A Casa que Jack Construiu
Original:The House That Jack Build
Ano:2018•País:Dinamarca, Suécia, França, Alemanha Direção:Lars von Trier Roteiro:Lars von Trier Produção:Louise Vesth, Jonas Bagger, Piv Bernth, Peter Aalbæk Jensen, Marianne Slot Elenco:Matt Dillon, Bruno Ganz, Uma Thurman, Siobhan Fallon Hogan, Riley Keough |
Eis aqui mais um produto controverso da rica e, hoje, consideravelmente extensa filmografia do cineasta dinamarquês Lars von Trier. Esse “consideravelmente extensa” tem em vista não só a quantidade de filmes que o realizador produziu, mas os profundos níveis de experiência que cada obra sua nos proporciona. Impossível não sair abalado de qualquer filme de Lars. Ver dois filmes seus em sequência, então, é algo que beira o sadismo.
A Casa que Jack Construiu, seu trabalho mais recente até o momento, mergulha fundo numa das figuras mais emblemáticas do lado obscuro do imaginário popular moderno: o serial killer. O filme narra a história de Jack, um “engenheiro” com uma sorte poderosa e um projeto de construir uma casa, que seria sua obra máxima. Entre idas e vindas sem conseguir alcançar seu intento, ele se perde no vício em matar, algo que toma 12 anos de sua vida, até que sua sorte finalmente o abandona.
A narrativa começa nesse ponto final de sua carreira, com Jack, literalmente, encontrando a morte. A morte aqui se materializa sob a figura do poeta romano Virgílio, que age como uma espécie de Caronte (o barqueiro que guia a alma dos recém-mortos até o Hades na mitologia grega) enquanto guia Jack pelos labirintos do seu mundo inferior particular, e este narra sua saga. Essa saga é contada em capítulos, onde Jack detalha aquilo que chama de “incidentes” (assassinatos) mais marcantes de sua jornada, e que, ao longo do tempo, transformaram seu gosto por poder em vício, ou ainda, elevaram seus crimes ao status de “arte”, conforme sua perspectiva.
Lars von Trier, que também assina o roteiro do longa, faz de Jack um assassino assustador. Todas as características de sua psicopatia são enumeradas, detalhadas e desenvolvidas ao longo da trama, permitindo perceber a “evolução” de Jack como um serial killer. Após o primeiro “incidente”, ocorrido de forma totalmente impulsiva, Jack passa ao nível de assassino “organizado”, planejado, onde dá vazão ao seu TOC por organização e limpeza, algo que, na melhor das hipóteses, o mantém longe de suspeitas. Sua sorte surreal encoraja e fortalece outras de suas características psicopatas, como a misoginia, o egoísmo, o narcisismo e a alta inteligência, tornando-o, ao longo da experiência, imprudente, desorganizado, provocador.
Tudo isso é perceptível pois o roteiro nos conduz com maestria pela mente de Jack. A história é narrada em flashbacks, e o acesso que temos às memórias de Jack não vem de forma linear, mas mesclando a narrativa de seus crimes com imagens de sua infância (que já nos dão indícios de sua personalidade perturbada), e referências clássicas da arte mundial às quais seus impulsos são relacionados (afinal, Jack é um “assassino intelectualmente refinado” e entende que a arte e a morte mantêm relação intrínseca) – um bom artifício que nos induz a imaginar como Jack se sente. Ou como ele não sente. E essa é a parte perturbadora.
Lars von Trier, apesar de ser conhecido por seu cinema psicologicamente cru, não é um adepto da direção de terror. Ele não usa de muitos artifícios para criar cenas de tensão, tampouco de grandes efeitos visuais para passar aquilo que deseja. E mesmo assim, o horror está presente em muitos momentos de A Casa que Jack Construiu.
A cada cena que passa, e à medida que “desconstruímos” a personalidade de Jack, mais assustador ele se torna. O ator Matt Dillon, em seu melhor papel (e olha que ele esteve em O Selvagem da Motocicleta (1983) e em Drugstore Cowboy (1989)), consegue distribuir quilos de tensão em cena ao assumir diversas personas nas interações com suas prováveis vítimas. Saber que a coisa não vai terminar bem, então, torna boa parte das 2h30 de filme em algo pesado e muito desconfortável de acompanhar.
Tudo em A Casa que Jack Construiu foi elaborado de forma minuciosa. A cenografia reforça as analogias entre os caminhos que Jack escolhe e as perturbações de mente a todo momento. A escolha da personalidade de suas vítimas, homens e mulheres (apesar de ele só lembrar das mulheres), também reforça o desprezo que tem por tudo o que não é como ele, um homem branco “altamente inteligente”, com o poder de Deus na capacidade de decidir sobre a vida e a morte de qualquer pessoa. Sua vontade se volta exclusivamente para seus projetos e idealizações pessoais; sua última réstia de amor é dedicada ao seu Paraíso perdido da infância.
Apesar do tom didático e até bem-humorado, A Casa que Jack Construiu é um filme difícil. Como numa epopeia regada a sangue, vísceras e corpos mutilados, Lars von Trier nos conduz pelos labirintos da mente de um serial killer para nos mostrar que, conforme as próprias palavras do diretor, “a vida pode ser má e sem alma”.
Esse diretor é um doente mental que deveria estar internado.
Quando vi o filme li uma crítica que tecia um paralelo entre a obra de Jack e a do próprio Von Trier. Chega a ser um pouco sórdido (e o filme nos coloca nesse lugar), mas realmente Jack acredita que está fazendo arte e que nunca será compreendido, um pouco como o próprio Von Trier.
Santo o Lars não é rssss e juro que pensei muitas vezes enquanto via o filme, que só um psicopata pra conseguir entrar tão bem na cabeça de outro.
Filme bem realista e impactante 😉✌️
Um dos melhores do Von trier
O filme é bem transparente nessa discussão. em uma das cenas, um policial barra dois caras (o mais visível dos dois caras é negro), por estarem caminhando proximo a uma propriedade privada a noite. enquanto o policial aborda os rapazes, que provavelmente não estão fazendo nada, o jack vai até a viatura do policial (que está a poucos metros com os dois rapazes) e prende o seio de uma mulher que ele acabou de arrancar com uma faca no parabrisa, e sai tranquilamente. Na mesma cena, o Jack começa a discorrer sobre o porque de ele, apesar de ja ter matado homens, preferir matar mulheres. Dá uma conferida, é muito interessante esse filme.
“homem branco”
“misógino”
Porra, não força a barra. O personagem é um psicopata, não tem absolutamente nada com a questão de ser homem branco.
Perfil da maioria absoluta dos Seriais Killers da vida real: homem e branco.
Concordo com seu comentário. Acho que o autor do texto forçou a barra mais uma vez
Como o João disse no comentário logo acima do seu, Fernando: o perfil da esmagadora maioria dos serial killers é de homens brancos. Seu negacionismo não vai mudar os fatos que estão sendo espelhados no filme.
Apesar de ser um FATO de que a mídia atual resolveu taxar o homem branco de “grande vilão” da humanidade (isso é escancarado em quase todo filme ou jogo atual). Eu devo ser obrigado á concordar com o pessoal aqui dos comentários de que realmente a grande maioria dos serial killers são homens brancos.