4.7
(3)

Muralhas do Pavor
Original:Tales of Terror
Ano:1962•País:EUA
Direção:Roger Corman
Roteiro:Richard Matheson, Edgar Allan Poe
Produção:Roger Corman
Elenco:Vincent Price, Maggie Pierce, Leona Gage, Edmund Cobb, Peter Lorre, Joyce Jameson, John Hackett, Lennie Weinrib, Wally Campo, Alan DeWitt, Basil Rathbone, Debra Paget, David Frankham, Scott Brown

Edgar Allan Poe é, indubitavelmente, o maior escritor de horror de todos os tempos, e qualquer tentativa de explicar o que faz jus a tão expressivo adjetivo é completamente inútil, basta analisarmos a sua inovadora e filosófica obra literária, jamais igualada por qualquer outro escritor. E, apoiando-se em bases tão sólidas quanto estas, é fácil imaginar porque os diretores e roteiristas sempre buscaram em Poe alguma inspiração. Foi assim em 1932, quando o diretor Robert Florey resolveu filmar o grande clássico policial e precursor do gênero na literatura Os Assassinatos da Rua Morgue, com Bela Lugosi, e impulsionando a filmagem de outras obras do mestre, como O Gato Preto (1934) e O Corvo (1935), filmes estrelados por Bela Lugosi e Boris Karloff, atores que acabavam de sair das bem sucedidas adaptações de Drácula e Frankenstein (ambos de 1931).

Nas décadas posteriores o genial escritor novamente inspirou diretores e roteiristas, mas apenas Roger Corman soube extrair o verdadeiro terror que emanava das obras de Allan Poe, criando filmes baratos mas que alcançaram rápido sucesso entre os amantes do velho e bom horror gótico, no verdadeiro estilo europeu do século XIX. Roger Corman, que além de dirigir também produzia os seus próprios filmes, descobriu esta fonte rica e inesgotável ao lançar A Queda da Casa de Usher (1960), que alcançou sucesso imediato, levando o diretor a criar outras obras-primas como O Poço e o Pêndulo (61), Muralhas do Pavor (62), O Corvo (63), A Máscara Mortal (64) e The Tomb of Ligeia (64); todos baseados em Poe, mas que apresentavam as características mudanças que o roteirista oficial da American International Pictures (AIP), Richard Matheson, geralmente fazia, sem contudo, prejudicar o clima gótico descrito pelo escritor, ao contrário, a mitológica parceria Corman-Matheson-Price fizeram as mais criativas pérolas do horror da história do cinema.

Muralhas do Pavor (Tales of Terror) é um caso à parte em termos de inovação. Neste filme o roteirista Matheson condensou quatro contos de Poe em três histórias fantásticas, demonstrando que o dinheiro se torna fútil quando se tem criatividade e talento.

A primeira história do filme é baseada no conto Morella e o clima gótico apresentado é grandioso mas cheio de clichês, com direito a castelo-macabro-na-beira-de-precipício. Mostra a estranha conduta do senhor Locke (Vincent Price), um homem excêntrico e recluso em sua velha mansão, e cuja rotina diária consiste em remoer e lamentar amargas lembranças do passado. Sua rotina, porém, muda completamente quando a sua filha Lenore (Maggie Pierce) retorna depois de 26 anos e traz consigo lembranças ainda mais amargas, já que era considerada por Locke a assassina de sua mãe Morella (Leona Gage), cujo corpo era mantido embalsamado em uma cama. Lenora tenta se reconciliar com o pai, que apesar de parecer duro e inflexível, se dobra ante as suas lamentações. Mas quando tudo parecia voltar ao normal, Morella, usando o corpo da própria filha, volta para vingar-se de ambos. “E os ventos do firmamento uivavam os únicos sons em meus ouvidos, mas as ondas do mar murmuravam… Morella“.

