Them
Original:Them
Ano:2021•País:EUA Direção:Nelson Cragg, Daniel Stamm, Janicza Bravo, Craig William Macneill, Ti West Roteiro:Little Marvin, David Matthews, Francine Volpe, Seth Zvi Rosenfeld, Dominic Orlando, Christina Ham Produção:Dominic Orlando, Michael Nelson Elenco:Deborah Ayorinde, Ashley Thomas, Alison Pill, Shahadi Wright Joseph, Melody Hurd, Ryan Kwanten |
Os últimos anos têm sido muito importantes para um protagonismo maior da comunidade negra no cenário audiovisual estadunidense, com uma particularidade para as histórias de terror. Antes marginalizados a personagens secundários e tramas desinteressantes, assistimos hoje uma revolução na participação de pessoas negras em obras do gênero, onde o próprio racismo como elemento principal do horror é o destaque, não faltando bons exemplos para serem citados como Get Out, Us, Lovecraft Country e até mesmo a minissérie Watchmen. Por isso, a proposta da série original da Amazon Prime, Them, em elevar o horror racial ao extremo soava interessante, mas em seu resultado final ela tropeça em erros graves, que tiram o brilho de seu produto e nos questiona aonde realmente queria chegar, principalmente ao pensarmos na máxima de que explorar o sofrimento particular de um grupo específico não pode ser feito pelo mero entretenimento.
Them faz parte de um projeto criado pelo produtor Little Marvin, que quer a série funcionando de forma antológica, como American Horror Story, mas com cada uma de suas temporadas trazendo uma história sobre a injustiça racial nos Estados Unidos. Em Them, nos início dos anos 50, a família Emory se muda da segregadora Carolina do Norte para um belo subúrbio de casas coloridas na Califórnia, fugindo de um grande trauma ainda a ser revelado e sonhando com a oportunidade de melhorar de vida. Ainda que a mudança seja contextualizada pela Segunda Grande Migração nos Estados Unidos estimulada pelo próprio governo no pós Segunda Guerra, os Emory chegam a um bairro tradicionalmente branco, que os vê unicamente como uma ameaça aos seus valores e que decide coletivamente expurgá-los dali.
E não bastasse tudo isso, os Emory caem cruelmente na armadilha de uma maldição sobrenatural, com fantasmas e acontecimentos bizarros que estão ali unicamente para levá-los a uma tragédia.
O horror vem de forma forte desde o primeiro episódio. As agressões raciais sofridas pela família são gráficas, pesadas e perturbadoras. A mãe Lucky não consegue superar o trauma de uma agressão sem tamanho sofrida ainda na Carolina do Norte, o pai Henry mesmo sendo um engenheiro promissor é arrasado exaustivamente em seu trabalho todos os dias, a filha Ruby como única aluna negra de uma escola do colegial sofre ao ponto de desejar ser branca, e a caçula Gracie mesmo sendo uma perfeição de criança é agredida até fisicamente pela bruxa invocada de seu próprio livro infantil.
É por isso que chega um ponto em que Them é cansativa. Exaustiva de assistir. Sentimos que nossas forças vão sendo sugadas ali. A família está sendo engolida por um racismo sórdido e cruel, um sistema capitalista opressor que criou planos reais de destruir famílias negras, além de uma maldição espiritual simplesmente nefasta. Com a personagem principal chamada ironicamente de Lucky, Them fica cansativa pelo fato de que essa linda família não tem um momento de paz, de conforto, de alento. Tudo para todos é uma provação. E para chegar onde eles chegaram e conseguir avançar, ter isso é realmente necessário.
Trazer representatividade para minorias em produtos da cultura pop escolhendo mostrar seus sofrimentos é sempre uma faca de dois gumes. E há momentos em Them que simplesmente não sabemos onde ela quer chegar. Henry é tratado pelos vizinhos como um grande gorila perigoso e violento, para mais na frente realmente assumir uma faceta de perigo e violência, enquanto até mesmo um tapa bem dado de Lucky em sua cretina vizinha Betty pode ser tratado como uma comemoração de gol em final da Copa do Mundo pelo espectador, ainda que saibamos que as consequências poderão ser de mais dor para aquelas pessoas.
E, claro, há o famoso episódio cinco. Um dos mais curtos da temporada, ele é um grande flashback sobre o trauma causado naquela família. Uma violência sem tamanho, que até mesmo o mais calejado dos espectadores de filmes de terror pode ser atingido. Há até mesmo avisos de gatilho no início, pedidos de que as pessoas procurem entrevistas com criadores para entender o contexto ali, mas se é preciso ir atrás de explicações além das que estamos vendo em tela, significa que algo ali não funcionou como devia.
Them ainda tem seus méritos. Tecnicamente ela é impecável. Ambientação, fotografia e figurino são deslumbrantes e enchem os olhos. Mas a verdadeira joia de Them está em seu elenco. Não há simplesmente uma única má atuação na série. E todo o elenco da família Emory é um primor, com Debora Ayorinde segurando simplesmente todas as cenas onde é colocada, não importando a situação, enquanto Alison Pill entrega provavelmente a melhor atuação de sua carreira como a vizinha de faces expressivamente marcantes.
