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Nosferatu: Uma Sinfonia do Horror
Original:Nosfératu le Vampire
Ano:2023 / 1925•País:França
Autor:Hughes Chelton•Editora: Sebo Clepsidra

É inegável a influência do clássico Drácula, de Bram Stoker, no mundo do horror. Apesar de já existirem lendas envolvendo vampiros muito antes do lançamento da obra, foi com ela que as portas para esses seres foram abertas para habitarem todos os cantos do mundo. As mais diferentes representações de vampiros são feitas até os dias de hoje, mas existe uma certa ramificação de suas características. Existem os que bebem da fonte de Stoker e apresentam seres belos, elegantes, românticos e angustiados, com um toque de crueldade (a exemplo dos vampiros de Anne Rice, da série True Blood, o clã Toreador do jogo de RPG Vampiro, a Máscara, o jogo de videogame Castlevania, o anime Vampire Hunter D, dentre diversos outros exemplos) e também há aqueles que retratam os vampiros como seres puramente maléficos, com características horrendas e animalescas (a exemplo da série The Strain, baseada na obra de Guillermo Del Toro, os seres da obra Salem’s Lot de Stephen King, todo um clã baseado em Nosferatu em Vampiro, a Máscara e por aí vai). Esse segundo grupo tem como grande influência, é claro, Nosferatu, clássico de um dos grandes nomes do expressionismo alemão, Friedrich Murnau. Portanto, não é exagero dizer que tanto Drácula quanto Nosferatu revolucionaram o horror, cada um a seu modo, nos apresentando assustadores seres bebedores de sangue com características diversas. Porém, como sabemos, Nosferatu é uma adaptação não autorizada do livro de Bram Stoker.

Em 1922, Murnau lançou aquilo que seria um dos grandes clássicos do cinema de horror, referência do cinema em preto e branco graças a inovações cinematográficas utilizadas. Entretanto, muita polêmica envolveu o filme. A família de Stoker não tinha interesse algum em vender os direitos do livro para adaptação naquela época; entretanto, Murnau pensou em uma solução – mudar os nomes dos protagonistas, algumas características, e deixou o roteiro bem mais enxuto – e produziu mesmo assim, torcendo para que tudo desse certo. Não deu. Foi processado por plágio, a produtora faliu e todas as cópias do filme tiveram que ser destruídas. Felizmente, nem todas tiveram um fim. Algumas cópias conseguiram chegar aos Estados Unidos e, assim, foram livremente distribuídas.

Hughes Chelton é o responsável pela novelização dessa joia da sétima arte, sendo recrutado para tal tarefa em 1925. Após quase 100 anos, é apenas em 2023 que a versão literária chega ao Brasil, graças aos esforços da editora Sebo Clepsidra, com tradução de Bruno Anselmi Matangrano do francês.

Sem mais delongas, a obra é dividida em duas partes: Nosferatu, o Vampiro e O Espectro da Morte Negra. Na primeira parte, conhecemos o jovem corretor de imóveis Jean Hutter, que tem a missão de ir até os Cárpatos tratar com um misterioso conde chamado Orlok sobre a compra de uma residência em Wisborg. Curiosamente, a casa a ser negociada fica em frente à sua residência. Hélène, esposa de Jean, teme por seu marido nessa longa viagem e começa a ter sonhos estranhos e ficar em estado alterado durante a estadia do amado no castelo de Orlok.

Jean descobre que os locais possuem um medo irracional tanto do castelo quanto do conde e, chegando lá após uma série de acontecimentos peculiares, depara-se com um homem de aparência cadavérica, careca e com unhas longas. Apesar de ser uma aparição assustadora, ele recebe seu convidado com muita cordialidade e começam a conversar amenidades, até que do mais absoluto nada mostra um interesse repentino e grande insistência em saber sobre o pescoço de sua esposa, fazendo perguntas e afirmações embaraçosas ao jovem. Após uma noite de sono, Hutter percebe que há duas marcas em seu pescoço, e atribui o incômodo fato a mosquitos da região.

