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A Filha de Drácula
Original:Dracula's Daughter
Ano:1936•País:EUA
Direção:Lambert Hillyer
Roteiro:Garrett Fort, John L. Balderston, Bram Stoker, David O. Selznick, Charles Belden
Produção:E.M. Asher
Elenco:Otto Kruger, Gloria Holden, Marguerite Churchill, Edward Van Sloan, Gilbert Emery, Irving Pichel, Halliwell Hobbes, Billy Bevan, Nan Grey, Hedda Hopper, Claud Allister, Edgar Norton, E.E. Clive, Agnes Anderson

O conto “O Hóspede de Drácula” (Dracula’s Guest) foi inicialmente publicado em 1914 na coletânea “Dracula’s Guest and Other Weird Stories“. Acredita-se que ele seja o primeiro capítulo do livro “Drácula“, escrito por Bram Stoker, em 1897, e que foi retirado do material original por destoar do restante da obra. Além da declaração da esposa de Stoker, confirmando a exclusão do trecho, estudiosos encontraram evidências que comprovam uma relação de continuidade, embora haja também quem acredite que o texto fez parte de uma reescrita do autor, e o descarte tenha ocorrido nesse processo de recomeço. De toda forma, o protagonista do conto, que pode ser Jonathan Harker, em viagem a Munique, se vê preso a um vilarejo assombrado, durante uma tempestade, onde um túmulo de mármore revela a inscrição: “Condessa Dolingen de Gratz / na Estíria / procurou e encontrou a morte / 1801“. Seu visual é descrito como uma “bela mulher com bochechas arredondadas e lábios vermelhos“, vista como se estivesse dormindo. Posteriormente, ele perderia os sentidos e acordaria diante de um lobo gigante, em uma experiência horrenda de um pesadelo gótico. Stoker teria feito uma homenagem ao clássico “Carmilla” (1872), de Sheridan Le Fanu, demonstrando respeito pela escrita referente a uma vampira sedutora e arrepiante. E o conto serviu para inspirar o segundo filme de Drácula da Universal.

Uma leve inspiração, na verdade. A única relação com o longa, dirigido por Lambert Hillyer, em 1936, é a presença de uma condessa vampira, no caso, uma descendente direta do Conde da Transilvânia. Embora o produtor David O. Selznick tenha comprado os direitos da obra para a Metro-Goldwyn-Mayer, em 1934 a Universal adquiriu o conto em uma cláusula que obrigava a produção a iniciar até outubro de 1935 e depois estendida para fevereiro de 1936. Assim, a produtora correu com o lançamento mesmo sem um roteiro finalizado, apenas ideias que completavam ou fugiam completamente do primeiro filme. Enquanto estava em seu poder, Selznick contratou John L. Balderston para escrever o roteiro da continuação e iria, inclusive, amarrar umas pontas soltas deixadas pelo longa Drácula, de 1931, como o sumiço das três noivas de Drácula. E ainda mostraria que Van Helsing (na época, grafado como Von) foi à Transilvânia para destruir as noivas, mas ignorou uma quarta tumba contendo a tal Condessa, e ela o seguiria até Londres. O único problema desse texto é que a Universal detinha os domínios sobre a obra Drácula, de Bram Stoker, e a MGM apenas o conto, isto é, o roteiro não poderia ter qualquer personagem em cena que não estivesse apenas em “O Hóspede de Drácula“. Com a volta do direito para a produtora, bastava agora iniciar rapidamente a produção e trazer algo interessante para o novo filme.

Antes de chegar às mãos de Garrett Fort, o roteiro teve alguns rascunhos de R. C. Sherriff, não aprovados pelo órgão de censura britânico, British Board of Film Censors, e nem pela Motion Picture Production Code, pelo teor considerado ofensivo. Fort então foi contratado e só precisou fazer uma breve alteração em um momento de insinuação sexual da Condessa para uma jovem encontrada nas ruas de Londres. Com o argumento definido e a falta de interesse de James Whale, que havia feito uma ótimo trabalho em A Noiva de Frankenstein, restou a direção ficar a cargo de Lambert Hillyer, com uma vasta experiência no cinema, principalmente em produções de faroeste. Com um orçamento final de mais de US$270 mil dólares, as filmagens tiveram início em 4 de fevereiro de 1936 e foram até 10 de março, para um lançamento no mesmo ano. Não teve o mesmo sucesso comercial de Drácula, tendo também críticas mistas, algo que culminou em uma pausa da Universal por três anos antes de retornar aos seus monstros.

