Uma Lagartixa num Corpo de Mulher
Original: Una lucertola con la pelle di donna
Ano:1971•País:Itália, Espanha, França,, UK Direção:Lucio Fulci Roteiro:Lucio Fulci, Roberto Gianviti, José Luis Martínez Mollá, André Tranché Produção:Edmondo Amati Elenco:Florinda Bolkan, Stanley Baker, Jean Sorel, Alberto de Mendoza, Silvia Monti |
Eu tenho sentido um imenso prazer em conhecer os primeiros trabalhos de Lucio Fulci voltados para o mistério e terror, aqueles lançados ali entre fins da década de 1960 e início da década de 1970. Fulci vinha de um grande período, quase 20 anos, trabalhando em estilos variados tendo a comédia como base, mas entrou no horror aos poucos, com a ousadia de quem já entende do riscado e arriscando produções diferenciadas.
Uma Lagartixa num Corpo de Mulher (Una Lucertola con la pelle di donna) é apenas o segundo giallo, se assim considerado, de Lucio Fulci, e segue o padrão de excelência que seus dois filmes anteriores alcançaram – Uma Sobre a Outra (Una Sull’altra, 1969) e Que o Céu a Condene (Beatrice Cenci, 1969). Uma trama de mistério por excelência, o filme tem o giallo como orientação, mas o estilo se entranha à narrativa, que se molda à sua forma, subjetiva, beirando a psicodelia tão comum daqueles tempos, o que faz desta uma proposta muito diferente e original.
A começar pela ausência de um assassino de luvas pretas, típico dos gialli convencionais. Há um assassinato, mas ele é testemunhado por Carol Hammond (a cearense Florinda Bolkan, em sua primeira parceria com Fulci) em sonho! A reprimida Carol sonha com o assassinato de sua vizinha, uma hippie por quem guarda uma mistura de desejo e amargura, sentimentos compartilhados apenas com seu terapeuta, e na manhã seguinte ela realmente é encontrada morta. O crime revela todos os detalhes de seu sonho (ou vice-versa), o que torna a instável Carol ainda mais confusa.
Os maiores interessados na resolução do mistério são seu pai Edmond (Leo Genn), e seu marido Frank (Jean Sorel, repetindo seu papel de Una Sull’altra, mais uma vez fazendo o marido adúltero, e mais uma vez se tornando o principal suspeito).
O desenlear desse novelo é de encher os olhos, e ouso dizer que o Fulci é o melhor diretor/roteirista no campo do mistério. Neste filme, em particular, ele mescla com maestria os diversos elementos técnicos que envolvem a realização de um filme com o olhar da “testemunha ocular” e de sua viagem muito particular, ampliando ou tonificando a experiência sensorial de quem assiste. É o tipo de filme que enquadro na categoria “filmes para os ‘extra senses’”, da mesma prateleira onde ficam o Imagens (Robert Altman, 1972), que já se auto denomina como esse tipo de produção, e o Vício Inerente (Paul Thomas Anderson, 2016), igualmente sinestésico.
Mas voltando, mesmo se encaixando melhor como “thriller” investigativo, Lagartixa num Corpo de Mulher é cheio de referências a clássicos do terror e sequências de deixar o corpo rígido de tensão, explorando com eficácia as possibilidades ou olhares “assustadores” que se pode lançar sobre o cotidiano.
O principal destaque é a cena de caçada no Alexandra Palace, localizado em Londres, em que, além do suspense carregado, ainda temos, mais uma vez, a direção misturando os tormentos mentais da protagonista aos seus descaminhos em cena de forma muito elucidativa. A cena dos cachorros no hospital (para fins de estudos anatômicos, prática comum no passado), que foi parar na Justiça de tão realista, também demonstra essa “esperteza” de captar a oportunidade para o horror. Pode até ser considerada uma mostra dos caminhos que Fulci viria a seguir mais a frente.
O roteiro faz uma crítica forte ao conservadorismo a partir da construção de seus personagens, sendo essa condição a base de todos os conflitos em cena. Esse subtexto só torna ainda mais rica a produção, que tem o capricho e o refinamento em todas as arestas – roteiro, trilha sonora (de Ennio Morricone), figurino, cenários, efeitos especiais – como principais características. E ao fim, ainda somos surpreendidos uma última vez! Recomendo forte. Tem na Darkflix.
Gostei muito desse filme. A cena dos cachorros no Hospital é uma das mais lindas e realistas que eu já vi! fiquei voltando algumas vezes só pra ver de novo! Uma obra de arte!
Para mim, o melhor filme do Fulci. Espetacular!