O Apocalipse
Original:Left Behind
Ano:2014•País:EUA Direção:Vic Armstrong Roteiro:Jerry B. Jenkins, Tim LaHaye, Paul Lalonde, John Patus Produção:Ed Clydesdale, Paul Lalonde, Michael Walker Elenco:Nicolas Cage, Lea Thompson, Cassi Thomson, Chad Michael Murray, Nicky Whelan, Martin Klebba, Laura Cayouette, Jordin Sparks, Quinton Aaron, Stephanie Honoré, William Ragsdale |
O Apocalipse na carreira de um ator “de nome” em Hollywood pode estar em suas escolhas. Papéis errados pode conduzir uma trajetória de sucesso a manchas irreparáveis na filmografia. Uma pesquisa simples nos artistas que fizeram sucesso nas décadas passadas e você encontra nomes que já foram boas referências, mas que se perderam em personagens mal desenvolvidos ou películas ruins: Kevin Costner (de Os Intocáveis, 87, Dança com Lobos, 90, e Robin Wood, 91…depois faria o terrível Waterworld – O Segredo das Águas, de 1995, e o fraco Possuída, 2009), Robert De Niro (de O Poderoso Chefão 2, 74, Coração Satânico, 87 e Cabo do Medo, 91, depois faria As Aventuras de Alceu e Dentinho, em 2000, e Entrando Numa Fria Maior Ainda com a Família, em 2010), Morgan Freeman (de Conduzindo Miss Daisy, 89, Um Sonho de Liberdade, 94, e Seven – Os Sete Crimes Capitais, 95, depois faria O Apanhador de Sonhos, 2003, e Edison – Poder e Corrupção, 2005), Christopher Walken (de A Sentinela dos Malditos, 77, O Franco Atirador, 78, A Hora da Zona Morta, 83, depois faria Canguru Jack, 2003, e Mulheres Perfeitas, 2004 )…e por aí vai. Um nome que se tornou símbolo das escolhas ruins é o de Halle Barry, principalmente depois da atriz participar de um Framboesa de Ouro (o Oscar dos filmes ruins) e agradecer a seu agente por colocá-la no horroroso Mulher-Gato, de 2004. Nesse caso, ainda há um “embora“, já que a atriz nunca foi um engenho da sétima arte!
Sob a mesma carapuça está Nicolas Cage. Nascido em 7 de janeiro de 64, o sobrinho de Francis Ford Coppola estudou teatro numa escola em Beverly Hills até abandoná-la aos 17 sem concluir o curso. Logo faria uma ponta na comédia Picardias Estudantis, em 82, mas sem conseguir sucesso, acabou vendendo pipocas num cinema, o que poderia encerrar sua carreira como ator. Porém, passou num teste de uma produção de seu tio, O Selvagem da Motocicleta (83), e seguiu para seu primeiro grande papel em Valley Girl, no mesmo ano. Fez tanto sucesso que foi convidado a outros trabalhos conhecidos como Arizona Nunca Mais (87), Feitiço da Lua (87), Coração Selvagem (90), Morte por Encomenda (93), O Beijo da Morte (95), Despedida em Las Vegas (que lhe rendeu o Oscar, em 95), Con Air (97), A Outra Face (97), Cidade dos Anjos (98), 8mm (99), Um Homem de Família (2000)…Entretanto, depois da virada do milênio, ele até fez algumas boas produções, mas errou a mão em projetos ruins como O Sacrifício (2006), Motoqueiro Fantasma (2007), Fúria Sobre Rodas (2011), Fúria (2014) até chegar aO Apocalipse!
