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Tudo o que envolve o nome de Stephen King, seja na TV ou no cinema (não cito os livros, pois possuem sempre uma qualidade inquestionável), deve ser vista encarado atualmente com empolgação e desespero. Empolgação porque estamos falando de um projeto que vai ter uma das fontes mais incríveis de roteiro adaptado – que vai atrair grande parte dos fãs – e desespero porque estas tentativas dificilmente aportam em algum lugar decente.

Em contrapartida, a televisão sempre foi a saída para transportar as histórias que demandam menos orçamento e com King não é diferente. De pouco tempo pra cá a maioria destas obras já está disponibilizada no Brasil em DVD: Desespero, A Dança da Morte, Fenda no Tempo e Jovem Outra Vez são os exemplos mais recentes e notórios.

No verão estadunidense de 2006, a rede de televisão TNT apostou numa minissérie baseada em contos curtos do mestre do King, repleto de vencedores ou indicados ao Oscar, que a despeito do título não são todos retirados do livro “Pesadelos e Paisagens Noturnas“, publicado pela primeira vez em 1993. E gosto de pensar que este tipo de iniciativa – cujo grande modelo tenho na antiquíssima série “Alfred Hitchcock Apresenta” (exibido originalmente entre 1955 e 1962) – deva ser aplicada mais frequentemente, pois aparte dos seriados normais – com personagens fixos – e dos telefilmes dos “Mestres do Terror“, as grandes ideias para TV em termos de histórias fantásticas de curta duração sofrem de uma carência grande, ou seja, os bons tempos de Twilight Zone, Tales of Darkside, Amazing Stories e Tales From the Crypt já ficaram para trás.

Em terra brazilis, o canal por assinatura Warner Channel por sua vez exibiu os episódios com cerca de 50 minutos cada a partir de 17 de julho de 2007. Finalmente chegam às prateleiras das locadoras e lojas especializadas pela própria Warner os três volumes contendo os oito episódios da minissérie compreendendo os segmentos “Campo de Batalha” (Battleground), “A Zona Misteriosa” (Crouch End), “O Último Caso de Umney” (Umney’s Last Case), “O Fim da Desordem” (The End of Whole Mess), “A Pintura” (The Road Virus Heads North), “O Mapa” (The Fifth Quarter), “Sala de Autópsia” (Autopsy Room Four) e finalmente “Uma Banda de Outro Mundo” (You Know They Got a Hell of a Band). Todos, vocês conferem em analises separadas nesta análise. Escolha pelo capítulo, separado pela ordem acima!

Campo de Batalha
Original:Battleground
Ano:2006•País:EUA, Austrália
Direção:Brian Henson
Roteiro:Richard Christian Matheson, Stephen King
Produção:Jeffrey M. Hayes, John J. McMahon
Elenco:William Hurt, Bruce Spence, Mia Sara, Krista Vendy, Lynda Kinkade, Enrico Mammarella, Brad McMurray, Jackie Kelleher

O primeiro e um dos melhores da série, baseado no conto “Battleground”, do livro Night Shift (1978), conta a história do assassino de aluguel Renshaw (William Hurt, de A Vila e vencedor do Oscar de melhor ator por O Beijo da Mulher Aranha) em mais um trabalho de rotina: matar o dono de uma fábrica de brinquedos, chamado Hans Morris (Bruce Spence, de Star Wars Episódio III).

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Como requer este tipo de profissão, Renshaw não possui a menor demonstração de sentimento, e, sem maiores dificuldades, anula a segurança do lugar, despacha seu alvo e para terminar o serviço como de costume leva uma lembrancinha.

No dia seguinte os jornais noticiam o evento sem, contudo, possuir um mínimo de pistas para uma investigação.

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Renshaw retorna tranquilo ao seu impecável apartamento no último andar de um luxuoso prédio, porém, mais à noite, recebe a sua porta um misterioso pacote. O assassino abre a encomenda receoso, pois pode se tratar de alguma armadilha, mas não passam de inofensivos soldadinhos verdes de brinquedo fabricado pela empresa de Morris.

