![]() Heavy Metal do Horror / O Rock do Dia das Bruxas
Original:Trick or Treat
Ano:1986•País:EUA Direção:Charles Martin Smith Roteiro:Rhet Topham (história), Michael S. Murphey, Joel Soisson, Rhet Topham, Glen Morgan e James Wong Produção:Michael S. Murphey, Joel Soisson, Scott White Elenco:Marc Price, Tony Fields, Lisa Orgolini, Doug Savant, Elaine Joyce, Glen Morgan, Gene Simmons, Ozzy Osbourne |
Bons tempos de Cinema em Casa… Lembro-me que via Heavy Metal do Horror (Trick or Treat, 1986) nas sessões de filmes do SBT, e isso mais ou menos durante aquele período mágico em que um adolescente começa a descobrir o rock. A história de Eddie Weinbauer (Marc Price), um estudante da high school obcecado por heavy metal e especialmente pelo selvagem cantor Sammi Curr (Tony Fields), ressoava muito em cada um de nós, roqueiros com os dedinhos em forma de chifre no ar. Ainda mais numa época em que, assim como Curr, um dos nossos ídolos, Kurt Cobain, líder do Nirvana, encontrava uma morte precoce no auge da fama e da controvérsia. Porém, diferentemente de Cobain, que achou melhor queimar de uma vez do que se apagar aos poucos, bem, Curr – que morreu queimado – não tinha a mínima intenção de virar cinzas de uma vez por todas. Quando Eddie começa a tocar de trás para frente o último e não lançado álbum de Curr, o falecido metaleiro passa a lhe transmitir mensagens sobre como vingar-se dos yuppies de trinta anos que são seus colegas de colégio e bullies costumeiros.
E foi a morte de outro ícone do rock que me fez revisitar essa pérola. Com a despedida de Ozzy Osbourne no dia 22/07/2025 fiquei com vontade de mergulhar novamente num tempo em que as músicas de artistas como ele, Twisted Sister e W.A.S.P., eram tema de debate no Senado americano devido à má influência que seriam capazes de exercer sobre os jovens. Um tempo em que o “Pânico Satânico” tirava o sono de pais, professores e religiosos, todos desconfiados de que seus filhos pudessem estar cultuando o capeta no conforto de seus quartos com cheiro de suor, hormônio adolescente e Cheetos. Enfim, um tempo mais ingênuo, pueril, assim como as letras de boa parte do heavy metal. E dessa maneira descobri que, após todos esses anos, o filme ainda é surpreendentemente bom.
Embora exista em torno de Heavy Metal do Horror uma aura de filme conservador, que corrobora a visão preconceituosa e desinformada dos detratores do metal, basta assistir para sacar que se trata de uma grande tiração de sarro da cara dessas pessoas. E, ao abraçar a má reputação do gênero musical que retrata, o filme veste a carapuça, não do condenado, mas do carrasco. Se isso não fica claro pelas participações de Gene Simmons, do Kiss, como o DJ de uma rádio local que presenteia Eddie com o disco maldito, e do próprio Ozzy Osbourne, como um impagável reverendo que vocifera na tevê contra as letras sacanas dos metaleiros, então o que mais?
No fundo, o filme é muito mais sobre rejeitar o fanatismo cego em relação a qualquer ídolo e tornar-se o herói da sua própria história sem precisar “vender a alma”, seja ao diabo ou a uma suposta normalidade que lhe trará aceitação. E é também sobre um sujeito bem-sucedido cujo maior desejo, no final das contas, era cantar no bailinho da sua antiga escola. Ingênuo e pueril, como um bom heavy metal.
A produção é bem cuidada, recheada de cenas com efeitos práticos. A montagem inicial, mostrando um dia lazarento de Eddie entre seus colegas, poderia bem ser um videoclipe de alguma banda pesada da época, pois já dá o tom e conversa diretamente com o gênero musical. A perseguição dos valentões a Eddie através do colégio é muito bem coordenada, com os atores realmente entregues. O filme como um todo possui uma fotografia bonita, um tanto onírica, que remete muito a A Hora do Pesadelo (A Nightmare on Elm Street, 1984), cujo sucesso reverberava naquele momento. O próprio personagem de Sammi Curr parece inspirado em Freddy Krueger, combinando uma morte por fogo, um rosto com queimaduras, um anel que simula uma garra e um poder capaz de dobrar a realidade, como quando ele interage com as pessoas na tevê. Inclusive, uma das coisas que menos me agradam é que, da metade pro final, Curr passa a ter seus poderes completamente relacionados à eletricidade, o que o deixa um vilão mais comum e limitado (é engraçado lembrar que, poucos anos depois, justamente Wes Craven lançaria Shocker: 100 Mil Volts de Terror (Shocker, 1989), apresentando um vilão com poderes elétricos e fechando curiosamente esse círculo).
Se você é um fã de heavy metal, o filme obviamente é um prato cheio, e você vai tentar pescar cada uma das bandas do estilo espalhadas pelo quarto de Eddie na forma de pôsteres, adesivos, camisetas e capas de álbuns (eu sempre adorei especialmente o momento em que a mãe do garoto (Elaine Joyce) encontra na coleção dele o vinil de Killing Is My Business… and Business Is Good!, do Megadeth). Além disso, a trilha sonora é do Fastway, banda formada pelo ex-guitarrista do Motörhead, “Fast” Eddie Clarke, e pelo ex-baixista do UFO, Pete Way. E se você não é um fã, ainda assim irá passar bons momentos com esse divertido exemplar do cinema de terror dos anos 1980, imbuído daquele espírito aventureiro e meio artesanal que nunca deixa de encantar.