O Clube de Leitores Assassinos
Original:El club de los lectores criminales
Ano:2023•País:Espanha Direção:Carlos Alonso Ojea Roteiro:Carlos García Miranda Produção: Elenco: Veki Velilla, Álvaro Mel, Priscilla Delgado, Iván Pellicer, María Cerezuela, Carlos Alcaide, Daniel Grao, Carmela Lloret |
Em dado momento no começo do filme O Clube de Leitores Assassinos (El club de los lectores criminales, 2023), o professor Cruzado (Daniel Grao), de alguma disciplina de redação criativa, diz que o “terror é um gênero fraco“. Menciona que a literatura pode ter neblina e portas que se fecham sozinhas, mas lhe falta o ingrediente essencial, a conexão com o mundo real. Ele até sugere que os alunos vivam suas vidas para que possam criar boas histórias e ainda diz que muito do que se faz hoje é oriundo de cópias de escritores consagrados, incluindo fanfics. Discordo da primeira parte de sua aula, até porque o horror, ainda que distante da realidade, pode trazer boas surpresas, porém a parte final é uma metacrítica ao próprio filme, que nada mais é que um apanhado de ideias chupadas de slashers conhecidos. Mas Pânico (Scream, 1996), uma das referências da produção, também não é uma paródia ao estilo? Sim, uma evidente paródia e não uma cópia carbono, como faz o roteiro de Carlos García Miranda, inspirado em sua própria obra.
Começa com uma inusitada cena em que uma garota queima a própria mãe, usando páginas de livro, atendendo ao que parecem ser os desejos de um contato virtual conhecido como Gacy, com o ícone de um palhaço – claro que é uma relação com o famoso assassino John Wayne Gacy, conhecido como Palhaço Assassino, e que teria servido de inspiração para diversos exemplares da literatura e do cinema, como Pennywise, de Stephen King, e um dos fomentadores da coulrofobia. Seis anos depois, um grupo de jovens amigos, pertencentes a um Clube do Livro universitário, é apresentado com créditos: a escritora de uma obra só Ángela (Veki Velilla) namora com o barman Nando (Iván Pellicer), enquanto é discretamente flertada pelo amigo, fã de terror, Sebas (Álvaro Mel); há o influenciador polêmico Koldo (Hamza Zaidi), a consciente Sara (Ane Rot), namorada de Rai (Carlos Alcaide), e Virgínia (Priscilla Delgado), além da bibliotecária Eva (María Cerezuela). Eles costumam se reunir em um espaço – não é à meia-noite – para comentar livros que estão lendo em conjunto, buscando inspirações para seus futuros trabalhos na universidade de artes e literatura.
Um erro de comunicação faz o professor Cruzado achar que Angela está interessada nele – apesar do erro ser justificado por uma ação, o mesmo não se pode dizer pela postura do docente em tentar agarrar a garota à força -, e a ameaça para que não conte a ninguém estimula os jovens a prepararem um susto. Vestidos com fantasias de palhaços e com armas brancas de verdade, eles o perseguem pelo espaço universitário até ocasionar sua morte acidental. O grupo faz um juramento de esconder a verdade, mas alguém começa a enviar capítulos de uma obra que narra a morte de cada um deles exatamente como ela ocorre. Será que alguém viu o que fizeram e está querendo se vingar? Ou alguém do clube enlouqueceu e resolveu assassinar os amigos por uma motivação pessoal?
Nesses dois parágrafos já é possível identificar semelhanças com outros filmes como Eu Sei o Que Vocês Fizeram Verão Passado (juramento), Cry Wolf – O Jogo da Mentira (aquele filme com o Jon Bon Jovi como um professor universitário e jovens querendo pregar uma peça) e, óbvio, Pânico (jovens sendo mortos por assassino mascarado, referências a obras e – pasmem – a surpresa final). Poderia até funcionar como uma versão espanhola da franquia de Wes Craven, como outras até conseguiram (Lenda Urbana, por exemplo), porém o longa é tão cheio de inverdades que faz o professor Cruzado ter razão no que disse em sua aula.
Só para exemplificar, basta notar que o filme praticamente não tem personagens “adultos“. O professor morre e não aparece um policial para investigar; os amigos começam a desaparecer e as aulas continuam acontecendo normalmente, sem familiares, sem ninguém notar as ausências. Os corpos desaparecem – e a razão para isso fere a inteligência -, os alunos não têm apoio médico, andam por onde querem, a universidade não tem câmeras e nem seguranças. O ápice da inverosimilhança acontece em um evento desafiado por Koldo, pedindo que as pessoas aparecem com fantasias de palhaço. Todas as pessoas só usam a mesma – ninguém lembrou de Pennywise ou o Bozo (o palhaço mesmo)? -, e a sequência que envolve transmissão ao vivo culmina com um assassinato em um ambiente público, em uma estufa, com vidros em toda lateral, sem que alguém, além da protagonista, consiga entender o que aconteceu.
São muitas as bobagens que acontecem, como se o enredo fosse mesmo uma fanfic, daquelas bem mal escritas. Se era essa a intenção, o filme de Carlos Alonso Ojea devia ter trabalhado mais no humor, transparecendo uma paródia realmente, com os próprios personagens questionando a falta de investigação e adultos em cena. Assim, o longa pode ser enaltecido apenas pelo mistério em torno da identificação do assassino, além dos aspectos técnicos como direção, direção de arte, fotografia e atuações. O espectador até se envolve na trama, apostando em teorias para justificar os crimes ou imaginando algo que possa ter passado pelos seus olhos atentos.
Desse modo, O Clube de Leitores Assassinos pode ser recomendado aos fãs de slashers que não procuram lógica, apenas curtem sequências de sangue e morte. Se busca referências ao universo da literatura como se espera, uma espécie de Pânico literário, passe longe. Opte por aquele seu livro que tenha uma neblina e portas se fechando sozinhas. Vai valer mais a pena.
Pior que eu gostei do filme (achei que não fosse gostar), o problema dele é que ele não tem um pingo de originalidade imitando escancaradamente filmes como Pânico e Eu Sei O Que Vocês Fizeram no Verão Passado e além disso o visual do assassino é muito pouco inspirado não lembrando quase nada um palhaço.