Pouco tempo depois os frágeis bonequinhos desaparecem e eventos inusitados começam a acontecer. Seria paranoia? O ponderado Renshaw estaria ficando maluco? Nada disso, os brinquedinhos estão vivos, querem vingança pelo seu fabricante e estão dispostos a travar uma verdadeira guerra para atingir seu objetivo. Não há tempo para entender ou pensar, há tempo somente para sobreviver e,  dentro do possível, reagir.

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O segmento é primoroso por não desfiar sequer uma única linha de diálogo, uma palavra. Isso me surpreende, pois em se tratando de Stephen King não pensei que fosse possível deixar tudo sugerido nas imagens e ações, mas o roteirista Richard Christian Matheson (dos episódios “The Damned Thing” e “Dance of the Dead” de “Masters of Horror“) conseguiu manter esta grande característica que valorizou grandemente o episódio.

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O diretor Brian Henson conduz de maneira irrepreensiva valorizando a atmosfera opressiva nos fazendo torcer muito pelos pequenos soldadinhos, de tal forma que até os elementos em cena representam esta situação. Por exemplo, no começo o apartamento do assassino é impecável, daquelas que aparecem nas revistas de arquitetura, pois ela corresponde com a personalidade de seu dono, frio e sem alma. Aos poucos com o andamento da ação ele é arruinado, tal como o vil protagonista interpretado com bastante competência por William Hurt.

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Os efeitos visuais criados pela equipe de Sam Nicholson (a mesma do seriado “Heroes“) são absurdamente convincentes se levarmos em consideração que é uma produção direta para a televisão; todos os pequenos soldados são atores vestidos a caráter filmados um a um em fundo azul e depois inseridos na tela em uma escala de 1:18. O trabalho nos efeitos foi tão preciso que rendeu um dos Emmys que o seriado ganhou (o segundo pela música composta por Jeff Beal para este mesmo episódio). Preciso dizer que eu queria realmente um bonequinho G.I. Joe igual ao que aparece no final, hahaha… Só por Battleground já valeria uma locação do volume um, mas ainda tem mais dois.

A Zona Misteriosa
Original:Crouch End
Ano:2006•País:EUA, Austrália
Direção:Mark Haber
Roteiro:Kim LeMasters, Stephen King
Produção:Jeffrey M. Hayes, John J. McMahon
Elenco:Claire Forlani, Eion Bailey, Linal Haft, Eva Lazzaro, Ryan Sheldrake, Kenneth Ransom, Luke Walker, Jennifer Congram, Monica Maughan, John Flaus, Ron Haddrick

Exibido pela primeira vez no mesmo dia de Battleground, A Zona Misteriosa é o elo mais fraco das adaptações e foi baseado no conto “Crouch End“, agora sim, do livro “Pesadelos e Paisagens Noturnas” – embora sua primeira publicação tenha ocorrido na antologia em homenagem a H. P. Lovecraft intitulada “New Tales of the Cthulhu Mythos“, de 1980, e por conta disso está repleto de referências propositais ao autor.

O roteiro acompanha a supersticiosa Doris (Claire Forlani, de O Medalhão e Encontro Marcado) e o advogado bem sucedido Lonnie Freeman (Eion Bailey, de Caçadores de Mentes) são recém-casados e estão em lua de mel na cidade de Londres. Tudo vai muito bem até que Lonnie recebe o telefonema de John Squales, seu provável futuro chefe o convidando para jantar em sua casa que fica em um bairro chamado Crouch End.

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Após dificuldades em encontrar alguém com coragem suficiente pra os transportar ao local combinado – considerado amaldiçoado por supersticiosos como Doris – o casal consegue que um táxi pilotado por um senhor de idade os leve a Crouch End. Durante o percurso o velho homem desata a contar as histórias envolvendo o bairro e seu passado sórdido. A inocente Doris, que já não gostava da ideia de interromper sua lua de mel para um jantar de negócios, rompe em hesitações. Lonnie está firme em sua decisão; para ele causar esta boa impressão é aumentar suas chances na empresa.

