por Kátia Oliveira dos Santos Andrade
─ Quero te mostrar algo que te deixará maluco. Não vai embora.
─ Nadja! Quem está aí com você? ─ pergunta Ítalo intrigado ao chegar na casa da namorada.
─ Como assim amor? Não tem ninguém comigo.
Ítalo franziu o cenho, pensando que deveria estar imaginando coisas.
─ Acho que estou trabalhando demais.
Ítalo deu um beijo em Nadja, bagunçou seus cabelos e foi direto para o banho.
Cansado de um dia cheio de trabalho deixou que a água caísse demoradamente em seus ombros. Encostou a testa no frio da parede, fechou os olhos por um instante.
Escutou Nadja ligar a vitrola antiga, sorriu. Ele sabe que essa noite prometia muito amor. A música do casal reverbera por todos os cantos da casa, um som que só a boa e velha vitrola podia produzir. Ítalo nunca enjoaria daquele som… Ao passar pelo corredor as luzes começaram a piscar e ele se resignou com a possibilidade de ficarem sem energia. Quando entrou no quarto a ,janela abriu e fechou, indo e vindo conforme a melodia da tempestade que estava para chegar.
Ítalo teve um prazer enorme ao sentir um ar gélido que invadia o quarto. A cortina parecia um véu de noiva tornando o ambiente com ar de mistério; sentou-se na ponta da cama, sentiu o aroma da chuva que se aproximava. Era como um mensageiro alertando que um visitante estava de passagem.
Esqueceu das horas. Saltou da cama e lembrou de ajudar a namorada com o jantar. Colocou seu shorts preto, velho de guerra, mas superconfortável, apagou as luzes e saiu cantarolando.
A casa estava mais fria que o normal e uma sensação estranha de estar em constante observação. Ítalo não gostou de se sentir paranoico.
Segurou a cintura de Nadja e a abraçou por trás. Dançou seguindo o ritmo da música. Nadja o olhou e sorriu.
Fazia tempo que não a via assim, sorrindo despreocupada. Estava mais séria ultimamente, desatenta por vezes. Notou um certo distanciamento, ficou preocupado com suas constantes mudanças de humor.
Hoje, o jantar era macarrão à bolonhesa, seu prato favorito!
Com a mesa posta, Ítalo serviu a namorada, comeram seu jantar silenciosamente. Ficou intrigado com o olhar fixado de Nadja sob ele, parecendo insanamente cruel.
Engasgando-se, Ítalo corre direto para a pia da cozinha mesmo e põe para fora o macarrão se desculpando pela falta de educação e sujeira. Limpou a pia envergonhado de olhá-la nos olhos.
─ Ítalo, você está bem? ─ Nadja perguntou preocupada.
Surpreso com a pergunta inesperada, Ítalo ri e diz que está tudo bem e que o macarrão desceu pelo buraco errado. Terminado o jantar, lavou a louça enquanto a namorada foi para o banho.
Recordou dos acontecimentos esquisitos e frequentes.
Nadja falava enquanto dormia, acordava no meio da noite, saía perambulando adormecida em um estado catatônico de sonambulismo e noites seguidas de insônia.
O pior é quando ela o olhava e o encarava como se fosse alguém completamente diferente. Arrepiou-se com a lembrança.
Geralmente ia para a cama antes dela, com o cansaço, sempre dormia rápido, mas, hoje iria esperá-la. O sono fugia dele nesta noite. Terminou de lavar a louça, foi para a sala e checou as mensagens no celular, depois voltou para o quarto, avistando a namorada adormecida como um bebê. Sorriu tranquilamente. Olhou o quarto, andou até a estante de livros e ficou lendo os títulos que lhe causaram estranheza. Viu no criado mudo um porta retrato com a foto dos dois e isso o deixou contente: divertiu-se ao ver o rádio relógio marrom da namorada, que um dia foi do seu pai, e que foi do pai de seu pai. Naná adorava coisas velhas, na verdade ela dizia: vintage!
Tudo estava calmo e completamente normal, mas porque ele se sentiu ansioso? Cansado de se questionar, pousou ao lado de Nadja, sorriu por estar ao lado daquela mulher que ele tanto amava. Fechou os olhos e se animou com a possibilidade de ser acordado mais tarde.
Não demorou para cair no sono. As horas de trabalho lhe pesaram, as pálpebras e sua mente cansada de lutar se renderam aos sonhos.
Imóvel, Ítalo mexeu freneticamente as pálpebras, soltou gemidos e franziu o cenho. Ao seu lado, o corpo de Nadja se posicionou vagarosamente até que ficou sentada e imóvel olhando para frente por um bom tempo.
