4.4
(7)

Rasen
Original:Rasen
Ano:1998•País:Japão
Direção:Jôji Iida
Roteiro:Jôji Iida, Kôji Suzuki
Produção:Takashige Ichise, Shin'ya Kawai, Takenori Sentô
Elenco:Kôichi Satô, Miki Nakatani, Hinako Saeki, Shingo Tsurumi, Shigemitsu Ogi, Yutaka Matsushige, Daisuke Ban, Naoaki Manabe, Naoto Adachi, Eri Kakurai

Quem frequentou os cinemas japoneses em 31 de janeiro de 1998 teve a oportunidade de fazer uma dobradinha inédita: Ring: O Chamado e Ring Espiral estrearam ao mesmo tempo. Foi uma estratégia de seus realizadores de dobrar a bilheteria, pelo fato de que a trama de Ring já era conhecida pelo sucesso da obra literária de Koji Suzuki, lançada em 1991, e também pelo telefilme de 1995, Ring: Kanzenban. O resultado passou longe de ser aceitável: Ring: O Chamado fez um tremendo sucesso, enquanto Espiral foi praticamente ignorado. E o curioso é que essa primeira continuação é uma adaptação considerada fiel do segundo livro do autor, “Spiral“, que chegou às livrarias em 1995. Com o fracasso, viria então a ideia de fazer uma nova parte 2, deixando de lado os acontecimentos de Ring Espiral e resgatando os envolvidos no roteiro e direção do primeiro.

Talvez esse seja o primeiro dos erros dessa aposta. Ringu teve a direção de Hideo Nakata, a partir de um roteiro de Hiroshi Takahashi. Como havia a intenção de produzir uma continuação ao mesmo tempo do original, Espiral teve o comando e roteiro de Jôji Iida. Embora traga retornos do elenco, parece que os envolvidos com Ring: O Chamado e Ring Espiral não se encontraram para alinhar as pontas. Iida deve ter apenas recebido como orientação a leitura da segunda obra, sem resgatar a atmosfera aterrorizante que a maldição de Sadako havia proposto, e ainda deu um rosto à garota dita no primeiro como algo não-humano. Mas, é provável que o texto original também tenha contribuído para o desgosto pela produção.

O filme começa exatamente onde o anterior terminou, com a morte de Ryūji Takayama (Hiroyuki Sanada) no encontro com Sadako em seu apartamento. O corpo do rapaz é levado ao necrotério para a realização de uma autópsia, sob o comando de seu amigo da época da faculdade, o patologista Mitsuo Andō (Kôichi Satô), que, momentos antes, planejava se matar devido ao sofrimento pela perda do filho. No processo, Andō identifica um estranho tumor na garganta do cadáver, além de uma mensagem em código em seu estômago – provável inspiração para o começo de Jogos Mortais 4. Ele ainda é atormentado por uma visão do fantasma de Ryūji, algo que irá ocorrer novamente mais tarde e se trata de uma das poucas boas ideias dessa continuação.

As investigações determinam um reencontro de Ryūji com sua ex-esposa Reiko Asakawa (Nanako Matsushima), e que ambos estariam buscando informações sobre uma fita de vídeo maldita. Reiko teria sido vista saindo do apartamento do ex momentos antes de ele ser encontrado morto pela namorada Mai Takano (Miki Nakatani). Tanto Reiko quanto o pequeno Yôichi (Rikiya Ôtaka) estariam desaparecidos desde então. Para quem não se lembra, após descobrir que um jeito de evitar a maldição de Sadako seria fazer uma cópia da fita de vídeo, Reiko terminou o filme partindo para a casa de seu pai, com a intenção de copiar o filme com o filho.

Não demora muito para a polícia encontrar os corpos de Reiko e Yôichi em um veículo destruído. Tudo indica que Yôichi já estaria morto, quando a mãe perdera o controle do veículo. Não teriam conseguido fazer a cópia ou Sadako tem outros planos? A morte da protagonista do filme anterior foi provavelmente um dos maiores erros de Ring Espiral. Quando Andō finalmente se convence da maldição, ele resolve então assistir à fita, sem receber qualquer telefonema, apenas a visita imediata de uma Sadako completamente nua sobre seu corpo, lambendo seu pescoço. Em Ring: O Chamado, Sadako foi interpretada por Rie Ino’o, sem sequer mostrar seu rosto, apenas o olhar monstruoso por baixo dos cabelos longos. Como havia a necessidade dessa sedução da assombração, a atriz foi substituída pela expressiva Hinako Saeki, que tem um rosto comum e ainda faz caras e bocas para demonstrar sua maldade. Péssima ideia!

Aproximando-se de Mai, até de forma mais íntima, Andô descobre com o seu chefe Yoshino (Yutaka Matsushige) o diário de Reiko, com relatos sobre todo o processo de pesquisa de Sadako, sua mãe poderosa e os acontecimentos do primeiro filme. Como o patologista já pensava em se matar no começo, ele tem a ideia – por fim, uma boa do filme – de destruir todas as cópias para encerrar com sua morte a maldição. O problema é que pessoas que não estão assistindo à fita mas tiveram contato com os escritos do diário estão morrendo com sintomas que afetam principalmente o pescoço – o tal tumor identificado no corpo de Ryūji, mas com uma mutação viral. Isto é, esqueça a ideia perturbadora das pessoas estarem morrendo de medo após confrontarem o olhar aterrorizante de Sadako!

Sem assombração ou sensação incômoda de ameaça, Espiral ainda reserva outras ideias horrendas como possessão, renascimento de Sadako no corpo de Mai, a volta de Ryūji e um momento piegas na sequência final na praia. Há uma nítida desconstrução do que fora feito de melhor em Ring: O Chamado, incluindo, claro, a própria entidade. Se no primeiro ela era vista como um fantasma perturbado, um exemplar dos “yurei“, neste é apenas uma vilã, um espírito vingativo na busca por seu retorno. Com a exploração sobre seu passado, mais detalhes são apresentados, sendo que boa parte de sua condição assustadora era sua concepção enigmática.

Outro ponto que incomoda é a relação conflitante entre ciência e misticismo. No primeiro, Ryūji, Masako (Shizuko Yamamura), Sadako e Yôichi tinham visões e evidências de poderes paranormais; neste, Mai se revela com tais características. Ao mesmo tempo, o vírus que está ocasionando as mortes tem semelhanças com o da varíola e da tuberculose, e está relacionado a um ambiente do passado. Assim há de tudo ali: marcas no pescoço das vítimas, escritos macabros, uma tosse incômoda antecipando a morte e uma assombração que já não se sabe se aparece antes da pessoa morrer. E os sete dias entre ver a fita e a morte? E o telefonema?

Nakata e Iida não possuem a mesma capacidade técnica. O primeiro já entendia que estava trabalhando em um longa de horror, e acrescentava elementos para perturbar o espectador enquanto propunha um jogo de investigação. Iida apresenta um drama sobre perdas, tem toques de romance e sexo, muitas das vezes acompanhados da trilha incidental insegura de La Finca. A maldição de Sadako perdeu toda a força em Espiral, a aposta da Toho em seu lançamento duplo. Não tinha mesmo como dar certo.

Lançado nos EUA com o título “Rasen“, uma transliteração do japonês, Ring Espiral foi feito para ser esquecido mesmo. Não funciona como continuação e nem como produção de terror. Descaracteriza o que há de melhor na concepção de Sadako pela necessidade de não repetir elementos, ainda que estes tenham feito sucesso no original. É a prova que mudar muito pode levar o trabalho a um espiral de desastre e esquecimento.

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