O táxi finalmente chega em Crouch End, e o local está assustadoramente deserto. O veículo desaparece antes que Doris tenha a chance de pagar a corrida. E o casal tenta localizar a residência de John, mas duas crianças sinistras brincando com uma bola, um gato com uma ferida horrível (e infelizmente mal-feita) cruzam os seus caminhos. Sem conseguir raciocinar sobre o que acontece, ambos procuram manter a sanidade diante dos eventos bizarros. Quais segredos escondem Crouch End e por que este lugar parece parado no tempo?

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A ação decorre sutilmente e, bem, talvez sutil demais e isso enfraquece demasiadamente o suspense. Outro ponto crítico está onde a apresentação deveria ter a maior força: depois de despejar muitos minutos de um mistério convincente, o clímax é totalmente desperdiçado com CGI de baixa qualidade e um nível alto demais de surrealismo para um trabalho mainstream para a televisão. O diretor Mark Haber deveria ter pensado em uma abordagem mais simples para tornar a história mais convincente.

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E apesar da interpretação condizente do paranoico Eion Bailey, Claire Forlani demonstra um bocado de apatia em seu papel. Sua forma de expressar desespero repleto de caras e bocas exageradas soam falsas, quebram a correspondência com a personagem e deixa a nós espectadores agoniados de uma maneira ruim.

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Entretanto nem tudo são paus e pedras e existem alguns elogios a serem feitos: a qualidade dos aspectos técnicos da produção como a os visuais ricos e a qualidade da trilha sonora são invejáveis. Pode-se dizer que são equivalentes às boas produções de cinema, concluindo o episódio ruim, mas que vale como passatempo devido as suas qualidades técnicas, as referências Lovecraftianas e a curta duração.

O Último Caso de Umney
Original:Umney's Last Case
Ano:2006•País:EUA, Austrália
Direção:Rob Bowman
Roteiro:April Smith, Stephen King
Produção:Jeffrey M. Hayes, John J. McMahon
Elenco:William H. Macy, Jacqueline McKenzie, Tory Mussett, Harold Hopkins, Melinda Butel, Julian O'Donnell, Don Halbert, Peter Curtin, Sigrid Thornton, Kodi Smit-McPhee

Para encerrar o DVD do primeiro volume, uma história que, mesmo não sendo necessariamente um conto de suspense, possui todos os elementos de fantasia que fazem de King, o melhor autor vivo do gênero.

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Publicado no livro titular, “Umney’s Last Case” é um conto fantástico mais apoiado nas perguntas “e se?“, e na construção de um personagem para envolver e cativar o público. E consegue fazê-lo com uma grande homenagem ao cinema noir e aos velhos livros de mistério.

Clyde Umney (William Macy, nomeado ao Oscar de melhor ator coadjuvante por Fargo) é um detetive particular dos anos 30 com uma rotina de combate ao crime invejavelmente controlada, tendo todas as suas ações e falas exalando canastrices. No entanto, de uma hora para outra, eventos estranhos começam a atormentar Umney: os vizinhos festeiros são assassinados, a mãe do humilde jovem cego Peoria (Julian O’Donnell), que vende jornais todos os dias, ganha uma bolada na loteria, o bar em que o detetive frequenta é subitamente fechado e sua secretária – e grande amor – Arlene Cain (Tory Mussett, O Pesadelo) abandona o emprego.

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Quando tudo não parece pior, um estranho homem engomado e com um Laptop (!) chamado Sam Landry (William Macy novamente) aparece em seu escritório e revela ser um escritor de livros e que o detetive não passa de personagem de sua imaginação. Cético, Umney reluta, porém após brincar um pouco de Deus com seu computador, Landry o convence.

Landry é um autor amargurado após a morte trágica de seu filho por afogamento e seu objetivo é simples: ele se torna detetive na ficção dos anos 30 – no lugar de Umney – enquanto o personagem do livro vai para a realidade do presente tomar o seu lugar. As implicações que esta atitude terá para ambos são tão complicadas quanto parecem ser…

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Andei lendo alguns comentários de que “Umney’s Last Case” é muito ofensivo para puristas de King por causa das alterações e concessões do roteiro de April Smith em relação ao material original, e, por conta destas modificações drásticas, muito do suspense e do clima sombrio se foram; também, devido a algumas tiradas de humor, ele acabou se tornando um episódio mais leve.

