5
(1)

A menina do poço teve sua versão ocidental em 2002, quando Sadako já era bem conhecida dentre as assombrações asiáticas. Ela veio em uma roupagem também assustadora, alternando com o olhar ingênuo de Daveigh Chase, na concepção de uma fita de vídeo amaldiçoada alternativa, com imagens condizentes com sua vivência em um rancho. O Chamado (The Ring, 2002), diferente do que pregam os depreciadores de refilmagens, tem bons momentos de um horror investigativo e complementa algumas ideias apresentadas em Ring – O Chamado (Ringu, 1998): a relação entre os sete dias com o tempo de vida de Samara Morgan; a conexão entre o conteúdo da fita com algumas visões que atormentam o telespectador amaldiçoado; o modo como a jornalista Rachel (Naomi Watts) encontra a ilha Moesko; a importância da primeira aparição do vídeo na pousada Mountain Inn; a paixão de Anna Morgan (Shannon Cochran) pelos cavalos; o modo como Richard Morgan (Brian Cox) se suicida usando um aparelho de TV; a exploração do rosto distorcido nas fotos como a visão de uma pessoa submersa; e, principalmente, a aparência grotesca das vítimas, com um olhar de medo absoluto.

Com a direção acertada de Gore Verbinski, a partir de um roteiro adaptado de Ehren Kruger, o filme foi um grande sucesso nos cinemas e o motor de propulsão de refilmagens e das portas abertas ao mercado oriental de assombrações de cabelos longos e vestimentas brancas. E, claro, deu o pontapé para a realização de uma continuação, com quase referência alguma a Ring Espiral, Ring 2 – O Chamado e Ring 0: O Chamado. Se o primeiro filme já tinha personalidade, a ideia seria ampliar a mitologia proposta na parte 1, trazendo mais alguns arrepios e detalhes do passado de Samara Morgan.

A continuação teve o comando de Hideo Nakata, responsável pelos dois filmes “oficiais” da franquia Ringu, e que chegava à América para construir uma carreira estrangeira. O Chamado 2 passou longe do sucesso do original ao partir para uma ideia exageradamente sensível, com uma carga dramática que destoou do terror visto no primeiro filme, e ainda contou com mais alguns problemas, incluindo a atuação horrenda de David Dorfman, não sabendo lidar com a responsabilidade que o papel exigia. O Aidan dele já tinha esbugalhado demais os olhos em O Chamado e deixava evidente algumas limitações que o segundo não conseguiu disfarçar.

Começa muito bem: em Astoria, Oregon, o jovem Jake Pierce (Ryan Merriman, de Premonição 3, 2006) está na última hora de vida do sétimo dia de seu contato com a fita amaldiçoada. Já sabendo como se safar de um encontro com a menina do poço, ele tenta convencer sua colega de escola Emily (Emily VanCamp, de Vírus, 2009) a ver o filme. Sabe aquela brincadeira de rede social em que o rapaz diz algo como “mentira, não tenho Netflix. Eu te chamei para transar.“? Pois, apesar do interesse da garota em estar com ele para algo mais íntimo, ele a convidou para ver a fita. O roteiro de Kruger só não se preocupou em explicar porque ele esperou sete dias para decidir passar o filme para alguém e nem porque o rapaz foi tonto o suficiente para usar como argumento que se trata de algo extremamente assustador.

Emily tapa os olhos diante do filme, enquanto Jake distorce a boca em um prólogo bem realizado. Rachel e seu filho Aidan estão nessa cidade, depois de deixarem Seattle para iniciar uma nova vida, longe de Samara e da fita amaldiçoada. Ela arruma um emprego em um jornal pequeno, The Daily Astorian, trabalhando para o editor Max Rourke (Simon Baker, de Terra dos Mortos, 2005), um local onde não costumam acontecer muitas coisas. Mas a morte de Jake a atrai, levando-a ao local onde seu corpo acaba de ser recolhido: ao investigar a aparência do cadáver e descobrir que se trata de uma vítima de Samara, a própria aparece para tocar em seu braço e dizer: “Achei você.

Rachel destrói a fita de Jake, sem saber que seu filho está sendo atormentado por pesadelos, desenvolvendo hiportemia e apresentando hematomas no braço. Ela, que já demostrava não ter as responsabilidades exigidas para ser mãe ao ponto de Aidan somente a chamá-la pelo nome, começa a notar algumas mudanças graduais no comportamento de Aidan. Em dado momento, durante um passeio pela feira do condado, Aidan, que passou a se interessar por fotografia como seu pai, percebe a presença de Samara nas fotos; e a proximidade logo se transforma em possessão, com o garoto nem sendo mais capaz de dormir.

Os calafrios do primeiro ficaram de lado nessa continuação. Nota-se a falta de ousadia, até mesmo na morte offscreen de um personagem em uma cena que poderia remeter à de Noah. Depois que Aidan apresenta uma solução, envolvendo o medo que Samara desenvolveu de água, fica fácil entender os caminhos da narrativa de O Chamado 2, retornando ao poço, com a escalada de um Samara contorcionista como visto em Ring – O Chamado. Aliás, esse “medo de água” é outra conexão com a franquia japonesa, mas sem aqueles exageros de canalização de poderes ou enterro no mar.

Sem aquele epílogo que destacou “um final surpresa” no primeiro filme, quando o espectador já imaginava que tudo caminhava para o final e testemunharia a morte de Noah, O Chamado 2 se conclui de maneira anti-climática e com uma solução boba: Samara consegue sair do poço porque ele está sempre aberto. Nakata até faz um bom trabalho na direção, mas ficou faltando mais sustos, um trabalho mais incômodo, no roteiro de Kruger. Ainda assim, há boas cenas como o encontro com a mãe biológica de Samara, Evelyn, numa participação muito bem-vinda de Sissy Spacek. A ideia dela ter tentado afogar a bebê Samara já pressentindo o que poderia vir daí é bem interessante e contribui para a mitologia da franquia americana.

Não foi a última aparição de Samara. Ela retornaria em O Chamado 3 (Rings, 2017), desta vez na interpretação de Bonnie Morgan, uma sequência desnecessária, com efeitos ruins e ainda pior do que Ring Espiral. E, olha, que foi preciso se esforçar bastante para conseguir fazer algo mais sonolento que a primeira continuação de Ringu.

O que você achou disso?

Clique nas estrelas

Média da classificação 5 / 5. Número de votos: 1

Nenhum voto até agora! Seja o primeiro a avaliar este post.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *