Carpe Diem
Original:Carpe Diem Ano:2024•País:Brasil Páginas:56• Autor:Cristal Moura, Leander Moura•Editora: Independente |
Sonhos podem ser tão traiçoeiros quanto belos. Algo agradável pode rapidamente se tornar algo curioso, beirando o estranho, até se transformar em imagens verdadeiramente perturbadoras produzidas pelo seu subconsciente. Um sonho que começa inocente pode logo virar assustador, sendo assim, um pesadelo. Você acorda em um pulo, suando, com taquicardia e ofegante. No início do século XVI dizia-se que “nightmare” (pesadelo em inglês) era um demônio que sufocava as pessoas durante o sono, por isso as vítimas que sobreviviam acordavam com tal sensação agonizante. Apesar de algumas pessoas terem pesadelos recorrentes, normalmente as imagens que causaram tal desespero desvanecem ao despertar, sobrando apenas o mal-estar. Porém, outras pessoas não só têm pesadelos recorrentes, como ficam anos sonhando com exatamente a mesma coisa, a ponto de ficar incrustado na mente a cada piscar de olhos. Esse é o caso de Cristal Moura, quadrinista e ilustradora. Sendo arista, nada melhor do que usar as angústias e medos para fazer arte, e assim surgiu Carpe Diem.
No quadrinho elaborado – com inspiração no pesadelo de Cristal – pela dupla Leander e Cristal Moura (A Besta, Horas Escuras e diversas participações em antologias e adaptações literárias), estamos em um mundo distópico. Os guardas Max e Romero conversam durante uma vigília, até que Romero acaba adormecendo. Como se a realidade já não fosse ruim o suficiente, o mundo dos sonhos claramente não está nada melhor. Uma mulher acorda em um lugar desconhecido, e dá-se início a uma experiência sombria e assustadora.
O casal já havia publicado uma versão mais curta da história anteriormente, em 2019, na Coletânea VHS do coletivo Belzeebooks. A edição ganhou o Troféu HQMix em 2020 na categoria de melhor publicação independente.
O quadrinho bebe de fontes como Mad Max e usa um horror atmosférico e psicológico. Não por coincidência, o personagem Max foi inspirado no ator Tom Hardy. Logo nas primeiras páginas, podemos ver tal influência: carros abandonados, lugares desolados e ambiente insalubre. Assim que Romero (inspirado em…sim, George Romero) adormece, temos uma mudança na ambientação. Tudo fica mais sombrio, ilusões grotescas tomam conta. A estranheza vai crescendo e se transformando em horror a cada página.
Os diálogos são poucos, e como dizem, uma imagem vale mais do que mil palavras. Em Carpe Diem, as ilustrações são a verdadeira pérola da obra. Assim como em um sonho (ou pesadelo), não sabemos direito o que está acontecendo, temos uma confusão mental por não entendermos o que está sendo visto, até que, quadrinho a quadrinho, as coisas vão ficando cada vez mais macabras. A cada releitura, novos elementos podem ser percebidos. Os traços são firmes, com frequência destacando os olhos das personagens, mostrando todo o pavor que sentem quando diante de algo horrível. Em poucas páginas, Carpe Diem nos traz um misto de sentimentos, como se acabássemos de acordar de um pesadelo que sabemos ser irracional, mas isso não faz com que seja menos aterrorizante. Aliás, curiosamente, passar o recorrente pesadelo para o papel fez com que ele desaparecesse dos sonhos de Cristal.
No final, temos algumas ilustrações e variações de capa feitos tanto por Cristal quanto por Leander. Se você tiver pesadelos após finalizar a leitura desse quadrinho, talvez seja um sinal para passa-lo adiante em forma de arte tal qual Cristal e Leander fizeram. Carpe Diem pode ser adquirida no site da loja Blind Cat.