A Marca do Diabo
Original:Hexen bis aufs Blut gequält
Ano:1970•País:Alemanha Direção:Michael Armstrong Roteiro:Michael Armstrong, Adrian Hoven Produção:Adrian Hoven Elenco:Herbert Lom, Olivera Vučo, Udo Kier, Reggie Nalder, Herbert Fux, Johannes Buzalski, Gaby Fuchs, Ingeborg Schöner, Adrian Hoven |
Uma pequena diligência transportando um monge e duas freiras atravessa um descampado no interior da Áustria enquanto é observada por um bando de caçadores de bruxas. Os religiosos são atacados pelo bando e violentados. O cenário, bucólico, verdejante e ensolarado, encantador sob a trilha sonora de Michael Holm, contrasta tragicamente com o terror perpetrado ali e que seguirá pela próxima hora e meia deste interessante e difícil A Marca do Diabo.
A produção alemã, lançada em 1970, segue o rastro do sucesso do cult britânico O Caçador de Bruxas (1968), bem lembrado pela violência marcante e exagerada, até realista, registrada numa história contextualizada no ápice da caça às bruxas na Idade Média europeia.
Em A Marca do Diabo, no entanto, o diretor e roteirista britânico Michael Armstrong vai “um pouco” além ao registrar os horrores de um dos capítulos mais tristes e inconsequentes da história. Para além de uma trama de caça às bruxas, o filme segue três casos, ditos reais documentados ainda na intro do filme, que subsidiam toda a narrativa que segue marcada por um realismo nauseante.
Um jovem e “idealista” caçador de bruxas (interpretado por um juvenil Udo Kier – caçando pessoas inocentes desde 1970), chega numa pequena cidade austríaca para fazer justiça e acabar com o sadismo do caçador de bruxas local – o assassino, estuprador e torturador Albino, interpretado por um asqueroso Reggie Nalder (o Reginaldo, rsrs). Albino tem decretado a prisão, tortura e morte de mulheres, homens e até crianças, acusando-os de bruxaria de forma arbitrária e pessoal, o que tem gerado certo transtorno nas camadas mais populares.
Enquanto isso, o “mentor” do juvenil Udo Kier, Lord Cumberland (Hebert Lom), um cargo alto no Judiciário da Inquisição, chega para pôr ordem no local com as próprias mãos, mas também é “desviado” (como se já não fosse), pelo poder ao longo dos acontecimentos, que culminam em tragédia (como se já não fossem).
Quem pesquisar por aí vai ver muitos críticos e comentaristas se referirem à Marca do Diabo como um dos primeiros torture porn do cinema. Não é para menos. O Caçador de Bruxas parece brincadeira de criança perto do que vemos aqui: cenas de enforcamentos, pessoas queimadas vivas, furadas com objetos cortantes, chicoteadas, surradas, membros sendo esmagados e até decepados, além do uso de uma ampla gama de instrumentos e formas de tortura que nos são apresentadas com tal riqueza de detalhes que talvez ultrapasse o gosto por revisionismo histórico de alguns.
Um revisionismo que é muito bem feito, aliás. Os três casos ditos reais em foco na história (que conta com muitos outros casos paralelos) contemplam a gama de interesses por trás da estratégia tirânica de controle social que foi a implantação dos tribunais de Inquisição – interesses estes que vão, por exemplo, desde a tomada de terras e propriedades da população pela Igreja até o medo dos homens de tornarem-se impotentes por feitiçaria (é sério).
Outro fator que amplia o realismo do filme é a escolha de um castelo austríaco onde realmente aconteciam os “interrogatórios” da Inquisição para realização das filmagens. O castelo em questão hoje é uma espécie de museu da Inquisição, e os instrumentos de tortura apresentados no filme são reais e estão em exposição no local.
Ao fim, mesmo com todos os “highlights” possibilitados pelas cenas de tortura, a cenografia realista, elenco afiado e conhecido, e alguns artifícios promocionais (como a distribuição de vomit bags nas salas de cinema), Marca do Diabo envelhece e chega ao nosso tempo como um interessante registro histórico de um período sombrio da história humana, alinhado a um pioneirismo curioso dentro do gênero horror.
Teve, ainda, algumas continuações de diversas nacionalidades, igualmente curiosas. Mark of the Devil Part II é uma sequencia ainda alinhada à narrativa original, também produção alemã. Já a Part III nada mais é que o mexicano Alucarda. As Parts IV e V parecem ter se convertido em filmes de uma série espanhola chamada La Noche del Terror Ciego, enquanto os Mark of the Devil 666: The Moralist e Mark of the Devil 777: The Moralist Part II parecem estar distantes demais do nosso interesse para serem mencionados aqui. Enfim, se forem encarar, vão com força. Tá disponível na Darkflix.
Tô vendo se crio coragem de ver esse filme. Kkkkkk fui abrir o Darkflix e me deparei de cara com ele. Fui pesquisar e como sempre achei a melhor análise aqui. Adoroooo
Gosto muito desse filme. Outro filme interessante sobre inquisição a caça às bruxas é Os Demônios, de 1971, baseado no livro Os Demônios de Loudun, de Aldous Huxley.
Temos um episódio do podcast sobre nunsploitation em que falamos de The Devils, inclusive.