Suor calafrios e tremedeiras. Ítalo não conseguiu acordar.
Um mundo invertido. Conhecia aquela voz, já ouviu essas palavras antes. Sentiu medo. Um medo crescente que o advertiu para acordar. “Corre vai! Não espere!”.
Risos se aproximaram, passos repetitivos causaram desconforto. Olhou para todos os lados e esperou o que viria.
Descalça, com a cabeça tombada para o lado esquerdo, Nadja tinha um olhar animalesco. Um sorriso diabólico surgia de sua face pálida. Nadja estava irreconhecível a não ser pelo camisão que vestira antes de dormir. Os dedos e unhas dos pés sujos da lama tocando o chão. Ítalo apavorado diz:
─ Nadja, por que está assim? O que está aconteceu com você?
Olhos vidrados, Nadja levantou o braço e com o dedo longo e sujo apontou para a direção de Ítalo. Confuso, ele olhou para trás e, ao se virar novamente, assustou-se com a presença de Nadja tão próxima, há alguns centímetros de seu rosto com um ar gélido e putrefato.
Nadja com uma voz demoníaca fala:
─ Venha comigo! Eu vou te mostrar um lugar especial. Lá você verá muitos amigos. Será divertido!
Recordou de ouvir algo parecido, percebeu que poderia ser um pesadelo. Olhou para a criatura a sua frente viu a boca dela soltar um grito medonho que o fez pular da cama. Ficou molhado de suor. Passou os dedos pelos cabelos emaranhado e riu com o medo descabido que sentiu; virou-se para olhar a namorada e tudo estava escuro demais, frio demais, as cortinas balançaram furiosamente, um odor lhe subiu as narinas. Começou a chamar a Nadja. Desesperado com a falta de luz, procurou por velas na gaveta do criado mudo. Por sorte a encontrou junto aos fósforos. Acendeu a vela e a colocou em um pires de aço envelhecido.
Iluminou o quarto com a vela e notou uma enorme sombra próxima à estante de livros de Nadja. Logo a frente em pé e cabisbaixa Nadja estava estática, assim como ficava quando entrava em estado de sonambulismo. Falou consigo mesmo se repreendendo por criar esse ar de medo ao seu redor. Seu sorriso foi sumindo quando notou a ausência da cor castanha dos olhos de Nadja, eram sombrios como um buraco escuro e sem fim. Pegou o celular para iluminar mais o quarto e poder enxergá-la melhor. Chacoalhou meio desajeitado e quando a lanterna se acendeu levantou e se assustou com o rosto de Nadja, tão pálido e diabólico.
Um olhar vazio, um sorriso cruel um medo incessante e a aflição surgiu do íntimo de Ítalo.
Questão de segundos, Nadja apunhalou Ítalo no peito duas três vezes. Ele não conseguiu reagir a tempo, não houve fuga, não teve suspiro. Só dor! Devagar e dilacerante um zumbido forte tirou os seus sentidos, se sentiu fraco submerso e começou a ter espasmos. Da boca de Ítalo um sangue quente e escarlate escorre e se derrama por seu peito em direção aos lençóis brancos de sua namorada.
Enfraquecido, viu o olhar de Nadja marejados e agoniados, olhando para as próprias mãos ensanguentadas sem acreditar na própria desgraça.
Ao lado de Ítalo, uma forma escura e pungente o encarou, segurou o seu pulso e o arrastou, levando-o para caminhos tortuosos e distantes. Distantes de tudo que já viu, de tudo e de todos.
Tão longe que não podia imaginar ou tão mesmo esquecer…
Dentro da alma do homem, seu lado sombra, quando não mediado, torna-se seu algoz. Os portões do inferno são abertos e os piores seres se apoderam do seu ser. Eles sugam e destroem todos a sua frente.
Um conto muito bom, amiga, parabéns! 👏🏽👏🏽👏🏽👏🏽👏🏽
Parabéns muito bom maravilhoso demais
Lindo conto maravilhoso demais parabéns vc vai longe orgulho de você 😊😊😊🥰🥰🥰
Credo!
Muito bom!
Parabéns, ótima escrita achei um talento inexplicável
Um conto perturbador para essa noite de sábado. Amei!
Eink conto fodaaaaaaaaaaaa
Muito feliz de ter meu conto aqui, que honra. Agradeço de coração o espaço, pela divulgação e ao querido Renato e todos envolvidos. Obrigadooooooo!
Uma honra ter meu conto postado no Boca do inferno. Agradeço ao Renato e a todos envolvidos e que divulgam o terror.
Amei demais!