![]() A Serpente e as Asas feitas de Noite
Original:The Serpent and the Wings of Night Ano:2024•País:EUA Autor:Carissa Broadbent•Editora: Suma |
Os vampiros estão em alta novamente. Não que algum dia tenham necessariamente saído de moda – especialmente entre os fãs de terror -, porém, produções que saíram da bolha e alcançaram grandes massas, como a série Entrevista com o Vampiro e o mais recente Nosferatu, deixaram o mundo vampírico em polvorosa. Inúmeras narrativas envolvendo esses sanguinários predadores já foram feitas, reinventando o mito e aumentando as lendas. Vampiros românticos, sensuais, artistas, brutais, bestiais, marginalizados, humanizados, que brilham no sol, animados… enfim, já vimos de tudo, e mesmo assim eles continuam a fascinar o imaginário humano. Apesar de algumas mudanças, uma coisa é certa em toda e qualquer obra que envolva vampiros: os humanos são suas presas. Em um mundo comandado inteiramente por vampiros, onde há espécies rivais sedentos por sangue e poder, será que é possível um humano sobreviver? Em um sangrento torneio estilo Battle Royale apenas composto por tais seres, Carissa Broadbent nos transporta a um mundo cheio de escuridão e fantástico em A Serpente e as Asas feitas de Noite, publicado no Brasil pela editora Suma.
Oraya é uma reles humana em um mundo onde sua espécie é vista apenas como gado esperando para ser abatido. Ainda criança, sua vila foi destruída e sua família morta, e esse seria seu destino se Vincent, o rei dos vampiros, não tivesse impedido. Por algum motivo, o rei viu algo naquela feroz criancinha, atacando como uma serpente, lutando para sobreviver mesmo sendo um bebê, e decide adotá-la. Ao longo dos anos, Oraya é treinada incansavelmente por Vincent, agora seu pai, que não mede esforços para que a garota saiba se defender em um lugar onde só há predadores. Mesmo protegida por ser filha do rei, vampiros são conhecidos por seu descontrole quando com fome. Virando uma lutadora habilidosa, decide que vai participar do Kejari, um torneio mortal entre os vampiros onde o vencedor tem o direito de pedir qualquer coisa que desejar à deusa Nyaxia, mãe dos vampiros. Determinada, pretende vencer o Kejari e finalmente não ser mais uma presa nesse mundo feito de noite e sangue.
Assim que o torneio começa, Oraya sabe que corre perigo a todo momento, e não apenas durante as provas. Seu único momento de descanso é quando o sol nasce. Contra todas as probabilidades, sobrevive ao primeiro desafio, e seus objetivos são dificultados quando, por motivos de força maior, precisa de aliar a Raihn, um vampiro implacável e de um clã inimigo ao de seu pai.
A Serpente e as Asas feitas de Noite é o primeiro livro da duologia Nascidos da Noite, que faz parte da série Coroas de Nyaxia. Ou seja, são dois livros abordando a história de Oraya, e os seguintes abordando outras histórias desse mesmo universo. A trama criada por Carissa Broadbent é cheia de detalhes e complexidades, criando um novo mundo governado inteiramente pelos seres da noite. O começo da leitura é um pouco mais devagar por causa da necessária explicação sobre aquele universo e todos os pormenores, mas logo a ação e magia tomam conta. À primeira vista pode parecer mais uma fantasia juvenil com romance demais e fantástico de menos, porém, não demora para percebemos que não é bem assim.
Além de seres sanguinários e violentos, a narrativa nos apresenta também intrigas políticas e internas, já que os vampiros podem ser de diferentes espécies, fazendo parte das seguintes casas: Casa da Noite, Casa da Sombra e Casa do Sangue. Todos foram criados pela deusa Nyaxia – abertamente inspirada na deusa grega da noite Nyx -, e cada espécie possui seu próprio território e habilidades únicas. Simplificando, dentro das próprias Casas há clãs rivais, como é o caso da Casa da Noite, à qual Oraya e seu pai fazem parte. O que difere um clã de outro são suas asas. Como dá para perceber, os perigos vão além de ser uma humana em território amplamente vampírico; traições estão à espreita a todo momento, inclusive é comum que mutilem ou até mesmo matem membros da própria família, tamanha a ferocidade e fome de poder. É quase um Game of Thrones dos vampiros com uma pitada de Jogos Vorazes (ou qualquer outra obra que use o sistema de Battle Royale). O torneio é visceral e não poupa ninguém, e nele temos a presença de diversos seres, como demônios e outros monstros.
Assim como a trama, os personagens são cheios de complexidades e personalidades fortes e marcantes, até mesmo os secundários. Tudo gira em torno de Oraya, Raihn e Vincent, mas a presença dos demais personagens é fundamental para o desenvolvimento da história, onde tudo e todos são imprevisíveis. Falando da protagonista, ela não é a típica mocinha em perigo, ou a típica heroína. Ela esconde segredos, é violenta, possui diversas questões mal resolvidas e é movida pelo desejo primal da sobrevivência. Violência e morte são o que regem o Kejari mas, no meio de todo esse banho de sangue, eles encontram alguns momentos de paz com seus aliados. Não é preciso dizer que fatalmente teremos um romance, que poderia ser desnecessário, entretanto, acaba sendo um elemento que não estraga a narrativa. Bem desenvolvido, explora com profundidade os aspectos psicológicos dos personagens e é crucial para determinados acontecimentos, sendo até certo ponto bem balanceado. Poderia ter sido feito de outro modo, com um pouco menos de cenas românticas, mas a brutalidade continua imperando na narrativa.
Elementos fantásticos não faltam. Magia, deuses, vampiros, demônios e outros seres mitológicos estão presentes a cada página. Os capítulos são intensos e recheados de ação, e a ambientação sombria é constante. As descrições das paisagens são vívidas, de modo que o leitor praticamente consegue visualizar o universo imerso em trevas e comandado por predadores cruéis, e temos também muitas cenas gráficas e bem descritivas.
Como se batalhas sangrentas, luta por sobrevivência, seres fantásticos, trama cheia de detalhes e tensão não fossem o suficiente, Broadbent ainda consegue trazer reviravoltas inesperadas. O final, em especial, é do tipo que dá vontade de tacar o livro na parede e querer saber o que diabos vai acontecer em seguida.
Se você gosta de fantasias sombrias com um universo cheio de detalhes e intrigas, vampiros, romance e brutalidade praticamente na mesma medida, torneios mortais e seres fantásticos se dilacerando sem dó, provavelmente vai achar A Serpente e as Asas feitas de Noite uma leitura deveras interessante.