Muralhas do Pavor (1962) (2)

A segunda história é na verdade uma criativa e bem humorada adaptação de Matheson, que condensou e uniu os contos O Gato Preto e O Barril de Amontilado e os narrou de forma excelente. Novamente brilha o gênio de Vincent Price, agora contracenando com outro mito, o cômico Peter Lorre, e sem dúvida nenhuma o grande momento dessa história é justamente o encontro deles em uma taverna onde ocorre uma convenção de vendedores de vinho; e a disputa entre eles para saber quem é o melhor conhecedor de vinhos é fantástica, numa verdadeira e bem humorada cena com trocas mútuas de canastrice (no bom sentido!).

Muralhas do Pavor (1962) (3)

O “pequeno gigantePeter Lorre, numa das caracterizações de bêbado mais perfeitas que eu já vi, mostra todo o seu talento ao interpretar Montresor Herringbone, um bêbado inveterado que vinga-se de seu amigo-rival Fortunato Luchresi (Price) e de sua infiel esposa Annabel (Joyce Jameson, a mesma de Farsa Trágica – 64) por traição. Ele empareda ambos, “nas muralhas do pavor”, só que comete o pequeno deslize de emparedar junto o gato preto que ele tanto odiava; e este mesmo gato, com rugidos macabros e fantasmagóricos, o denuncia futuramente durante uma inspeção da polícia em sua casa. “Emparedara o monstro negro bem dentro do túmulo.

A terceira e última história é baseada no conto O Estranho Caso do Sr. Valdemar; e é a mais sombria e mórbida, e apresenta novamente Vincent Price no papel principal, contracenando agora com outro monstro sagrado do horror, o excêntrico Basil Rathbone, que faz o papel do Dr. Carmichael, o médico de Valdemar. Na minha opinião, O Estranho Caso do Sr. Valdemar forma, juntamente com A Queda da Casa de Usher os mais sombrios e fantásticos contos de Poe, e talvez de toda a literatura macabra. O clima pesado e gótico dessa história mostra que o autor a escreveu em seu momento de maior inspiração, revelando de forma assustadora como poderia ser se uma pessoa fosse colocada em transe hipnótico-magnético exatamente no momento em que exala o seu último suspiro. É uma história tão fantástica que em alguns momentos parece ser real! E creio que Richard Matheson conseguiu perceber esse clima, e adaptou de forma extraordinária esta obra-prima da literatura fantástica, modificando-a em detalhes quase imperceptíveis, apenas para se encaixar nos padrões cinematográficos.

A belíssima Debra Paget (que voltaria a trabalhar com Price em 1963 no clássico O Castelo Assombrado, também de Corman) interpreta a esposa do Sr. Valdemar e tenta impedi-lo de deixar que o Dr. Carmichael prossiga com suas macabras experiências mesméricas. Mas quando o Sr. Valdemar estava em seu leito de morte, o doutor finalmente realiza sua experiência e consegue êxito, impedindo que o velho moribundo descanse em paz. Mas este, no final, volta-se contra a conduta egoísta e traiçoeira do Dr. Carmichael, já que as consequências não foram muito boas, e o mata para sair de seu inferno podre e inacabável e descansar para sempre no sono da morte.

Muralhas do Pavor apresenta tudo que um fã do horror clássico poderia pedir: clima gótico apurado e eficiente; a presença impagável de atores cujo nome não é necessário citar e história baseada no mais sombrio escritor de todos os tempos, Edgar Allan Poe… Quer mais?! Então morra!!!!

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4 Comentários

  1. Nunca vou esquecer de Montressor e sua célebre frase: “comida? Eu bebo a minha comida”
    ??????

  2. adoro esse filme! Sinto nojo e aversão do corpo embalsamado na cama e um certo alívio com o desfecho da sequência.

    Consigo morrer de rir com a sequencia da disputa do vinho, com o “primeiro encontro” entre Vincent Price e a esposa do bêbado (a cara de ambos é impagável). Consigo sentir pena do estado degradante do bêbado e ao mesmo tempo odiá-lo por isso, sentir pena do casal adúltero no desfecho.

    Adoro a sequencia final, a voz fantasmagórica do morto é arrepiante e imaginar como é estar preso entre a vida e a morte e o transtorno causado é instigador!

    Eu recomendo, recomendadíssimo!

  3. dever ser legal esse filme.e o gatinho preto do filme parece o que tenho aqui em casa,muito fofo 🙂

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