Prontuário 666 - Os Anos de Cárcere de Zé do Caixão
Original:Idem Ano:2008•País:Brasil Páginas:120• Autor:•Editora: Conrad |
Em 1964 chegava às telas de cinema aquele que é considerado o mais importante expoente do cinema fantástico brasileiro: À Meia-Noite Levarei Sua Alma, de José Mojica Marins. Com ele o imaginário popular nunca mais seria o mesmo.
Um certo Josefel Zanatas, coveiro obcecado pela continuidade do sangue através de um filho gerado na mulher perfeita, livre de medos e crenças, vestindo capa e cartola, com suas “unhas deste tamanho”, invadia os pesadelos das plateias incautas. Nascia o Zé do Caixão.
Durante os mais de 40 anos desde sua estreia no cinema, Zé do Caixão estrelou dois longas, participou de outros filmes, apresentou programas de TV e encarnou diversas versões em quadrinhos do personagem. Mas a trilogia idealizada por Mojica nunca se concluiu.
Após 40 anos e algumas tentativas de concluir a trilogia iniciada em 1964 com À Meia-Noite Levarei Sua Alma e que teve sua segunda parte, Esta Noite Encarnarei em Teu Cadáver em 1967, Mojica estava prestes a realizar seu sonho com a estreia de Encarnação do Demônio em 2008.
Mas por onde andou Zé do Caixão durante estes mais de 40 anos? Quem conhece a história do coveiro sádico, sabe que em 1967 ele encontra a morte e redenção após ser perseguido por uma turba enfurecida em um pântano, pedindo perdão a Deus. Mas veja bem, este nunca foi o final intencionado por Mojica. Zé do Caixão nunca teria pedido perdão, nunca teria morrido com um crucifixo nas mãos.
Agora Zé do Caixão teria sido preso após os incidentes no segundo filme, teria passado oito anos em um sanatório e depois levado a uma prisão de segurança máxima em São Paulo. E lá, Zé encontrou um terreno fértil para praticar suas experiências macabras enquanto espera sua soltura quando poderia voltar à busca pela mulher perfeita.
Mojica nunca escondeu que sempre foi fã de quadrinhos, inclusive colecionador de Conan, e este hiato de quarenta anos era a oportunidade perfeita para trazê-lo de volta a esta mídia do qual sempre foi um apreciador.
Prontuário 666: Os Anos de Cárcere de Zé do Caixão nos conta o que aconteceu com o Sr. Josefel durante estes mais de quarenta anos em que esteve recluso. Um ótimo recurso, cheio de referências aos filmes anteriores, que faz uma ponte perfeita entre as duas primeiras partes da trilogia e o seu final, Encarnação do Demônio. Aqui você irá entender, entre outras coisas, quem é o fantasma que sai do caixão logo no começo do terceiro filme, retirando uma faca da boca para citar um exemplo desta conexão entre as mídias.
E para contar esta história foi convocado Samuel Casal, exímio ilustrador, vencedor de diversos troféus HQ Mix, entre outros prêmios, com trabalhos publicados na Europa, Argentina e Brasil. E a escolha não poderia ser melhor.
A arte de Samuel Casal é impecável. Toda em altos contrastes, a arte do álbum é sombria e expressionista e dá o peso certo para um conto de Zé do Caixão passado em uma prisão. Podemos notar a passagem do tempo e o efeito da reclusão no sadismo de Zé do Caixão através da arte que começa mais contida, com contornos mais delineados e uma diagramação mais padronizada, e aos poucos vai se tornando mais solta, agressiva, com ilustrações de página inteira, mais suja. Até o final, terminando exatamente onde começa o terceiro filme.
O texto simples e eficiente foi escrito a quatro mãos por Samuel Casal e Adriana Brunstein, cientista ligada à física quântica e genética que agora se dedica apenas à ficção. Roteirista de diversos curtas e do longa de Liz Vamp – a filha de Mojica, Liz Marins – foi consultora no roteiro de Encarnação do Demônio.
Parecia difícil trazer de volta um personagem clássico com uma história tão rica e ainda assim amarrar os filmes, atualizando-o para estes novos tempos, mas Casal e Adriana fizeram um trabalho magistral. A leitura flui muito bem com suporte da ótima arte e as 120 páginas voam diante de seus olhos.
Para finalizar, as últimas páginas do álbum trazem pin-ups de vários artistas com o personagem. Entre eles Angeli, Mozart Couto e Maracatti. Amarrando tudo isso o projeto gráfico excelente torna Prontuário 666 um álbum agradável de ler, impossível de parar até se chegar ao final. A editora Conrad merece os parabéns por dar esta chance a dois grandes personagens brasileiros, Zé do Caixão e seu criador José Mojica Marins.
O álbum é fácil de encontrar em livrarias e comic shops ainda e é indispensável para os fãs e para aqueles que apreciam uma boa história em quadrinhos.