Otis, O Ninfomaníaco (2008)

1.7
(3)
Otis (2008)
Um filme diferente, engraçado e envolvente sem deixar de ser terror
Otis, O Ninfomaníaco
Original:Otis
Ano:2008•País:EUA
Direção:Tony Krantz
Roteiro:Erik Jendresen, Thomas Schnauz
Produção:Steve Ecclesine, Tony Krantz, Daniel Myrick, John Shiban
Elenco:Bostin Christopher, Ashley Johnson, Daniel Stern, Illeana Douglas, Kevin Pollak, Jere Burns, Jared Kusnitz, Tarah Paige, Burt Bulos, Angelo Custino, Gary Kraus, Tracy Scoggins, Kristen Trucksess

No mundo do cinema existem dois tipos de paródias de gêneros, as que tiram sarro de filmes de sucesso – como Espatalhões ou a franquia Todo Mundo em Pânico – e as que conseguem arrancar risos subvertendo fórmulas de gêneros inteiros – como Corra que a Polícia Vem Aí e Chumbo Grosso.

A diferença entre as duas é nítida e de fácil explicação: normalmente as primeiras são comédias de ocasião que necessitam que o espectador faça vestibular com uma lista de referências para funcionar corretamente, pois amarram as cenas famosas de suas fontes para gerar uma história e na falta de elementos engraçados apelam para sexo, flatulência e escatologia em geral. Já o segundo tipo é calçado em um roteiro mais consistente que funciona por seus próprios méritos por não precisar necessariamente de uma lista de “produções obrigatórias” na sinopse, basta ter assistido a um par de filmes do mesmo gênero.

Assim, hoje temos produções atemporais que já tiraram dos grandes subgêneros do horror: monstros (O Jovem Frankenstein), vampiros (Drácula, Morto Mas Feliz e Os Vampiros que Se Mordam), slashers (Terror no Pântano) e zumbis (Shaun of the Dead e Fido). Faltava um para os “torture porns“, modinha que de tão banal está se ridicularizando…

Agora não falta mais, Otis – O Ninfomaníaco, lançado em DVD no Brasil pela distribuidora Warner, é a mais nova produção da Raw Feed (Rota Mortal), que representa com larga margem a redenção de Tony Krantz em seu segundo filme como diretor, sendo o primeiro o fiasco chamado Sublime, da mesma produtora.

Com um roteiro a quatro mãos escrito por Erik Jendresen e Thomas Schnauz, Otis possui uma história envolvente e divertida, uma visão amalucada dos “torture porns”, contudo é profundo o suficiente para se destacar entre os exemplares de gênero, contando com um elenco fenomenal que valoriza a produção em cada linha de diálogo proferida nas ocasiões mais absurdas que a história trabalha.

O filme abre com uma garota loira deitada em um colchão e presa no porão de uma casa do subúrbio enquanto um gordão tarado, o personagem título Otis (Bostin Christopher), assiste a tudo através de um sistema de câmeras. Aparentemente ela cativa a várias semanas, e o antagonista aciona o aparelho de telefone do lado da cama da garota com o intuito de convidá-la para participar de um suposto baile de formatura.

Otis se refere a garota apenas como Kim – o que remete a um amor não correspondido na juventude – e para conseguir o que quer, no caso fazer com que ela diga apenas o que o maníaco quer ouvir, o local onde ela é mantida possui um cercado de lâmpadas incandescentes controladas por ele que, se acionadas, transformam o ambiente em um desconfortável forno em tamanho gigante.

Após uma tentativa frustrada de fuga, a “vitma inicial” morre eletrocutada, e, assim, descobrimos que esta é a quinta “Kim” que falece nas mãos do obeso psicopata. Otis desmembra os corpos para desaparecer com as evidências, e a polícia não faz ideia de que o homem chamado pela imprensa de “Kim killer” possui um trabalho normal como entregador de pizza.

É quando conhecemos os Lawson, uma típica família estadunidense de classe média. O patriarca Will (Daniel Stern, C.H.U.D. e Morto ao Chegar) trabalha na construção civil e vive frustrado com o stress cotidiano, reprimindo sua raiva por não ter a coragem de peitar seu chefe. Ao contrário de sua esposa Kate (Illeana Douglas, Cabo do Medo e Ecos do Além), uma impulsiva enfermeira que acumula o emprego no hospital com o serviço doméstico. O casal tem dois filhos, o problemático adolescente Reed (Jared Kusnitz, Dance of the Dead) com os hormônios a flor da pele e a loiríssima Riley (Ashley Johnson, Fast Food Nation e Os Irmãos Solomon).

Otis (2008) (2)

O caminho dos Lawson e o do lunático se cruzam com o simples pedido de uma pizza. Otis conhece Riley durante a entrega e desta forma fica marcada para ser a próxima Kim, sendo raptada na manhã do dia seguinte enquanto sai de casa para a escola.

Porém a “Kim” Riley não é igual às outras cinco, pois ela saca rapidamente qual é o jogo do maníaco e também percebe que se jogar de acordo com as regras poderá sobreviver até arrumar uma chance de fugir. Otis simula encontros adolescentes com Riley como se estivesse no colégio: um passeio após o jogo de futebol, uma volta de carro e uma ida ao cinema culminando no baile de formatura. Tudo meticulosamente ensaiado, montado e realizado no porão da casa.

Do lado de fora do cativeiro, a família desesperada não encontra uma saída para o labirinto e recorre ao FBI, representado pelo insípido, incompetente e cheio de maneirismos agente Hotchkiss (Jere Burns, Pânico na Estrada e O Próximo Alvo), que mais atrapalha do que ajuda.

