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Provavelmente não passou pela cabeça do irlandês Bram Stoker que o seu Drácula influenciaria tanto e por tanto tempo a cultura e o comportamento dos jovens ao redor do mundo. Stoker não inventou o mito do vampirismo, até por que mito não se inventa. Mas o seu misterioso personagem serviria de inspiração para o cinema, que acabaria desconstruindo, reinventando e popularizando a imagem do vampiro, chegando até aquela que conhecemos hoje.

Vampiros Mudos e em Preto e Branco

Nosferatu (1922) (2)

Curiosamente, a primeira adaptação de Drácula para os cinemas foi uma versão não autorizada. O cineasta alemão F. W. Murnau não conseguiu entrar em acordo com a família Stoker quanto aos direitos autorais, mas isso não o impediu de lançar em 1922 Nosferatu – Uma Sinfonia do Horror. Bastaram algumas alterações, Conde Drácula transformou-se em Conde Orlok e a Inglaterra de 1897 transportou-se para a Bremem alemã de 1938. Entre as sombras e as luzes do expressionismo alemão surgia o primeiro grande vampiro do cinema, interpretado pelo ator Max Schreck. Até hoje, esta versão não oficial e muda de Drácula é considerada uma das mais assustadoras, principalmente pelo visual nada sedutor do Conde: careca, corcunda, com as orelhas e os dentes pontiagudos. Uma diferença interessante entre a concepção visual do vampiro de Murnau e a imagem clássica do personagem são exatamente os dentes. Em vez de caninos, o Conde Orlok apresenta os incisivos salientes. O vampiro, em Nosferatu, é a fiel representação do horror, materializada numa criatura de aparência abominável e sedenta de sangue.

Drácula (1931) (6)

Oito anos depois, já em solo americano, a Universal Pictures daria voz a Drácula e viria
a rodar o mais importante filme sobre vampiros já realizado. Esta voz traria o sotaque refinado e aristocrático do ator húngaro Bela Lugosi, que já interpretava o personagem num espetáculo em cartaz na Broadway havia alguns anos. Nascia neste momento o vampiro do modo romântico como seria eternizado pelos cinemas: educado, inteligente e sedutor. A figura do Drácula com sua elegante capa preta, os caninos protuberantes e o olhar perturbador, tornaria referência obrigatória para o gênero, influenciando todas as futuras adaptações do livro de Bram Stoker. O sucesso, de público e de crítica, e a exposição de Bela Lugosi nas várias continuações rodadas pela própria Universal transformaram o ator no primeiro grande ícone do cinema de horror. Associado à imagem do vampiro, personagem e intérprete se fundiram, criando um vínculo confuso que acompanhou a carreira do ator até a sua morte em 1956.

A Universal ficou conhecida por, após o êxito de bilheteria de Drácula, adaptar todos os chamados monstros clássicos, como o monstro de Frankenstein, A Múmia, O Lobisomem, O Homem Invisível e O Fantasma da Ópera. Pela primeira vez o gênero fantástico entrava em evidência, tornando-se extremante popular e imortalizando outros nomes, como os dos atores Boris Karloff e Lon Chaney Jr., que juntavam-se a Bela Lugosi no hall dos primeiros ídolos americanos do cinema de horror.

A Casa de Drácula (1945)

No entanto, a Universal acabou explorando a exaustão o personagem criado por Bram Stoker. Continuações de qualidade duvidosa, inserindo filhos, filhas e noivas para Drácula e ainda crossovers como A Casa de Drácula, onde o Conde contracena com o Monstro de Frankenstein e o Lobisomem, acabaram desgastando a imagem do vampiro diante o público, que já não levava a sério as produções do estúdio. Uma última reunião dos monstros clássicos aconteceria na comédia que se tornaria o símbolo da decadência do gênero dentro do estúdio, a paródia caça-níqueis Abbott e Costello encontram Frankenstein (1948).

Os Vampiros em Cores da Hammer

Em 1958, a produtora inglesa Hammer adquiriu os direitos para filmagens de Drácula e dos outros célebres personagens de horror da Universal.

O primeiro grande trunfo do estúdio era uma inovação recém criada chamada technicolor. Finalmente o público veria o vermelho extravagante do sangue das pobres vítimas de Drácula. Procurando atrair ainda mais o público masculino, a Hammer não pensou duas vezes e aumentou as doses de erotismo e sensualidade, inserindo lindas mulheres em decotes quase sempre generosos.

