Seoul Station (2016)

4.8
(5)

Seoul Station
Original:Seoulyeok
Ano:2016•País:Coreia do Sul
Direção:Sang-ho Yeon
Roteiro:Sang-ho Yeon
Produção:Dong-Ha Lee, Youngjoo Suh, Sang-ho Yeon
Elenco:Seung-ryong Ryu, Franciska Friede, Joon Lee, Sang-hee Lee, Eun-kyung Shim

Desde a época em que os mortos saíram de suas tumbas e passaram a se interessar pela carne dos vivos, poucos exemplares souberam fazer jus a essa gênese. Depois da trilogia dos mortos (ampliada, mas sem a mesma intensidade), do ciclo italiano de zumbis, dos mortos-cegos espanhóis e de outros achados isolados, nota-se que a qualidade foi perdendo força com o avanço dos anos. Os infectados da franquia Extermínio e do primeiro [Rec], a sátira Todo Mundo Quase Morto, o remake Madrugada dos Mortos e Doghouse podem ser considerados exceções em um inferno de repetições e desgastes. Quando parecia não haver mais motivos para eles andarem entre nós – talvez a série The Walking Dead em algumas temporadas possa suprir essa vontade -, eis que um exemplar sul-coreano traz uma injeção de adrenalina no estilo, promovendo não apenas um filme divertido, mas aterrorizante e emocionante.

Invasão Zumbi (título comum demais para o marcante Train to Busan) foi, sem dúvidas, um dos melhores trabalhos desse subgênero nos últimos anos. Lançado em 2016 – e foi apontado como um dos melhores filmes de terror desse ano -, o longa trazia a jornada do pai ausente Seok-woo (Yoo Gong) para levar sua filha, a graciosa Soo-an (Su-an Kim), para encontrar a mãe em uma outra cidade, exigindo uma longa viagem a bordo de um trem. O que parecia ser uma missão desnecessária para um homem de negócios ocupado acaba se tornando uma possibilidade de descoberta dos encantos de sua pequena, quando um vírus atinge o país e uma jovem infectada ataca os passageiros, transformando-os em criaturas animalescas, contorcionistas e canibais. Um grupo de sobreviventes tenta encontrar um local seguro em alguma estação, enquanto a claustrofobia e o egocentrismo passam a acompanhá-lo nesse longo pesadelo de sangue e perdas.

Com cenas sangrentas de luta e distração dos mortos-vivos – a melhor acontece quando eles precisam atravessar um bagageiro -, Seok percebe que precisará mais do que força e inteligência para levar sua filha com segurança. Destaca-se entre os que resistem uma grávida e seu marido, um jovem esportista e duas irmãs senhoras, separadas por cabines distantes, além daquele que só se irá se importar com seu umbigo e trará complicações até o último minuto. Um filmaço de zumbis, disponível na Netflix, com quase duas horas de duração, mas que valem cada minuto. O que algumas pessoas não sabem é que meses antes de chegar aos cinemas na Coreia do Sul, foi realizada uma animação-prelúdio, trazendo fatos anteriores aos narrados em Invasão Zumbi – além, é claro, da continuação, um tema a ser abordado em outra resenha.

Com exceção dos zumbis e do cenário apocalíptico, Seol Station não tem quase relação com Invasão Zumbi. Não há personagens que se cruzam, nem menção a Busan e ao trem, ou até mesmo cenário identificado nas duas produções – apenas a tal biotech, responsável por espalhar o vírus é um ponto em comum. A própria movimentação dos infectados não segue o estilo “quebra as costas” do outro trabalho de Sang-ho Yeon, embora exista a carga emocional e a relação família. Ainda perde pontos pela ausência da atmosfera claustrofóbica do anterior, e sem personagens que possam permitir a empatia do infernauta. Contudo, é uma boa animação, divertida e com algumas cenas sangrentas e interessantes, com um humor sutil e boas doses de violência.

Com sérias dificuldades financeiras, o casal Ki-woong (Joon Lee) e Hye-sun (Franciska Friede) tem encontrado meios alternativos para conseguir dinheiro, como o de prostituir indiretamente a garota, aplicando golpes pela internet. E o curioso é que o rapaz, ao invés de utilizar os ganhos para pagar o aluguel, é viciado em videogame e dispõe de seu tempo em um cybercafé, apenas interrompendo a diversão para promover a namorada. Ele faz isso, desde que a encontrou na rua, quando ela aparentemente fugiu de casa e não tinha para onde ir. Quando a jovem se cansa desse trabalho ingrato, eles se separam, exatamente quando uma praga começa a se espalhar pelas ruas.

Sem explicar como, já na primeira cena da animação, um velho andarilho caminha com um ferimento de mordida no pescoço e se deita à porta da estação Seoul. Seu irmão preocupado busca ajuda nos arredores, mas, quando não é desacreditado, o senhor, aparentemente morto, já não está mais no local. Iniciando pelos sem-teto, logo o vírus começa a se espalhar e a transformar as pessoas em mortos, ávidos por carne humana. Enquanto a doença se espalha, um outro personagem é apresentado: Suk-kyu, ao ver o anúncio de acompanhante de Hye-sun, entra em desespero para encontrar sua filha. Ele se une a Ki-woong nessa jornada pelas ruas e estações, ao passo que a jovem tenta sobreviver com o apoio de um outro andarilho.

A base do enredo é essa tentativa de reunião de pai e filha. E essa narrativa alternada funciona bem, seja na intensa sequência em que a garota fica presa numa cela com policiais e um homem mordido ou tem que atravessar uma rua pendurada nos fios elétricos, ou nas andanças dos rapazes na descida por prédios e com o carro. Além dessa aventura cheia de possibilidades numa cidade dominada por mortos, há também evidentes críticas sociais ao modo como os mendigos e sem-tetos são tratados na região, inclusive ao criar uma confusão sobre estarem ou não infectados, e também mostra o modo agressivo da polícia na tentativa de isolamento, independente se existem sobreviventes em uma certa região. Por fim, Seoul Station reserva um “plot twist” muito bem orquestrado e ousado no ato final, com toques de pessimismo, que conduz a produção a um tenso thriller.

Embora inferior ao live action mas melhor que muitos filmes de zumbis, Seoul Station também diverte e honra o subgênero. Uma animação adulta, bem desenvolvida tecnicamente, e que merecia um lugar de destaque ao lado de seu parente mais conhecido.

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Marcelo Milici

Professor e crítico de cinema há vinte anos, fundou o site Boca do Inferno, uma das principais referências do gênero fantástico no Brasil. Foi colunista do site Omelete, articulista da revista Amazing e jurado dos festivais Cinefantasy, Espantomania, SP Terror e do sarau da Casa das Rosas. Possui publicações em diversas antologias como “Terra Morta”, Arquivos do Mal”, “Galáxias Ocultas”, “A Hora Morta” e “Insanidade”, além de composições poéticas no livro “A Sociedade dos Poetas Vivos”. É um dos autores da enciclopédia “Medo de Palhaço”, lançado pela editora Évora.

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