Rua do Medo: 1994 - Parte 1
Original:Fear Street
Ano:2021•País:EUA Direção:Leigh Janiak Roteiro:Kyle Killen, Phil Graziadei, Leigh Janiak, R.L. Stine Produção:Peter Chernin, David Ready, Jenno Topping Elenco:Maya Hawke, Charlene Amoia, David W. Thompson, Noah Bain Garret, Darrell Britt-Gibson, Ashley Zukerman, Kiana Madeira, Jana Allen, Benjamin Flores Jr., Julia Rehwald, Fred Hechinger |
Séries de livros infanto-juvenis de terror fazem muito sucesso, principalmente lá fora. Isso se explica porque o medo se configura na tenra idade, quando, no propósito errôneo de evitar que uma criança saia da cama durante a madrugada, os pais dizem que há um bicho-papão embaixo dela, à espreita de pequenos pés descuidados. E se você perguntar para os fãs do gênero, irá descobrir relatos que passeiam por acontecimentos oriundos de dez, vinte e até trinta anos antes. A própria gênese do Boca do Inferno envolve a curiosidade pelo inexplicável, pelo além-túmulo, por monstros que se escondem em armários e causos ocorridos com parentes e conhecidos. Esse terror, que nasce muitas vezes prematuro, começa a ganhar forma e se estabelecer nas preferências, embora possa se dizer que essa ânsia pelo sobrenatural exista em qualquer pessoa – um tema para longas e oportunas discussões.
Dentre os autores de renome com a especialidade no susto para crianças, destaca-se o de R.L. Stine. Nascido em Columbus, Ohio, nos EUA, em 1943, ele tem alimentado a literatura assombrosa com diversas publicações, além de duas séries bem conhecidas: Goosebumps e Fear Street. Esta última, com mais de cinquenta livros, é a inspiração para a trilogia Rua do Medo, que teve a estreia de seu primeiro filme na Netflix no dia 2 de julho e deve permanecer entre os assuntos mais falados pelas próximas duas semanas. Apesar da experiência com o público juvenil, o próprio Stine sentiu o amadurecimento de seus leitores no próprio interesse por novos livros desse mesmo universo, o que o levou a apresentar enredos mais sangrentos, histórias que condenam seus personagens a um ambiente além da escola. E é esse conflito de idades e gerações que se tornou o principal motor propulsor dessa adaptação seriada.
É claro que a primeira associação do infernauta será com o popular Stranger Things. Jovens enfrentando vilões sobrenaturais, com a presença quase nula de adultos, enquanto se relacionam, trocam intimidades e encontram motivos para fazer piadas diante de ameaças reais. Provavelmente foi o que sugeriu os produtores da Chernin Entertainment e da 20th Century Studios (antiga 20th Century Fox antes de ser comprada pela Disney), quando deram luz verde ao projeto. Imagina-se alguns engravatados em uma reunião em que dois nomes foram mencionados como espelho da adaptação: a já mencionada série com criaturas de uma dimensão paralela e It – A Coisa. Comparações são inevitáveis, assim como associar o ritmo brando à franquia Goosebumps, mesmo que o humor desta seja ainda mais elevado. Embora os planos iniciais tenham sido levar os filmes aos cinemas, devido à pandemia e com o acordo estabelecido, a Chernin Entertainment vendeu os direitos para a Netflix em agosto de 2020, até que o lançamento fosse determinado para o mês de julho deste ano, aproveitando o verão americano.
Com a estreia do primeiro – e hoje do segundo filme -, talvez a principal dúvida dos infernautas esteja nessas relações com produtos já conhecidos. Será que aqueles que não viram graça em Stranger Things e torceram o nariz para a adaptação de Stephen King irão encontrar motivos para se empolgar com Rua do Medo, ainda mais sabendo que a associação a essas obras se torna inevitável quando o próprio roteiro, de Phil Graziadei e da também diretora Leigh Janiak, faz questão, de certa forma, de homenageá-las? A resposta a essa dúvida talvez esteja na chance que deve ser dada a novos produtos, sempre na expectativa de encontrar algo interessante e divertido. E nesse ponto, se excluir alguns problemas de ordem ironicamente cronológica, vale a recomendação como uma série que ousa levemente e proporciona alguns momentos de tensão em seus exagerados sustos.