Enquanto a história se desenrola e o FBI tenta inutilmente localizar de onde vem as ligações ameaçadoras de Otis pedindo “permissão” para levar Riley ao baile, é revelado para nós que a verdadeira Kim é casada com seu irmão dominador, o segurança mal-humorado Elmo (Kevin Pollak, Fim dos Dias e Os Suspeitos) e que foi toda esta obsessão pela cunhada que fez começar os raptos e a matança. Será que Riley agüentará o teatro e conseguirá escapar das garras do retardado e perigoso Otis Broth? E o que os Lawson poderão fazer para impedir o assassinato de sua filha?

Uma das coisas mais bacanas para os fãs em Otis é que não somente o moderno “torture porn” é satirizado, mas a história bolada por Jendresen e Schnauz volta no tempo e dá uma cutucada na sua origem mais antiga, os filmes de “rape and revenge” dos anos 70.

Não quero “spoilear” o filme e entregar de bandeja uma das maiores surpresas que o roteiro reserva, mas preciso deixar uma coisa no ar: [PORTANTO, OS AMIGOS QUE NÃO QUEREM SABER NADA SOBRE ELA, PULEM PARA O PRÓXIMO PARÁGRAFO] em Aniversário Macabro, imagine o que aconteceria se a família de Mari Collingwood no calor do momento tivesse se vingado das pessoas erradas… Segundo os roteiristas, esse caminho traçado em Otis tem mais a ver como uma maneira de criticar o governo Bush, que se julgava tão certo durante a invasão do Iraque que acabou cometendo um grande erro e agora está com uma grande bagunça para consertar.

De forma que com essa sutilidade cheia de detalhes e graficamente revoltante em certo ponto, até para uma comédia de humor negro – ou para uma história de amor pelo ponto de vista de um maluco – é que faz a película ganhar ainda mais meu apreço, já que tudo começa como se fosse sério – um assassino típico de um torture porn com sua mente deturpada faz vitimas e a polícia não sabe o que fazer. Então, na segunda metade da produção, o assunto principal do roteiro ganha outra motivação, um outro ritmo que poderia se tornar até um segundo filme dentro de Otis. O legal é que ambas as partes são tão bem amarradas que você se pega rindo em circunstâncias que poderiam causar náuseas no público despreparado.

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E como todo filme que tem potencial para se tornar cult, Otis tem no elenco nomes de gabarito e talentosos. Bostin Christopher faz sua estreia como o antagonista e seu trabalho consegue ser bom e dramático o suficiente para nos deixar com um pouquinho de pena por seu personagem ser tão repugnante, mesmo levando em conta que se trata de um pedófilo fetichista. É notória também a química que passa quando está contracenando com a linda Ashley Johnson.

Todos os demais são excelentes, não há sequer um elo fraco na tentativa de gerar humor com um pé na realidade irônica da situação, porém quem rouba a cena é o casal formado pelos sumidos Daniel Stern e Illeana Douglas: O marido, interpretado por Stern, é tão influenciado pela esposa e cheio de expressões exageradas que me fizeram lembrar imediatamente aos dois primeiros Esqueceram de Mim nos longínquos anos 90. Já Illeana tem uma expressão de permanente psicose no rosto e sua interpretação é feita de forma que os atos de sua personagem sejam, no mínimo, imprevisíveis.

Outra coisa que salta aos olhos, ou melhor, aos ouvidos, é a excepcional trilha sonora cheia de clássicos do Rock – de Quiet Riot até Blue Oyster Cult – revelando uma escolha brilhante que acrescenta muito ao valor da produção. A fotografia em tons sombrios do porão de Otis é bem cuidada ainda que simples, transpirando “torture porn” em cada detalhe. Para levar nota dez faltou só um pouco mais de dinamismo na edição, porém nada que estrague o prazer de se esbaldar em risos a cada cena.

O DVD lançado no Brasil possui um vasto conteúdo de extras, comentários em áudio do diretor Krantz e do autor Jendresen – não legendado, infelizmente -, making of com duração de 12 minutos; o filme caseiro isolado que Otis exibe para Riley durante o longa; e a grande atração: o fantástico final alternativo, que de acordo com o diretor era o original do script, mas que foi deixado de lado por ser um pouco “louco demais” (como se o restante não fosse doido o suficiente) e foi rodado exclusivamente para ser um bônus no DVD.

De acordo com Krantz, foi preciso um esforço enorme da equipe de apoio para não rachar de rir durante os takes e interferir no áudio. E, depois de conferi-lo, preciso reconhecer este esforço, pois é realmente hilário. Eu gostei mais do alternativo, contudo assistam a ambos e julguem por vocês mesmos. Para terminar fica aqui minha recomendação, pois esta é uma sátira que além de inteligente possui “alma“, coisa muito rara ultimamente. Não perca a oportunidade de testemunhar os atos de Otis com seus próprios olhos.

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Gabriel Paixão

Colaborador e fã de bagaceiras de gosto duvidoso. Um Floydiano de carteirinha que tem em casa estantes repletas de vinis riscados e VHS's embolorados. Co-autor do livro Medo de Palhaço, produz as Horreviews e Fevericídios no Canal do Inferno!

3 thoughts on “Otis, O Ninfomaníaco (2008)

  • 18/08/2020 em 20:40
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    Ashley Johnson é foda, ela é a voz e o rosto da Ellie, em The Last of Us 1 e 2.

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  • 11/12/2013 em 00:14
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    Doido e delicioso! Me rachei de rir com a mãe de família e suas decisões!

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  • 10/12/2013 em 14:30
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    adorei esse filme,muito divertido,assistam galera 🙂

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