A Violência Desmedida de Michael Myers em Halloween Kills

4.9
(17)

Dr. Loomis sabia que Michael Myers era um monstro. Desde quando notara os olhos vazios do pequeno em 1963, durante sua análise sobre o que o levou a assassinar sua irmã Judith de forma tão violenta e fria, ele percebeu que estava diante do próprio Diabo. Quando Michael Myers retornou para Haddonfield já adulto assumindo a máscara que representava sua essência, a trilha de sangue e morte passou a ser sua assinatura. A única maneira de pará-lo foi mantê-lo preso em um sanatório para criminosos violentos, até que mais uma vez ele conseguiu a liberdade, e rumou para casa. Halloween, de David Gordon Green, mostrou sua tentativa de retorno até os caminhos cruzarem ao da sobrevivente Laurie Strode, pronta para um novo encontro.

O lançamento de Halloween Kills trouxe um novo capítulo para a história da cidade maldita. Michael Myers não se queimou no incêndio – também sobreviveu ao provocado pelo Dr.Loomis em 1981 -, e findou toda uma equipe de bombeiros, com picaretada na cabeça de um, machadadas nos demais e até utilizou uma motosserra em uma sequência que demonstrou agilidade e força física para um assassino com mais de sessenta anos. Tal sequência, embora bastante comum para quem já conhece bem o estilo violento dos slashers, provocou manifestações contrárias e até uma petição para que fosse excluída do filme; não pela qualidade ou exageros do idoso psicopata, mas pelo grau de agressividade visto em cena, algo que não chegou aos pés do que estaria reservado para Sondra e o marido.

O casal simpático morava próximo à casa de Laurie. Não se sabe qual foi o critério de escolha, se foi algo aleatório, ou se Michael percebeu o acesso facilitado e a ausência de crianças. Apesar de toda a maldade que constitui seu cerne, ele poupou crianças como o garoto Lonnie nos anos 70, e também o pequeno Julian. Sondra brincava com um pequeno drone, na boa convivência com Phil, quando o aparelho foi atirado para longe de um quarto e fez com que percebessem a presença de um estranho mascarado. Mesmo com sua natureza fria e agressiva, seja para bater a cabeça da vítima na janela para depois lentamente quebrar uma lâmpada e abrir o pescoço de Sondra, que irá observar tristemente uma série de perfurações nas costas do marido, Michael gosta de se manter nos cantos escuros da morada esperando o momento certo para agir. Cria incômodos, perturba por saber que está ali para exterminar quem estiver pelo caminho. E o pior de tudo: assiste à morte de suas vítimas, sem pressa, virando levemente o pescoço na satisfação pela agonia e dores proporcionadas.

Enquanto a cidade enlouquecia em busca do demônio dos olhos vazios, ele continuaria seu percurso, desta vez atravessando uma praça onde iria reencontrar duas velhas conhecidas, Lindsey e Marion, cujo confronto em um veículo no passado iria ironicamente selar seu destino. “Isto é pelo Dr. Loomis“, proferiu até perceber que a arma já não dispõe mais de balas, pois ela a utilizara quando sentiu a presença do monstro. Michael Myers rasgaria a órbita de um médico e ainda conseguiria levar a enfermeira a atirar em si mesma – provavelmente, ele não deve ter aprovado a eliminação de alguém sem uma ação sua diretamente. Lindsey irá golpear seu rosto, tirar sua máscara (algo que o incomoda ao ponto de deixar de lado o ato para colocá-la novamente) antes de correr para o parque em busca de abrigo. Mais tarde, o local apresentaria um cenário de morte e referência a Halloween 3, comprovando que Michael Myers não é apenas um psicopata, mas um arquiteto na construção de ambientes macabros.

Ele só queria ir para casa. Lá ainda teve a sorte de encontrar um casal de moradores, Big John e Little John , que, após serem incomodados por crianças que só queriam travessuras, logo iriam perceber que há um intruso no andar de cima. Apenas um deles terá seu destino traçado diante das câmeras, restando ao público vê-los na imitação de um retrato exposto no quarto, celebrando um outrora momento de intimidade. O que será que Michael Myers fez até o incômodo de Loonie, seu filho Cameron e a namorada Allyson? Teria ficado simplesmente contemplando seu reflexo, observando a silenciosa cidade onde trilhara uma trajetória de sangue e medo?

Dentre todas as ações violentas de Myers, sem dúvida a pior de todas foi reservada para Cameron. Loonie nem sequer foi visto em confronto, mas Cameron teve um final doloroso e lento, com cada golpe do assassino permitindo que o espectador sinta sua traqueia sendo dilacerada e seus ossos quebrados. Allyson pode assistir a tudo, e quase sucumbiu a um facada final, se não fosse a ação ágil de sua mãe Karen, com um garfo e uma pisada sobre sua cabeça. O show de horrores passaria para as ruas, com os moradores prontos para uma vingança que não traria os resultados esperados se eles percebessem o que Laurie e Dr. Loomis sempre souberam: o Mal não pode ser morto.

Michael Myers representa o lado mais sombrio do ser humano. Desperta a agressividade, o desespero em findar o incômodo; traz o impulso de uma ação impensada e a frieza de quem não se importa em promover a dor. Seu olhar pela janela representa uma tentativa de buscar a si mesmo, um reflexo que justifique seu desejo de eliminar qualquer um que esteja pelo caminho.

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Marcelo Milici

Professor e crítico de cinema há vinte anos, fundou o site Boca do Inferno, uma das principais referências do gênero fantástico no Brasil. Foi colunista do site Omelete, articulista da revista Amazing e jurado dos festivais Cinefantasy, Espantomania, SP Terror e do sarau da Casa das Rosas. Possui publicações em diversas antologias como “Terra Morta”, Arquivos do Mal”, “Galáxias Ocultas”, “A Hora Morta” e “Insanidade”, além de composições poéticas no livro “A Sociedade dos Poetas Vivos”. É um dos autores da enciclopédia “Medo de Palhaço”, lançado pela editora Évora.

3 thoughts on “A Violência Desmedida de Michael Myers em Halloween Kills

  • 02/11/2021 em 16:29
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    Marcelo, o que você acha dessa nova transformação dele em um tipo de super-humano que leva tiros e continua como se não tivesse acontecido nada? Cara, eu teria adorado o filme se não fosse esse detalhe de novamente voltarem aos filmes dos anos 80 em que ele era baleado por diferentes calibres e nada parecia fazer diferença.

    Sobre as mortes, nesse quesito o filme realmente me perturbou, mas de uma forma positiva (se é que dá). Na questão do gore, esses filmes tão de parabéns.

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  • 02/11/2021 em 11:21
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    Muitos fãs detestaram os filmes do Rob Zombie por conta da violência “desmedida”. Aparentemente, agora, esse elemento caiu nas graças do público.

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      02/11/2021 em 14:23
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      Na verdade, não. Os filmes do Rob Zombie não pecam pelo excesso de violência, mas pelo roteiro mesmo. A ideia de mostrar Michael Myers se transformando em um monstro, do conteúdo onírico e da construção de seus personagens condenou seus dois filmes.

      Abs

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