o trajeto de carro, alguém menciona uma certa lenda presente na região. Quando parece que vai relatar algo importante, a gravação é interrompida. Noutro, eles dão carona a um senhor na estrada – a versão tupiniquim do Crazy Ralph – e ele diz que há algo ruim no local. Alguém questiona, e…cut!

Sem história para contar, apenas alguns indícios encontrados na mata como símbolo nas árvores – parece que a bola de vôlei do Náufrago deixou marcas – ou certas oferendas, o que resta é acompanhar a luta em vão pela sobrevivência do grupo. Os atores são extremamente talentosos e parecem estar realmente numa situação de perigo, mas o excesso de gritos e choros histéricos e as conversas atravessadas dificultam a compreensão do público. Com isso, há gargalhadas em cenas tensas, aplausos quando uma jovem é puxada para a mata e repetições do nome Rodrigo durante a sessão, tornando a experiência ainda mais constrangedora.

Com a cópia de cenas emblemáticas do gênero – como a jovem que pede desculpas para a mãe (A Bruxa de Blair) e a outra que é arrastada para a escuridão (Rec) -, Desaparecidos talvez assuste crianças ou jovens que não conheçam o estilo. Os demais, que já viram produções fazer uso da fórmula de modo mais satisfatório, não verão muitas razões para recomendar aos amigos uma conferida. Já os mais calejados com o gênero vão sair se perguntando como filmes divertidos como A Noite do Chupacabras só são exibidos em festivais, enquanto este, repleto de falhas, consegue destaque nos cinemas brasileiros.

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Marcelo Milici

Professor e crítico de cinema há vinte anos, fundou o site Boca do Inferno, uma das principais referências do gênero fantástico no Brasil. Foi colunista do site Omelete, articulista da revista Amazing e jurado dos festivais Cinefantasy, Espantomania, SP Terror e do sarau da Casa das Rosas. Possui publicações em diversas antologias como “Terra Morta”, Arquivos do Mal”, “Galáxias Ocultas”, “A Hora Morta” e “Insanidade”, além de composições poéticas no livro “A Sociedade dos Poetas Vivos”. É um dos autores da enciclopédia “Medo de Palhaço”, lançado pela editora Évora.

2 thoughts on “Desaparecidos (2011)

  • 25/11/2013 em 09:50
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    Concordo em partes com a crítica…

    Esperava menos e me surpreendi. Muito interessante o Brasil investir neste tipo de filmagem, apesar de estar desgastado há algum tempo. É óbvio que o filme possui falhas, mas existem vários outros filmes americanos neste mesmo estilo que são absurdamente piores, mas como é horror nacional muitas vezes a crítica é mais pesada. Na minha opinião o que mais estragou foi a garota que gritava o filme todo, isto irritou mesmo, e as excessivas imagens de plantas e mais plantas. As personagens poderiam ter melhor desenvolvimento, mas raramente isto acontece nos filmes de terror. Os pontos positivos ficam por conta:

    Da câmera ficar pendurada e não na mão das personagens, este mínimo fato deu muito realismo às cenas. Ao fato da criatura não aparecer (apenas na última cena e de relance), nos fazendo imaginar o que poderia ser. Algumas cenas de tensão que funcionaram. A mata fechada e escura deu uma sensação de claustrofobia convicente. O final pessimista.

    Gostei, vale a conferida sim. É claro que não é nenhuma obra prima, mas merece todos os créditos pela tentativa. Vida longa ao cinema de horror nacional.

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  • 24/11/2013 em 10:50
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    ainda não tive coragem de ver essa bomba,deve ser ruim demais hahaha.é uma pena o Brazil não investir de verdade em filmes de terror,enquanto isso a bosta da globo filmes reina nos cinemas com comédias insuportáveis de tão sem graça 🙁

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