The Terror - 2ª Temporada
Original:The Terror - Season Two
Ano:2019•País:EUA Direção:Michael Lehmann, Frederick E.O. Toye, Josef Kubota Wladyka, Toa Fraser, Everardo Gout, Lily Mariye, Meera Menon Roteiro:Max Borenstein, Steven Hanna, Naomi Iizuka, Alexander Woo, Shannon Goss, Tony Tost, Alessandra DiMona, Benjamin Klein, Danielle Roderick Produção:Mitch Engel, Ridley Scott Elenco:Derek Mio, Kiki Sukezane, Cristina Rodlo, Shingo Usami, Naoko Mori, Miki Ishikawa, George Takei, Hira Ambrosino, Lee Shorten, Eiji Inoue, Alex Shimizu, C. Thomas Howell |
Não canso de repetir o quanto o contexto faz a diferença em qualquer obra, seja literária, cinematográfica e até em jogos. Quando a produção vai além de uma história de fantasmas para apresentar um período histórico importante e faz referência a acontecimentos, ela ganha notoriedade e relevância. Sustos contextualizados são bem mais eficientes do que exposições de monstros e assombrações, ainda que aterrorizantes. E a série The Terror se mostrou curiosa exatamente pelo seu pano de fundo, abrigando, na primeira temporada, o desaparecimento de embarcações de exploração sob o comando de Sir John Franklin, e, na segunda, o período da Segunda Guerra Mundial sob o prisma dos campos de concentração americanos. Mas os monstros estavam lá, seja um urso gigante conhecido como Tuunbaq; ou o folclore japonês do bakemono, assombração que assume formas. Ambas foram muito bem realizadas, com produção de Ridley Scott, bons efeitos especiais, direção acertada e um enredo envolto em calafrios.
Lançada em 2019, pelos showrunners Max Borenstein e Alexander Woo, a segunda temporada mostra um horror maior que o medo sobrenatural: o de ser considerado um inimigo dentro de seu próprio país. Os nipo-americanos que viviam tranquilamente em uma comunidade portuária acompanharam o momento em que os japoneses atacaram Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941, “uma data que viverá na infâmia“, como disse o presidente Franklin D. Roosevelt, dando início a uma batalha particular entre esses dois países durante a Segunda Guerra Mundial até culminar nas bombas nucleares americanas, no último suspiro do confronto. Tem inicio com o suicídio de Masayo (Yuki Morita) em uma doca em Terminal Island, alguns quilômetros ao sul de Los Angeles, com interferência sobrenatural.
Quando Chester Nakayama (Derek Mio) tenta tirar fotos da família no funeral da suicida, já nota borrões que dão indícios de que alguma coisa sinistra está nas proximidades. Trabalhando como pescador ao lado do pai Henry (Shingo Usami) e sua mãe imigrante Asako (Naoko Mori), Chester tem o sonho de uma união estável em outro lugar com sua namorada, a hispano-americana Luz Ojeda (Cristina Rodlo), grávida de seu primeiro filho. Com o ataque a Pearl Harbor, os nipo-americanos passaram a ser investigados como traidores, sendo mantidos em campos de concentração, sob vigilância militar constante. A mudança de ares é acompanhada por uma entidade vingativa, apresentada como Yuko Tanabe (Kiki Sukezane), alimentando crenças de que pode ser um bakemono.
Luz precisa esconder a natureza de seu filho, pelo preconceito que pende no local, enquanto Chester posteriormente é enviado para os campos de batalha em Guadalcanal como tradutor. Ao ajudar o Exército a encontrar um sargento desaparecido, Chester identifica um código secreto e influências de um fantasma, “Yurei” nas tradições japonesas. Assim, Yuko parece estar presente nos dois lugares, disfarçando-se de parteira para acompanhar o parto de Luz e até possuindo a enfermeira Hasegawa, sem deixar de fazer suas vítimas, com possessão e suicídio. A questão é tentar entender o que essa entidade quer, o que isso tem a ver com um episódio ocorrido no passado, quando a vilã vivia um relacionamento abusivo.
Aliás, é esse tipo de relação que também cria um terror particular com Amy Yoshida (Miki Ishikawa), contratada para trabalhar como secretária do Major Bowen (C. Thomas Howell, em ótima performance). Além da pressão psicológica pelas funções burocráticas e a necessidade de mostrar seu valor para americanos, ela tenta ajudar o namorado a não criar um grupo rebelde e seus esforços quase se mostram eficientes até uma ação desesperada do rapaz. Se já não bastassem a entidade vingativa e o abuso particular de alguém com estrelas na roupa, ainda existe a necessidade de resistir a uma época que tinha seus próprios monstros. Em dado momento, Asako mostra a Chester um pedaço de papel que tem a força para afastar espíritos, chamado “ofuda“. Ela diz que aquilo irá mantê-los seguros, tendo como resposta de Henry: “Pode nos proteger dos espíritos, mas não da maldade humana“.
E é esse o caráter aterrador de The Terror, nas duas temporadas. Vai além de seu conteúdo sobrenatural para se aprofundar nos medos que acompanham o Homem, com as criaturas servindo como símbolos da loucura e da pressão psicológica às quais todos estão sujeitos. As escolhas dos contextos foram primorosas para a construção de suas histórias sobrenaturais porque nada assombra mais do a sensação de claustrofobia e da solidão, de ameaça e terrorismo. Envoltos em metáforas, há corpos destruídos, monstros, evidências de body horror, o inferno da repetição, suicídio provocado, fantasmas e demônios, possessão, crenças e superstição. Com todas qualidades, no roteiro e direção, figurinos e ambientações, é de se estranhar que The Terror não tenha conquistado uma terceira temporada. Na verdade, havia já conversas a respeito em 2020, mas a pandemia influenciou no interesse de contar mais um conto de terror, até porque não seria possível competir com a realidade.