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Carmilla
Original:Carmilla
Ano:1872•País:Irlanda
Autor:J. Sheridan Le Fanu•Editora:

A contribuição do escritor irlandês Joseph Sheridan Le Fanu foi imensa para o desenvolvimento do horror gótico no século XIX, principalmente para o subgênero do vampirismo. Sua obra mais conhecida, Carmilla, publicada em 1872, é, sem dúvida, uma das fontes de inspiração de Bram Stoker para o desenvolvimento de Drácula, publicado 26 anos depois. No entanto, este último adquiriu uma importância maior pela força literária de sua publicação, tanto que é bastante comum a referência ao vampiro da Romênia, em vez da sedutora descendente dos Karnstein. Talvez porque muitos leitores associaram a escrita de Le Fanu pelo erotismo implícito, esquecendo que o material também tem uma intensa história de horror.

A despeito de suas adaptações diversas – muitas realmente com mais apelo ao erotismo como “a versão de Jess FrancoA Maldição da Vampira (1973) -, a valorização à leitura de Carmilla ainda se mantém assustadora. Em poucas páginas – não deve chegar a 100 -, o autor apresenta um conto de maldição, de segregação da alma, de destruição da família, em pela era Vitoriana. Com sua linguagem descritiva, com muitos adjetivos que se repetem como o “lânguida“, Le Fanu ainda assim dá um tom dinâmico à sua arte, com acontecimentos variados entre os capítulos, e sempre uma presença perturbadora de algo sinistro, observando e torturando suas vítimas.

Como se fosse parte dos relatos de um aterrorizante caso do Dr. Hesselius, a história é contada sob o ponto de vista de Laura, uma pós-adolescente que vive com seus devaneios – e seu pai, um ex-combatente do império austríaco – em seu castelo na Estíria. Ela conta que o seu primeiro contato com o horror aconteceu durante um possível pesadelo aos seis anos de idade, quando recebeu a visita de uma estranha e bela mulher, que ainda a mordeu no peito. Agora aos dezoito, vive com a expectativa da chegada do General Spielsdorf e sua sobrinha Bertha Rheinfeldt, algo que não acontece e confusamente explicado numa carta que traz o informe da morte da garota, sob circunstâncias obscuras. A versão da Hammer, Carmilla, A Vampira de Karnstein (Vampire Lovers, 1970), mostra os acontecimentos de maneira cronológica, iniciando pelo episódio do general, interpretado pelo genial Peter Cushing, com o terror de Laura (nomes trocados), até alcançar Emma (Madeline Smith).

Laura não tem muito tempo para lamentar a morte da amiga, pois uma carroça se acidenta nas proximidades, tendo como passageiras a belíssima Carmilla e sua protetora. Com a aparência de alguém que já foi bela, a senhora lamenta a perda de tempo da viagem e a necessidade de deixar a filha em um vilarejo próximo, surgindo, então, o convite para que a jovem se hospede no castelo até o retorno da mãe. Com a disposição recuperada, Carmilla, sempre mostrada com frieza e um olhar tristonho, conta que tivera o mesmo sonho de Laura quando criança, insinuando uma sintonia cósmica entre as duas.

Com o tempo e cada vez mais próximas, o relato de Laura mostra que Carmilla não se importava com velórios, nem com afeto que não fosse o de sua nova amiga, enquanto notícias sobre garotas mortas pela região começam a se tornar frequentes, levando a família a crer que uma enfermidade está acometendo a população. O enredo fala sobre a visita de um corcunda para vender produtos às garotas, algo que não é lembrado em suas adaptações, assim como a força da lua, como bem diz a temível vampira. Outra visita inusitada acontece com a chegada de um restaurador de pinturas, destacando uma com bastante semelhança a Carmilla, mas com os dizeres Marcilla Karnstein, 1698. “O artista o mostrou, com orgulho evidente. Era muito bonito; era surpreendente, parecia estar vivo. Era o retrato de Carmilla!“.

Laura volta a ter pesadelos ainda mais aterrorizantes, como o de visualizar um gato preto enorme perto de sua cama, além da sempre presente Carmilla. “Mas logo vi que era um animal negro como carvão, que lembrava um gato monstruoso. (…) Eu o senti saltar levemente sobre a cama. Os dois grandes olhos se aproximaram do meu rosto, e senti repentinamente uma dor aguda, como se duas agulhas penetrassem profundamente em meu seio, afastadas uma ou duas polegadas. Acordei com um grito. (…) E vi uma figura feminina de pé perto da cama.” Em decorrência desses encontros noturnos, Laura começa a definhar, sentir-se fraca, doente, como o princípio da doença que está atingindo as moças nas proximidades.

E, mais próximo do fim, acontece o encontro entre o pai de Laura, o médico e o General. Este começa a contar o horror inexplicável que experimentara, apresentando siemilaridades com o pesadelo vívido de Laura. Então o grupo, com o auxílio de um lenhador e principalmente do Barão de Vordenburg – que inicia o prólogo da excelente adaptação de Roy Ward Baker – decidem encontrar o túmulo de Mircalla, Condessa de Karnstein, a fim de colocar um fim ao malefício que tomara a Estíria. Por fim, o autor traz uma conclusão do Dr. Hesselius, que apresenta as bases de seu conhecimento sobre vampirismo e que dá um tom verídico a tudo o que foi apresentado.

A partir de uma bem feita tradução de Eduardo Kraszczuk, Carmilla, de Le Fanu, está disponível em português para download na internet. É um texto ágil, daqueles que podem ser lidos numa única investida, e que, além de trazer um conto aterrorizante, propõe um estudo sobre o vampirismo em sua essência. Possui uma importância histórica absoluta, com riqueza de detalhes macabros sobre a época, num transporte interessante do leitor ao mundo onde todo o gênero encontra suas raízes. Além da trilogia Karnstein, da Hammer, a mais fiel e bem representada, vale menção duas outras produções: Vampyr (1932), de Carl Theodor Dreyer, e A Noiva Ensanguentada (La novia ensangrentada, 1972), de Vicente Aranda.

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