Eu sinceramente não sei, pois não li este conto, porém deixo esta opinião “terceirizada” registrada para que o leitor esteja avisado quando fizer a comparação. De minha parte ainda assim eu achei entretenimento divertido e inteligente; lembrem-se que é um telefilme e coisas extremas demais normalmente acabam cortadas ou banidas (vide “Imprint” de “Masters of Horror“).

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O diretor Rob Bowman (que também comanda o episódio “The Fifth Quarter“) provê contrastes de luz e sombra característicos do citado cinema noir apoiado no talento único de William Macy, que é a força do episódio fazendo um trabalho esplendido, ficando até difícil confirmar que Umney e seu autor são interpretados pela mesma pessoa.

O Fim da Desordem
Original:The End of the Whole Mess
Ano:2006•País:EUA, Austrália
Direção:Mikael Salomon
Roteiro:Lawrence D. Cohen, Stephen King
Produção:Jeffrey M. Hayes, John J. McMahon
Elenco:Ron Livingston, Henry Thomas, Andy Anderson, Nicholas Bell, Tyler Coppin, Rebecca Gibney, Rarmian Newton, Justina Noble

Outro grande episódio abre o volume 2 em DVD: “The End of the Whole Mess” consegue transmitir com bastante fidelidade o espírito dramático de narrativa de Stephen King, principalmente porque o roteirista é ninguém menos que Lawrence D. Cohen, que, experiente no ramo, já havia adaptado Carrie para o cinema, Tommyknockers e IT – Uma Obra-Prima do Medo para a televisão.

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O conto foi escrito para a extinta revista de ficção científica estadunidense “Omni Magazine” e publicado pela primeira vez em 1986 – até que acabou ficando mais popular após a compilação no livro título da série.

Howard Fornoy (Ron Livingston, de The Cooler – Quebrando a Banca) é um documentarista premiado com o Oscar e tem um irmão gênio chamado Robert (Henry Thomas, o agora irreconhecível Elliot de E.T. – O Extraterrestre). Hoje Howard faz seu último registro em vida e quer contar para todo o mundo porque teve que matar seu irmão, a pessoa que conseguiu erradicar todas as guerras do mundo, motivo pelo qual era chamado de Messias.

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E o documentarista resolve contar desde o princípio da história dos dois: na infância, o jovem Howard era astuto e tirou o gosto pelo cinema por causa do pai; o irmão caçula era o “professor Pardal” da família, brilhante e avançado demais para seu tempo. Bem, creio que “avançado” é uma palavra boa para se usar quando um garoto de 7 anos constrói um aeroplano sozinho, hehehe…

O tempo passa, seus caminhos se separam e Robert fica impressionado com tamanha brutalidade dos seres humanos contra eles mesmos. Quando a gota que transborda o copo acontece – os ataques de 11 de Setembro – o gênio fica obcecado em encontrar uma maneira da ciência impedir a insanidade das pessoas e colocar um fim na desordem. Sem entregar surpresas, digamos, somente, que ele finalmente encontra uma solução e a coloca em prática com enorme sucesso.

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Tudo começa perfeitamente bem e a paz mundial é finalmente alcançada – “mas o demônio está nos detalhes“, diz Howard, e o documentarista tem sua última chance de contar o que aconteceu.

Convenhamos, apesar de ser o episódio mais fiel ao conto, a primeira metade é chata, demorada e arrastada em prol do desenvolvimento das personagens – dá vontade de dizer: “Ok, Sr. diretor eu já peguei a ideia, chega de dar exemplos sobre a genialidade de Bobby e podemos prosseguir com a história, por favor?” – contudo, quando as coisas esquentam, o episódio toma formas interessantes e vira um legítimo conto “kingiano” até o final abrupto e bem trabalhado. A sacada do vídeo caseiro foi uma solução inteligente para as limitações que a história original possuía para a adaptação.