Com diversas homenagens ao primeiro filme da franquia Pânico (posicionamento de câmera, aparição do faxineiro, sequência slow motion de golpes e até identidade do vilão), o filme começa com uma cena de assassinato. Heather (Maya Hawke, de – pasmem! – Stranger Things) trabalha como atendente na livraria de um shopping até ser perseguida por um assassino mascarado, que se revela como seu namorado Ryan (David W. Thompson, de Sala Verde, 2015) antes de levar um tiro na testa na ação do policial Nick Goode (Ashley Zukerman). Nos créditos iniciais, o espectador fica sabendo que o local, a cidade de Shadyside, tal qual Woodsboro em Pânico, é conhecido como “a cidade dos assassinatos“, devido a episódios que envolvem matanças em diversas épocas, principalmente em um acampamento em 1978, numa relação direta com a condenação à morte da bruxa Sarah Fier, em 1666, que teria amaldiçoado os habitantes.
A morte de Heather causa uma comoção na cidade e na vizinha e rival, Sunnyvale, com quem compete no futebol, mas não impressiona a jovem Deena (Kiana Madeira), que não acredita na bruxa. Ela tem apoio dos amigos Kate (Julia Rehwald) e Simon (Fred Hechinger), enquanto lamenta o relacionamento conturbado com Samantha (Olivia Scott Welch), que teve se mudar para a cidade vizinha, devido à mãe não aceitar o namoro. Durante o retorno de uma partida que promoveu o encontro de torcedores das duas cidades para uma vigília, Deena é aterrorizada por uma visão da bruxa, com o sangramento do nariz, e causa um acidente com um veículo de Sunnyvale que trazia Sam. A partir de então, os jovens passam a ser perseguidos pelos assassinos que cometeram massacres no passado, como o recente Ryan, precisando descobrir um meio de evitar uma nova tragédia, com o apoio do irmão de Deena, o aficionado pela história dos crimes e fã de chats, Josh (Benjamin Flores Jr.).
Enquanto se envolve nos mistérios e na luta pela sobrevivência dos jovens, o espectador é bombardeado por inúmeros sustos falsos – qualquer encontrão eleva o som – e por uma ótima trilha sonora, com clássicos que fizeram sucesso nos anos 90, tocados de maneira pincelada, embora tenham sido lançados depois de 1994, como é o caso de “Only Happy When It Rains“, do Garbage, e até mesmo de “More Human than Human“, do White Zombie. Mas essa não é a única anacronia: os próprios slashers tiveram seu ápice nos anos 80 e só voltaram a fazer sucesso com a franquia Pânico, iniciada em 1996. Além disso, é de se lamentar que o filme não tenha utilizado outras referências a 1994, como brinquedos, artistas da época, disc-man e filmes em VHS, como fizera Stranger Things. A piada, com a internet paga, teria uma graça maior se o longa fosse ambientado no Brasil, na época da sofrida conexão discada.
Excluindo as homenagens ao período, resta ao público conferir um slasher light, preocupado com a sobrevida de personagens estereotipados, mas que pode divertir, dependendo do que se espera. Bem dirigido e bem-humorado, o filme inicial deixa muitas pontas soltas, mas que devem ser respondidas nos longas seguintes na conclusão de um ciclo de violência e morte em várias épocas. A proposta entretém, ainda que não assuste ou cause medo, e deixa boas expectativas para os próximos episódios desse novo endereço do terror.
Gostei do começo,mais esse lance da Bruxa, não gostei
Preferia que fosse focado só em serial killers apenas