O pobre Hutter passa por momentos pavorosos no castelo, enquanto Hélène está em desespero em sua casa, com ataques de sonambulismo e um crescente interesse em vampiros que preocupa parentes e amigos. Como se isso não fosse o suficiente, Orlok está prestes a chegar em Wisborg, trazendo todo um rastro de destruição consigo.

Como o infernauta pôde perceber, a semelhança com Drácula é facilmente notada, mas não a essência em si. Não nos é apresentado um ser de notável inteligência com entendimentos profundos sobre a humanidade, Orlok é muito mais a parte selvagem do vampiro, sendo movido puramente por sua sede de sangue. Sua aparência destoa completamente da criatura da obra original, e foi justamente isso que deu origem a muitos outros seres assustadores citados no começo do texto.

O enredo de Nosferatu é muito mais condensado, deixando apenas as partes voltadas ao horror e brutalidades e cortando qualquer romantismo que existe em Drácula. Aqui, temos uma criatura bestial tanto por fora quanto por dentro. Isso acaba fazendo a leitura ser mais dinâmica, direta ao ponto, sem muitas enrolações e dando muita ênfase aos horrores passados pelo casal de protagonistas, apesar de tornar toda a história muito mais simplista. Não existe a profundidade de Drácula aqui. Vale citar que existem diferenças entre o filme e sua novelização escrita por Chelton, tais como os nomes de Jean e Hélène – no filme, Thomas e Ellen – e o jeito de se expressar de Orlok, já que no filme não há diálogos e podemos apenas imaginar como seria uma conversa entre humano e tal criatura. Também é interessante notar que, no livro, Nosferatu faz um paralelo com a Peste Negra, dando a entender que a doença começou assim que Orlok e sua terra contaminada desembarcaram em Wisborg, coisa que não existe na obra de Stoker.

São nítidos os elementos de Drácula usados como base para criar a história de Nosferatu, mas é importante notar que também há diferenças cruciais, muito além da aparência da criatura noturna. Por isso são tratadas como obras diferentes, e não como se ambos fossem a mesma obra apenas com ligeiras mudanças. Cada uma teve uma contribuição incomparável para o mundo do horror, seja na literatura ou no cinema. Enquanto os filhos de Nosferatu se escondem nas profundezas e saem para se alimentar fazendo uma carnificina, os filhos de Drácula fazem questão de se misturar aos humanos, mostrar seu intelecto e fazer vítimas sem levantar suspeitas para si. Tais diferenças são primordiais. Nosferatu fez com que seres cruéis e assustadores de dentes, unhas e orelhas pontudas e com medo da luz pudessem sair dos bueiros e mostrar suas garras, enquanto Drácula abriu espaço para os belos, sádicos, bem vestidos e românticos seres das trevas se misturarem à sociedade.

Por mais que Nosferatu seja uma cópia não autorizada de Drácula, Murnau conseguiu criar todo um mito que o separa completamente de sua inspiração, deixando à mostra o lado mais bestial, sangrento e horripilante do vampiro e, consequentemente, ficando mais próximo das lendas contadas no leste europeu. Se não existisse a narrativa de um conde querendo comprar uma propriedade e o pobre Thomas/Jean não viajasse para tão longe para encontrar Orlok e passasse por apuros no castelo, talvez a viúva de Stoker não tivesse argumentos suficientes para ganhar o processo.

A edição, além de uma bela capa dura com relevos prateados, conta com um excelente posfácio, escrito por Carlos Primati, falando sobre a trajetória do primeiro vampiro do cinema, artigos franceses traduzidos por Bruno Matangrano, artigos alemães traduzidos por Felipe Vale da Silva e artes conceituais e promocionais de Nosferatu por Albin Grau. Também há fotografias do filme espalhadas ao longo do livro. Item indispensável na coleção de qualquer fã de cinema e horror.

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3 Comentários

  1. Este filme só mudou minha vida. Já tinha lido Stoker, e vi as referencias, mas como diz o artigo…Noferatu é infame, cruel e mau, por sua própria natureza bestial. Eu reassisto 1 vez ao ano. Já fazem 20 anos.

  2. Tô com o DVD desde o ano passado e ainda tô procrastinando em vez de assistir.

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