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Não há soluções mirabolantes para o diretor Mikael Salomon (que também dirige “Sala de Autópsia“), que segue o script de forma mais burocrática, mas tem ao seu favor – além do excelente material fonte, claro – a magnífica fotografia e não podia ser diferente, pois Salomon foi nomeado ao Oscar de fotografia por O Segredo do Abismo.

A Pintura
Original:The Road Virus Heads North
Ano:2006•País:EUA, Austrália
Direção:Sergio Mimica-Gezzan
Roteiro:Peter Filardi, Stephen King
Produção:Jeffrey M. Hayes, John J. McMahon
Elenco:Tom Berenger, Marsha Mason, Susie Porter, Marg Downey, Nate Butler, Amelia Christon, Virginia Gay, Chris Haywood, Hamish Michael

The Road Virus Heads North“, do livro “Tudo é Eventual“, de 2002 – embora sua primeira publicação tenha ocorrido em 1999 – é um dos meus contos favoritos escritos por Stephen King e sua adaptação era algo que eu queria ver muito, por causa do forte apelo visual que este conto possui. Neste segundo episódio do volume 2 do DVD ele se apresenta coeso e adequado, todavia deixa a desejar por passar um bocado de frieza na execução e acaba não mexendo muito com os sentimentos do telespectador.

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Na história, Richard Kinnell (Tom Berenger, de Invasão de Privacidade e indicado ao Oscar de ator coadjuvante por Platoon) é um escritor famoso por escrever livros assustadores, porém sua aparência denota bastante frustração com o fato de ser uma celebridade – o que provavelmente estivesse acontecendo com King na época em que escreveu o conto – desânimo este que aumenta com um check-up médico que revela um problema em seu cólon, porém ainda é cedo para dizer que se trata de um câncer.

Durante o retorno para casa (que fica no Maine, claro) vindo de uma convenção, Richard pára em uma venda de garagem numa cidade pequena e fica encantado com uma bizarra pintura encontrada num dos cantos. Ela retrata um jovem demoníaco com dentes pontudos atrás do volante de um carro possante cruzando uma ponte. O nome da “arte” é, como podem adivinhar, “o vírus da estrada vai para o norte” (King diz na introdução do conto que realmente possui a pintura em questão).

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A vendedora Judith revela que o pintor foi seu vizinho, Bobby Hastings (Hamish Michael), que cometeu suicídio por enforcamento deixando um bilhete: “Não suporto o que está acontecendo comigo“. Segundo ela foi por causa do vício das drogas, todavia antes do fim trágico, ele pegou todas suas pinturas e desenhos – exceto esta – e fez uma grande fogueira com eles.

Muito mais intrigado do que assustado com a história, o escritor compra o quadro e faz uma visita para sua tia Trudy (Marsha Mason, de As Duas Vidas de Audrey Rose e indicada quatro vezes ao Oscar de melhor atriz entre 1973 e 1981), que avista algo de diabólico no quadro. O ceticismo inicial de Kinnel vai se tornando em agonia a medida que a pintura muda sua forma: passando em localidades reais, o vírus segue para o norte deixando um rastro de sangue enquanto o persegue.

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Meu principal problema com A Pintura é Tom Berenger. Não que ele seja um mau ator, porém a personificação de Richard Kinnell que eu tinha em minha mente era de um escritor mais despojado, jovial e que pudesse transmitir uma carga maior de dramaticidade conforme o desespero vai se acumulando pela aproximação do monstro na pintura.

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O roteiro de Peter Filardi (de Linha Mortal) falha em apenas um ponto – um grande ponto, se me permitem dizer – é a possível doença de Richard Kinnel e esta inserção que parece pequena soa como uma tentativa de inserir uma lição de moral ou justificar o que acontece como uma alucinação, coisa que não é muito do feitio de King e não acontece no conto. Será que os roteiristas pensam que tudo precisa de uma explicação para ser mais apreciado?