Numa primeira impressão, a partir do título nacional mal escolhido e do cartaz, o infernauta pode imaginar que se trata de uma produção ao estilo Mad Max, com personagens caminhando por ruas com carros virados e uma dificuldade intensa de respirar. Algo pós-apocalíptico ou um filme-catástrofe, com o fim iminente do mundo, como no pesadelo cometido por Lars Von Trier em Melancolia. Contudo, Vic Armstrong (de Joshua Tree, de 1993…hein?) apostou no romance escrito por Jerry B. Jenkins e Tim LaHaye e no roteiro de Paul Lalonde e John Patus para “tentar salvar sua alma e acabou perdendo-a de vez“. Para entender frase em aspas, é preciso conhecer um pouco do enredo de O Apocalipse.
Cage interpreta (ou, pelo menos, tenta) Ray, um piloto de avião que tem intimidade com a mentira. Quem sofre com seus desvios de caráter é sua filha Chloe (Cassi Thomson), uma estudante universitária que viaja para casa para o aniversário do pai. Ele conta que foi escalado para uma viagem para Londres, mas, na verdade, quer aproveitar o trabalho para efetivar uma relação extra-conjugal com a aeromoça Hattie Durham (Nicky Whelan, que esteve em outro voo em 7500). Deixando para trás a filha e a esposa religiosa Irene (Lea Thompson, que foi a mãe de Marty McFly na trilogia De Volta para o Futuro), o avião parte para uma viagem tranquila de seis horas, sem escalas.
No voo, entre os passageiros, há o recente affair de Chloe, o jornalista investigativo Buck Williams (Chad Michael Murray, de A Casa de Cera), além de outros personagens estereotipados como a mãe desesperada, o muçulmano e um anão mal-humorado (Martin Klebba, de Zumbilândia) – parece o roteiro de uma piada de um encontro numa viagem de avião, e, de certa forma, pode-se dizer que é. Enquanto passeava pelo shopping com o irmão, Chloe é surpreendida pelo desaparecimento repentino do garoto, juntamente com milhares de pessoas pelo mundo, inclusive no avião. O que parecia um episódio da antiga Além da Imaginação aos poucos evidencia um longa carregado de moralismo religioso e mensagens positivas sobre a importância de ser uma pessoa correta e blá blá blá.
O resultado é suficientemente irritante, sem profundidade e extremamente chato. Chloe passa boa parte do filme correndo de um lado para outro, tentando descobrir o que aconteceu; enquanto seu pai rapidamente percebe que se trata de uma convocação das boas almas ao Paraíso, diante do fim dos tempos. Caberá aos que foram “deixados para trás” aceitar as mudanças e aproveitar para corrigir suas falhas antes que tudo acabe, ao passo que Ray tentará pousar o avião em algum lugar que não seja o aeroporto, seguindo a cartilha das produções envolvendo desastres aéreos.
O Apocalipse é uma adaptação simplória do primeiro livro da série Left Behind. Com uma produção pequena (U$16 milhões…se bobear, mais da metade para o astro), o longa peca em praticamente tudo: efeitos especiais, trilha sonora e, principalmente, atuações. Extremamente caricatural, Cage não se empenha na construção de seu personagem, tornando-se difícil para o público se importar com suas ações. Já Chad não faz nada que justifique sua presença ali, como se tivesse sido escalado para atrair meninas adolescentes. A única que se salva – menos no sentido bíblico – é Cassi Thomson, embora o roteiro não contribua para o desenvolvimento de Chloe.
Há discussões em fóruns pela internet sobre o conteúdo ser ou não moralista. Enquanto alguns defendem suas posições pelas poucas citações à Bíblia, outros estabelecem relações entre os personagens e metáforas religiosas. Tanto faz. O que importa é a qualidade do filme, até mesmo porque é possível encontrar religiosidade em várias produções do gênero, muitas vezes disfarçadas em boas ações. Porém, O Apocalipse é ruim demais, não funcionando nem como filme de auto-ajuda, nem como produção de ficção científica. É um filme-catástrofe literalmente, mais uma mancha na carreira do carismático Nicolas Cage; um longa me fez pensar no sabor da pipoca que ele vendia no cinema…
O filme apenas faz juz ao nível de atuação do Cage.