O Fantasma da Ópera
Original:The Phantom of the Opera
Ano:1925•País:EUA Direção:Rupert Julian, Lon Chaney, Ernst Laemmle, Edward Sedgwick Roteiro:Elliott J. Clawson, Bernard McConville, Frank M. McCormack, Tom Reed, Raymond L. Schrock, Richard Wallace, Jasper Spearing, Gaston Leroux Produção:Carl Laemmle Elenco:Lon Chaney, Mary Philbin, Norman Kerry, Arthur Edmund Carewe, Gibson Gowland, John St. Polis, Snitz Edwards, Mary Fabian, Virginia Pearson, Olive Ann Alcorn, Alexander Bevani, Ruth Clifford |
O Horror no Cinema Mudo foi basicamente moldado pelo expressionismo alemão em clássicos como O Golem (1920), O Gabinete do Dr. Caligari (1920) e Nosferatu (1922). Mas teve representantes em outras partes do mundo, como Suécia (A Carruagem Fantasma, 1921) e Estados Unidos da América (O Médico e o Monstro, 1920; O Corcunda de Notre Dame, 1923; e O Fantasma da Ópera, 1925). Estes dois últimos foram estrelados pelo “homem das mil faces” Lon Chaney, experiente na atuação e caracterização de personagens repugnantes e imponentes.
O Fantasma da Ópera é uma das produções mais bem realizadas do período, uma adaptação sombria e bastante fiel à obra de Gaston Leroux, lançada em 1910. Começou a ser desenvolvida em 1922, durante as férias em Paris do presidente da Universal Pictures Carl Laemmle. Em um encontro com o autor, expressando sua admiração pela Ópera de Paris, ele recebeu uma cópia da obra, devorou-a em uma noite, e já comprou os direitos para uma adaptação. Sem familiaridade com as locações, foi preciso fazer um estudo de cenário e também trabalhar a imaginação na composição, principalmente dos porões e adegas do Teatro Ópera. O roteiro, desenvolvido por Elliott J. Clawson e parceiros, atendeu às expectativas, mas também precisou de algumas alterações, ignorando o passado de Erik, que, em uma das versões, seria visto em flashback.
Além das dificuldades de adaptar a obra pela magnitude de seus cenários e o envolvimento de um grande número de atores e figurantes, o longa teve também problemas nos bastidores pela relação conturbada do elenco com o diretor Rupert Julian. Para muitos, como o próprio Chaney, ele não era muito bom na função e também nos diálogos – ironicamente -, o que gerou comando dos próprios atores em cena. Como disse o diretor de fotografia Charles Van Enger, Lon Chaney “fez o que quis“, uma vez que o ator não estava conversando diretamente com o cineasta, precisando de intermédio para saber como se posicionar na frente das câmeras.
As primeiras exibições-teste foram bem negativas, necessitando de algumas refilmagens e mudanças, principalmente no final. Muitas dessas alterações já não contavam com a presença de Rupert Julian, embora os créditos não apontassem para as conduções do próprio Lon Chaney, além de Ernst Laemmle e Edward Sedgwick, em refilmagens da versão sonora. A segunda exibição também foi muito mal recebida, com vaias de uma plateia incomodada pela mudança do tom de thriller dramático para uma comédia romântica com elementos de ação. Somente a terceira versão, exibida em setembro de 1925, com a inclusão de cenas já gravadas e alterações na parte final, que fez o filme finalmente ter seu lançamento oficial.
Toda essa bagunça de filmagens e refilmagens influenciaram na crítica na época. Houve elogios e também apontamentos negativos, seja pelas mudanças em relação ao texto original, ou na composição de uma história de horror grotesca. Esta se deve, claro, ao talento de Lon Chaney, com relatos da época que falam sobre gritos histéricos da plateia quando o personagem retira a sua máscara pela primeira vez. Embora fiel às descrições do texto original, a criação de um homem com aparência de esqueleto, a partir da maquiagem, fez pessoas desmaiarem nas primeiras sessões, até porque o cartaz de divulgação escondia a aparência do vilão fantasmagórico.
O longa começa na descrição do Teatro Ópera de Paris, um ambiente de estrutura grandiosa, onde estão sendo realizadas exibições da ópera Fausto, de Charles Gounod. Enquanto o espetáculo acontece, acompanhado da orquestra, com bailarinas flutuando em cena, nos bastidores o teatro era negociado com o alerta sobre algo além do contrato, uma entidade residente no Box 5. Os novos donos conversam com uma faxineira e depois visitam o tal local, encontrando uma figura de costas, causando arrepios e a dúvida sobre terem ou não visto alguém.