E se o episódio cinco é quase um atentado ao público, o seis é provavelmente o melhor da temporada, ao mostrar como cada um dos Emory está sendo assombrado pela maldição do bairro. Há cenas memoráveis para todos os personagens, mas é o Homem do Sapateado com blackface “invertido” quem realmente nos aterroriza aqui, de longe o ser mais assustador da série, que nas cenas com Emory nos inflige desespero.
Por esses motivos é que Them também é viciante. Ainda que dez episódios pareçam muito, com várias quebras de ritmo, é difícil começar e não ir ao final. Mesmo assim, quando chegamos ao episódio nove, com sua bela fotografia em preto e branco para contar o motivo da maldição ali, somos bombardeados por uma vibe clichê, um argumento meio A Bruxa, com mais violência gráfica e a sensação de que por um momento a série quis justificar o racismo de uma pessoa desprezível como oriunda de um mero plano sobrenatural. Tudo isso para no episódio seguinte termos uma conclusão corrida e… mais uma vez… nossa… como Them é exaustiva.
a pura verdade do racismo é essa todo tipo de pessoa que eles vem com ameaça e manipulada
Achei a nota completamente injusta. Entendo o incômodo que a série gerou, mas eu achei interessante mostrar o racismo na sua face mais horrível e desprezível, como um mal ainda mais perverso do que as próprias assombrações que perseguiam a família. Um soco no estômago, mas é uma série de terror que trata de uma realidade que nos afeta ainda hoje! Imagine como as coisas eram naquela época! Fiquei impactado com o final e o significado de tudo aquilo. Eu, como um cara negro, mesmo torcendo e desejando um final feliz para aquela família, sei que isso seria completamente inverossímil, infelizmente…
Get Out, Us, Them, His House, Lovecraft Country, Watchmen… acho que já podemos cravar um novo gênero no terror. Sobre o racismo, o que melhor abordou o tema nos últimos anos foi Little Fires Everywhere, na minha humilde opinião.
Achei o seriado muito bom por possuir esse clima de suspense e terror muito bem apurados como o próprio Samuel bem ressaltou, porém acho que deixou muito a desejar por causa do discurso panfletário e ideológico, coisa este que quase me fez abandoná-lo depois do segundo episódio, demonizando todo americano classe média, branco e cristão como se esses fossem racistas, violentos e cruéis.
Para quem ainda não sabe, os maiores trabalhos sociais hoje em todo o mundo são realizados por cristãos, católicos e evangélicos, distribuindo sopas, roupas e agasalhos. Ajudando drogados em casas de reabilitação, arrumando empregos para gays, transexuais e prostitutas, mas acho que vocês não sabem, pois não andam nas ruas das cidades durante as madrugadas ou aos domingos quando essas ações são executadas.
“…A família está sendo engolida por um racismo sórdido e cruel, um sistema capitalista opressor que criou planos reais de destruir famílias negras…” este comentário pareceu-me de um adolescente de quinze anos de idade que usa uma camiseta de Che, acabou de ler Marx e crê que vive em uma sociedade racista, opressora e genocida. O Racismo nos Estados Unidos é episódico e não “estrutural” como vocês bem dizem, pois senão o fosse o Barack Obama não teria sido eleito por dois mandatos consecutivos.
PS: sou mestiço antes que me acusem de nazista, fascista, racista etc.
Thiago Leão,
seu comentário é simplesmente deslocado da realidade. Não é ‘panfletário’ ou ‘ideológico’, criticar o racismo, que mostrado na série, mostra como é violento e opressor. Você diz que o racismo nos EUA é ‘episódico e não estrutural’ – SÉRIO? Em que mundo você vive? Você falou de Obama, mas rebato com Trump, que trouxe a tona todo tipo escroto que acham que podem continuar berrando seus preconceitos, afinal o presidente tentou dar voz a esses indivíduos. O debate aqui é sobre racismo estrutural sim, que segrega os indivíduos e os classifica de acordo com sua cor de pele, e isso é bem claro na série. Acho engraçado que você não passou do segundo episódio da série, por não concordar com discurso, e se acha no direito de criticar o Samuel, autor do texto, que fez uma análise maravilhosa sobre – a sua tentativa de minimizar uma luta diária, é uma das piores formas de racismo.
Sou incapaz de dar uma nota pra essa série. Ela é brutal e viciante, é como se eu quisesse ver como a minha própria sessão de tortura fosse acabar. É dolorida, é cruel, é quase sádica. Me doeu muito assistir. E eu quis parar tantas vezes porque doeu tanto.
Achei a nota injusta e os motivos pra ela injustos.
Se cansa pra você, imagina pros pretos, bicho.
É poderosa e corajosa e dolorida. E foi feita quase toda por brancos, o que me deixa em conflito se ela é um retrato fiel ou uma sádica sessão de tortura pra gente que fetichiza sofrimento preto.
Fiquei torcendo por um final feliz como em Corra, que todas aquelas pessoas horríveis queimassem, mas não aconteceu. Como não aconteceu tantas vezes na minha vida, na vida dos meus pais e irmãos.
Tenho sentimentos conflitantes.