![]() Dias Perfeitos
Original:Dias Perfeitos Ano:2025•País:Brasil Autor:Raphael Montes•Editora: Companhia das Letras |
A procura pelo par perfeito é quase uma obsessão das pessoas desde os tempos antigos. Muitos querem viver um amor arrebatador, encontrar a alma gêmea, ter um amor à primeira vista, e acreditam que precisam disso para se sentirem verdadeiramente completos. Querem a sorte de um amor tranquilo – já dizia Cazuza -, seguro, estável. Em Dias Perfeitos, escrito por Raphael Montes, definitivamente o amor não vai ser nada tranquilo, e vai passar longe de ser seguro.
Téo é um estudante de medicina que, desde o começo, deixa claro que é emocionalmente frio. Mostra gostar e zelar pela mãe, que é paraplégica, apenas por saber que esse é o certo, mas não sente amor verdadeiro por ela e nem por ninguém da família. É cordial com os colegas, mas não gosta verdadeiramente de nenhum. Sua única amiga que parece genuinamente gostar é Gertrudes, que é um cadáver da aula de anatomia. Durante um churrasco no qual foi para acompanhar a mãe, é abordado por Clarice, uma mulher de espírito livre, extrovertida e impulsiva. Daquele dia em diante não para de pensar nela, e acredita que finalmente se apaixonou por alguém, finalmente encontrou o amor que o fará se sentir completo. Téo começa a seguir os passos de Clarice na faculdade, no parque, no bar, chegando a segui-la até a própria casa. O jovem decide que ele é a melhor coisa que poderia ter acontecido na vida de Clarice e, após alguns acontecimentos intensos, decide sequestrá-la para mostrar o quanto ele e ela são feitos um para o outro. Uma bela história de amor e horror.
Os acontecimentos são narrados pela perspectiva de Téo, que acredita piamente estar vivendo uma história de amor com a mulher de sua vida, enquanto Clarice passa horrores absurdos sendo mantida presa, amarrada e sedada, sendo obrigada a fazer as vontades de seu captor em prol da sobrevivência.
Com uma linguagem direta, Raphael Montes descreve cenas e momentos perturbadores com naturalidade, como se Téo estivesse apenas sendo prudente – que é no que nosso protagonista de fato acredita. A lógica distorcida dele é desesperadora e inquietante, nos deixando colados nas páginas do livro para saber o que vem a seguir, ao mesmo tempo que causa repulsa. Uma cena em específico é tão pesada e gráfica que o choque do que foi feito nos faz fechar o livro para tomar fôlego antes de continuar.
Ao longo do livro, acompanhamos o declínio mental tanto de Téo quanto de Clarice. As atrocidades dele vão escalonando conforme ele fica mais e mais apegado à moça, e a negação de sua vítima em aceitá-lo como o homem dos sonhos, que antes era compreendida, passa a ser punida com extrema crueldade. Enquanto vítima, Clarice tenta a todo custo conseguir uma brecha para escapar dessa loucura, muitas vezes de forma inteligente e desafiando o papel de vítima. Sua natureza livre e seu jeito espontâneo é quebrado aos poucos, a ponto de sobrar apenas uma casca vazia, e são nesses momentos que Téo acredita que ela enfim se apaixonou por ele também, incapaz de ver a verdade. Constantemente somos expostos, de uma forma extremamente clara e cruel, da diferença entre desejo e controle, de amor e obsessão.
Esse seria um ótimo thriller psicológico, ideal para quem gosta de histórias pesadas e sabe que Raphael Montes não pega leve com palavras e descrições, se não fossem pelos capítulos finais. Nessa edição comemorativa de 10 anos da publicação de Dias Perfeitos temos o final original, que foi publicado em 2014, e um segundo final que passou pela cabeça de Montes, mas nunca havia sido publicado até então. O primeiro final – o original, e favorito do autor – é revoltante de diversas formas. Provavelmente seu objetivo era causar esse tipo de reação nos leitores, de inconformidade, mas a sensação que fica é que toda a violência descrita foi gratuita, que ficou faltando algo, que há algo de muito errado devido aos furos presentes. O segundo final, presente nessa edição após o final original, é bem mais coerente com toda a trajetória do personagem, e mais interessante.
Dias Perfeitos é uma história de horror disfarçada de romance sobre obsessão e controle, tenso e incômodo do começo ao fim. Definitivamente não é uma obra para pessoas sensíveis.
Em 2025 Dias Perfeitos foi adaptado para minissérie pela Globoplay e conta com Jaffar Bambirra, Julia Dalavia e Débora Bloch no elenco.