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Inegável, porém é a qualidade do próprio Vírus da Estrada, com quadros pintados por Ralph Moser, que é efetivamente o que eu esperava para uma adaptação. Como em todos os episódios da série, a parte técnica é excelente e digna de uma superprodução, mas a execução sem muita emoção e brilho do diretor Sergio Mimica-Gezzan (diretor de segunda unidade de vários filmes de Steven Spielberg) torna A Pintura um segmento satisfatório e nada muito além disso.

O Mapa
Original:The Fifth Quarter
Ano:2006•País:EUA, Austrália
Direção:Rob Bowman
Roteiro:Alan Sharp, Stephen King
Produção:Jeffrey M. Hayes, John J. McMahon
Elenco:Jeremy Sisto, Samantha Mathis, Christopher Morris, Christopher Kirby, Robert Mammone, Peter O'Brien, Kodi Smit-McPhee, Christine Moffat

Um pouco deslocado do tema terror – o que não diminui este que é o melhor episódio do segundo DVD. “The Fifth Quarter” é um segmento sobre crime, traição e ganância que traz o diretor Rob Bowman de volta à minissérie e conta com interpretações inspiradíssimas dos atores principais.

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The Fifth Quarter” é um conto que foi publicado pela primeira vez em abril de 1972 na revista estadunidense Cavalier e um bocado de tempo depois compilado no livro Pesadelos e Paisagens Noturnas. Não é uma das histórias mais inspiradas do autor, porém a adaptação que ganha a pequena tela é muito bem executada e se não fosse pelo risível final seria certamente um dos melhores da série.

O roteiro acompanha Willie Evans (Jeremy Sisto, de May – Obsessão Assassina e Um Ponto Zero), que é reincidente no crime e cumpre sua segunda sentença na prisão onde sua esposa Karen (Samantha Mathis, de O Justiceiro) vai visitá-lo sempre que pode. A mulher trabalha na limpeza de um parque de diversões, ganha uma mixaria e está cansada de precisar mentir para o filho Jackson sobre a situação de seu pai.

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Willie termina sua pena e vai para o trailer onde mora com uma promessa de vida limpa e honrada ao lado da esposa e do filho, mas, logo mais a noite, seu ex-companheiro de cela Barney (Christopher Morris) vai encontrá-lo.

Ferido de morte à bala, Barney explica a Willie que participou um último grande golpe com outros quatro bandidos. Cappy, outro ex-presidiário conhecido de Willie que já estava em estágio terminal de câncer, pegou todo o dinheiro do roubo – algo em torno de 3,5 milhões – e enterrou em algum lugar do estado dividindo o mapa da localização em quatro partes entregues para Barney, e os outros membros da gangue Keenan (Peter O’Brien, de O Retorno), Sarge (Christopher Kirby, de Matrix Reloaded e Matrix Revolutions) e Jagger (Robert Mammone, também da franquia Matrix).

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O moribundo diz que foi Keenan quem lhe deu o tiro a fim de roubar sua fração do mapa; entrega sua “quarta parte” para Willie e antes de falecer pede que recupere o dinheiro por ele e por Karen.

Willie se torna então a “quinta parte” e irá colocar um jogo sua recém liberdade determinado a encontrar os outros três pedaços do mapa movido pelo desejo de vingança e pela ganância de tanto dinheiro, matando seus donos se preciso for.

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Jeremy Sisto é o nome do episódio; o Willie que ele interpreta é muito convincente e emotivo, com o ator quase chegando a loucura junto com seu personagem, sempre apoiado no grande trabalho do restante do elenco. Rob Bowman dirige ainda melhor do que em seu episódio anterior – O Último Caso de Umney – até mesmo porque é facilitado pelo formato mais sombrio e calçado na violência.

Também é preciso destacar que embora tenha elementos fictícios, “The Fifth Quarter” é o roteiro mais próximo da realidade entre todos os escolhidos para o seriado e isso conta mais alguns pontos a favor para aumentar o suspense do segmento. Quer um conselho final? Assista uma vez e se deixe levar, então assista novamente para pegar os detalhes do tipo que só S.K. – com o perdão da intimidade – poderia imaginar.