A Filha de Drácula começa exatamente onde o anterior terminou, embora o cenário seja nitidamente diferente. Dois policiais chegam à Abadia Carfax e encontram o corpo de Renfield com o pescoço quebrado, além de Van Helsing (Edward Van Sloan, único a retornar do filme anterior), que acabara de finalizar o Conde Drácula com uma estaca – utilizaram um busto de Bela Lugosi no caixão, com a autorização do ator. As autoridades não acreditam na história sobre vampiros imortais, e, com a confissão do assassinato, levam Van Helsing algemado. O Sargento Wilkes (E.E. Clive) e o guarda Albert (Billy Bevan) desdenham do envolvimento sobrenatural no confronto com Drácula e deixam numa cela os dois corpos, de Renfield e do Conde, sem informar o que teria acontecido com Mina e as noivas do vampiro.

Van Helsing pede ajuda ao seu ex-aluno e psiquiatra Dr. Jeffrey Garth (Otto Kruger), único capaz de confirmar sua história ao examinar os corpos. Na delegacia de Whitby, Albert está assustado pelo movimento no chão próximo aos caixões, com indícios que possam ser ratos. A Condessa Marya Zaleska (Gloria Holden) chega ao local, hipnotiza o guarda com seu anel, e leva embora o corpo do Conde Drácula, com a ajuda de seu servo Sandor (Irving Pichel). Ela queima o corpo em um ritual de aparente exorcismo, atirando sal na pira, acreditando que tal ação irá livrá-la da maldição que assombra sua família. Sim, a Condessa não quer mais matar, sugar sangue, nem muito menos a imortalidade, almejando se tornar uma pessoa comum, mesmo a contragosto de Sandor, sempre mantendo sua morbidez e gosto pelo macabro.

A vilã deixa evidente seu modus operandi, contado com o auxílio de seu servo para trazer vítimas. Em um evento social, a Condessa conhece o recém-chegado Dr. Garth, com sua secretária, a ciumenta Janet Blake (Marguerite Churchill), e pede ajuda para se livrar de sua condição, a partir da experiência do médico em ajudar viciados e pacientes a esquecerem seus traumas. O psiquiatra promete ajudá-la, ao mesmo tempo em que acompanha casos de pessoas sendo encontradas mortas, com perfurações no pescoço. Uma das vítimas é a jovem Lili (Nan Grey), convidada por Sandor a fazer parte de uma pintura da Condessa, numa atitude de resistência contra sua vontade de morder pescoços. E esse encontro que promoveu a polêmica cena “lésbica” do filme, atribuindo uma relação com a obra “Carmilla“, de Sheridan Le Fanu. Devido à influência da censura, a cena apenas envolveu uma sugestão de nudez da vítima, sem qualquer vestígio de sedução e relacionamento. Contudo, mais para o final, há um momento de quase beijo da Condessa em Janet, alimentando historiadores de horror como as primeiras insinuações homossexuais do cinema. A própria Universal aproveitou o hype para divulgar o filme com o slogan “Salve as mulheres de Londres da Filha do Drácula!“.

Polêmicas à parte, A Filha de Drácula é bastante inferior ao primeiro filme. Ainda que conte com a boa atuação de Gloria Holden – a própria atriz não se sentiu muito à vontade com o papel -, o filme deixa de lado o horror pelas discussões sobre ciência e o sobrenatural. Aliás, Holden não queria ser rotulada com o gênero, visto desde aquela época como marginal, e acompanhando a luta de Bela Lugosi para se livrar de seu estigma. E é até curioso, porque sua rejeição rima perfeitamente com o papel da Condessa, lutando contra seu desejo de fazer vítimas. A sequência final acontece na Transilvânia, no castelo do Conde Drácula, com mais uma vez Van Helsing em cena e Dr. Garth tentando salvar Janet e ouvindo uma sugestão de troca: a vida dele no lugar da moça. É uma sequência até mais intensa que a vista no final de Drácula, com o combate envolvendo Sandor munido de arco e flecha, e a vampira tentando hipnotizar o médico. Mas sem morcegos, sem embarcações perdidas no mar revolto e principalmente sem a imponente atuação de Bela Lugosi.

Depois de A Filha de Drácula, vampiros voltariam a atacar na Universal com O Filho de Drácula (Son of Dracula, 1943), com Lon Chaney Jr. no papel do Conde, seguido por A Casa de Frankenstein (House of Frankenstein, 1944), desta vez com a vestimenta de John Carradine, também presente em A Casa de Drácula (House of Dracula, 1945). Bela Lugosi só voltaria a vestir a capa na comédia Abbott e Costello Encontram Frankenstein (Bud Abbott and Lou Costello Meet Frankenstein, 1948), encerrando seu envolvimento com o personagem no Cinema – na TV, ele faria uma pontinha na série The Paul Winchell and Jerry Mahoney Show, no terceiro episódio da primeira temporada, exibido no dia 2 de outubro de 1950. Apesar da participação curta como Drácula, é a principal referência, ao lado de Christopher Lee, como os maiores vampiros que o cinema já apresentou.

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