Círculo Vicioso
Original:Vicious Fun
Ano:2020•País:Canadá Direção:Cody Calahan Roteiro:Cody Calahan, James Villeneuv Produção:Chad Archibald, Cody Calahan Elenco:Evan Marsh, Amber Goldfarb, Ari Millen, Julian Richings, Robert Maillet, Sean Baek, David Koechner, Alexa Rose Steele, Mark Gibson |
A onda nostálgica e o eterno ode ao terror oitentista e noventista não são nenhuma novidade, e diversos filmes tentam emular ou homenagear sua atmosfera. Só nos últimos dois anos tivemos como exemplo Censor, que de maneira bem inteligente relembrou o lado sombrio dos vídeo nasties, e o Psycho Goreman, que emulou os monstros dos filmes trash oitentistas de forma bem eficaz e divertida. Tivemos também exemplos de tentativas fracassadas com Um Clássico Filme de Terror, que tentou trazer um texto pretensioso numa atmosfera confusa, ou o Sem Conexão, que supostamente seria um slasher de acampamento no estilo Sexta-Feira 13 e que acabou sendo algo similar aos piores episódios de um seriado de terror infantil.
O filme que trago hoje é de 2021 e também busca na fonte do saudosismo alcançar uma parcela muito específica dos fãs do terror, parcela esta que se emociona só em relembrar das vídeo-locadoras e se identifica facilmente com o estereótipo do nerd desajustado.
Vicious Fun, ou Círculo Vicioso – como foi lançado no Brasil -, chega cheio de neon e com um texto afiado mostrando que excesso de elementos não é sinal de qualidade e que um bom roteiro vale mais que mil galhofas.
Nesse filme dirigido por Cody Calahan, conhecemos a história de Joel (Evan Marsh), que é um nerd de marca maior, que tem ambições de crítico de filmes de terror, assim como este que vos escreve. Num belo dia ele percebe que um de seus maiores ídolos nada mais é que um boçal capitalista e que sua colega de quarto, que também é sua crush, está claramente o deixando na friendzone ao sair com outros caras. Numa ideia “brilhante” ele decide então seguir o último pretendente da moça até um bar e ficar por ali para analisar o que o outro tem que ele não tem. Em meio a amarguradas constatações de fracasso, ele acaba bebendo todas e adormecendo no banheiro do bar abraçado no vaso, para jogar terra sobre a própria fossa.
Algum momento depois, acorda de ressaca e percebe que o bar está fechado e lá dentro está rolando uma reunião intimista bem diferente. Nos mesmos moldes dos encontros do AA, seis pessoas estão dispostas em um círculo confessando suas particularidades, que, nesse caso, são as dificuldades em assassinar pessoas.
Isso mesmo, naquele bar acontecem encontros de psicopatas que abrem seus corações e suas maletas de ferramentas afiadas para a comparação e diversão de seus colegas. Joel tentará se enturmar para sobreviver, mas rapidamente será descoberto e veremos então tentativas bem atrapalhadas de um cara completamente comum, fugindo de diversos estereótipos do gênero slasher.
Aqui temos o psicopata do acampamento, o médico insano e cruel, o terrorista patriota, a Femme Fatale, o psicopata playboy e o coreano mafioso e extremamente mortal. Todos unidos com um único objetivo: matar o nerd.
Pensa num prato cheio para fãs de filmes slasher e, para aqueles que não curtem tanto esse subgênero de terror, ainda sobra um bom espaço para a comédia inteligente que brinca com os clichês tão batidos do gênero.
Joel é um personagem extremamente carismático que me lembrou muito o Ash de A Morte do Demônio, por sua naturalidade em meio ao caos. As piadas do texto não soam forçadas e as situações que claramente são muito exageradas, são plausíveis dentro da proposta. A roupagem dos anos 80 se mostra pelos cartazes de cinema, nos figurinos dos personagens ou nos cortes de câmera, mas elas são apenas elementos cênicos e ficam ali apenas como isso. O acerto do Cody Calahan se dá exatamente nesse ponto, ao não precisar da autoafirmação no seu roteiro, deixando o público preencher as eventuais lacunas. Aqui, o principal está no humor ácido, no inusitado e claramente no terror bem diferente do comum.
Cito a atuação primorosa do Ari Millen como Bob, que é o psicopata playboy sádico, uma referência clara ao filme Psicopata Americano, de 2000, e que consegue ter uma entrega única ao papel, mesclando o sadismo e o humor na medida certa, e o Julian Richings, figurinha já conhecida dos fãs de terror (três dedos da franquia Pânico na Floresta e a “Morte” do seriado Supernatural), que traz outro ponto alto da trama com o médico louco, que só de olhar em poucas cenas já traz sua presença pro filme todo.