Sala de Autópsia
Original:Autopsy Room Four
Ano:2006•País:EUA, Austrália
Direção:Mikael Salomon
Roteiro:April Smith, Stephen King
Produção:Jeffrey M. Hayes, John J. McMahon
Elenco:Richard Thomas, Greta Scacchi, Robert Mammone, Robyn Arthur, Paul Gleeson, Linc Hasler, Josh Lawson, Steve Mouzakis

Um absurdo tão grande que seria cômico se não fosse trágico ou vice-versa, “Autopsy Room Four” – coincidentemente inspirado em um episódio de “Alfred Hitchcock Apresenta” – é um conto bem curto publicado no livro “Tudo é Eventual” em que Stephen King coloca uma parte de sua veia cômica para fora, todavia sem esquecer da expectativa nervosa inerentes ao trabalho do autor. Neste primeiro segmento do terceiro e último DVD da coleção, a adaptação ganha asas e tem tudo pra ser um dos favoritos dos chatos – e com razão – puristas de King.

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A história, mais simples impossível: Howard Cottrell (Richard Thomas, de IT – Uma Obra-Prima do Medo), um bem apessoado especulador da bolsa de valores de sucesso, chega num saco de cadáveres direto para a sala de autópsia de um hospital. Porém ele está vendo e ouvindo tudo o que acontece ao seu redor, mas estaria vivo realmente? E se está morto por que ouve e enxerga tudo a sua volta?

Aos poucos Howard vai se lembrando do que aconteceu: ele estava jogando golfe com o amigo Ed Brooks (Paul Gleeson) quando foi picado por uma cobra enquanto buscava uma bola caída no mato. Diagnosticado (muito) erroneamente por um médico caquético como morto por ataque cardíaco agora está paralisado e precisa emitir algum som, algum sinal ou qualquer coisa – antes que a equipe da Dra. Katie Arlen (Greta Scacchi, de Vida Sem Limites) faça a autópsia enquanto ainda está vivo e torne sua quase-esposa Angela (Jude Beaumont) viúva pelos motivos errados.

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Richard Thomas está magnífico como o convencido e problemático Cottrell e rouba a cena mesmo estático na mesa de autópsia conseguindo arrancar algumas gargalhadas do telespectador, o que infelizmente não é correspondido pelo elenco de apoio, um pouco apagado, destoando da tensão harmoniosa que era de se esperar – detalhes que, felizmente, não comprometem tanto o resultado final.

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Ironias e muito humor negro dão o tom do segmento de acordo com o conto original, e isso o torna um dos melhores adaptações da minissérie, nem tanto pela fidelidade linha a linha, mas pela perfeita transferência da alma da história no conjunto do episódio – sem querer inserir lições de moral gratuitas (sim, estou falando de A Pintura) ou enxertos desnecessários, também porque o tamanho do material escrito condiz sob medida à curta duração característica evitando os famigerados “pontos mortos“, de modos e maneiras que todos os demônios que April Smith colocou em “Umney’s Last Case” são exorcizados aqui.

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Mikael Salomon é outro diretor que se supera em sua segunda participação na minissérie, cadenciando os momentos com naturalidade, pois ao contrário de O Fim da Desordem, as apresentações são feitas a conta gotas no decorrer da história, o que aumenta significativamente a dinâmica do episódio. Em duas palavras: não perca!

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Uma Banda de Outro Mundo
Original:You Know They Got a Hell of a Band
Ano:2006•País:EUA, Austrália
Direção:Mike Robe
Roteiro:Mike Robe, Stephen King
Produção:Jeffrey M. Hayes, John J. McMahon
Elenco:Kim Delaney, Steven Weber, William McNamara, Erin Wright, Joey Sagal, Jacinta Stapleton, Kristian Schmid, André de Vanny, Mitchell Butel, Fletcher Humphrys, Damien Richardson

Pra fechar o pacote – como mais cedo ou mais tarde não poderia deixar de acontecer – um Guilt Pleasure com aquela classificação “ame ou odeie“, que causa tantas fissuras entre os “kingianos“. “You know they got a hell of a band” foi publicado pela primeira vez na antologia de histórias inspiradas na música chamado “Shock Rock“, que contém introdução de Alice Cooper, em 1992 e em seguida inserido no livro título. Esta adaptação, dirigida e roteirizada por Mike Robe (de Testemunha Silenciosa), busca encontrar forças nos absurdos do conto, e, se não fosse alguns detalhes que veremos mais abaixo, seria o maior destaque desta minissérie.