Quem também testemunha a aparição, denominada “sombra cinzenta” e “homem sem nariz“, são as bailarinas da apresentação, alimentando ainda mais teorias e lendas sobre um ocupante sobrenatural. “Seu rosto é como um pergaminho leproso, com a pele amarela presa firmemente sobre ossos salientes.“, diz um dos funcionários que reside nas adegas. Aproveitando de sua fama aterrorizante, o Fantasma, apaixonado por Christine Daaé (Mary Philbin), pressiona a cantora Carlotta (Mary Fabian), através de uma carta, a abandonar a apresentação, deixando o papel de “Marguerite” para sua amada para evitar “algo desastroso” em sua carreira.
Com o alerta incomodando o Conde Philippe de Chagny (John St. Polis), ele avisa ao irmão, Visconde Raoul (Norman Kerry), sobre a ameaça que vai além das apresentações, mas também em seu relacionamento com ela. Raoul pede que Christine abandone o show para casar-se com ela, mas, incentivada pelo que ela chama de “Espírito da Música“, o tal Fantasma parece encantá-la para que ela se torne uma estrela em Paris. Isso antes de mostrar sua verdadeira face. Com a insistência de Carlotta para assumir Marguerite, o Fantasma cumpre sua ameaça, derrubando um imenso lustre de cristal sobre algumas pessoas. Mas não será a única vítima do vilão sombrio.
O Fantasma da Ópera adquire aspectos aterrorizantes pela sua apresentação muda e as versões em preto e branco e em matizes – esta beneficia a experiência pela fotografia que destaca ambientações em vermelho, verde, amarelo e azul, com cada cor tendo uma relação com o que está sendo mostrado em cena. Nas tomadas inferiores, em que a câmera testemunha as adegas, a cor vermelha dá um tom infernal, enquanto a amarela é mais concentrada nos shows musicais, em tomadas abertas, na imagem de um enforcamento e na sequência em que Christine se vê “aprisionada” pelo Fantasma. Os encontros da protagonista com Raoul, tentando convencê-la a desistir da carreira artística, como na sequência no teto do teatro, são mostrados em um azul frio. Já o verde acompanha a busca pela desaparecida nos porões e passagens secretas.
Além do espetáculo de imagens e o som incidental, há alguns momentos que merecem destaque pela ousadia de sua realização assustadora. Um deles é o baile de máscara que causa espanto pela aparição de Erik com uma máscara de esqueleto e roupas vermelhas, como a morte rubra de Edgar Allan Poe. E o outro é a sequência em que o Fantasma conduz Christine até sua moradia em um barco, atravessando túneis escuros como Caronte, na condução pelas águas do rio Estige. Simbolismo e horror podem se misturar de maneira bem intensa, e, nesse ponto, O Fantasma da Ópera faz um trabalho magnífico de combinação poética apavorante.
Com a realização bem sucedida, a Universal Pictures pensava em realizar uma continuação intitulada O Retorno do Fantasma. Desistiu da ideia por não poder contar com Lon Chaney, em contrato com a MGM. Assim, optou pelos acréscimos sonoros a cargo do musicista Joseph Cherniavsky, e a refilmagem de algumas cenas. Alguns atores retornaram para as regravações, enquanto outros acabaram sendo substituídos, com a adição de George B. Williams, Phillips Smalley, Ray Holderness e Edward Davis. Sem o retorno de Chaney, o estúdio lançou nos cinemas a versão sonora em 15 de dezembro de 1929, tendo sido acompanhada por quem teve a sorte de vê-la, pois um incêndio, em 1948, fez com que ela fosse em parte destruída, contribuindo para a maldição que carrega a produção.
De todo modo, foi graças ao sucesso comercial de O Fantasma da Ópera que a Universal Pictures começou a desenvolver seus monstros. Drácula, a Criatura de Frankenstein, a Múmia, o Lobisomem, e outros filmes e personagens são frutos da ação aterrorizante de uma entidade física que habitava os lugares escuros da Ópera de Paris. O Fantasma retornaria ao estúdio em uma versão em 43, com Claude Rains no papel principal, sem a mesma caracterização grotesca de Chaney. Depois foi a vez da Hammer lançar seu exemplar em 1962, com Herbert Lom como o vilão sob a direção de Terence Fisher. Houve também uma versão para a TV, lançada em 1983, com Maximilian Schell, e uma estrelada por Robert Englund, em 1989, dirigida por Dwight H. Little. Outros filmes para a TV, uma minissérie, a contribuição de Dario Argento (Um Vulto na Escuridão) e o musical, lançado em 2004, com Gerard Butler pela condução de Joel Schumacher, completam as vezes em que a obra de Gaston Leroux ganhou vida em múltiplas formas, algumas deformadas e sutis, outras monstruosas e ousadas. De todas, Chaney ainda continua sendo o que melhor representou a obra como se deve, numa produção de horror atmosférica.