O Sangue de Drácula (1970)

Outra vantagem do estúdio britânico era poder contar com a paisagem do velho mundo como cenário. Enquanto os americanos utilizavam cenários artificiais, a Hammer abusava das tomadas externas, mostrando castelos verdadeiros e belas florestas naturais.

Assim como a Universal projetou os astros Bela Lugosi e Boris Karloff, a Hammer imortalizou os atores Christopher Lee como Conde Drácula e Peter Cushing como o caçador de vampiros Dr. Van Helsing. Grande parte do sucesso do novo ciclo de Dráculas do estúdio inglês deve-se a atuação marcante e enigmática de Lee.

O Conde Drácula (1970)

Dentre uma dezena de produções vampíricas, quatro se destacam por marcarem um novo começo para a mitologia do personagem: O Vampiro da Noite (Horror of Dracula, 1958), Drácula – O Príncipe das Trevas (Dracula – Prince of Darkness, 1966), Drácula – O Perfil Do Diabo (Dracula Has Risen From the Grave, 1968) e O Conde Drácula (Scars of Dracula, 1970).

Mas nem só de Drácula sobreviveram os vampiros da Hammer. O estúdio resolveu adaptar o escritor que segundo os especialistas é a maior influência literária de Bram Stoker, o também irlandês Sheridan LeFanu. Foram três filmes de erotismo ainda mais acentuado, que ficaram conhecidos como a Trilogia Karnstein: Carmilla, a Vampira de Karnstein (The Vampire Lovers, 1970), Luxúria de Vampiros (Lust For a Vampire, 71) e As Filhas de Drácula (Twins of Evil, 71).

Carmilla (1970) (1)

Eu Era Um Vampiro Adolescente

Anos 80. Foram-se os hippies. Foi-se a disco music. Foram-se os hormônios a flor da pele dos vampiros da Hammer. O mundo se renova. O cinema entra na era dos efeitos especiais e dos blockbusters. Chega a hora do cinema romper com o personagem de Bram Stoker e criar novos vampiros. Esqueça o passado e o romantismo. Os vampiros vivem no presente. Em vez de castelos, as criaturas estão nas grandes cidades. Podem ser seu vizinho. Em vez de música clássica, a trilha sonora agora é rock and roll. Os vampiros são jovens e bem-humorados.

A Hora do Espanto (1985) (2)

Três filmes são emblemáticos desta fase, que alguns chamam de terrir: A Hora do Espanto (Fright Night, 1985), Garotos Perdidos (Lost Boys, 1987) e Deu a Louca Nos Monstros (Monster Squad, 1987).

Vampiros em Crise

Ainda na década de oitenta surge um novo tipo de personagem no cinema: o vampiro atormentado. É o vampiro reflexo do homem moderno: inacabado, repleto de dúvidas e muitas vezes deprimido. Um dos primeiros exemplares desta nova categoria aparece numa produção de 1987, dirigida por uma mulher, a cineasta californiana Kathryn Bigelow. Em síntese Quando Chega a Escuridão é um road movie que narra a história de amor dramática entre uma vampira e um rapaz do interior. Outro bom exemplo de vampiros depressivos é a ótima adaptação do romance de Anne Rice, Entrevista Com Vampiro (Interview witth a Vampire, 1994). Em tom introspectivo e melancólico, o vampiro Louis (interpretado pelo galã Brad Pitt) conta para um jornalista todas as suas desventuras, desde que foi mordido, 200 anos antes.

Deixa Ela Entrar (2008) (2)

Uma produção recente que merece destaque é o sutil Deixe Ela Entrar (Låt Den Rätte Komma In, 2008). Esta excelente produção sueca conta o drama da delicada amizade entre dois adolescentes: Oskar, um garoto solitário e esquisito que é frequentemente humilhado na escola e Eli, uma vampira que vive os seus eternos 12 anos de idade.

Retorno aos Clássicos

Com Drácula, de Bram Stoker (1992), o cineasta Francis Ford Coppola presta uma grande homenagem ao personagem, rodando um filme cujo roteiro tenta ser fiel ao livro e o visual (cenário, efeitos e cores) se assemelha ao das produções antigas. Seguindo esta mesma perspectiva, é lançado dois anos depois Frankenstein, de Mary Shelley, dirigido pelo britânico Kenneth Branagh (1994).

Drácula (1992) (4)

Em 2000, é a vez de Nosferatu ser homenageado com A Sombra do Vampiro. Misturando personagens reais e ficção, o filme mostra o set de filmagens da produção de 1922 sendo aterrorizado por um vampiro de verdade. A criatura seria o próprio o ator Max Schreck, interpretado brilhantemente por Willian Dafoe.

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