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No roteiro, o casal Clark (Steven Weber, da mini Desespero) e Mary Rivingham (Kim Delaney, de Darkman 2) estão fazendo uma grande viagem com Sally – um belo Mustang vermelho. Após uma parada em um restaurante de beira de estrada, o programador de computadores chega a uma estranha encruzilhada que não está no mapa na estrada e tem uma ideia nada esperta em uma história de horror, seguir direto sem pestanejar.

Muitos quilômetros depois e após um bocado da velha discussão entre homem e mulher sobre direções, chegam a uma cidade chamada “Paraíso do Rock and Roll“, contudo não se deixe enganar, estamos numa história de Stephen King e mesmo um local chamado “Paraiso” não deve ser boa coisa.

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Clark e Mary entram na cidade que aparenta ter parado no tempo nos anos 60 e os habitantes parecem cópias escarradas dos grandes astros já mortos do Rock… Quando a estranheza destas pessoas não se revela tão curiosa como a princípio, as coisas começam a ficar cada vez mais assustadoras e eles são compelidos a ficar no concerto mais à noite.

Eles tentam fugir, todavia parece que todos na cidade em especial o prefeito Elvis Presley (Joe Sagal) têm um interesse grande nos dois e fará de tudo para que não saiam. O que terá de tão bizarro nesta apresentação que a presença do casal é tão requisitada?

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Eu gostei – do conto e consequentemente do episódio, por causa das referências aos grandes astros do rock; mesmo até alguns não tão famosos dão as caras também, junto com a história bem trabalhada por exibir os deuses da música de um jeito sombrio que nunca havíamos pensado antes. O que o peculiar segmento peca é na execução do suspense (ou na falta dele), pois embora seja mais despojado não há nenhum momento angustiante e Mike Robe parece fazer questão de tornar “You know they got a hell of a band” menos traumatizante quanto possível, parecendo que algo ficou perdido na tradução.

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Mike Robe como roteirista não entrega grandes surpresas e suprime coisas por causa do pouco tempo, provando que este conto se trabalhado com um pouco mais de esmero e orçamento tem condições de ser uma interessante adaptação cinematográfica do autor.

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Bons atores compõem a equipe, mas faltou um pouco de química entre o elenco principal. Além disso, a caracterização dos falecidos fornece apenas uma vaga lembrança dos astros originais (exceção de Roy Orbison, que está idêntico), não que eu esteja cobrando a exumação dos corpos para se ter fidelidade absoluta, porém quando se vê na tela um cara falando que está vendo Jimi Hendrix, o mínimo que se espera é ver um sósia com os traços do ídolo, coisa que não acontece aqui.

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Não foi feita para agradar todo mundo: uns vão dizer que é fraco na condução outros vão elogiar pela fotografia (que como podem reparar é uma constante em toda série) e pela história diferente e divertida. Acredite quando digo que ambas as opiniões tem procedência e o único jeito de saber em que lado o leitor vai ficar é simples e acho que nem é preciso dizer, não é?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em um balanço geral posso dizer que mesmo com seus erros e limitações fiquei bastante satisfeito com o resultado como um todo, afinal é diversão ligeira e quase sempre descompromissada. E, além disso, até as piores adaptações não diminuem o grande trabalho do mestre do terror e suspense. Espero que este seriado tenha estimulado uma nova leva de produtos para a TV neste nível e que não demore demais para uma nova minissérie – ou até mesmo um seriado fixo, por temporadas – para levar para as telas, quem sabe, alguns outros contos de Stephen King ou mesmo de outros autores. Bom, de qualquer maneira, fica a sugestão.

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1 comentário

  1. Eu queria rever o filme a cidade do Rock and roll

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